INTRODUÇÃO
O eucalipto (Eucalyptus globulus) é uma espécie invasora, com um crescimento expressivo na ocupação da área florestal portuguesa nas últimas décadas. As características intrínsecas do eucalipto resultam não só num rápido repovoamento em terrenos ardidos, mas também na sua dispersão para outras áreas. Deste modo, e acrescido do seu interesse económico, atualmente é uma das espécies dominantes no território nacional (ICNF, 2019). No entanto, o eucalipto é considerado muito inflamável, o que potencia o risco de incêndio, sendo por isso importante controlar a sua proliferação.
Neste sentido, o projeto PEST(bio)CIDE visa, através da valorização da biomassa foliar de eucalipto, oferecer uma resposta para uma melhor gestão das áreas de eucalipto regeneradas após um incêndio florestal e sua proliferação.
Estudos anteriores indicam que existe um potencial fitotóxico das folhas do eucalipto, uma vez que os compostos envolvidos na tolerância contra insetos e agentes patogénicos (Batish et al., 2008) revelaram também capacidade herbicida contra espécies-alvo (Oerke, 2006). Deste modo, o projecto PEST(bio)CIDE propõe, numa perpectiva de economia circular, a utilização da biomassa foliar de eucalipto como biocida eficaz e ambientalmente seguro. Espera-se também que a incorporação das folhas de eucalipto no solo, possa trazer benefícios para a qualidade do mesmo e contribua para o sequestro de carbono. Deste modo, este trabalho pretende avaliar os efeitos ao longo do tempo da incorporação de diferentes percentagens de biomassa foliar de eucalipto em algumas propriedades fisicas, químicas e biológicas do solo.
MATERIAL E MÉTODOS
Para a realização deste trabalho utilizou-se um solo natural (cambissolo húmico), recolhido no Campus de Vairão da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Após recolha, o solo foi imediatamente congelado de modo a que a comunidade microbiana fosse devidamente preservada. Antes da implementação do ensaio em microcosmos o solo foi descongelado, crivado a 4mm (para retirar raízes e restos de plantas) e homogenizado. A amostra foi dividida em várias subamostras às quais foram misturadas diferentes percentagens (0% - CTR; 2,5% e 5,0%, m/m) de folhas de eucalipto jovem, préviamente seco a 60ºC, fragmentado e crivado a 4mm. Foi feito um ajuste da humidade do solo a 75% da sua capacidade de retenção da água. Para cada condição e tempo de permanência definidos (0, 7, 14, 30 e 90 dias) foram preparadas 3 réplicas. Todas as subamostras foram colocadas numa câmara fitoclimática com condições controladas de temperatura (20ºC) e fotoperíodo, e a humidade reposta semanalmente.
Após cada período definido, os solos foram secos e crivados a 2 mm para as seguintes análises fisico-químicas: humidade (após secagem numa estufa a 105±5ºC até massa constante); capacidade de retenção de água (segundo o protocolo ISO 17512-1); pH (suspensão 1:5 v/v em água de acordo com a norma ISO 10390:2020); condutividade elétrica (medida na suspensão 1:5 v/v após 24h). Determinou-se também a atividade da enzima desidrogenase nas amostras de solo, utilizando como substrato o cloreto de trifeniltetrazólio. A quantificação do trifenilformazão produzido, após incubação a 40oC durante 24h, foi realizada espetrofotometricamente a 546nm (Schinner et al., 1996).
A análise estatística (GraphPad Prism 8), consistiu na realizção de ANOVA a duas dimensões, seguida de teste de comparação múltipla para verificar a existência de diferenças estatisticamente significativas entre os diferentes tratamentos e também para avaliar o efeito do fator tempo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Efeito da adição de eucalipto nas propriedades fisico-químicas do solo
Ao analisar o Quadro 1 verifica-se que o aumento da percentagem de folhas de eucalipto no solo resulta numa ligeira diminuição do teor de humidade. Por outro lado, os valores referentes à capacidade de retenção de água (CRA) no solo (Figura 1) demonstram que existe um aumento significativo quando se incorpora 5,0% de folhas de eucalipto no solo. Verificou-se também que o tempo de incubação não afeta este parâmetro, uma vez que não se observaram diferenças significativas entre os dois períodos avaliados (0 e 90 dias) para cada um dos tratamentos.
No que diz respeito ao pH, ao analisar a Figura 2 verifica-se que as amostras do dia 0 e após 7 dias apresentam um comportamento semelhante, ou seja, uma diminuição significativa do pH à medida que a percentagem de eucalipto no solo aumenta. No entanto, após 14 dias verifica-se um aumento dos valores de pH nas amostras que contêm eucalipto, principalmente no tratamento de 5%. Após 90 dias já não se observam diferenças nos valores de pH dos diferentes tratamentos. Ou seja, apesar da incorporação de folhas de eucalipto afetar negativamente o pH do solo, tornando-o fortemente ácido, este efeito é temporário e o solo consegue recuperar os seus níveis de pH originais após duas semanas.
A condutividade elétrica (Figura 3), uma medida da quantidade de sais no solo, foi avaliada apenas no início do ensaio (0 dias) e após 90 dias. Verificou-se que este parametro aumenta significativamente à medida que se aumenta a percentagem de folhas de eucalipto no solo, não se observando nenhuma diferença entre os dois períodos de incubação avaliados. Este aumento da condutividade elétrica poderá indicar a salinização dos solos, que afeta negativamente a qualidade dos mesmos. Por outro lado, pode estar relacionado com um aumento da concentração de nutrientes disponíveis. A integração destes resultados com outros parametros que estão a ser analisados, como por exemplo o teor de nutrientes disponível, irá permitir entender melhor o aumento da condutividade observado.
Efeito da adição de eucalipto na atividade enzimática do solo
A atividade da enzima desidrogenase é frequentemente utilizada como um indicador da atividade biológica dos solos, pois é uma medida da intensidade do metabolismo microbiano (Schinner et al., 1996; Gianfreda & Rao, 2010). Os resultados obtidos (Figura 4) indicam um aumento significativo da atividade da desidrogenase nos tratamentos com incorporação de eucalipto, para todos os tempos de incubação. O facto de este aumento se verificar logo no início do ensaio (dia 0), pode indicar a existência de algum tipo de interferência na determinação desta enzima. No entanto, os resultados após 90 dias mostram um aumento notório da atividade no tratamento de 5,0%, quer em relação aos restantes tratamentos quer para este tratamento ao longo do tempo. Este resultado poderá estar relacionado com a degradação das folhas de eucalipto, uma vez que as desidrogenases têm um papel importante na oxidação da matéria orgânica do solo. Os trabalhos ainda em curso, tais como a avaliação deste parâmetro para períodos de incubação mais longos e a caracterização da matéria orgânica dos solos, irão permitir obter resultados mais consistentes.
CONCLUSÕES
Considerando o crescimento expressivo do eucalipto na ocupação da área florestal portuguesa, e atendendo também ao facto de ser de uma espécie invasora e muito inflamável, é importante controlar a sua proliferação. Este controlo, nomeadamente através da utilização das das folhas do eucalipto como herbicida contra espécies-alvo, está a ser avaliado no projeto Pest(bio)Cide. Por outro lado, a incorporação da biomassa foliar no solo altera as propriedades fisicas, químicas e biológicas do solo, tal como demonstram os resultados preliminares apresentados neste trabalho. No entanto, e de modo a concluir se estas alterações são benéficas ou não para os solos, será necesessário integrar outros paramentros fisico químicos e biológicos que estão a ser determinados, assim como avaliar tempos de incubação mais longos.