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Revista de Ciências Agrárias
versão impressa ISSN 0871-018X
Rev. de Ciências Agrárias v.33 n.2 Lisboa dez. 2010
Ensaio de variedades de linho em diferentes épocas. Comportamento fenológico e produção
Carlos Castro1, Pedro Martins
1Univ. de Trás-os-Montes e Alto Douro, Dep. Agronomia, 5001-801 Vila Real (ccastro@utad.pt)
RESUMO
Apresentam-se os resultados de um ensaio, conduzido em Vila Real (Portugal) no âmbito de uma parceria com a Universidade DeMontfort, visando avaliar o comportamento de variedades de linho, Linum usitatissimum L., em duas épocas de sementeira. Analisaram-se diversos parâmetros fenológicos e a produção obtida. Não se constataram diferenças entre as variedades mas a sementeira outonal revelou ser significativamente mais produtiva originando plantas mais altas e com maior diâmetro.
Palavras-chave: Fenologia, linho, Linum usitatissimum L., produção.
Flax varieties trial at different seasons. Phenological behaviour and production
ABSTRACT
We present the results of an experiment conducted in Vila Real (Portugal) by a partnership with the University DeMontfort, to evaluate the behavior of varieties of linum (flax), Linum usitatissimum L., at two periods of sowing. We analyzed several phenological parameters and the production yield. No differences were registered between the varieties. However, the autumn sowing proved to be significantly more productive than the spring one, resulting in taller plants with larger diameter.
Key-words: Flax; Linum usitatissimum L., phenology, production.
INTRODUÇÃO
O linho, Linum usitatissimum L., é uma planta com referências muito antigas, quer em Portugal quer a nível mundial (van Zeist, 1970; Durrant, 1976; Hopf, 1991). No entanto, sobretudo a partir do século XIX, perdeu a importância devido à concorrência do algodão. Apesar de Pery (1875) referir 25000 ha em 1871, hoje em dia apenas em termos de comércio internacional se apresentam valores atribuíveis ao seu uso como matéria-prima no artesanato; em 2000/01 citam-se 75 produtores numa área de 3810 ha (Anónimo, 2001). Em Portugal, a sua importância residual pode ser observada nas Estatísticas Agrícolas (INE, 1962-1991) que deixaram de a referir a partir de 1981. Daí a escassa bibliografia abordando ensaios experimentais da cultura.
Rossini & Casa (2003), em Itália, estudaram a influência de datas de sementeira na produção de linho; o Inverno Mediterrânico, relativamente ameno, permite a sementeira em duas épocas distintas mas são praticamente nulas as referências actuais acerca do comportamento de variedades de linho no Inverno e Primavera de Portugal. No passado estas eram duas épocas normais para a sementeira (Oliveira et al., 1991).
Este trabalho apresenta resultados de ensaios de campo, conduzidos entre Outubro de 1999 e Julho de 2000 em Vila Real de Trás-os-Montes e Alto Douro, no âmbito de um projecto levado acabo em parceria com a Universidade DeMontfort (Reino Unido).
MATERIAL E MÉTODOS
Semearam-se dois ensaios, no Outono (AT) e Primavera (ST), em Vila Real (41º 19N lat. e 7º 44W long.). O solo (franco limoso) apresentava uma ligeira inclinação e as características apresentadas no Quadro 1.
Quadro 1 Análise do solo dos ensaios.
Antes da sementeira aplicou-se 120 kg K2O ha-1 e 90 kg P2O5 ha-1 na forma de, respectivamente, Cloreto de Potássio e diluição calcária de Superfosfato de Cálcio. Usaram-se duas variedades de linho, Laura (L, 42 Kg ha-1) e Escalina (E, 45 Kg ha-1).
Os talhões do ensaio (25 m2) foram casualizados em quatro repetições. Na colheita colheram-se amostras com 0,25 m2 em cada talhão, considerando-se como palha toda a planta (arrancada e não cortada pela base como é normal noutras culturas). Após a pesagem, cortaram-se as raízes e pesaram-se novamente todas as amostras. As determinações também incluíram:
População - registada um mês após a sementeira e na colheita contando o número de plantas e caules por metro quadrado.
Altura - avaliada, em amostras de 40 plantas (10 por repetição), a intervalos de uma semana em duas posições acima do solo (cm), a mais alta (até à folha, gomo ou cápsula mais alto) e a mais baixa (até à primeira ramificação).
Progresso da floração - iniciou-se esta observação logo após o surgir da primeira flor, registando-se os números de gomos, flores e cápsulas em 10 plantas por repetição (40 no total de cada variedade).
Diâmetro do caule (mm) - avaliado a intervalos de uma semana em amostras de 20 caules à altura de 30 cm.
Produção de palha - calculada pesando amostras de cada talhão e referida ao valor de 15% de humidade.
Durante os ensaios registaram-se os dados meteorológicos. Manteve-se o controlo de infestantes com herbicidas. O problema principal foi o Raphanus raphanistrum L. que se conseguiu controlar. No ensaio de Primavera, o controlo de Echinochloa crus-galli (L.) Beauv. não foi satisfatório em alguns locais.
Foi necessário regar (11 regas) o ensaio de Primavera recorrendo-se a miniaspersores.
Os dados foram sujeitos a análise de variância usando-se o software SPSS e, quando obtidas diferenças significativas, as médias foram comparadas através do teste de Duncan (5% de probabilidade).
RESULTADOS E DISCUSSSÃO
Os registos meteorológicos permitem afirmar que Janeiro foi um mês frio e seco, Fevereiro seco e quente, Março seco, Abril frio e chuvoso e Maio chuvoso, sendo a distribuição da precipitação pouco frequente na região de Vila Real.
O solo dos ensaios não é o ideal para a cultura de linho devido à sua textura, traduzindo-se, sobretudo na época invernal, por fenómenos de encharcamento temporário.
A Figura 1 mostra a evolução da altura do caule (mais alta) das variedades Laura (L) e Escalina (E) em estudo no ensaio de Outono - Inverno (AT).
Figura 1 Altura do caule (cm) das variedades L (---○) e E (-●) no ensaio AT.
Não se verificaram diferenças significativas da altura das variedades (p < 0.05). No início, a variedade Laura apresentou uma altura ligeiramente superior mas no fim do crescimento a situação inverteu-se (99 cm L e 107 cm E). A altura da ramificação mais baixa apresentou uma evolução similar; valores finais de 73,7 cm (L) e 79,8 (E).
A Figura 2 mostra uma evolução semelhante da altura das variedades no ensaio de Primavera. O valor final da altura foi de 70,8 cm (L) e 70,4 cm (E).
Figura 2 Altura (cm) das variedades no ensaio de Primavera; L (---○) e E (-●).
A evolução da altura da ramificação mais baixa foi similar com valores finais de 59,7 cm (L) e 56,8 cm (E).
O crescimento das plantas na Primavera foi mais rápido, apenas 85 dias da sementeira à plena floração (MPF), enquanto que no Outono - Inverno esta fase demorou 218 dias. A altura dos caules das variedades é semelhante mas no ensaio de Outono Inverno ambas mostram maior altura. Esta diferença dos resultados obtidos em cada uma das épocas justifica-se com a maior duração da fase vegetativa do linho cultivado no período de Outono Inverno resultante dos dias mais curtos e mais frios desta fase (Marshall, 1989).
A Figura 3 mostra a evolução da floração das variedades no ensaio AT avaliada contando todos os órgãos florais e calculando a % de gomos relativamente ao total.
Figura 3 Evolução da floração (% gomos) das variedades L (---○) e E (-●) no ensaio de Outono Inverno.
As primeiras flores surgiram na variedade Laura, 10 dias depois na Escalina, e decorreu durante cerca de dois meses. Apesar de algumas diferenças iniciais, a data do fim da floração foi praticamente a mesma nas duas variedades (Quadro 2).
Quadro 2 Datas de floração nos ensaios de Primavera (ST) e Outono (AT).
A floração no ensaio de Primavera (ST) foi menos demorada, apenas duas semanas (Quadro 2). A duração da floração é normalmente muito influenciada pelo genótipo (Keijzer, 1989) mas neste ensaio foi praticamente semelhante em ambas as variedades.
À semelhança do observado em relação à altura das plantas, a floração foi muito influenciada pelas condições ambientais, temperatura e fotoperíodo (Moule, 1972); no ensaio AT a floração demorou quase dois meses mas no ST apenas duas semanas devido às temperaturas mais elevadas. As diferenças entre variedades não foram significativas.
A Figura 4 representa a evolução do teor de água avaliada com amostras de caules à altura de 30 cm no ensaio AT; as variedades não diferiram significativamente.
Figura 4 Teor de água (%) das variedades L (---○) e E (-●) no ensaio AT.
No ensaio de Primavera Verão (ST) a evolução do teor de água das variedades também não diferiu significativamente confirmando-se a semelhança do comportamento das duas variedades.
A Figura 5 apresenta os valores do diâmetro do caule (à altura de 30 cm) no ensaio de Outono - Inverno (AT).
Figura 5 Diâmetro (mm) dos caules das variedades L (---○) e E (-●) no ensaio AT.
Durante todo o ciclo, a variedade L revelou caules mais finos; na última semana, 9 semanas após a floração, a média dos diâmetros foi de 2,4 mm (L) e 3,0 mm (E).
Na Figura 6 mostram-se as observações do diâmetro do caule no ensaio de Primavera Verão (ST). A variedade L também mostrou ter caules mais finos; na última semana (8 semanas após floração), os valores médios foram de 1,7 mm (L) e 1,8 mm (E).
Figura 6 Diâmetro (mm) dos caules das variedades L (---○) e E (-●) no ensaio ST.
O Quadro 3 apresenta os valores do número de plantas e caules observados em ambos os ensaios.
Quadro 3 Número de plantas e caules por metro quadrado.
Os valores (médias das duas variedades) foram sempre superiores no ensaio de Outono - Inverno (672 plantas m-2 e 905 caules m-2) do que no de Primavera - Verão (518 plantas m-2 e 554 caules m-2) traduzindo-se num maior nº de caules por planta (1,35 versus 1,07). Não se verificou o efeito compensatório, referido por Marshall et al (1989), segundo qual o linho compensaria o menor nº de plantas com um maior nº de ramificações caulinares, apesar de o número de plantas observado estar dentro dos limites, 100 a 800 plantas m-2, apontado por aqueles autores.
Os valores do número de plantas observados no início dos ensaios foram sempre superiores ao verificado no final; a diminuição do nº de plantas (média das duas variedades) foi superior no caso do ensaio ST (211 plantas m-2) do que a registada no AT (100 plantas m-2) e a variedade L mostrou menos perdas (136) do que a E (176). A maior perda de plantas no ensaio ST pode justificar-se com a maior ocorrência de infestantes.
A produção (planta inteira) e erro padrão dos ensaios e variedades estão representados na Figura 7.
Figura 7 Produção média (Mg ha-1) e erro padrão (I) das variedades Laura (L) e Escalina (E) nos ensaios de Outono (AT) e Primavera (ST).
A variedade E foi mais produtiva do que a L mas os resultados foram estatisticamente significativos apenas no ensaio de Outono (p <0.01). Os resultados, quando se pesaram as plantas sem as raízes e a parte cimeira, foram semelhantes.
As plantas no ensaio de outonal foram em maior número, mais altas e de maior diâmetro justificando a maior produção resultante de uma estação de crescimento mais demorada e de menor concorrência de infestantes.
A correlação estabelecida entre a produção e o diâmetro (r = 0,95) ou a altura (r = 0,87) dos caules mostrou ser altamente significativa (p <0,001) quando consideradas as amostragens na proximidade do inicio da floração, permitindo antecipar uma estimativa razoável da produção futura.
A maior produção da variedade E deveu-se aos seus caules mais grossos que compensaram o menor nº de plantas e caules desta variedade no ensaio AT; no entanto, mostrou ser mais sensível à acama apesar de esta observação não ter sido quantificada.
CONCLUSÕES
Apesar de algumas diferenças entre variedades, em termos genéricos, o seu comportamento foi semelhante.
A produção de linho pode ser efectuada no período de Outono Inverno com produções significativamente superiores às da Primavera Verão. Esta maior produção resulta de plantas mais altas e com maior diâmetro.
As condições meteorológicas não foram as normais, registando-se valores de 10ºC negativos em Janeiro que, no entanto, não afectaram de modo irreversível as plantas.
A anormalidade das condições meteorológicas e a restrições colocadas pelas características do solo justificam a necessidade da repetição dos ensaios.
O controlo de infestantes pode ser um problema, sobretudo nos ensaios de Primavera Verão, dado que em Portugal não existem herbicidas homologados para esta cultura.
AGRADECIMENTOS
Este trabalho foi elaborado no âmbito de um projecto de colaboração com a Universidade DeMontfort: Research contract Nº FAIR-CT98-9574 (DG12-SSMI).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Anónimo (2001) - Panorama agricultura 2000. Gabinete de Planeamento e Política Agro-Alimentar, Lisboa.
Durrant, A. (1976) - Flax and linseed. In: Simmonds, N. W. (Ed.) Evolution of Crop Plants. Longman, London, pp. 190-195.
Hopf, M. (1991) - South and Southwest Europe. In: Zeist, W. Van; Waslikowa, K. & Behre, Karl-Ernst (Eds.) Progress in old world palaeoethnobotany. Brookfield, Rotterdam, pp. 241-277.
INE (1962 1991) - Estatísticas Agrícolas. Instituto Nacional de Estatística, Lisboa.
Keijzer, P. (1989) - Synchronization of fibre and grain maturation of flax (Linum usitatisssimum L.). In: Marshall, G. (Ed.) Flax: breeding and utilisation. Kluwer Academic Publishers, Dordrecht, pp. 26-36.
Marshall, G.; Morrison, I. & Nawolsky, K. (1989) - Studies on the physiology of Linum usitatissimum L.: the application of mathematical growth analysis. In: Marshall, G. (Ed.) Flax: breeding and utilisation. Kluwer Academic Publishers, Dordrecht, pp. 39-47.
Moule, C. (1972) - Plantes sarclées et diverses. La Maison Rustique, Paris.
Oliveira, E.V.; Galhano, F. & Pereira, B. (1991) - O linho - Tecnologia tradicional portuguesa. I.N.I.C., Lisboa.
Pery, G. (1875) Geographia e Estado Geral de Portugal e Colónias. Imprensa Nacional, Lisboa.
Rossini, F. & Casa, R. (2003) - Influence of sowing and harvest time on fibre flax (Linum usitatissimum) in the Mediterranean environment. Journal of Agronomy and Crop Science 189: 191-196.
Van Zeist, W. (1970) - The Oriental Institute excavations at Mureybit, Syria: preliminary report on the 1965 campaign. Part III. Palaeobotany. Journal Near East Stud 29: 167-176. [ Links ]
Recepção/Reception: 2009.07.28
Aceitação/Acception: 2010.03.01