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Análise Psicológica

versão impressa ISSN 0870-8231versão On-line ISSN 1646-6020

Aná. Psicológica vol.34 no.4 Lisboa dez. 2016

https://doi.org/10.14417/ap.1044 

Aceitação e eficácia de um programa de intervenção psicoeducativa para pais de crianças com asma: Estudo exploratório

Cláudia Mendes da Silva1, Luísa Barros2, Fátima Simões1

1Departamento de Psicologia e Educação, Universidade da Beira Interior

2Faculdade de Psicologia, Universidade de Lisboa

Correspondência

 

RESUMO

Considerando a importância que a educação sobre a asma deve assumir no plano de gestão familiar da doença, e a falta de programas deste tipo em Portugal, construímos uma intervenção psicoeducativa breve para pais de crianças com asma entre os 7 e os 13 anos, visando a aquisição de atitudes mais positivas na gestão da doença. O estudo teve como objetivo avaliar a aceitação, eficácia e a satisfação relativa ao programa intervenção. Completaram a intervenção 10 mães, tendo participado nas 3 sessões de grupo e nos 3 momentos de avaliação (linha de base, final da intervenção e follow-up a 9 meses). Para além da recolha de informação sociodemográfica e clínica, aplicaram-se dois questionários, um de conhecimentos sobre a asma e outro de qualidade de vida da criança (DISABKIDS-37, versões pais e criança). Utilizou-se também uma entrevista sobre a gestão da asma pela família (FAMSS) na avaliação inicial e no follow-up. Os resultados evidenciaram uma melhoria moderada no conhecimento dos pais e nas práticas de gestão da asma, confirmando a utilidade de incluir a intervenção psicoeducativa nos cuidados às crianças com asma.

Palavras-chave: Asma, Intervenção psicológica, Gestão da doença, Pais.

 

ABSTRACT

Based on the importance of asthma education on disease management by the family, and on the lack of such programs in Portugal, we built a brief psychoeducational intervention directed to parents of children with asthma between 7 and 13 years old, to promote the acquisition of more adaptive asthma management attitudes. This study aimed to evaluate its acceptability, efficacy and satisfaction with by parents. Ten mothers completed the intervention, by participating in 3 intervention group sessions and in the 3 assessments (at baseline, at the end of the intervention and at follow-up). In addition to socio-demographic and clinical data collection, it were applied two questionnaires, one assessing knowledge about asthma and other children’s quality of life (DISABKIDS-37, versions to parent and child). It was also used an interview about asthma management by the family (FAMSS) at baseline and at follow-up. From the results obtained, we highlight the moderate increase in mothers’ knowledge and in disease management practices. This study emphasizes the usefulness of psychoeducational interventions for parents of children with asthma.

Key words: Asthma, Psychological intervention, Disease management, Parents.

 

Introdução

A asma é uma doença inflamatória crónica do trato respiratório caracterizada por períodos de aparente acalmia interrompidos por períodos de dificuldades respiratórias severas (Kumar & Gershwin, 2006). É uma das doenças crónicas mais comuns na infância e uma importante causa de utilização dos serviços de urgência pediátricos e de internamento hospitalar (Gaspar, Almeida, & Nunes, 2006), estando a sua prevalência durante a vida da criança a aumentar em quase todos os países, segundo o International Study of Asthma and Allergies in Childhood (Pearce et al., 2007). Os resultados da fase III deste estudo referentes a Portugal apresentam um aumento na percentagem de crianças da faixa etária dos 13-14 anos que referem já ter tido asma alguma vez (com valores a variar entre os 12% e os 16 %) (Pearce et al., 2007).

Apesar dos progressos no conhecimento sobre esta doença e no respetivo tratamento, a asma continua a ter um impacto significativo na vida dos pacientes e os níveis de controlo da doença mantêm-se muito abaixo das metas definidas pelas diretrizes internacionais (Rabe et al., 2004).

Os objetivos do tratamento são atingir e manter o controlo clínico da asma [Global Initiative for Asthma (GINA), 2011], diminuir a mortalidade e melhorar a qualidade de vida dos doentes (Chang, 2006). Segundo as conclusões do programa Practall (Bacharier et al., 2008), a gestão da asma implica o desenvolvimento de um plano de tratamento que inclua o evitamento de alergénios e irritantes desencadeadores da asma, o tratamento farmacológico adequado e programas de educação para os doentes, os pais e outros cuidadores. Com efeito, a educação sobre a asma destaca-se como uma parte essencial do plano de gestão da doença (Chang, 2006; GINA, 2011).

Na asma pediátrica, os pais são habitualmente responsáveis pela implementação das medidas de controlo e gestão da doença, constituindo-se também como uma das influências mais relevantes na adaptação da criança à doença. Deste modo, os pais devem receber informação não só sobre o diagnóstico e a medicação, mas também sobre a prevenção dos sintomas e das crises, os comportamentos a adotar quando detetam sinais de agravamento, a monitorização do controlo da asma e o recurso à ajuda médica (GINA, 2011). Considera-se, assim, imprescindível a implementação de estratégias ou programas de educação com o objetivo de aumentar o conhecimento da doença (alterações fisiológicas associadas às dificuldades respiratórias, sintomas, fatores desencadeantes), diminuir os receios face à medicação e melhorar a comunicação entre a criança, os cuidadores e os profissionais de saúde, contribuindo para a melhoria da autogestão da asma (Kotses & Creer, 2010). O tratamento médico da asma, especialmente com agentes anti-inflamatórios, assume um papel primordial no controlo da doença, implicando a adesão regular, muitas vezes diária, a esta medicação preventiva. O controlo total da asma pode ser bastante difícil, nomeadamente devido à dificuldade em evitar todos os fatores desencadeantes das crises e à exigência da adequação do tratamento à variação dos sintomas (Chang, 2006; GINA, 2011).

Na asma pediátrica os programas de educação podem ser dirigidos à criança, aos cuidadores ou a ambos (Kotses & Creer, 2010). Até ao final da adolescência, os pais têm a principal responsabilidade pelo tratamento e pela adesão às recomendações do médico, embora desde cedo as crianças devam ser um parceiro no tratamento (Barros, 2003; Orrel-Valente, Jarlsberg, Hill, & Cabana, 2008). Na revisão de intervenções dirigidas à asma infantil, Bravata e colaboradores (2009) verificaram que, tanto nas intervenções de promoção da autogestão da asma, como nas de educação sobre a doença, aquelas que eram dirigidas aos pais ou cuidadores da criança tinham maior probabilidade de estar associadas a melhorias significativas nos resultados clínicos.

Os estudos que relatam intervenções dirigidas aos pais de crianças com asma evidenciam que as estratégias educativas de fornecimento de informação acerca da doença, da medicação e do controlo dos sintomas, produzem resultados positivos: (1) no conhecimento dos pais acerca da doença (Bonner et al., 2002; Butz et al., 2005; Chiang, Huang, Yeh, & Lu, 2004); (2) na competência percebida pelos pais para uma gestão e controlo mais eficaz da asma (Bonner et al., 2002; Chiang et al., 2004; McCarthy et al., 2002; Sockrider et al., 2006); (3) no nível da adesão ao tratamento (Bonner et al., 2002; Boychuk et al., 2006; Bravata et al., 2009; Guevara, Wolf, Grum & Clark, 2003; Lemanek, Kamps, & Chung, 2001; Teach, Crain, Quint, Hylan, & Joseph, 2006); e (4) nos resultados de saúde (Bonner et al., 2002; Bravata et al., 2009; Guevara et al., 2003; Lemanek et al., 2001; Teach et al., 2006). No entanto, a revisão destes estudos mostrou uma grande diversidade de metodologias usadas pelos investigadores (duração, participantes, formato, contexto de aplicação), quer no tipo de estratégias de intervenção, quer na multiplicidade de medidas de resultados, não permitindo retirar conclusões claras sobre os componentes mais eficazes na melhoria da gestão da asma pelos pais. Por outro lado, não foi possível encontrar estudos sobre intervenções psicoeducativas dirigidas aos cuidadores de crianças com asma realizados em Portugal.

A melhoria da gestão da doença constitui-se, assim, como uma área de desenvolvimento de intervenções psicológicas dirigidas principalmente aos pais. Neste contexto, foi construído um programa psicoeducativo breve dirigido a pais de crianças com asma, com base na revisão da literatura e na discussão com especialistas, assente no fornecimento de informação sobre a doença e na discussão de atitudes parentais sobre a sua gestão pela família, contribuindo para uma gestão mais eficaz da asma da criança, concretizado numa intervenção educativa em pequeno grupo. Tendo em conta os custos associados a estas intervenções e a dificuldade de adesão dos pais a programas psicoeducacionais (e.g., Bonner et al., 2002; Kuijer, De Ridder, Colland, Schreurs, & Sprangers, 2007), decidiu-se desenvolver um programa breve (Osman & Calder, 2004) e que pudesse ser avaliado pelos pais como útil e eficaz.

O presente estudo teve, assim, como objetivo avaliar a versão preliminar deste novo programa de intervenção psicoeducativa para pais de crianças com asma, considerando: (1) a sua aceitação pela população-alvo, com base nas taxas de adesão e drop-out; (2) indicadores de eficácia, averiguando a evolução no conhecimento dos pais acerca da asma, na gestão familiar da doença e na qualidade de vida das crianças, desde o período anterior à intervenção (linha de base) até ao período pós-intervenção (1 mês após a intervenção) e ao follow-up (9 meses após a intervenção); e (3) as perceções de utilidade e satisfação dos participantes.

 

Método

 

Participantes

A população alvo foram os pais de pelo menos uma criança com asma, com idade entre os 7 e os 13 anos de idade, acompanhados num serviço hospitalar especializado de alergologia pediátrica. Os critérios de inclusão das crianças no estudo foram: ter um diagnóstico clínico de asma persistente há pelo menos 6 meses, fazer medicação regularmente para a asma, não ser a primeira consulta naquele serviço e ter entre os 7 e os 13 anos de idade. Foram excluídas as crianças que sofressem de outra doença grave ou de atraso de desenvolvimento (confirmado com o clínico responsável). A amostra final foi constituída por 10 mães com idades entre os 32 e os 54 anos (M=41,80; DP=5,79), com escolaridade ao nível do 9º grau (n=3), do 12º grau (n=3) e do ensino superior (n=4). Todas eram casadas e nove estavam empregadas.

As crianças, equitativamente distribuídas por ambos os sexos, tinham idades entre os 7 e os 13 anos (M=11,03; DP=2,08). No que se refere à faixa etária incluída, procurou-se garantir alguma homogeneidade, estabelecendo-se como limite mínimo os 7 anos para garantir que as crianças tivessem já algum domínio sobre a leitura e compreendessem os itens dos questionários. Não alargámos o limite superior de idade (13 anos) por considerar que na adolescência os pais deixam progressivamente de ter um papel tão central na gestão da asma dos filhos, que se tornam mais autónomos, o que poderia influenciar grandemente a sua resposta aos questionários e à entrevista. De acordo com o relato das mães, a idade dos primeiros sintomas da asma variava entre 1 e 12 anos (M=5,70; DP=3,88). Nove das crianças tinham prescrição para fazer medicação preventiva para a asma diariamente e uma apenas medicação de alívio rápido em situação de exacerbação. O tempo de seguimento no serviço de alergologia variava entre os 6 meses e os 9 anos, e 4 crianças já tinham sido hospitalizadas pelo menos uma vez devido a uma crise de asma. Os médicos assistentes classificaram a asma de 3 destas crianças como controlada, de 5 como parcialmente controlada e de 2 como não controlada (GINA, 2011).

 

Procedimento

Este programa foi aplicado no âmbito de um estudo mais alargado sobre conhecimentos, perceção de sintomas e gravidade da doença e qualidade de vida de crianças com asma (Silva & Barros, 2013, 2014). Trata-se de uma investigação aplicada, isto é, centrada na aplicabilidade de um programa psicoeducativo breve sobre a gestão da asma pediátrica pelos pais. Tem um caráter longitudinal, com a recolha de informação quantitativa e qualitativa numa fase inicial, antes do programa (T0), no final do programa (1 mês após a última sessão) e no follow-up (9 meses depois).

Após a obtenção das autorizações do Conselho de Ética dos dois hospitais da região centro onde o estudo decorreu, os pais foram contactados no momento da admissão a uma consulta de seguimento no serviço de alergologia pediátrica, tendo sido entregue um folheto de divulgação do programa e solicitada a sua colaboração. A participação foi voluntária e, após a assinatura do consentimento informado, os participantes foram entrevistados acerca da gestão familiar da asma e preencheram um conjunto de questionários de autorresposta destinados a avaliar as características sociodemográficas, o conhecimento acerca da asma e a qualidade de vida da criança, antes de integrarem o programa de intervenção (T0 – linha de base).

De seguida, as mães das crianças foram divididas em 4 grupos (um composto por 2 participantes; e 3 compostos por 3 participantes), de acordo com a sua disponibilidade temporal para frequentar o programa de intervenção. O programa de intervenção foi aplicado no serviço hospitalar onde as crianças eram acompanhadas, em horário pós-laboral. As sessões, bem como toda a recolha de dados, foram realizadas pela investigadora, com formação em psicologia. Um mês após a intervenção (T1), as participantes preencheram novamente um conjunto de questionários de autorresposta, presencialmente, destinados a avaliar o conhecimento acerca da asma, a qualidade de vida da criança e a perceção de utilidade e satisfação com a intervenção.

Nove meses após a intervenção (T2 – follow-up), as mães e as crianças foram novamente entrevistadas acerca da gestão familiar da asma e preencheram os questionários de autorresposta de avaliação do conhecimento acerca da asma (as mães) e da qualidade de vida da criança (crianças e mães).

 

Instrumentos

Com vista à caracterização da amostra, recolheu-se informação sociodemográfica junto das mães e informação sobre a medicação prescrita a cada criança e sobre o grau de controlo da asma, de acordo com as diretrizes internacionais (GINA, 2011), junto do médico especialista que acompanhava cada criança.

 

Questionário de Conhecimentos Sobre a Asma (QCSA) (Asthma Knowledge Questionnaire; Ho et al., 2003, versão portuguesa de Lopes, Delgado, & Ferreira, 2008). Foi aplicado às mães para avaliar o nível de conhecimentos sobre a asma relevantes para a gestão da doença, incluindo conhecimento sobre os sintomas, os fatores desencadeantes e a intervenção. O questionário é composto por 25 afirmações sobre a doença, com três alternativas de resposta: verdadeiro, falso ou não sei. A pontuação da escala total é obtida através da adição de todas as respostas corretas (i.e., indicando conhecimentos adequados sobre a asma), variando entre 0 e 25, com os resultados mais elevados a indicar um melhor conhecimento acerca da asma. Nos estudos de validação, o QCSA revelou uma consistência interna adequada para um questionário de conhecimentos, com um alfa de Cronbach de 0.69 no estudo original (Ho et al., 2003) e de 0.71 no estudo de validação para Portugal (Lopes et al., 2008).

 

DISABKIDS-37 – Módulo Genérico do Questionário de Qualidade de Vida para Crianças e Adolescentes com Condições Crónicas de Saúde (DISABKIDS Chronic Generic Module – DCGM-37) para a criança e para o seu cuidador familiar. Trata-se de um questionário destinado a crianças e adolescentes, entre os 8 e os 18 anos de idade com condições crónicas de saúde, adaptado para Portugal (Carona, Bullinger, & Canavarro, 2011; Carona et al., 2013). Tem uma versão para a criança e outra equivalente para o cuidador, ambas compostas por 37 itens de resposta numa escala de Likert de 5 pontos (de nunca a sempre) e cujo referencial temporal são as últimas 4 semanas. Os itens organizam-se em 6 facetas e 3 domínios: domínio físico (limitação e tratamento); domínio psicológico (independência e emoção) e domínio social (exclusão social e inclusão social). São calculados resultados para cada faceta e um resultado global baseado em todas as respostas do questionário. O DISABKIDS-37 revelou boa fidelidade no estudo de validação para a população portuguesa, com uma elevada consistência interna para os resultados globais de QDV nas duas versões (α=0.92 para ambas) (Carona et al., 2011). Considerou-se que, devido à simplicidade dos itens e ao preenchimento presencial do questionário, o limite inferior de passagem podia ser alargado para os 7 anos.

 

Entrevista FAMSS (Family Asthma Management System Scale; Klinnert & McQuaid, 1997, 2005, versão portuguesa de Silva & Barros, 2014). A FAMSS é uma entrevista clínica semi-estruturada, com a criança e o cuidador em simultâneo, que avalia a gestão da asma dentro do contexto familiar (Klinnert, McQuaid, & Gavin, 1997). Este instrumento permite identificar os pontos fortes e as fragilidades da família em vários domínios relevantes para a gestão da asma, mais especificamente, o conhecimento sobre a asma (e.g., O que entende que é a asma?), a avaliação dos sintomas (e.g., Como consegue perceber que o seu filho está a ter dificuldades em respirar?), a resposta do cuidador e da criança aos sintomas e exacerbações (e.g., Diz-me o que é que acontece quando começas a ter sintomas de asma e estás com a tua família, o que fazes?), o controlo ambiental (e.g., Existem várias mudanças que pode fazer em casa para ajudar o seu filho a ter menos problemas com a pieira ou tosse. Diga-me o que é que o médico lhe disse para mudar e o que é que tentou?), a adesão à medicação (e.g., Até que ponto é fácil para si manter o controlo sobre o horário da medicação?), a colaboração com o profissional de saúde (e.g., Avalie o grau de conforto que sente para fazer perguntas ao médico) e a integração equilibrada da asma na vida familiar (e.g., Avalie em que grau está a conseguir equilibrar a gestão da asma com as outras obrigações na sua vida) (McQuaid, Walders, Kopel, Fritz, & Klinnert, 2005). Para cada domínio começa-se por questionar a criança e depois complementa-se com as perguntas aos pais. Cada subescala da FAMSS é cotada com o auxílio do manual com critérios detalhados, numa escala de Likert de 1 a 9, que indica a qualidade da gestão adaptativa da asma em cada área (maiores valores correspondem a uma melhor gestão), sendo também calculado um resultado global através da média das escalas. Os estudos de validação da FAMSS têm revelado boas qualidades psicométricas, nomeadamente uma boa consistência interna (com o alfa de Cronbach a variar entre 0.91, 0.84 e 0.87) (Celano, Klinnert, Holsey, & McQuaid, 2011; Klinnert et al., 1997; McQuaid et al., 2005). Esta entrevista foi usada na avaliação inicial e no follow-up, na medida em que cobre um período temporal de cerca de um ano, não fazendo sentido por isso aplicá-la no final da intervenção. No follow-up incluiu-se uma pergunta final sobre as mudanças sentidas pelos pais na vivência da gestão da asma.

 

Avaliação Qualitativa do Programa: Na sessão de avaliação no final do Programa (pós-intervenção) foi aplicado às mães um questionário de avaliação subjetiva da utilidade e da satisfação com o Programa com 12 itens, construído pelas autoras, com resposta numa escala de Likert de 5 pontos (de totalmente em desacordo a totalmente de acordo). Os primeiros três itens avaliavam o grau de conhecimento percebido sobre os sintomas, os desencadeantes e a medicação, 2 avaliavam a auto-eficácia das mães no controlo da doença, outros 2 analisavam a adesão à medicação e os últimos cinco a utilidade e interesse do Programa. O questionário terminava com 2 questões abertas, uma sobre o que tinham considerado mais útil ou interessante no Programa e outra pedindo sugestões de alterações.

 

Intervenção

A construção do programa baseou-se principalmente no “Manual de boas práticas na asma” da Direção Geral de Saúde (2007) e no “Manual educacional do doente: Asma brônquica” da Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica (2007). Esta informação foi complementada com informação de outras fontes (e.g., Bacharier et al., 2008). O programa foi revisto por um médico especializado em alergologia e imunologia pediátrica e por um especialista em psicologia pediátrica.

O programa consistiu em 3 sessões em pequeno grupo, de cerca de 50 minutos cada, com periocidade quinzenal, incluindo o fornecimento de informação sobre a asma e a gestão do tratamento, apoiado por uma apresentação audiovisual, e o debate e partilha de experiências entre as mães. A apresentação audiovisual teve como principal objetivo assegurar que todos os participantes recebiam a mesma informação e serviu também para ilustrar alguns conteúdos, tornando-os mais concretos e claros.

Cada sessão começou com a apresentação de 2 fichas às mães, uma de monitorização da gravidade dos sintomas da asma nas últimas duas semanas e da autoeficácia percebida pelas mães no enfrentamento desses sintomas (Como avalia a forma como lidou com a asma do seu filho(a) nas últimas duas semanas?), e outra com exemplos de significações sobre a doença e o seu enfrentamento (e.g., “Só o médico pode controlar a asma, eu não sou médica, não sei; tenho de fazer o que eles aqui mandarem!”). Estes exemplos de significações maternas tinham como objetivo incentivar a reflexão e discussão sobre essas significações e o seu papel de cuidadores, através da identificação ou da rejeição desses exemplos.

Na primeira sessão definiu-se o que é a asma, apresentaram-se as principais características da doença e sintomas, os fatores desencadeantes de uma crise, medidas preventivas a tomar e sinais de alerta de uma exacerbação. Reforçou-se o caráter crónico e controlável da asma, isto é, que a asma está presente mesmo quando os doentes estão assintomáticos e que as crises podem ser prevenidas (McAndrew et al., 2008). A segunda sessão começou com o esclarecimento sobre os tipos de medicação para a asma e os seus mecanismos de ação, a relevância da adesão à medicação e a discussão de significações desadequadas relativas à medicação, nomeadamente sobre os efeitos secundários e a necessidade de medicação diária. A terceira sessão foi dedicada à gestão da asma pela família, começando pela necessidade de cumprimento do plano terapêutico, as medidas a adotar perante uma exacerbação, e uma abordagem das atitudes educativas dos pais e da influência da ansiedade manifestada pelos pais no comportamento da criança.

 

Análise estatística

Utilizaram-se análises descritivas (frequência e percentagens, média, desvio-padrão) para proceder à caracterização da aceitação do programa de intervenção, da gestão familiar da asma e das perceções de utilidade e satisfação dos participantes. Devido ao pequeno tamanho da amostra, recorreu-se a testes não-paramétricos. Assim, a eficácia do programa foi avaliada com recurso ao teste não-paramétrico de Wilcoxon (gestão familiar da asma) e da ANOVA de Friedman (conhecimento acerca da asma e qualidade de vida da criança), seguida de análises a posteriori de Wilcoxon na presença de diferenças estatisticamente significativas. Calculou-se também a magnitude do efeito para as diferenças de médias. As análises foram efetuadas com recurso ao SPSS Statistics (v. 19, IBM SPSS) para p=.05.

 

Resultados

 

Avaliação da aceitação do Programa

Um número elevado de pais contactados no momento da consulta não aceitaram participar no estudo, invocando principalmente a falta de tempo ou incompatibilidades de agenda para integrar os grupos de intervenção e a grande distância do local de residência ao hospital para se deslocarem quinzenalmente para as sessões. Noutros casos, a não-aceitação deveu-se ao não reconhecimento da doença da criança como asma, apesar de todas as crianças terem sido referidas pelo médico como tendo um diagnóstico de asma. Dezassete mães demonstraram interesse e preencheram a ficha de inscrição no programa, das quais 6 (35%) não participaram no programa por dificuldades no agendamento das sessões ou porque desistiram antes do início. Onze mães (65%) iniciaram o Programa de intervenção e 10 (59%) cumpriram as 3 sessões psicoeducativas (em grupo) e os 3 momentos de avaliação individual.

 

Avaliação da eficácia do Programa

 

Efeitos no conhecimento sobre a doença. Após a participação no programa verificou-se um aumento no conhecimento das mães sobre a asma, com o resultado mediano no QCSA a subir da linha-base (Me=15) para o pós-intervenção (Me=19.5) e o follow-up (Me=19.5). Este aumento no conhecimento mostrou-se estatisticamente significativo (χ2F(2)=14.649, p=.000). Acomparação das medianas do conhecimento entre a linha de base e o follow-up confirma que o aumento do conhecimento se mantinha significativo 9 meses após a intervenção, podendo considerar-se moderado (Z=-2.83, p=.005, r=0.63).

 

Efeitos na Qualidade de Vida da criança. A comparação das médias globais do DISABKIDS-37 na versão dos pais nos três momentos de avaliação (M(T0)=4,20; M(T1)=4,20; M(T2)=4,14) não revelou diferenças no nível de qualidade de vida das crianças (χ2F(2)=0.667; p=.814). A análise das diferenças entre os resultados nas diferentes facetas e no total entre a avaliação inicial e o follow-up também não revelou diferenças significativas, com a exceção da faceta limitações onde o resultado se aproximou da significância estatística (Z=-1.49; pUD=.086, r=0.33), com a média nesta faceta a subir do momento inicial (M=22.11; DP=3.18) para o follow-up (M=23.78; DP=2.82), revelando um pequeno aumento da qualidade de vida neste domínio.

Relativamente à versão criança, também não foram encontradas diferenças no resultado total nos três momentos de avaliação (M(T0)=4,25; M(T1)=4,25; M(T2)=4,25; χ2F(2)=0.286; p=.930). A comparação dos resultados nas várias facetas também não revelou diferenças significativas na qualidade de vida da criança.

 

Mudanças na gestão da asma pela família. Observou-se um aumento significativo da pontuação média total e das pontuações médias em quase todas as escalas da entrevista no follow-up (Tabela 1), revelando uma melhoria do conhecimento sobre a doença, sobre os sintomas, na resposta aos sintomas e exacerbações por parte da família e da criança e, ainda, da integração da gestão da asma na vida familiar. Excetua-se as escalas do controlo ambiental, da adesão ao tratamento e da relação com os profissionais.

 

 

A análise qualitativa das respostas das mães na FAMSS, nos 2 momentos de avaliação, de acordo com o manual de cotação da entrevista, traduz uma evolução: (1) no conhecimento sobre o objetivo e o mecanismo de atuação dos medicamentos, no reconhecimento de que as exacerbações estão associadas a uma obstrução das vias aéreas (broncoconstrição) e do caráter crónico da asma; (2) no reconhecimento dos sintomas de exacerbação, em especial a tosse que era pouco valorizada; (3) no controlo eficaz das exacerbações por parte das mães e das crianças; (4) na adesão à medicação, especialmente a administração atempada da medicação de alívio rápido de acordo com as recomendações; e (5) na diminuição das consequências psicológicas da doença na vida da família.

Os resultados no controlo ambiental mostram poucas mudanças ao nível da exposição aos alergénios e irritantes desencadeadores de sintomas de asma. Relativamente à exposição ao fumo do tabaco o programa não teve qualquer efeito, com quatro mães a referirem que se continuava a fumar dentro de casa, embora evitando a presença da criança, e outras quatro a referirem que o pai continuava a fumar, embora só fora de casa. Apenas uma mãe relatou mudanças importantes neste domínio da gestão da doença, embora noutras áreas (maiores cuidados com as roupas de cama da criança e retirada das aves do domicílio familiar).

Relativamente à adesão à medicação, embora se tenha verificado uma ligeira melhoria, em três casos continuou a haver muitos esquecimentos da medicação preventiva (dois relacionados com as férias escolares e um devido à pouca supervisão familiar quando a mãe trabalha em horário noturno).

 

Avaliação das perceções de utilidade e satisfação

A análise das resposta aos itens do questionário de avaliação do Programa mostrou que todas as mães responderem positivamente (4. de acordo / 5. totalmente de acordo) aos sete itens de avaliação dos objetivos do programa, sendo os valores mais elevados (5) obtidos na compreensão do papel dos fatores desencadeantes de crises e no saber usar a medicação, e o mais baixo (4) no item sobre saber o que fazer perante uma exacerbação. Relativamente ao nível de satisfação geral, avaliado pelos últimos cinco itens, nove mães referiram estar totalmente de acordo que o programa foi útil, que as sessões foram interessantes e que aprenderam coisas novas. Todas as mães assinalaram acordo total nos itens referentes a sentirem-se mais capazes de ajudarem o(a) filho(a) e a recomendarem o programa a outros pais de crianças com asma.

A análise do conteúdo das respostas às duas perguntas abertas do questionário realçaram como pontos fortes a possibilidade de esclarecer dúvidas, aprender sobre as alterações pulmonares durante uma exacerbação da asma, sobre a atuação perante as crises e sobre a medicação. A intervenção em pequeno grupo foi também valorizada pelas mães, pela oportunidade de discussão e de partilha de experiências com outras mães de crianças com asma. Na questão sobre possíveis mudanças a introduzir no programa, nenhuma sugestão foi registada.

No final da entrevista de follow-up introduziu-se uma pergunta sobre o que tinha mudado na vivência da asma depois do programa de intervenção. As respostas de oito mães evidenciam a aquisição de conhecimentos e a melhoria na compreensão da asma:

 

“Entendi muito melhor a doença” (A., mãe de uma criança com 13 anos).

 

“O conhecimento em relação à forma como se desencadeia uma crise de asma e o que provoca […], as mudanças ao nível do organismo. […] Não tinha consciência de que a asma pode estar, inclusivamente, anos sem se manifestar e de um momento para o outro voltar exatamente como estava inicialmente” (I., mãe de uma criança com 12 anos).

 

“Aprendi que não é assim uma coisa tão… bem controlada, consegue-se fazer uma vida normal” (A., mãe de uma criança com 9 anos).

 

As respostas de quatro mães atestam mudanças de comportamento, nomeadamente no controlo dos sintomas e na adesão à medicação:

 

“Agora ele toma sempre o medicamento, nunca mais deixou de tomar o medicamento” (I., mãe de uma criança com 12 anos).

 

“É que fazer a medicação resulta, é a conclusão que eu tiro. Eu tinha um bocado aquela ideia errada de que o facto de ser todos os dias que seria uma sobrecarga grande” (F., mãe de uma criança com 12 anos).

 

Efeitos ao nível psicológico foram também mencionados por três mães, com melhorias na autoconfiança e diminuição da ansiedade depois da intervenção:

 

“Sinto-me um bocado mais à vontade e mais confiante em a poder ajudar, do que há um ano. […] A gente começa a criar um certo à-vontade, menos nervosismo” (P., mãe de uma criança com 8 anos).

 

“Acho que me mantenho mais calma, a gente ficou com mais uma noção daquilo que era” (A., mãe de uma criança com 9 anos).

 

“Entendi muito melhor a doença e todos os aspetos, como lidar, tanto com ele, como comigo mesma, ajudou-me bastante” (A., mãe de uma criança com 13 anos).

 

Discussão

O presente estudo teve como objetivo avaliar a aceitação, a eficácia e as perceções de utilidade e satisfação dos participantes de um novo programa de intervenção psicoeducativa para pais de crianças com asma entre os 7 e os 13 anos. Os resultados fornecem algum suporte para a aceitação e eficácia deste programa de intervenção, concretizado em três sessões de grupo de fornecimento de informação acerca da asma e da sua gestão pela família, bem como para perceções de elevada satisfação e utilidade do programa por parte dos participantes.

No entanto, é necessário realçar a dificuldade em motivar os pais para participarem no programa, pois o não reconhecimento da doença da criança como asma, a perceção da asma como uma doença comum e pouco grave e a necessidade de se deslocar ao hospital para participar no programa em dias em que não havia consulta, constituíram três grandes obstáculos à participação dos pais, bem como os horários de trabalho prolongados e o facto de residirem longe do hospital. Esta dificuldade de adesão dos pais a programas psicoeducacionais tem sido referenciada por outros autores (e.g., Bonner et al., 2002; Kuijer et al., 2007). Uma maior sensibilização dos pais para a importância da educação sobre a asma, por parte dos profissionais de saúde que acompanham a criança, poderá ser fundamental para ultrapassar esta dificuldade na mobilização inicial dos cuidadores para a participação em programas de intervenção educativa. Por outro lado, os obstáculos logísticos (e.g., deslocações extra ao hospital, conciliação com os horários de trabalho) poderão ser minimizados se o programa de intervenção for incluído no plano de consultas de seguimento. De realçar, porém, que a quase totalidade (91%) das mães que iniciaram o Programa cumpriram-no na íntegra, assim como a avaliação de follow-up, evidenciando uma muito boa taxa de adesão.

Como previsto, o programa conduziu a um aumento do conhecimento sobre a asma que se manteve no follow-up a 9 meses. No mesmo sentido, estudos anteriores também verificaram que as melhorias no conhecimento sobre a asma nos pais se mantinham 6 a 12 meses depois (Butz et al., 2005; Chiang et al., 2004).

Não se encontraram diferenças no nível de qualidade de vida das crianças relatado pelas mães antes e depois da intervenção, com exceção da faceta limitações onde se verificou uma ligeira melhoria da qualidade de vida. Esta evolução positiva aconteceu na dimensão em que as mães relataram inicialmente menor qualidade de vida da criança, tendo o programa conduzido a uma mudança positiva no impacto percebido da asma nas limitações físicas da criança, o que poderá estar associado a um melhor controlo dos sintomas. Também não foram encontradas diferenças significativas no nível de qualidade de vida relatado pela própria criança entre a avaliação inicial e o follow-up. Quase todas as crianças, exceto uma, avaliaram muito positivamente a sua qualidade de vida antes do início da intervenção, pelo que não se antecipavam grandes alterações nesta dimensão, corroborando os resultados da investigação que têm confirmado que as crianças com asma e os seus pais tendem a percecionar a qualidade de vida da criança como boa (Silva, Barros, & Simões, 2015) e que as intervenções na asma pediátrica habitualmente não mostram efeitos ao nível da qualidade de vida das crianças (Bravata et al., 2009; Butz et al., 2005).

Relativamente à gestão da asma pela família, avaliada pela entrevista clínica FAMSS, constatou-se um aumento significativo na pontuação total obtida pelas mães, entre a avaliação inicial e o follow-up, com melhorias no conhecimento da doença e dos sintomas, na resposta aos sintomas e exacerbações por parte das mães e das crianças e no equilíbrio e integração da asma na vida familiar. Estudos anteriores de intervenção com pais têm evidenciado um efeito positivo na eficácia percebida pelos pais na gestão e controlo da asma da criança (Bonner et al., 2002; Chiang et al., 2004; McCarthy et al., 2002; Sockrider et al., 2006). A partilha de experiências entre as mães e a discussão de significações durante as sessões poderá ter facilitado a aprendizagem e reforçado a perceção de controlo das mães (Barros, 2003). Neste sentido indicam também os resultados obtidos por McCarthy e colaboradores (2002) na comparação de uma intervenção centrada no fornecimento de informação sobre a asma, com outra que associava um espaço de discussão em que os pais eram encorajados a discutir as suas preocupações e dificuldades, concluindo que ambas conduziam a um aumento no conhecimento sobre a doença, mas apenas a abordagem interativa levava a uma melhoria na capacidade de tomar decisões e de gerir a asma por parte dos pais.

A análise das respostas na entrevista de follow-up revela melhorias importantes no reconhecimento dos sintomas de exacerbação, fundamental para que sejam tomadas as medidas adequadas de controlo dos sintomas. A investigação tem mostrado que a monitorização e gestão dos sintomas da asma é uma das grandes dificuldades reportadas pelos pais na gestão da asma (Boyle, Baker, & Kemp, 2004), sendo esta uma área fundamental na intervenção com pais para melhorar o controlo da doença. Verificou-se também uma melhoria das medidas adotadas perante o agravamento dos sintomas, quer pelas mães, quer pelas crianças, que parecem também ter beneficiado com a intervenção, embora não tenham participado nas sessões informativas. A natureza transacional das interações pais-criança pode ajudar a explicar como as mudanças no comportamento dos pais conduziram a mudanças no comportamento da criança (Barros, 2003; Sameroff & Seifer, 1983).

Esta entrevista evidenciou, ainda, uma diminuição do impacto psicológico negativo da doença, com algumas mães a revelarem menor ansiedade e maior autoeficácia perante uma crise. Estes resultados estão de acordo com a investigação sobre a evolução do processo de doença da criança, que tem revelado uma evolução no sentido de maior normalidade e menor perturbação emocional dos pais (Maltby, Kristjanson, & Coleman, 2003; Santos, 2010; Sawyer et al., 2005). Por outro lado, os cuidados associados ao plano de tratamento estavam melhor integrados e de forma mais equilibrada na vida das famílias. Um resultado semelhante foi encontrado Maltby e colegas (2003) que verificaram que os pais vão desenvolvendo estratégias para lidar com a doença que ajudam a manter uma vida familiar normal.

As melhorias nos comportamentos de adesão não atingiram a significância estatística, embora a magnitude do efeito indique uma diferença moderada entre os resultados nos dois momentos, revelando algum impacto, embora menor, do programa nesta dimensão da gestão da asma. A análise qualitativa dos resultados mostra uma evolução positiva na administração da medicação de alívio rápido, com um maior número de casos a tomar a medicação perante os primeiros sintomas de exacerbação de acordo com as recomendações médicas, associada a uma diminuição do receio dos efeitos secundários destes medicamentos. A investigação tem confirmado que as crenças acerca da medicação são o principal preditor das taxas de adesão (Horne & Weinman, 1999), pelo que esta modificação parece traduzir uma mudança nas crenças dos pais sobre os benefícios desta medicação.

A evolução na escala de controlo ambiental foi muito reduzida. O programa teve pouco efeito na adoção de comportamentos de evitamento dos fatores desencadeantes da asma, área em que as famílias evidenciaram uma pior gestão da doença. A análise qualitativa das respostas à entrevista revela que, nomeadamente no caso do tabaco, as duas mães que fumavam, e os seis pais que eram fumadores e não participaram diretamente no programa, mantiveram este hábito. Este resultado traduz a dificuldade em produzir mudanças no comportamento dos pais relativo à exposição da criança ao fumo do tabaco. Uma intervenção específica de motivação para a cessação tabágica dos pais fumadores seria importante para reduzir a exposição das crianças ao fumo do tabaco (Borrelli, McQuaid, Novak, & Hammond, 2010; Hovell et al., 2002).

As mães que participaram demonstraram elevada satisfação com o formato e os conteúdos do programa, tendo classificado muito favoravelmente a utilidade das sessões na aquisição de conhecimentos e o interesse do global do programa. A possibilidade de esclarecer dúvidas e a partilha de experiências com outras mães foram também realçadas como vantagens. A realização das sessões com apenas 2 ou 3 mães contribuiu para uma maior adaptação das sessões às características de cada caso e às preocupações de cada mãe, o que parece ter contribuído para a sua satisfação, embora em contrapartida tenha restringido o debate entre as mães. A investigação indica que as oportunidades de aprendizagem interativa produzem melhores resultados do que outros tipos de intervenções educativas sobre a asma (Coffman, Cabana, Halpin, & Yelin, 2008). Os resultados relativos à satisfação podem, no entanto, ter sido comprometidos por questões de desejabilidade social, em especial se tivermos em conta a dimensão dos grupos e o facto de a investigadora ter sido também a responsável pela condução das sessões.

 

Limitações

O presente estudo não se encontra isento de limitações que devem ser consideradas na interpretação dos resultados obtidos. Em primeiro lugar, a ausência de um grupo de controlo. Esta falta impede a atribuição das mudanças nos resultados antes e depois da intervenção unicamente ao programa. Outros fatores, como possíveis alterações no plano de tratamento, uma maior aceitação da doença ou integração da asma na vida familiar com o passar do tempo, podem ter contribuído para as alterações nas medidas de resultado. Em segundo lugar, o tamanho da amostra limita o poder da análise estatística dos dados e dificulta a generalização dos resultados. Em terceiro lugar, a não independência do avaliador e do dinamizador do programa de intervenção, ou seja, o programa ter sido dinamizado pela pessoa que recolheu os dados de avaliação pode ter conduzido a algum enviesamento dos resultados. Por último, a baixa aceitação inicial do programa e o facto de as mães que aceitaram entrar no programa poderem ser, de alguma forma, diferentes das mães que recusaram participar, pode ter introduzido também algum enviesamento nos resultados.

Por outro lado, o uso de uma abordagem multimétodos, multidomínios e multi-informadores e o processo multifásico de desenvolvimento do novo programa de intervenção (e.g., revisão da literatura, discussão com especialistas na área, feedback dos participantes, privilegiando metodologias qualitativas) constituem-se como forças deste trabalho. A abordagem longitudinal na medição dos efeitos do programa, assim como os resultados qualitativos evidenciados na FAMSS, reforçam a importância dos resultados obtidos. A aplicação do programa num contexto real de um serviço de ambulatório foi ao mesmo tempo um desafio à aplicabilidade de um programa deste tipo, devido aos constrangimentos logísticos encontrados, e, paralelamente, uma vantagem para a generalização dos resultados, obtidos em dois serviços de alergologia pediátrica.

 

Conclusão

Os resultados deste estudo exploratório permitem-nos, pois, concluir pela aceitação e eficácia deste novo programa de intervenção psicoeducativa com pais de crianças com asma, ultrapassando a falta de programas deste tipo para cuidadores de crianças com asma em Portugal. As mães que participaram no programa obtiveram resultados positivos e relevantes, nomeadamente melhoria do conhecimento da doença e da gestão da doença, revelando uma elevada satisfação com o mesmo. Um maior conhecimento por parte dos cuidadores sobre a doença poderá, por outro lado, facilitar a monitorização dos sintomas da asma e a sua comunicação aos profissionais de saúde que acompanham a criança, domínios fundamentais para atingir um bom controlo da doença. O formato em pequeno grupo parece ter sido uma mais-valia para os resultados obtidos.

O facto de algumas mães terem tido dificuldade em reconhecer a doença do filho como asma poderá alertar para a necessidade de uma comunicação mais clara do médico sobre o diagnóstico, mas são necessários mais estudos para esclarecer este aspeto. Este estudo evidenciou também a necessidade de ações diretas com o progenitor fumador para a modificação desse comportamento.

Investigação futura nesta área é necessária para confirmar os resultados obtidos, por exemplo, através de estudos randomizados controlados com amostras de maior dimensão. Por outro lado, será importante organizar estudos que explorem os fatores que influenciam a aceitação dos programas de intervenção psicoeducativa. Assim, estudos futuros poderão avaliar se a integração de estratégias promotoras da motivação, ou a participação mais ativa da equipa clínica e a estruturação desta ação psicoeducativa como parte integrante da consulta de asma pediátrica, permitem ultrapassar esta dificuldade de adesão inicial ao programa.

 

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CORRESPONDÊNCIA

A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Cláudia Mendes da Silva, Departamento de Psicologia e Educação, Universidade da Beira Interior, R. Marquês de Ávila e Bolama, 6201-001 Covilhã, Portugal. E-mail: cmsilva@ubi.pt

 

A investigação foi parcialmente suportada por uma Bolsa de Doutoramento da Fundação para Ciência e Tecnologia (SFRH/BD/44757/2008) do primeiro autor

 

Submissão: 25/03/2015 Aceitação: 09/03/2016

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