INTRODUÇÃO
A oliveira é atualmente a cultura que ocupa a segunda maior superfície agrícola em Portugal (379 mil hectares em 2020) (INE, 2021). Os primeiros registos de cultivo da oliveira na Região de Trás-os-Montes (Nordeste de Portugal) datam dos fins do século XVI (Oliveira et al., 2020), sendo que a ascensão e estabelecimento dos olivais começou em meados do século XIX (Reis, 2014) e, desde então, a importância socioeconómica da cultura tem sempre aumentado. Atualmente o Nordeste tem uma participação de 28% na área agrícola total portuguesa destinada ao cultivo da oliveira.
Existe pouca informação disponível sobre as condições edáficas em áreas cultivadas com olivais no Nordeste (NE) de Portugal e como elas exercem influência na distribuição e desenvolvimento da cultura. Dessa forma, este estudo visa contribuir com a atualização da informação existente através da identificação das principais características edafoclimáticas das áreas olivícolas na Região.
MATERIAL E MÉTODOS
A informação de base para o estudo incluiu como fontes principais a Carta dos Solos e da Aptidão da Terra do NE Portugal (Agroconsultores & Coba, 1991; Araújo et al., 2004), a Carta de Uso e Ocupação do Solo (COS) de Portugal Continental para 2018 (DGT, 2019) e a Carta Administrativa Oficial de Portugal (CAOP) versão 2020, sendo toda a informação recortada pelos limites regionais.
Os dados obtidos foram em boa parte condicionados pelos limites da informação contida em Agroconsultores & Coba (1991) que segue e o sistema FAO/UNESCO (1988). Trata-se de cartas à escala 1:100 000, cujas unidades cartográficas de solos são definidas como associações de unidades pedológicas, compostas por de uma a três dominantes e de uma a três subdominantes, ocorrendo em zonas caracterizadas por uma combinação específica de fatores pedogenéticos: clima, litologia e características do material originário dos solos, relevo e declive, presença de obstáculos e uso da terra dominante. A COS 2018 (DGT, 2019) descreve os principais tipos de ocupação/uso do solo e sua proporção em níveis e classes hierárquicas, sendo para este estudo utilizado o nível de maior detalhe (4) para a representação dos olivais (classe 2.2.3.1). A CAOP disponibiliza os limites oficiais de Distrito, Concelho e Freguesia a nível de País.
A informação de base foi tratada em ambiente SIG com as ferramentas do ArcGIS@ESRI, a partir das tabelas de atributos de cada carta e das suas sobreposições. Os dados obtidos foram analisados com auxílio da ferramenta tabela dinâmica no Excel.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O olival cobre aproximadamente 105 mil ha no NE de Portugal (cerca de 7% do território) e é a cultura que ocupa a maior área agrícola da Região (21%). Dos Concelhos que compõem a Região, 90% apresentam alguma área destinada ao cultivo de oliveiras em menor ou maior extensão, sendo a maior percentagem de superfície afetada por oliveiras situada na zona central de Trás-os-Montes (Mirandela, Macedo de Cavaleiros, Valpaços, Alfândega da Fé e Vila Flor), responsáveis por 55% da área agrícola com olivais e ao longo do rio Douro (Mogadouro, Torre de Moncorvo e Vila Nova de Foz Côa) com uma participação de 17% do total regional (Figura 1).
Os olivais concentram-se na zona climática mais seca “Terra Quente” (T > 14ºC, P < 600mm, < 400m de altitude). As oliveiras são mais raras nas faixas noroeste e nordeste da “Terra Fria” (T<12,5ºC, >700m de altitude), informação que está de acordo com a encontrada em Figueiredo et al. (2002) e em Figueiredo et al. (2015) quando tratou, respetivamente, das características edáficas dos olivais em Trás-os-Montes e do índice de aridez para medir a suscetibilidade dos solos do NE de Portugal à desertificação.
Alguns Concelhos como Vila Pouca de Aguiar, Figueira de Castelo Rodrigo, Freixo de Espada À Cinta e São João da Pesqueira destinam percentagens de áreas consideráveis para cultivo de oliveiras, que abrangem respetivamente 36%, 22%, 11% e 11% da sua área total. Todavia, dentro do panorama da Região, as suas contribuições somam apenas 7% do total.
Os Leptossolos representam 80% da área sob olivais no NE, sendo as unidades secundárias êutrica (40%) e dístrica (38%) as mais representadas. Em relação à litologia, a maior parte dos Leptossolos deriva de xistos, a que se seguem as rochas básicas e granitos. Em seguida, tem-se os Antrossolos áricos que ocupam aproximadamente 11% da área (8% dístricos e 3% êutricos) e são desenvolvidos a partir de xistos e granitos. Os Cambissolos ocupam 7% da área, sendo quase em totalidade dístricos (6%) e a maioria deriva de granitos (Figura 2).
Na sua maioria os solos são delgados, devido à dominância dos Leptossolos, com espessura útil < 50cm. Uma parte significativa corresponde a solos originalmente delgados, aprofundados por operações de preparação do terreno para a plantação (Antrossolos). As unidades secundárias dístricas dominam mais de metade da área, evidenciando que os solos são em sua maioria ácidos ou muito ácidos e pobres em matéria orgânica. Uma parte significativa das unidades secundárias são êutricas (44%) indicando solos com grau de saturação de bases ≥ 50% e de reação subácida e neutra. Na sua maior parte, o material originário é constituído por xistos e rochas afins (Figura 2).
A maioria da área olivícola apresenta aptidão para a agricultura marginal (57%) e nula (34%), sendo apenas 2% das terras consideradas adequadas para uso agrícola e 7% estão condicionadas a investimentos antes da instalação dos olivais. Os principais fatores limitantes que explicam a classificação da aptidão da terra nas áreas de olival são a diminuta profundidade dos solos, a elevada pedregosidade, o domínio da reação ácida, e a evidente carência de água no solo durante parte do ano (Figura 3).
Tais elementos caracterizadores dos solos olivícolas corroboram com os observados por Figueiredo (2013) em seu trabalho sobre os recursos pedológicos do Nordeste Transmontano, onde os indicadores de aptidão do solo evidenciam limitada espessura útil, elevada carência de água no solo e elevada pedregosidade.
Em relação a carência de água, foi observado que os solos sob o cultivo de oliveiras no NE apresentam maior período de défice hídrico (> 8 meses em 54%) em relação ao total dos solos sob uso agrícola na mesma Região (27%), como assinalado por Figueiredo (2013), informação que evidencia como o recurso água é ainda mais limitante para a primeira situação. Da mesma forma, em extensão considerável a área olivícola regional, a pedregosidade do solo é elevada (30-50% em 35% da área) e muito elevada (> 50% em 10%). No conjunto do NE, estas percentagens são substancialmente menores (respectivamente, 19 e 4%).
Embora o plantio da oliveira seja realizado dominantemente em declives inferiores a 12/15%, os olivais também se encontram frequentemente em encostas mais declivosas (12/15% - 25/30% em 23% dos casos e > 25/30% em 20%). Um fator que pode diminuir o risco de erosão associado a estes declives é a elevada pedregosidade. No caso dos olivais do NE, a percentagem de elementos grosseiros é superior a 30% em 45% da área, o que sugere a proteção da superfície do solo contra perdas por erosão. Em contrapartida, estes dois fatores condicionam a trafegabilidade e as operações mecanizadas da cultura (Figueiredo et al., 2002).
CONCLUSÕES
Os olivais são um elemento caracterizador da paisagem e com grande importância para o desenvolvimento socioeconómico do Nordeste Transmontano. A sua distribuição e densidade concentram-se nas zonas climáticas mais secas e quentes, onde o caráter Mediterrâneo é mais marcante.
Os solos sob olivais são na sua maioria pouco profundos, pedregosos, ácidos e pobres em matéria orgânica. A cultura ocupa em grande parte terrenos declivosos.
Globalmente, as terras com olivais foram classificadas com aptidão marginal ou nula para a agricultura. No entanto, as oliveiras apresentam boa adaptação aos parâmetros edafoclimáticos regionais, com expressivas produções de azeites regionais de boa qualidade. Condição que indica a necessidade de adequação e contextualização dos parâmetros utilizados na definição das limitações ao uso da terra pelo olival, de forma a trazer informações que melhor traduzam o observável no terreno.
As oliveiras estão bem-adaptadas aos condicionalismos edafoclimáticos regionais, mas é necessário implementar práticas alternativas que promovam uma melhor gestão dos pomares, para o que é importante aprofundar o conhecimento dos solos das áreas de olival.