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Análise Psicológica
versão impressa ISSN 0870-8231
Aná. Psicológica v.28 n.1 Lisboa jan. 2010
A dinâmica da consistência moral
Ana Carita (*), Gonçalo Tomé (*)
ISPA – Instituto Universitário
RESUMO
O estudo inscreve-se na problemática da moralidade, centrando-se no problema da acção moral consistente. A mobilização de variáveis cognitivas e afectivas para a compreensão desta questão, e a operacionalização empírica da consistência no quadro das contribuições da abordagem desenvolvimental e estrutural da moralidade constituem traços centrais da pesquisa.
Para a recolha da informação foi construído um questionário, o qual foi administrado a 156 participantes, dos 8º e 11º anos de escolaridade, rapazes e raparigas.
Relativamente aos resultados confirmaram-se algumas das hipóteses colocadas, embora a sua interpretação não se apresente linear. Assim, a relação entre a cognição e a consistência apresentou-se positiva, mas fraca; já a relação entre a variável afectiva e a consistência apresentou-se igualmente positiva, mas mais confiável. Também o género parece contribuir para a variabilidade da consistência. Inteiramente não confirmadas foram as hipóteses sobre a contribuição da escolaridade na consistência, bem como o efeito mediador da satisfação perspectivada na relação entre a cognição e a consistência. Finalmente, a análise integrada da contribuição das variáveis preditoras na consistência mostrou que todas elas, com excepção da escolaridade, contribuem para explicar a variabilidade da consistência, aliás, mais do que qualquer uma delas isoladamente considerada.
Palavras-chave: Afectos, Cognição moral, Consistência moral, Escolaridade, Género.
ABSTRACT
The present study is based on a moral problem, and focus on the issue of consistent moral action. The mobilization of cognitive and affective variables for the understanding of this issue, and the empirical operationalization of consistency, within the frame of the contributions of a developmental and structural approach to morality, constitute central features of this research.
In order to gather information a questionnaire was structured and applied to 156 8th and 11th grade boys and girls.
The results have confirmed some of the formulated hypotheses, although their interpretation is not straightforward. The relationship between cognition and consistency presented a positive, however weak, result regarding the relationship between the affective variable and consistency, the latter being more reliable. Gender also seems to play a role in the consistency variability. The assumptions on the contribution of schooling to consistency, as well as the mediating effect of satisfaction, understood in the relationship between cognition and consistency, have not been confirmed. Finally, the integrated analysis of the contribution of predictor variables for consistency showed that all of them, with the exception of schooling, help to explain the variability of consistency, in fact, more than each one of them considered per se.
Key-words: Affect, Gender, Moral cognition, Moral consistency, Schooling.
INTRODUÇÃO
Por que razão fazemos nós o que julgamos que devemos fazer? Ou, inversamente, por que razão não fazemos nós o que achamos que devemos fazer? Estas são questões que têm preocupado e ocupado diversos investigadores na área do comportamento e do pensamento (por exemplo, Aquino & Reed, 2002; Blasi, 1980, 1994, 1999; Hardy & Carlo, 2005; Lourenço, 2002). Quando as questões anteriores se constituem em fazer, ou não, bem ou mal a outrem, entramos na área da moralidade.
O estudo aqui apresentado pretende contribuir para o esclarecimento, no campo moral, da relação entre o que pensamos e o que fazemos, já que esta continua a ser uma questão em aberto (Aquino & Reed, 2002; Hardy & Carlo, 2005; Lourenço, 2002). A interrogação de raiz que se colocou na pesquisa foi então: o que faz com que certas pessoas apresentem consistência entre o raciocínio moral e a acção moral e outras apresentem menos consistência nesta relação?
Um pressuposto central do estudo é o de que a cognição e a acção morais se relacionam entre si. Trata-se, ao fim ao cabo, de partir de um pressuposto não pacífico, mas presente na abordagem estrutural desenvolvimentista da moralidade (Candee & Kohlberg, 1987; Kohlberg, 1992; Kohlberg & Candee, 1992), ainda que sobre ele se afigure necessária mais averiguação empírica.
A afirmação largamente conhecida de Kohlberg (1992) de que quem conhece o bem, escolhe e pratica o bem, subentende que existe uma tendencial consistência entre juízo e acção moral, particularmente evidente nos estádios morais mais elevados.
Kohlberg atribuiu aos juízos de responsabilidade – juízos sobre o compromisso pessoal em agir conforme o que se julga ser a acção moral mais correcta – uma função mediadora entre os juízos morais e a acção moral efectiva (Candee & Kohlberg, 1987). À medida que os indivíduos progridem na sua competência moral, verifica-se que também aumenta o número de juízos de responsabilidade consistentes com o juízo moral.
Esta consistência progressiva, porém, não é prefeita, mesmo nos estádios finais do desenvolvimento moral (Kohlberg & Candee, 1992). Assim sendo, é de considerar a pertinência de outras hipóteses que permitam compreender melhor a relação entre a cognição moral e a acção moral. É o caso do eventual efeito mediador de variáveis emocionais naquela relação, tal como, por exemplo, o efeito da satisfação que se perspectiva com a prática do bem no reforço da consistência entre a cognição e a acção moral.
Como é sabido, a investigação de Kohlberg sobre a moralidade não incide, em primeira linha, sobre esta problemática. Kohlberg inicia as suas pesquisas na área da moralidade sobre a questão do desenvolvimento do juízo moral e fá-lo a partir dos estudos de Piaget sobre a moralidade (1932/1994) e, também, sofrendo a influência do seu modelo estrutural e desenvolvimentista da cognição lógica. Porém, a sua contribuição excedeu as preocupações com a explicação do desenvolvimento da cognição ou juízo moral. Com efeito, os seus interesses estenderam-se, nomeadamente, à procura de compreensão do agir moral na sua relação com a cognição moral (Candee & Kohlberg, 1987; Kohlberg, 1992; Kohlberg & Candee, 1992) e à questão da educação moral (Kohlberg, 1992), valorizando, deste modo, uma dimensão funcional e socialmente interventora dos estudos sobre a psicologia da moralidade.
Alguns autores têm apontado as limitações das contribuições teóricas de Kohlberg, quer para a predição do agir moral (por exemplo, Mischel & Mischel, 1994), quer para a promoção de comportamentos morais (por exemplo, Bandura, 1991). Trata-se de pretender acantonar aquelas contribuições no campo da cognição moral e de menorizar o seu impacto na compreensão e na educação do agir moral, campos que, segundo os referidos críticos, seriam centrais na investigação sobre a moralidade.
Não obstante estas críticas, é sabido que a teoria Kohlberguiana do desenvolvimento moral e da acção e educação morais constituem uma referência incontornável para os estudos contemporâneos sobre a moralidade e um ponto de partida para muitos deles, como é o caso do estudo que aqui se apresenta.
A DINÂMICA DA CONSISTÊNCIA MORAL
Sendo a dinâmica da consistência moral o tema central desta pesquisa, interessa clarificar o significado desta variável, bem como das variáveis que supomos a ela associadas.
A cognição moral
Genericamente falando, entende-se por cognição moral qualquer informação ou declaração verbal de conteúdo moral. Numa investigação sobre o tema, porém, requer-se a sua definição mais detalhada. Blasi (1980), por exemplo, identifica três enfoques da cognição moral quando investigada na sua relação com a acção moral: (a) atitudes morais, expressas por crenças ou inclinações afectivas; (b) informação moral ou reconhecimento das normas morais; (c) julgamento ou raciocínio moral, baseado nas justificações e conclusões em que são suportadas as decisões morais. É no quadro desta última acepção que a perspectiva cognitivo-desenvolvimentista faz a sua abordagem da moralidade.
A qualidade moral de uma acção deriva do raciocínio moral que lhe é subjacente: “para ser moral, uma acção tem de ser, em primeiro lugar, subjectivamente moral” (Lourenço, 2002, p. 55). É a cognição moral, e não tanto a acção, que permite distinguir condutas e aferir a sua qualidade moral. É sobretudo pelo pensamento que a qualidade moral da acção pode ser aferida.
Ainda segundo a perspectiva cognitivodesenvolvimentista, é também o pensamento, ou melhor, o modo de pensar moral, que indica o nível de desenvolvimento moral dos indivíduos. Deste modo, falar de desenvolvimento moral equivale a falar de desenvolvimento do juízo moral e, mais especificamente, do desenvolvimento dos juízos deônticos de justiça.
Advoga-se que este desenvolvimento ocorre de acordo com uma sequência de estádios que é independente da cultura, do meio social, do continente ou do país a que o indivíduo pertence (Colby & Kohlberg, 1987; Kohlberg & Hersh, 1977), isto é, assume-se a transculturalidade e o universalismo como seus pressupostos centrais.
Cada estádio, por sua vez, representa uma organização do pensamento moral qualitativamente distinta e superior à organização do estádio anterior; porém, cada estádio não só representa um modo mais elevado e complexo de pensar, como também inclui, simultaneamente, o pensamento dos estádios anteriores (Kohlberg & Hersh, 1977). Kohlberg descreve o desenvolvimento moral como um processo em seis estádios, distribuídos, dois a dois, por três níveis: pré-convencional, convencional e pós-convencional. O Estádio 1 é caracterizado por uma orientação moral para o castigo e obediência; o Estádio 2, por uma orientação calculista, instrumental, assente na pura troca, no hedonismo e pragmatismo; o Estádio 3, por uma orientação para o bom menino e para uma moralidade de aprovação social e interpessoal; o Estádio 4, por uma orientação para a manutenção da lei, da ordem e do progresso social; o Estádio 5, por uma orientação para o contrato social, o relativismo da lei e o maior bem para o maior número; e o Estádio 6, por uma orientação para os princípios éticos universais, reversíveis e auto prescritos (Colby & Kohlberg, 1987; Kohlberg & Hersh, 1977).
Os estádios, por sua vez, apresentam-se organizados em três níveis morais. A moralidade pré-convencional é o nível da maioria das crianças antes dos 9 anos, e de alguns adolescentes e adultos (Colby & Kohlberg, 1987). Neste nível de raciocínio moral a justiça e a moralidade são representadas como normas externas ao indivíduo, sendo a obediência a estas normas devedora da sua função utilitária; trata-se, sobretudo, de procurar satisfazer os desejos e interesses ou evitar castigos.
A moralidade convencional é normalmente alcançada pelos adolescentes e adultos de diversas sociedades. Este nível caracteriza-se pelo conformismo face às normas sociais vigentes, agora já interiorizadas pelo indivíduo. É o nível moral que corresponde a uma moralidade orientada pela necessidade de aprovação pessoal e de manutenção geral da ordem social, entendidas como condições necessárias à inserção dos indivíduos nos grupos e na sociedade e mesmo à salvaguarda destes (Colby & Kohlberg, 1987).
A moralidade pós-convencional é alcançada apenas por uma minoria de adultos, normalmente após os 20-25 anos. Neste nível, o valor moral não reside na conformidade com as normas e convenções sociais, mas sim na conformidade com os princípios éticos universais, tais como o direito à vida, à liberdade ou à justiça. Prevalece, neste nível moral, o reconhecimento da natureza relativa, e por vezes, arbitrária, de algumas normas sociais e a consideração dos princípios éticos universais como critérios últimos do julgamento moral (Colby & Kohlberg, 1987).
Uma das críticas aos estudos de Kohlberg, a protagonizada por Gilligan (1982), enfatiza que a sua investigação omite a questão do género. Tal omissão seria responsável por uma descrição do desenvolvimento moral que tende a transformar as mulheres em candidatas naturais ao Estádio 3, enquanto os homens seriam candidatos naturais ao Estádio 4. Tal risco sexista dever-se-ia ao facto de o enfoque de Kohlberg se apoiar na sobrevalorização de uma abstracta ética da justiça, centrada em direitos e deveres e na consequente ignorância de uma ética contextualista do cuidado, centrada na preocupação com o bem-estar. Ora, de acordo com Gilligan (id), enquanto a moral dos direitos e deveres é uma boa expressão dos aspectos dominantes da moralidade masculina, mais direccionada para as questões da justiça e da lei, a moralidade do cuidado, aproximar-se-ia mais da moralidade feminina, mais emocional e concreta. Desta forma, a autora conclui que mulheres e homens, em termos morais, se expressam preferencialmente de modo diferente. Em articulação com estas posições, situa-se a crítica ao recurso exclusivo a dilemas morais hipotéticos como forma de acesso ao nível de raciocínio moral, instrumento a que não se atribui capacidade para captar a voz feminina, mais sensível a histórias reais e a narrativas pessoais
A revisão efectuada por Walker (1984, 1994), sobre os muitos estudos gerados pela controvérsia atrás referida, não confirmou a alegada natureza sexista da teoria e dos instrumentos de avaliação do desenvolvimento moral propostos por Kohlberg, já que as mulheres não apresentaram nesses estudos níveis de desenvolvimento inferiores aos dos homens, excepto quando comparadas com homens de estatuto educacional e profissional mais elevado que o seu, resultado que salienta, antes de mais, o grande impacto da escolaridade no desenvolvimento moral. Em todo o caso, este não parece ser um dossier fechado.
A acção moral
O interesse primordial de Kohlberg e seus colaboradores na investigação sobre a moralidade centra-se na questão da cognição moral; porém, não é legítimo deixar de sublinhar a atenção que igualmente dispensaram ao tema do agir moral e da educação moral. O enfoque Kohlberguiano não deixa de se preocupar, ainda, com a exploração do factor ou factores que motivam para a acção e com a consistência entre esta e o juízo moral (Colby & Kohlberg, 1987). Valoriza-se, do lado da abordagem desenvolvimental, que o facto de se aceder ao raciocínio moral através de situações hipotéticas, permite fazer predições sobre a conduta moral efectiva; seria, justamente, o recurso a situações hipotéticas na avaliação do juízo moral que permitiria reduzir a lacuna entre os juízos morais e as acções específicas (Damon, 1977).
Entretanto, sucede que a tarefa de definir uma acção como moral ou imoral é de grande complexidade e dificuldade para os investigadores na área da moralidade, registando-se sobre a questão diferentes contribuições.
Rest, Bebeau, e Volker (1986), por exemplo, advogam que um indivíduo age moralmente quando desencadeia, pelo menos, quatro processos psicológicos fundamentais: (1) avalia as possíveis opções e suas consequências, em particular, quem, incluindo o próprio, seria afectado pela acção e como iriam as partes considerar os efeitos da acção; (2) julga qual a acção que seria moralmente correcta; (3) prioriza, acima de outros valores, os valores morais; (4) tem força de vontade e perseverança para actuar de forma moral e para fazer frente e ultrapassar os obstáculos que essa decisão acarrete.
Blasi (1999) identifica duas características que considera academicamente consensuais, a saber: (1) a acção moral não é acidentalmente produzida, nem resultante de factores externos ao agente activo; para que uma acção adquira o estatuto de acção moral tem de ser intencional; (2) no agir moral as razões têm de ser morais, têm de estar relacionadas com o que é moralmente bom ou mau no entendimento do agente. Basta que uma destas características não esteja presente, para que não possamos falar em acção moral.
Mais recentemente, Hardy e Carlo (2005) defendem que a acção moral requer a presença da decisão final de agir. Também para Gollwitzer (1993, cit. por Hardy & Carlo, 2005), a intenção de agir é a causa próxima do comportamento; assim, a acção é vista como sendo o resultado de uma decisão sobre a sua execução. Diga-se que, em consonância com este olhar, no quadro da presente pesquisa, o que esteve em jogo não foi a averiguação directa sobre a acção moral, mas sobre o seu elemento necessariamente precedente, a decisão ou intenção de agir (Hardy e Carlo, 2005). A intenção de acção, ou a determinação para agir, foi uma das variáveis instrumentais utilizadas, com base na assunção da sua proximidade e necessária precedência relativamente ao agir. Aliás, outras contribuições do campo do desenvolvimento moral advogam a legitimidade da inferência sobre a acção dos indivíduos, a partir do questionamento sobre a sua determinação em actuar (Blasi, 1999).
Entretanto, do lado do modelo da aprendizagem social, apontam-se insuficiências ao modelo cognitivista na investigação sobre o comportamento moral. Mischel e Mischel (1994), por exemplo, defendem que o comportamento moral, como aliás qualquer outro comportamento, é resultado de contingências de reforço e imitação; argumentam que os comportamentos são determinados por modelagem, observação e imitação e que a perspectivação das consequências dos comportamentos adoptados inibe, no caso das consequências negativas, ou facilita, no caso das consequências positivas, o comportamento futuro. Afirmam, por isso, que “o mais nobre altruísmo, baseado no nível mais elevado de raciocínio moral, depende, ainda, das consequências esperadas” (id, 1994, pp. 97-98). Defendem, deste modo, que o raciocínio moral, e a fortiori as palavras através das quais se exprime, tem pouco valor preditor da acção moral, as duas variáveis teriam pouca relação entre si. Contribuindo para o reforço dos argumentos que suportam esta posição, está a evidência de que as diferenças linguísticas entre os indivíduos podem influir no nível de raciocínio moral por ele exibido em situação de entrevista.
A crítica destes autores é especialmente contundente quando o que está em causa é a predição do comportamento em indivíduos com baixo nível de desenvolvimento moral. Para o efeito, mobilizam mesmo resultados obtidos por estudos empíricos efectuados no quadro do modelo desenvolvimentista. É o caso do estudo de Haan, Smith, e Block (1968), em que se verificou que são os indivíduos situados nos estádios morais mais elevados e nos estádios morais mais baixos que apresentam condutas morais efectivas (activismo político e desobediência civil, respectivamente), não se tendo verificado tal situação nos indivíduos situados nos estádios médios e intermédios. Apoiando-se nestes resultados, Mischel e Mischel (1994) consideram difícil justificar uma forte ligação entre julgamento moral e acção moral.
A consistência moral
Partindo nós do pressuposto da existência de uma relação positiva entre o pensamento moral e a acção moral, recolocamos a questão: O que faz com que certas pessoas não actuem em conformidade com aquilo que pensam ser correcto fazer? Trata-se de uma interrogação que nos remete para a questão da consistência e inconsistência moral e para a necessidade de definirmos estes termos.
A inconsistência moral pode ser definida como uma descontinuidade ou divergência entre o pensamento moral de uma pessoa e a sua conduta moral efectiva. Esta descontinuidade não surpreende, mesmo alguns investigadores filiados numa perspectiva desenvolvimentista. Erkut, Jaquette, e Staub (1981), por exemplo, na sequência de estudos empíricos, concluem que um elevado nível sócio-cognitivo nem sempre anda associado a um elevado ajustamento na conduta social do indivíduo. O mesmo é dizer que um resultado moral elevado, evidenciado numa entrevista reflexiva sobre situações hipotéticas, não basta para predizer o funcionamento dos indivíduos em situações naturais de vida, limitação que aliás também se verifica quando se atende exclusivamente a variáveis de contexto: “nem o conhecimento da situação por si só, nem o conhecimento do julgamento moral isolado são suficientes para predizer acções morais” (id, pp. 10-11).
Entretanto, a inconsistência moral não surpreende de todo quem se situa no quadro da aprendizagem social, já que aqui não se espera a existência de uma forte relação entre o pensamento moral do indivíduo, ou melhor, entre a sua expressão verbal, e a conduta moral efectiva (Mischel & Mischel, 1994). Neste enfoque, advoga-se a especificidade da conduta moral. Aliás, estes autores salientam que nos podemos não só confrontar com inconsistências entre a cognição e a acção moral, como, também, com inconsistências na própria conduta e, ainda, com inconsistências no próprio pensamento. Consoante as situações e as circunstâncias, assim se pode apresentar quer o pensamento moral dos indivíduos, quer o seu comportamento moral, já que estes variam com a variação das motivações e incentivos, e mesmo com alterações sociais de natureza socio-económica e com a educação recebida (Mischel & Mischel, 1994).
Em todo o caso, do lado da abordagem desenvolvimental da moralidade, Blasi (1980), que reviu 75 estudos sobre a relação entre o julgamento moral, avaliado maioritariamente pela entrevista de Kohlberg, e o comportamento, verificou que em 57 deles se encontraram relações significativas entre as duas variáveis. Também Rest, Thoma, e Barnett, com base na revisão de estudos que relacionavam o juízo moral, avaliado pelo questionário de avaliação moral de Rest (DIT), com medidas de comportamento, concluem que “parece razoável assumir que o julgamento moral está ligado ao comportamento” (1986, p. 135).
Deve destacar-se que esta foi uma questão a que Kohlberg e colaboradores prestaram particular atenção, tomando-a como objecto de investigação empírica. Foi na sequência destes estudos que Candee e Kohlberg (1987) concluíram que é de esperar uma relação positiva entre estádio moral e acção moral, mas apenas se um ou ambos os juízos mediadores desta relação estiverem presentes. Atribuem a qualidade de juízos mediadores desta relação, aos juízos deônticos e aos juízos de responsabilidade. Os primeiros decidem sobre o que é correcto e o que não o é; os segundos decidem sobre o prosseguimento do que foi julgado correcto (follow-through), têm a função de decidir sobre o prosseguimento na acção com o julgamento deôntico que foi feito.
A propósito da questão da consistência entre o pensamento moral e a acção, tem sido habitual invocar os resultados do polémico estudo de Milgram (1963, 1965, 1974, cit. por Vala & Monteiro, 2004) sobre a obediência à autoridade. Os resultados obtidos neste estudo mostraram que dos 40 sujeitos intervenientes na experiência, 26 chegaram a aplicar a outro o máximo de volts possível e que 86% dos sujeitos obedeceram à autoridade, contrariando a sua posição face à mesma. Kohlberg e Turiel (1971), porém, verificaram que os indivíduos com um raciocínio moral de nível mais elevado tendem a recusar mais frequentemente a aplicação a outro de choques eléctricos, desobedecendo, assim, à autoridade. Aliás, já estudos anteriores tinham mostrado que os indivíduos de níveis inferiores de raciocínio moral tendem a obedecer à autoridade, enquanto os indivíduos de níveis de raciocínio moral mais elevados tendem a desobedecer à autoridade, contrariando a influência e a pressão social. Berkeley (1964, referido por Kohlberg & Turiel, 1971) confirmou esta ideia ao verificar que os sujeitos que aceitam aplicar os choques eléctricos a outros se situam nos níveis mais baixos de juízo moral e que apenas alguns destes se situam nos Estádios 3 e 4 de moralidade. Face a estes resultados, o que se pode dizer “é que um baixo nível de juízo moral é um factor que, entre outros, contribui para o comportamento anti-social” (Carita, 2005, p.151). Em suma, pode concluir-se que, face à evidência de as pessoas com um raciocínio moral mais elevado apresentarem maiores índices de consistência entre a cognição moral e a acção moral, é legítimo supor que se trata de pessoas que mais facilmente põem em prática juízos de responsabilidade, ou seja, que traduzem em acção efectiva o que julgam ser as suas obrigações morais (Blasi, 1980, 1994a; Candee & Kohlberg, 1987; Kohlberg & Candee, 1992).
Para terminarmos, observe-se que, na sequência da sua meta-análise, Blasi (1980) salienta que, a propósito da relação entre o juízo e acção morais, têm sido utilizadas duas significações diferentes e ambíguas do termo consistência. A primeira definição, segundo ele, pode ser chamada de “traço de consistência”: esta remete, não só para a tendência para se agir de forma semelhante em momentos e situações diferentes, como, também, para a tendência de, no mesmo indivíduo, vários traços permanecerem juntos, formando, assim, traços super ordenados. Esta é a significação que podemos ver espelhada nos argumentos proferidos por Mischel e Mischel (1994). A segunda definição remete para o acordo entre as declarações dos indivíduos sobre as suas acções e as suas próprias acções. Esta noção de consistência, designada por Blasi de “consistência pessoal”, aponta para uma visão processual da mesma. É, aliás, no quadro desta segunda concepção que temos vindo a abordar a questão da relação entre o juízo e a acção moral e é também neste sentido que ela é tomada no nosso estudo empírico.
Em todo o caso, a polémica em torno da relação entre juízo moral e acção moral está longe de se encontrar suficientemente esclarecida, como aliás sucede sobre a relação entre cognição e acção fora do âmbito da moralidade. Maclean, Walker, e Matsuba (2004), por exemplo, observam que o grau de consistência não pode mascarar o facto de um indivíduo poder ter um raciocínio de nível pós-convencional e continuar a ser imoral no comportamento. Interessa, pois, prosseguir a investigação empírica sobre a dinâmica da acção moral consistente.
PROBLEMÁTICA
O problema em análise diz respeito à dinâmica da consistência moral, ou seja, à dinâmica do acordo entre o pensamento moral e a acção moral; trata-se de averiguar que factores interferem naquela dinâmica de modo a favorecerem que o sujeito faça efectivamente o que julga que deve ser feito, quando em situação de conflito moral hipotético. É pois central na pesquisa a procura de aprofundamento da compreensão da dinâmica da acção moral consistente, tendo-se recorrido para o efeito à consideração de variáveis de natureza cognitiva (Indicador de Estádio Moral) e afectiva (Satisfação Perspectivada com a prática da acção julgada justa).
A abordagem da Cognição Moral e da Consistência Moral foi operacionalizada nos termos que se passa a apresentar. Assim, relativamente à Cognição Moral, tomou-se como seu indicador a variável que designámos de Indicador de Estádio Moral (IEM), medida nos termos que adiante se esclarecem. Relativamente à Consistência Moral (CM), concorreram para a sua averiguação a consideração de duas outras variáveis, digamos, instrumentais, a saber, a Intenção de Acção (IA) e a Determinação para a Acção (DA). Deste modo, apoiados nestas variáveis instrumentais, e estando em jogo a escolha entre roubar ou não roubar o medicamento, tomou-se por Consistência Moral, num primeiro momento, a verificação de concordância entre a acção escolhida pelo sujeito no contexto do seu juízo deôntico (o que deve fazer o Henrique?) e o conteúdo da intenção de acção, ou seja, a acção escolhida no contexto do seu juízo de responsabilidade (o que faria eu se estivesse no lugar do Henrique?), concordância associada à escolha de um dos primeiros níveis de Determinação para a Acção (1, 2, 3 ou 4). Tratou-se de apurar a Consistência A (CA). Num segundo momento, foi apurar-se um nível muito acentuado de consistência, a Consistência B (CB), assente na verificação cumulativa de consistência entre as orientações das acções afirmadas no contexto do juízo deôntico e do juízo de responsabilidade e um Nível 5 de Determinação para a Acção. Finalmente, tomou-se por Inconsistentes (I) os participantes que não caem em nenhuma das condições anteriormente definidas.
Tratou-se de operacionalizar empiricamente a tese segundo a qual a relação entre julgamento moral e acção moral só acontece se um ou ambos os julgamentos mediadores dessa relação estiverem presentes, ou seja, se estiverem presentes o julgamento deôntico, ou seja, o juízo sobre o dever ser universal, e o julgamento de responsabilidade, ou seja, o juízo em que me envolvo e afirmo o meu compromisso com a afirmação universal (Candee & Kohlberg, 1987).
Com vista à abordagem do problema, foram definidos quatro objectivos principais, a saber:
(1) averiguar a relação entre a Cognição Moral, medida através do Indicador de Estádio Moral e a Consistência Moral; (2) averiguar a relação entre a variável afectiva Satisfação Perspectivada com a Acção (SPA) e a Consistência Moral; (3) averiguar o efeito mediador desempenhado pela variável Satisfação Perspectivada com a Acção na relação entre a Cognição Moral e a Consistência Moral. Embora com um estatuto menos central comparativamente aos objectivos acima referidos, também se pretendeu (4) averiguar como se distribui a amostra segundo as variáveis Estádio Moral, Consistência Moral e Satisfação Perspectivada com a Acção e, ainda, segundo as varáveis sócio demográficas, Idade e, ou Escolaridade e Género, bem como a relação destas últimas com a Consistência Moral. Finalmente, pretendeu-se (5) averiguar num modelo estatístico conjunto a contribuição relativa de cada variável preditora considerada para a explicação da variabilidade da variável critério, a Consistência Moral.
Adicionalmente, também nos interessa perceber se os estádios de desenvolvimento moral, além de definirem a dimensão cognitiva da moralidade da justiça, também predizem, como alguns autores defendem (Blasi, 1980; Hardy & Carlo, 2005; Kohlberg & Candee, 1992), a orientação da acção moral, ou, ao menos, a intenção e a determinação do agir moral.
Entretanto, dada a inserção da pesquisa nos estudos a que fizemos referência nas secções anteriores e considerando os resultados neles obtidos (por exemplo, Aquino & Reed, 2002; Blasi, 1980, 1994a, 1999; Blasi & Milton, 1991; Hardy & Carlo, 2005), operou-se na investigação com um conjunto de hipóteses, que de seguida se enunciam.
As hipóteses
Alguns estudos evidenciaram inconsistência entre a cognição e a acção moral. É o caso, por exemplo, do estudo sobre a obediência à autoridade de Milgram. Porém, estudos de matriz desenvolvimentista concluíram que, à medida que o desenvolvimento moral aumenta, aumenta também a consistência entre a cognição moral e a acção moral, já que se verificou que as pessoas com um raciocínio moral mais elevado apresentam maiores índices de consistência entre a cognição moral e a acção moral (Candee & Kohlberg, 1987; Kohlberg & Candee, 1992). Então, a partir desta evidência, podemos supor que estas pessoas põem mais frequentemente em prática os seus juízos de responsabilidade, ou seja, são pessoas mais determinadas em seguir em frente com o que julgam ser as obrigações morais, em agir de acordo com o que pensam ser a forma mais correcta de acção (Blasi, 1980, 1994a; Candee & Kohlberg, 1987; Kohlberg & Candee, 1992).
Posto isto, esperamos, então, que a Cognição Moral, traduzida em termos do Indicador de Estádio Moral, esteja positivamente relacionada com a Consistência Moral. Dito de outro modo, espera-se que os sujeitos com IEM menos elevado se apresentem menos consistentes do que os indivíduos com IEM mais elevado e que estes, por sua vez, se apresentem moralmente mais consistentes que os restantes (Hipótese 1). No quadro desta hipótese, o Indicador de Estádio Moral goza do estatuto de variável preditora e a Consistência Moral o estatuto de variável critério.
Entretanto, no quadro das contribuições do modelo da aprendizagem social para a compreensão da dinâmica da acção moral, salientámos o advogado efeito das consequências esperadas com a acção nesta última variável e mostrámos a pertinência da invocação da expectativa de recompensa afectiva.
Assim, em consonância com aquele enfoque, tomou-se a expectativa de satisfação a obter com a adopção de um agir moral como uma recompensa e, assim, como uma boa variável preditora da acção moral e da determinação para a acção moral. Trata-se, aliás, de explorar uma componente emocional da acção moral, até porque, segundo Blasi (1999), parece haver razões para supor que algumas emoções determinam as acções morais.
Então, tendo em conta estes postulados, parece legítimo esperar que a Satisfação Perspectivada com a Acção contribui para a Consistência Moral dos sujeitos (Hipótese 2). Dito de outro modo, esperamos no quadro desta segunda hipótese que os sujeitos que perspectivam obter uma maior satisfação decorrente da acção moral, sejam também os que apresentam e põem em prática juízos de responsabilidade coerentes com o que julgam ser a obrigação moral, isto é, com os seus juízos deônticos (Blasi, 1980, 1994a; Candee & Kohlberg, 1987; Kohlberg & Candee, 1992). No quadro desta hipótese, a Satisfação Perspectivada com a Acção goza do estatuto de variável preditora e a Consistência Moral o estatuto de variável critério.
Também nos interessou averiguar se a variável emocional em causa, a SPA, interfere de algum modo na relação entre a cognição e a acção, se exerce nessa relação um papel mediador, eventualmente perturbador daquela esperada associação. Formulámos, por isso, a nossa Hipótese 3, de acordo com a qual esperamos que a relação entre a Cognição Moral e a Consistência Moral seja tanto mais elevada quanto maior for o nível de Satisfação Perspectivada com a Acção. No contexto desta averiguação, assume-se como variável mediadora a Satisfação Perspectivada com a Acção e como variáveis independente e dependente, respectivamente, a Cognição Moral, medida através do Indicador de Estádio Moral e a Consistência Moral.
A Idade e a Escolaridade são variáveis com elevado valor preditor no campo da moralidade, tendo-se verificado que um aumento da Idade e da Escolaridade está associado a mais desenvolvimento da cognição moral (Colby & Kohlberg, 1987). Acresce que, no quadro do mesmo enfoque da moralidade, a cognição e a acção moral são variáveis vistas como associadas, não obstante os problemas que persistem na explicação empírica de tal associação.
Parece então legítimo esperar que, se a Idade e a Escolaridade se relacionam positivamente com o desenvolvimento da cognição moral, e se cognição e acção moral são duas componentes articuladas da moralidade, então a Idade e a Escolaridade também permitem predizer a consistência moral (Hipótese 4). Dito de outro modo, esperamos, no quadro desta quarta hipótese, que mais escolaridade esteja associada a mais consistência moral. Esclareça-se que no presente estudo empírico tomaremos apenas a Escolaridade como variável preditora, em virtude de a Idade e a Escolaridade se apresentarem, em regra, associadas nos estudos sobre a cognição moral que vimos referindo. Assim sendo, doravante apenas nos referiremos à variável Escolaridade.
O Género é a outra variável sócio demográfica considerada no estudo. Ela induz, no entanto, uma postura predominantemente exploratória, razão pela qual não haverá lugar à formulação de hipótese. Na verdade, nem a teoria, nem os resultados empíricos invocados, legitimam a formulação de uma expectativa clara sobre esta questão do estudo.
MÉTODO
É o objecto desta secção a caracterização dos participantes, bem como das medidas e procedimentos utilizados.
Participantes
Participaram neste estudo 156 sujeitos, rapazes (80) e raparigas (76), com uma média de idades de 15.51, frequentando o 8º (75) e o 11º (81) anos de escolaridade (Quadro 1). Optou-se, pois, por desenvolver a pesquisa junto de adolescentes, tomando-se os níveis escolares intermédios dos dois ciclos de escolaridade que a maioria frequenta. A amostra foi seleccionada com base nos sujeitos que constituíam a as turmas de 8º e 11º anos de uma escola pública do Concelho de Cascais, Distrito de Lisboa, nos níveis escolares escolhidos e nas idades que a eles estão associados. A escolaridade dos pais e mães dos participantes situa-se, predominantemente, até ao 9º ano de escolaridade.
QUADRO 1
Distribuição dos participantes em função da escolaridade, idade e género
Medidas
O instrumento usado para a recolha de informação foi um questionário criado para o efeito (Carita, 2005), a partir da entrevista original de Colby e Kohlberg (1987a,b), mais concretamente a partir do dilema vida/lei, o dilema de Heinz, que passamos a designar por dilema de Henrique. Este dilema coloca o sujeito perante a escolha entre dois valores conflituantes, um remetendo para o valor vida e outro para o valor lei, e entre duas orientações de acção, roubar ou não roubar o medicamento.
Tendo em conta os objectivos visados no presente estudo foram seleccionadas duas questões iniciais do Dilema de Henrique (Colby & Kohlberg, 1987), que traduzimos para português, a que foram acrescentadas três questões.
Assim, o questionário divide-se em duas partes distintas. A primeira parte visa a avaliação do juízo moral e é composta por duas questões. A primeira questão apresenta um formato fechado, tendo o sujeito que optar por uma de duas acções – Roubar ou Não Roubar o Medicamento; a segunda, apresenta um formato aberto, tendo o sujeito que justificar a sua opção inicial, invocando um juízo deôntico. Desta forma, as questões são:
1) Quanto a si, qual a acção mais correcta que o Henrique devia tomar?2) Porquê? Justifique a sua escolha.
Com vista à avaliação do juízo moral, o material de resposta à primeira parte do questionário foi dividido em unidades discretas, os designados juízos de questionário. Estes juízos consistem em afirmações onde a pessoa opta por um certo valor e justifica esta escolha com a invocação de uma determinada norma, norma que é justificada, por sua vez, pela invocação de um determinado elemento moral. Em concreto, e tendo como referência as instruções do Measurement of Moral Judgment de Colby e Kohlberg (1987), a tarefa consistiu em procurar o juízo critério a que correspondesse cada um dos juízos de questionário previamente identificados, sendo que os juízos-critério são uma espécie de juízos-modelo que tipificam os Estádios Morais, os puros e os de transição. Atendendo a que utilizámos apenas um dilema moral no nosso questionário, simplificação que noutros contextos de avaliação desenvolvimental se pratica (Schultz, Yeats, & Selman, 1989), preferimos designar o resultado da avaliação por Indicador de Estádio Moral em vez de Estádio Moral.
A segunda parte do questionário é constituída por três questões e tem por referência o mesmo dilema e as respostas do participante à primeira questão da primeira parte. É agora proposto ao participante que se coloque no lugar do Henrique (juízo de responsabilidade), com o objectivo de se aferir (a) qual o conteúdo da intenção de acção do sujeito, roubar ou não roubar o medicamento, (b) qual o seu nível de determinação para a levar por diante e (c) qual o grau de satisfação perspectivada pelo sujeito, em função da perspectiva de efectiva execução da acção. A primeira questão desta parte tem um formato fechado, tendo o sujeito que optar por uma de duas opções de acção (Roubar ou Não Roubar); a segunda tem um formato tipo Likert de cinco níveis; a terceira é de igual formato, mas de quatro níveis. Saliente-se que as questões relativas à intenção de acção e ao nível de determinação para a levar por diante são instrumentais relativamente à aferição da Consistência Moral dos participantes, como deriva da definição desta variável apresentada na secção Problemática. Assim, as questões são as seguintes:
3) Se estivesse no lugar do Henrique, qual seria a acção que tomava? Roubava ou não roubava o medicamento?
4) Até que ponto estaria você decidido a fazer a acção pela qual optou na questão anterior: muito decidido a fazê-la; decidido a fazê-la; indeciso quanto a fazê-la; decidido a não fazê-la; muito decidido a não fazê-la.
5) Como iria sentir-se consigo próprio se fizesse a acção pela qual optou: ia sentir-me muito bem comigo próprio; ia sentir-me bem comigo próprio; ia sentir-me mal comigo próprio; ia sentir-me muito mal comigo próprio.
Para a atribuição do nível de Determinação para a Acção – até que ponto estaria você decidido a fazer a acção pela qual optou na questão anterior? – foram atribuídos os pontos 5, 4, 3, 2, e 1, respectivamente, às opções muito decidido a fazê-la, decidido a fazê-la, indeciso em fazê-la, decidido a não fazê-la e muito decidido a não fazê-la. Para a atribuição do nível de Satisfação Perspectivada com a Acção – como iria sentir-se consigo próprio se fizesse a acção pela qual optou? –, foram atribuídos os pontos 4, 3, 2 e 1, respectivamente, às opções ia sentir-me muito bem comigo próprio, ia sentir-me bem comigo próprio, ia sentir-me mal comigo próprio, ia sentir-me muito mal comigo próprio. Para a atribuição dos níveis de Consistência Moral procedeu-se de acordo com o que foi apresentado na secção Problemática.
Procedimentos
A aplicação do questionário foi realizada em sala de aula, tendo sido solicitado aos alunos silêncio e respeito pela privacidade de cada uma na elaboração das suas respostas. Estas condições foram suficientemente conseguidas, tendo durado a aplicação aproximadamente 15 minutos.
Os alunos foram previamente convidados a participar no estudo durante uma das suas aulas, tendo-lhes sido explicado que se tratava de responder a um questionário que tinha como objectivo recolher informação para a realização de uma pesquisa sobre o modo como os adolescentes pensam sobre algumas questões morais. Foi sublinhada a confidencialidade dos dados e o facto de não haver respostas certas nem erradas.
Na sessão de aplicação do questionário, antes do início de realização da tarefa, prestaram-se os esclarecimentos e instruções julgados úteis. Após estes esclarecimentos, foi distribuído pelos participantes o dilema de Henrique. O experimentador solicitou que todos os participantes acompanhassem em leitura silenciosa a história que ele leu em voz alta. Terminada a leitura solicitou-se que alguém do grupo recontasse a história que tinha acabado de ser lida e perguntou-se se não havia dúvidas sobre o que acabara de ser lido e recontado. Prestou-se, quando necessário, um ou outro esclarecimento, e passou-se de seguida à aplicação do questionário, tendo sido esclarecidas algumas dúvidas que surgiram no decorrer da realização da tarefa.
No que respeita ao tratamento dos dados, quando em presença de variáveis ordinais, como geralmente sucedeu, e para a averiguação da correlação entre elas, foi utilizado o teste Coeficiente de Correlação Ordinal de Spearman.
No caso da relação entre as variáveis Género e Consistência Moral, procedeu-se à comparação de médias das ordens entre dois grupos independentes, com recurso ao teste Mann-Whitney
Passemos, agora, à apresentação dos resultados obtidos.
RESULTADOS
Na presente secção começaremos por dar conta do modo como se distribui a amostra segundo o Indicador de Estádio Moral, a Consistência Moral e a Satisfação Perspectivada com a Acção, atendendo à totalidade da amostra e, também, aos grupos definidos pelas variáveis Escolaridade e Género. Apresentaremos de seguida, em primeiro lugar, os resultados relativos ao apuramento da esperada relação entre o Indicador de Estádio Moral e a Consistência Moral (Hipótese 1); em segundo lugar, os resultados relativos à esperada associação entre a Satisfação Perspectivada com a Acção e a Consistência Moral (Hipótese 2), bem como ao papel mediador daquela variável afectiva na relação entre a Cognição Moral e a Consistência Moral (Hipótese 3). Apresentaremos de seguida os resultados relativos à esperada relação entre a Escolaridade e a Consistência Moral (Hipótese 4), bem como os decorrentes da questão exploratória sobre a associação entre Género e Consistência.
Finalmente, daremos conta dos resultados relativos à análise da contribuição conjunta das variáveis Indicador de Estádio Moral, Satisfação Perspectivada com a Acção, Escolaridade e Género na Consistência Moral.
Distribuição das variáveis
Relativamente à distribuição dos Indicadores de Estádios Morais (IEM), um primeiro aspecto a destacar diz respeito ao facto de 50% dos sujeitos (78) se terem situado no IEM 3, distribuindo-se os restantes 50% (78) pelos IEM 1 (11.5%), 2 (17.9%) e 4 (2.6%) e pelos indicadores intermédios 1/2 (0.6%), 2/3 (8.3%) e 3/4 (8.9%). Ou seja, foi no IEM 3 que o maior número de sujeitos se situou (Quadro 2).
Esta prevalência de sujeitos no IEM 3 verificou-se quer no grupo do 8º ano (45.3%), quer, e de modo mais expressivo, no do 11º ano (54.3%). Destaque-se ainda que, enquanto 4.0% dos sujeitos do 8º ano se situou acima do IEM 3, no grupo do 11º ano essa percentagem foi de 18.8.
Se observarmos os resultados do ponto de vista do Género, também podemos concluir que a localização prioritária no IEM 3 se verificou tanto para o grupo das raparigas (42.1%) como, e de modo mais expressivo, para o dos rapazes (53.8%). Destaque-se, ainda, que foram os rapazes que se situaram em maior percentagem no IEM 3 ou acima deste, com 62.6% dos sujeitos e as raparigas com 56.5%.
QUADRO 2
Distribuição dos indicadores dos estádios morais pela escolaridade, género e na totalidade da amostra
Diga-se que, na avaliação do IEM, o índice de concordância inter-juízes alcançado foi de .875, resultado que, no contexto empírico da pesquisa, confere um elevado grau fiabilidade à atribuição do nível de raciocínio moral.
Relativamente à distribuição da Consistência Moral, verificou-se que a maior parte dos participantes, 122 dos 156, se apresentou consistentes (78.2%) e 34 inconsistentes (21.8%). Os consistentes distribuem-se do seguinte modo: 74 apresentou CA (47.4%) e 48 apresentou CB (30.8%) (Quadro 3).
Quanto à distribuição da Consistência em função da escolaridade, verificou-se que apenas no grupo dos mais consistentes (CB) a diferença entre os dois grupos escolares se apresenta expressiva: o grupo mais escolarizado, quando comparado ao menos escolarizado, apresenta quase o dobro de sujeitos CB, com 30 no grupo de 11º ano (37.0%) e 18 no grupo de 8º ano (24.0%).
Na distribuição da Consistência em função do Género, verificou-se que no grupo intermédio de consistência (CA), os dois grupos apresentam uma distribuição semelhante, com 35 participantes do grupo dos rapazes (43.8%) e 39 das raparigas (51.3%). Já no grupo dos mais consistentes (CB), verifica-se uma maior participação de rapazes (34) do que de raparigas (14), com as percentagens, 42.5% e 18.4%, respectivamente. Relativamente aos inconsistentes (I) a presença das raparigas (23) é bastante superior à dos rapazes (11), o se que se traduz nas percentagens de 30.3% e 13.7%, respectivamente.
Relativamente à distribuição da Satisfação Perspectivada com a Acção (SPA), a mediana obtida pelo total de sujeitos foi de 3.00, o que constitui um resultado positivo, tendo em conta os quatro níveis crescentes de possibilidade de resposta. As medianas de SPA apresentam-se iguais nos grupos do 8º e 11º anos de escolaridade, sendo o valor de 3.00 para os dois grupos. O mesmo acontece com as medianas de SPA obtidas no cruzamento com a variável Género.
Cognição moral e consistência moral
Nesta secção daremos conta dos resultados relacionados com uma questão central da pesquisa, a da relação entre a Cognição Moral, medida através do Indicador de Estádio Moral, e a Consistência Moral, expressa nos níveis de Inconsistência, Consistência A e Consistência B.
Numa leitura em linha dos resultados obtidos deve destacar-se, por um lado, a verificação esperada de alguns deles, mas, por outro lado, o carácter não linear do seu padrão de distribuição (Quadro 4).
Assim, comecemos por salientar que, como seria de esperar, é no grupo dos sujeitos de IEM 1 que se concentra a maior percentagem de inconsistentes (77.8). Acresce que a percentagem de inconsistentes desce no grupo dos sujeitos com IEM 1/2, 2, 3 e 3/4, mas, por um lado, tem uma subida expressiva no grupo com IEM 2/3 (30.8%) e, por outro lado, no estádio mais elevado, o IEM 4 regista-se uma elevada percentagem de inconsistentes (75.0), ainda que se possa dizer que neste estádio se localiza um número residual de sujeitos (apenas 4).
QUADRO 3
Distribuição da consistência pela escolaridade, género e na totalidade da amostra
QUADRO 4
Distribuição dos indicadores dos estádios morais pelos diferentes níveis de consistência
Relativamente ao nível intermédio de consistência, a CA, e comparativamente com os 16.7% no IEM 1, a percentagem de participantes sobe expressivamente e mantém uma relativa constância, próxima dos 57%, nos IEM 2, 3 e 3/4. Em consonância com o que se observou no parágrafo anterior para os inconsistentes, também é de salientar agora nos CA o relativo desvio deste padrão de regularidade no caso do grupo de sujeitos com IEM 2/3 que desce cerca de 10 pontos (46.2%), mas, sobretudo, no grupo com IEM 4, dos quais apenas 25% se apresenta CA, ainda, que, como já se referiu, se trate de um número residual de sujeitos.
Relativamente ao nível superior de consistência, a CB, é de salientar que o grupo definido pelo IEM 1 encontra aqui a mais baixa expressão (5.6%). Portanto, relativamente ao grupo de sujeitos do IEM1 pode dizer-se que a distribuição dos sujeitos pelos níveis de consistência é tanto menor quanto mais elevado o nível da consistência. Por outro lado, se fizermos abstracção do que se passa com o IEM 1/2, que apenas tem 1 sujeito, podemos dizer que a percentagem de sujeitos CB vai subindo à medida que se sobe nos estádios de desenvolvimento moral, com 28.6% de CB em IEM 2, 37.2% em IEM 3 e 42.9% em IEM 3/4. Mais uma vez, e em consonância com as observações feitas nos parágrafos anteriores, o grupo do IEM 2/3 altera a regularidade deste padrão, aqui de um modo mais ligeiro, descendo 5 pontos relativamente ao resultado do estádio imediatamente anterior.
Portanto, relativamente aos grupos em que se concentra a maioria da amostra, os quais correspondem aos níveis intermédios de desenvolvimento moral, IEM 2, 2/3 e 3, e por oposição ao que passa no nível mais baixo, o IEM 1, a tendência é de prevalência dos CA sobre os I, portanto do nível de consistência mais elevado. No IEM 1 a percentagem dos consistentes tende a ser baixa, registando-se maior percentagem de I do que de CA e, sobretudo, de CB.
Entretanto, o recurso ao Coeficiente de Correlação Ordinal de Spearman confirma-nos que as variáveis Indicador de Estádio Moral e Consistência Moral estão significativa e positivamente associadas [r(156)=.265; p= .001], ainda que se trate de uma correlação pouco elevada.
Satisfação perspectivada com a acção e consistência moral
Nesta secção daremos conta dos resultados relacionados com uma outra questão central da pesquisa, a da relação entre a variável afectiva Satisfação Perspectivada com a Acção (SPA), expressa através dos respectivos Níveis 1, 2, 3 e 4, e a Consistência Moral, expressa nos níveis de Inconsistência, Consistência A e Consistência B, resultados apresentados no Quadro 5.
QUADRO 5
Distribuição dos níveis de satisfação perspectivada com a acção pelos diferentes níveis de consistência
A distribuição dos inconsistentes (I), após ser praticamente idêntica nos dois primeiros níveis de SPA (30% e 31%, respectivamente, Nível 1 e 2 de SPA), tende a diminuir nos dois níveis mais elevados desta, de tal modo que podemos dizer que quanto mais elevado o nível de satisfação perspectivada menor a percentagem de inconsistentes (17.6% e 14.8% nos Níveis 3 e 4 de SPA, respectivamente).
Relativamente à distribuição dos consistentes intermédios (CA) em função da SPA, verificou-se um padrão de distribuição algo semelhante ao dos inconsistentes, embora em todos os níveis de SPA tenhamos mais sujeitos CA do que I. Na distribuição de CA, observa-se que os seus valores tendem para uma progressiva diminuição à medida que se sobe nos valores da SPA. Assim, a CA apresenta-se com os valores de 60%, 53.3%, 52.7% e 18.5%, respectivamente, nos Níveis 1, 2, 3 e 4 de SPA. Ou seja, parece que se pode concluir que mais satisfação perspectivada não anda associada a mais consistência, nos termos em que se definiu o nível intermédio desta variável (CA).
Relativamente à distribuição dos mais consistentes (CB) em função da SPA, observa-se que a sua percentagem tende para um aumento progressivo à medida que se sobe nos valores da SPA. Assim, a CB apresenta-se com os valores de 10%, 15.6%, 29.7% e 66.7%, respectivamente, nos Níveis 1, 2, 3 e 4 de SPA. Ou seja, parece que se pode concluir que mais satisfação perspectivada anda associada a mais consistência, nos termos em que se definiu o nível superior desta variável (CB).
Vale a pena sublinhar que nos dois primeiros níveis de SPA, os inconsistentes são mais do que os CB (30% e 31.1% de inconsistentes para 10% e 15.6% dos consistentes mais elevados, respectivamente nos Níveis 1 e 2 de SPA), ao passo que, nos dois últimos níveis de SPA, os CB são mais do que os I (17.4% e 14.8% de I, para 29.7% e 66.7% de CB, respectivamente nos Níveis 3 e 4 de SPA).
Entretanto, o teste de Coeficiente de Correlação Ordinal de Spearman permitiu verificar que as variáveis Satisfação Perspectivada com a Acção e Consistência Moral estão associadas significativa e positivamente [r(156)=.325; p<.001], embora não se trate de uma correlação elevada. Parece, então, poder concluir-se que quanto maior o nível de Satisfação Perspectivada com a Acção, mais Consistência Moral, especialmente nos termos definidos como CB.
Papel mediador da satisfação perspectivada com a acção na dinâmica da consistência moral
A verificação do papel mediador da Satisfação Perspectivada com a Acção (SPA) na relação entre a cognição e a consistência moral, requer a verificação prévia de associação positiva daquela variável com cada uma das duas outras. Ora, relativamente à relação entre a SPA e o IEM, o recurso ao Coeficiente de Correlação Ordinal de Spearman, mostra-nos que estas variáveis não se correlacionam significativamente entre si [r(156)=.034; p=.675].
Deste modo, este resultado inviabilizou o prosseguimento da pesquisa sobre o papel mediador da SPA na relação entre a Cognição e a Consistência Moral, já que entre aquelas duas variáveis não se detectou uma associação significativa, condição estatística necessária à análise da mediação.
Variáveis demográficas e consistência moral
Apresentam-se, agora, os resultados relativos à averiguação da relação das variáveis Escolaridade e Género com a Consistência Moral.
Os resultados, com recurso ao Coeficiente de Correlação Ordinal de Spearman, indicam que a Escolaridade e a Consistência Moral não se correlacionam entre si [r(156)=.282; p=.082]. Já a comparação entre rapazes e raparigas em função da consistência, permitiu verificar a existência de diferenças significativas entre os dois grupos, com as raparigas a apresentarem valores centrais de consistência mais baixos do que os obtidos pelos rapazes (U=2120.0; p=.000)
As variáveis cognitiva, afectiva e demográficas e a consistência moral
Finalmente, procedeu-se a uma análise de regressão linear, com vista a averiguarmos num modelo integrador das quatro variáveis, Indicador de Estádio Moral, Satisfação Perspectivada com a Acção, Escolaridade e Género, a sua contribuição para a Consistência Moral.
Refira-se, em primeiro lugar, que se verificou que todas as variáveis, com excepção da Escolaridade, contribuem para explicar a variabilidade na Consistência Moral. Verificou-se, igualmente, que as restantes três variáveis, a variável cognitiva, Indicador de Estádio Moral, a variável afectiva, Satisfação Perspectivada com a Acção, e o Género, no seu conjunto, permitem explicar 26% da variabilidade da consistência (R2=.259), um valor não atingido por cada uma daquelas variáveis per si, quando associadas à consistência.
DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
O desafio de raiz deste estudo residiu na intenção de contribuir para a compreensão da dinâmica da acção moral consistente, definida como tal em função do seu acordo com o conteúdo do juízo moral acerca do que deve ser feito, tal como este juízo é produzido quando o sujeito se coloca na posição de sujeito universal. No contexto desta intenção geral, a mobilização da variável cognitiva, enquanto variável preditora, era incontornável. Porém, procurou-se complexificar o modelo de análise integrando num quadro metodológico de inspiração desenvolvimental, não só variáveis demográficas habituais nestes estudos, como a escolaridade e o género, mas, também, uma variável de natureza afectiva, tomando-a não só como variável preditora da acção moral, mas, também, como variável mediadora da relação entre a cognição e a acção. Optou-se, deste modo, por um estudo que, embora de inspiração cognitivo desenvolvimental, considerou como variáveis preditoras não só a cognição, mas também o afecto, e não apenas enquanto variáveis independentes, mas, também, em modelos mais integrados de análise.
Podemos então dizer, de um modo mais preciso, que, por um lado, fomos averiguar se o desenvolvimento moral (Indicador de Estádio Moral), as recompensas antecipadas (Satisfação Perspectivada com a Acção), a Escolaridade e o Género permitem predizer a acção moral consistente. Por outro lado, procurámos perceber o papel mediador da variável afectiva na relação entre a cognição e a acção e, num modelo de análise integrada, qual a contribuição relativa de cada variável considerada na predição da acção moral.
Podemos ainda dizer que, de um modo indirecto, também esteve em jogo perceber se os estádios do desenvolvimento moral, tal como Kohlberg os entendeu, além de definirem uma dimensão cognitiva e deôntica da moralidade centrada na justiça, também predizem, como alguns autores defendem (Blasi, 1980; Hardy & Carlo, 2005; Kohlberg & Candee, 1992), a orientação da acção moral, ou, ao menos, a intenção e a determinação do agir moral.
Entretanto, diversamente do que foi feito noutras investigações, não se tratou de averiguar a relação entre desenvolvimento moral e condutas efectivas (condutas pró-sociais, condutas políticas, etc.). O que se fez foi manter o quadro metodológico característico das investigações desenvolvimentais; partiu-se de um dilema moral hipotético utilizado por Kholberg na sua entrevista de avaliação do desenvolvimento moral (o dilema de Henrique) e confrontou-se os participantes, não só com a produção de um juízo deôntico de valor universal (o que deve fazer o Henrique?), mas, também, com a produção de um juízo de responsabilidade pessoal (o que faria efectivamente se estivesse no seu lugar?). Portanto, operacionalizámos, no quadro da entrevista moral clássica, o juízo de responsabilidade que Kolberg tinha avançada como um dos factores determinantes, a par do juízo deôntico, da articulação coerente entre o pensamento e a acção. Acresce que se procurou enriquecer o modelo de análise com a integração de uma variável afectiva, ausente dos modelos desenvolvimentais puros.
Vejamos, então, o que se pode concluir, relativamente às hipóteses formuladas.
A cognição moral e a consistência moral
A relação entre a Cognição Moral e a Acção Moral, ou, dito de outro modo, a relação entre estádio moral e acção moral consistente, constituiu uma questão central do estudo. Esta questão articulou-se com a hipótese segundo a qual a Cognição Moral, expressa em termos de quatro níveis de Indicador de Estádio Moral (IEM), estaria positivamente relacionada com a Consistência Moral, expressa nos níveis de Inconsistência, Consistência A e Consistência B. Dito de outro modo, esperava-se que os sujeitos com IEM menos elevado se apresentassem menos consistentes do que os indivíduos com IEM mais elevado, e que estes, por sua vez, se apresentassem moralmente mais consistentes que os restantes (Hipótese1: H1).
Ora, os resultados obtidos não permitem uma conclusão linear. Não é legítimo dizer, simplesmente, que a H1 se verificou, se bem que também não se possa dizer o inverso, já que a correlação existe, embora não seja elevada. A correlação entre cognição e acção moral consistentes verifica-se e é positiva, mas, sendo a correlação fraca, não permite que se confie muito na expectativa de que quanto mais estádio mais consistência. Não parece que o nível de desenvolvimento moral de um indivíduo, nos termos em que foi avaliado na presente pesquisa, nos prediga com muita segurança o seu nível de consistência moral.
Entretanto, parece que o que mais contribui para a correlação positiva entre as variáveis foi a elevada percentagem de participantes inconsistentes no nível mais baixo de desenvolvimento moral, bem como a distribuição mais tendente à consistência nos participantes que se localizam no IEM 3. O que parece fazer baixar mais a correlação é, por um lado, um certo padrão irregular da consistência nos IEM 2 e 2/3 e a existência de três dos quatro casos do mais elevado nível de desenvolvimento moral, o IEM 4, como inconsistentes. Pode dizer-se que o padrão de distribuição da consistência se realiza de acordo com o que era esperado nos participantes dos IEM 1 e IEM 3, mas que apresenta contradições nos estádios intermédios de desenvolvimento moral.
Em suma, o que parece poder concluir-se é que o desenvolvimento moral permite predizer alguma coisa sobre a consistência, mas que não basta para se perceber tudo o que nela interfere; em termos gerais, não se apresenta como uma variável suficientemente confiável para predizer a consistência. Os IEM 1 e 3, permitem predizer alguma coisa, mas nos IEM 2, 2/3, e mesmo 4, levantam-se dúvidas.
Diga-se que, como oportunamente referimos, a literatura sobre a relação entre cognição e acção moral é controversa. Vários estudos evidenciaram inconsistência entre a cognição moral e a acção moral, como é o caso, por exemplo, do estudo de Milgram sobre a obediência à autoridade. Outros estudos, pelo contrário, verificaram que, à medida que o desenvolvimento moral aumenta, aumenta também a consistência entre a cognição moral e a acção moral (Candee & Kohlberg, 1987; Kohlberg & Candee, 1992).
Note-se que a maioria destes últimos estudos procurou correlacionar a cognição moral, medida no quadro das metodologias desenvolvimentais, com condutas morais efectivas. A nossa metodologia é diferente, já que não sai do modelo desenvolvimental clássico (produção de juízo deôntico a propósito de uma situação hipotética), ao operacionalizar, no quadro desse modelo, o conceito de juízo de responsabilidade (o que faria eu se estivesses exactamente naquela situação?). Deste modo, o que se pode concluir é que, no quadro dos procedimentos utilizados, os resultados obtidos apenas confirmam parcialmente a evidência encontrada naqueles estudos (Blasi, 1980, 1994a; Candee & Kohlberg, 1987; Kohlberg & Candee, 1992), de acordo com a qual são os sujeitos de estádios morais mais elevados que mais facilmente põem em prática os seus juízos de responsabilidade, ou seja, que dão continuidade, na acção, aos juízos deônticos, seguindo no agir o que julgam ser as suas obrigações morais.
Invoque-se aqui, a propósito da aparente insuficiência da variável cognitiva para a predição da acção moral, os resultados obtidos por Erkut, Jaquette, e Staub (1981) em pesquisas com referência desenvolvimental, com base nos quais avançam que nem sempre a transferência directa para a prática social de um elevado nível sócio-cognitivo se traduziria num elevado ajustamento social do indivíduo, motivo que poderia explicar as inconsistências observadas. No quadro de um outro enfoque, também Mischel e Mischel (1994) advogam que o funcionamento moral é específico, idiossincrático e variável de situação para situação. Em resposta a estes estudos, com os nossos resultados, o que se pode dizer é que o nível de cognição moral contribui em alguma medida para a consistência moral, mas que o seu poder preditor apresenta insuficiente alcance.
Acrescente-se que, numa análise fina da relação entre julgamento moral e acção moral, Candee e Kohlberg (1987) afirmam que esta relação apenas acontece se um ou ambos dos seus julgamentos mediadores estiverem presentes, ou seja, se estiverem presentes o julgamento deôntico (o juízo sobre o dever ser universal) e o julgamento de responsabilidade (o juízo em que me envolvo e afirmo o meu compromisso com a afirmação universal). Sobre esta questão, e tendo em conta que a correlação encontrada entre as variáveis, embora positiva, é fraca, torna-se difícil afirmar com segurança que à medida que a cognição moral evolui, também evoluem as outras componentes determinantes da consistência moral, nomeadamente, os Juízos de Responsabilidade, os quais, aliás, segundo Aquino e Reed (2002) e Blasi (1994a), poderão ser mais fortes e eficazes se enraizados na identidade moral dos sujeitos.
Em suma, e por extensão, os resultados não admitem que se pense com suficiente segurança que os estádios morais incluem, não só uma dimensão cognitiva e deôntica, mas, também, uma dimensão de responsabilidade e de determinação para a acção moral. Não parece legítimo afirmar de modo simples e geral que os estádios morais definem, além de um certo nível de juízo deôntico, uma certa direcção para o agir moral, que contribuem tanto para compreender melhor o significado moral da conduta dos sujeitos, como para a predizer. Em alguma medida é possível estabelecer tais relações, mas apenas de um modo cauteloso e parcelar, já que a cognição não parece representar uma variável suficientemente robusta para a compreensão da dinâmica do agir moral.
A dinâmica afectiva da consistência moral
A relação entre afecto e acção moral consistente, ou, dito de outro modo, a relação entre Satisfação Perspectivada com a Acção (SPA), expressa em quatro níveis de satisfação, e a Consistência Moral, expressa em três níveis de consistência (I, CA, CB), constituiu a segunda questão do estudo. Sublinhe-se que a satisfação perspectivada foi entendida como uma recompensa decorrente da acção moral ou, melhor, da intenção e determinação em agir moralmente.
Esta questão articulou-se com a segunda hipótese do estudo (H2), segundo a qual a recompensa afectiva antecipada, a SPA, contribui para a consistência moral dos sujeitos. Dito de outro modo, esperava-se, no quadro desta segunda hipótese, que os sujeitos que perspectivam obter uma maior satisfação decorrente da acção moral, fossem também os mais consistentes, isto é, os que apresentam e põem em prática juízos de responsabilidade coerentes com o que julgam ser a obrigação moral, isto é, com os seus juízos deônticos.
Os resultados obtidos confirmam de certo modo a hipótese formulada, podendo dizer-se que é na distribuição dos participantes inconsistentes (I) e dos mais consistentes (CB) que melhor se manifesta a expectativa de a menor nível de satisfação antecipada corresponder menor percentagem de consistentes e de a maior nível de satisfação antecipada corresponder maior percentagem de consistentes. A distribuição dos consistentes intermédios (CB) apresenta um padrão menos óbvio, o que eventualmente não será alheio ao facto de a correlação encontrada, embora positiva, não ser muito forte. Em suma, embora com alguma precaução, parece que podemos concluir que o nível de satisfação esperada com a prática de uma acção moral permite predizer a intenção em concretizar essa acção, ou seja, a intenção e determinação em actuar de acordo com o julgado mais correcto.
Estes resultados parecem-nos compreensíveis à luz do que o enfoque da aprendizagem social nos afirma sobre a importância concedida à recompensa, por parte do agente activo, para a efectividade da acção, o que sublinha a relação da acção moral com a estrutura das motivações e incentivos (Bandura, 1991; Mischel & Mischel, 1994). Na verdade, de acordo com os resultados, parece poder concluir-se que a perspectiva de obtenção de satisfação com a adopção de uma acção que se julgou moralmente correcta, funciona como incentivo ou motivação para a adopção efectiva dessa acção.
Em todo o caso, a dimensão afectiva considerada no presente estudo apresenta uma conotação muito pragmática: é de uma recompensa afectiva antecipada que se trata. Ora, a declaração Kantiana, assumida por Kholberg, segundo a qual para que uma acção seja moralmente boa não basta que seja conforme à lei, mas tem, também, de ser cumprida com devoção e amor a essa mesma lei, aponta para um afecto mais próximo da orientação moral ideal e do tipo autónomo e menos da orientação consequencialista e do tipo moral heterónomo. Deste modo, seria interessante que em trabalhos futuros se procurasse uma operacionalização empírica da variável afectiva mais conforme com a natureza das orientações e tipologias moralmente mais sofisticadas. Como nos diz Blasi (1999), é impossível conceber a vida moral de uma pessoa em que as emoções não desempenhem um papel importante, pelo que se torna imperioso insistir na averiguação desta dinâmica.
Entretanto, também nos interessou averiguar o papel mediador da satisfação perspectivada na relação entre a cognição e a acção, questão traduzida na nossa terceira hipótese (H3), de acordo com a qual se esperava que a relação entre a Cognição Moral (IEM) e a Consistência Moral (CM) fosse tanto mais elevada, quanto mais elevado fosse o nível de Satisfação Perspectivada com a Acção (SPA).
Esta hipótese não se confirmou. Deve sublinhar-se que tal resultado advém, desde logo, da inexistência de associação entre a Satisfação Perspectivada com a Acção e o Indicador de Estádio Moral, associação requerida para que o tratamento estatístico da procura da mediação fosse executável.
Sobre esta questão, queremos sublinhar que porventura a aposta numa operacionalização mais complexa da variável afectiva, a que já atrás se aludiu, poderá esclarecer melhor a dinâmica entre a cognição, o afecto e a acção no campo moral. Especificando, poderá revelar-se interessante considerar, não apenas os afectos mais próximos da orientação moral consequencialista e pragmática, mas, também, os mais próximos das orientações morais mais sofisticadas.
Variáveis demográficas e consistência moral
A distribuição da Consistência Moral em função da Escolaridade apresentou insuficiente variabilidade, não se tendo confirmado a nossa H4. Com efeito, apenas no grupo dos mais consistentes a diferença entre os grupos de 8º e 11º anos apresentou alguma expressão, diga-se que a favor do grupo mais escolarizado. Parece que a acção moral, ao contrário do desenvolvimento moral avaliado nos termos classicamente propostos por Kholberg, não parece sofrer o efeito da escolarização. Porventura níveis mais contrastantes de escolaridade permitam observar um outro padrão de resultados. Porém, também porventura possamos imaginar a acção moral consistente tão associada a um pensamento intuitivo, emocional, quanto a um pensamento formal e, poderíamos talvez dizer, escolar. Trata-se, aliás, de uma consideração igualmente subjacente à discussão que se segue, sobre a relação entre Género e Consistência moral.
O estudo da moralidade feminina no quadro do modelo desenvolvimental clássico, bem como a sua comparação com a moralidade masculina, tem suscitado bastante polémica, nomeadamente à luz das críticas e propostas avançadas por Gilligan (1982). Sucede que os resultados que obtivemos quanto à relação entre Género e Consistência Moral, não permitem pacificar a questão. Na verdade, o que obtivemos foi a verificação de diferenças significativas na consistência moral entre rapazes e raparigas, com as raparigas a apresentarem valores centrais de consistência mais baixos do que os dos rapazes.
Recorde-se que sobre esta questão exploratória não se levantou nenhuma hipótese, em virtude de os estudos sobre o assunto, além de controversos, terem sido orientados mais para a questão do nível do desenvolvimento, do que para a questão da consistência moral. Em todo o caso, os resultados obtidos suscitam igualmente as leituras de Gilligan (1982) sobre o tema da moralidade e dos géneros. Na verdade, faz sentido invocar a sua alegação sobre a existência de duas moralidades: uma moralidade mais assente na vivência de responsabilidades em conflito, por oposição a uma outra mais assente em direitos que se disputam, uma moralidade cujos problemas é suposto serem encarados por meio de um pensamento contextual e narrativo, em contraste com a mobilização de um pensamento formal e abstracto. A moralidade do cuidado, predominantemente feminina, vincula o desenvolvimento moral sobretudo à compreensão das responsabilidades, dos relacionamentos e dos contextos reais de vida, enquanto a moralidade da justiça como equidade, alegadamente mais masculina, faz assentar aquele desenvolvimento sobretudo na compreensão dos direitos e das regras. A ser assim, o facto de termos utilizado como base de análise e produção dos dados uma situação formal e hipotética, pode ter contribuído para o resultado menos satisfatório obtido pelas raparigas, quando comparadas aos rapazes, em termos de consistência moral. É plausível que a utilização de dilemas hipotéticos, como método de acesso e avaliação do pensamento moral e da acção moral, possa não ser eficaz na análise destas componentes da moralidade nas raparigas. Em todo o caso, deve concluir-se que, também no campo específico da consistência moral, o efeito da variável género requer a continuidade das pesquisas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para concluirmos, gostaríamos de lembrar que o que esteve em jogo nesta pesquisa, não foi a acção efectiva, mas antes a intenção e determinação para a acção, avaliadas a partir do discurso verbal dos participantes. Por esse motivo, e não obstante a pertinência da abordagem efectuada, parece-nos relevante a utilização complementar de outros dispositivos metodológicos que incrementem a potência e a robustez da abordagem da acção moral consistente.
A acção moral consistente foi tomada como consistência entre o conteúdo do juízo deôntico, dos juízos de responsabilidade e da acção ela mesma. Seria interessante, neste mesmo quadro conceptual, o confronto dos participantes com dilemas morais reais, em conjunturas concretas e variadas de conflito moral, nas quais seria mais viável, por exemplo, a consideração de variáveis de contexto. Tratar-se-ia de ir ao encontro daquilo que reclamam diversos autores, ao afirmarem que nem o conhecimento da situação por si só, nem o conhecimento do julgamento moral isolado, são suficientes para predizer acções morais e que, neste entendimento, a questão crítica parece ser a interacção entre a situação e o julgamento moral (Erkut, Jaquette, & Staub, 1981). Em todo o caso, parece-nos igualmente de apostar na mobilização de outras variáveis do sistema pessoal, além das variáveis cognitivas de natureza estrutural. Assim, tal como nos propõe Blasi (1980, 1994, 1999), a consideração do papel jogado pela identidade moral na dinâmica da consistência moral, é um desafio que se coloca. Para o efeito, torna-se necessária conseguir a operacionalização empírica do conceito, bem como a construção de instrumentos de medida adequados à sua avaliação. Tendo em conta os resultados alcançados, também o estudo do efeito mediador do género na relação entre a consistência moral e variáveis de contexto e do sistema pessoal, se configura como uma interessante linha de pesquisa.
O alargamento das variáveis preditoras a considerar parece-nos, pois, ser um bom caminho, quer no que respeita às variáveis de contexto (hipotético versus natural), quer relativamente ao sistema pessoal. Aliás, relativamente ao sistema pessoal, saliente-se que, no presente estudo, o modelo integrado de análise da contribuição das variáveis preditoras para a consistência, evidenciou que tal integração explica mais variabilidade da consistência do que cada uma das variáveis autonomamente consideradas.
Finalmente, face aos resultados obtidos, e não obstante a sua natureza controversa, entendemos poder concluir que este trabalho alcançou o propósito de contribuir para a construção de mais conhecimento e conhecimento mais abrangente sobre a dinâmica da consistência moral, um dos problema mais delicados que se colocam no estudo do desenvolvimento moral, porque, como nos disse Piaget, as relações entre pensamento e acção estão muito longe de ser tão simples como é comummente suposto (1994, p. 174).
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