INTRODUÇÃO
O aumento da área nacional de olival (377 mil hectares) e a crescente conversão do olival tradicional em olivais superintensivos, que já ocupam mais de 1/5 da superfície de olival para azeite, proporciona uma cada vez maior disponibilidade de subprodutos resultantes desta cultura (INE, 2021).
Através do processo de compostagem é possível realizar a transformação destes e outros subprodutos orgânicos em corretivos, ricos em matéria orgânica estabilizada, bem humificada, isentos de fitotoxicidade, higienizados, de armazenamento e manuseamento muito mais fácil. A utilização destes fertilizantes orgânicos apresenta inúmeros benefícios para o solo receptor destacando-se o aumento do sequestro de carbono e o aumento da sua fertilidade, aumentando a capacidade de armazenamento e retenção de água, bem como de catiões de troca e de nutrientes contribuindo, no seu conjunto, para o aumento da resiliência, em especial dos solos com menor poder tampão (Lal, 1997).
A reciclagem de resíduos biodegradáveis em agricultura através da compostagem é considerada como um meio de manter ou restaurar a qualidade dos solos através das propriedades exclusivas da MO humificada contida no material compostado, com especial relevância nas regiões do sul da Europa, onde é um valioso instrumento de luta contra a escassez de matéria orgânica que leva à desertificação e erosão do solo (Van-Camp et al., 2004).
Com o presente estudo pretendeu-se avaliar, em condições controladas (ensaios em vasos instalados em estufa), os efeitos de um composto orgânico, produzido à base de subprodutos do olival e estrume de ovino, na fertilidade de dois solos distintos e no desenvolvimento de uma cultura teste, demonstrando que é viável realizar a produção de um bom fertilizante orgânico na própria exploração e utilizando os resíduos orgânicos e recursos existentes.
MATERIAL E MÉTODOS
Tendo em vista os objetivos do estudo, estabeleceram-se dois ensaios em vasos, utilizando macroamostras de terra provenientes da camada superficial (0-0,20m) de um Luvissolo (LV) e de um Podzol (PZ) (IUSS Working Group WRB, 2014) de caraterísticas distintas no que diz respeito à textura (franco argiloso e arenoso, respetivamente), ao teor de matéria orgânica (22,0 e 8,0 g/kg) e de nutrientes. Utilizou-se como cultura teste a alface (Lactuca sativa L.). O composto orgânico utilizado no estudo foi submetido a análise físico-química cujos resultados revelaram encontrar-se devidamente higienizado, com uma baixa razão C/N (11,8), evidenciando uma boa estabilidade, e sem fitotoxicidade devido a elementos metálicos.
Os ensaios foram delineados em blocos completos casualizados, com 3 repetições e quatro tratamentos experimentais, uma testemunha sem composto e os restantes com níveis crescentes (valores equivalentes a 25, 50, 75 e 100 t ha-1). Não se aplicou qualquer fertilização mineral.
Os vasos, com 1,5 dm3 de capacidade, foram preenchidos com 2,0 kg de terra previamente misturada com as diferentes quantidades de composto correpondentes a cada tratamento experimental, sendo regados até 60% da capacidade de campo. No final do ensaio as plantas foram cortadas rés-terra, pesadas, lavadas, secas e preparadas para análise. Foram colhidas amostras de terra representativas de cada vaso que foram também analisadas.
Para a análise estatística dos resultados recorreu-se ao programa Statistica tendo sido utilizado o método de análise de variância e o teste de Duncan (p=0,05) para comparação a posteriori das médias correspondentes aos diferentes tratamentos experimentais. Recorreu-se também à análise de regressão para avaliar a relação entre os niveis de composto aplicado e a produção de biomassa e os efeitos sobre alguns parâmetros do solo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Produção de Biomassa
Observou-se um efeito altamente significativo (p≤0,001) dos tratamentos experimentais sobre o diâmetro das plantas e sobre a produção de biomassa (expressa em material seco a 62±3oC) (Quadro 1). A aplicação de quantidades crescentes do composto orgânico conduziu a aumentos da produção de biomassa, verificando-se que o modelo que melhor se ajusta aos resultados obtidos no ensaio com o solo LV é uma função quadrática, significativa (p≤0,05), com um coeficiente de determinação de 90% (Figura 1) e, no caso do ensaio com o solo PZ, é uma função linear, altamente significativa (p≤0,001), com um coeficiente de determinação de 99% (Figura 2). Não se observou qualquer efeito de fitotoxicidade sobre a cultura teste, mesmo quando se utilizaram as quantidades mais elevadas de composto.
Trat. Exp. | Ensaio c/ LV | Ensaio c/ PZ | ||
Ø da planta (cm) | MS (g vaso-1) | Ø da planta (cm) | MS (g vaso-1) | |
0 t ha-1 | 14,1 c | 1,9 c | 11,3 e | 1,1 e |
25 t ha-1 | 15,1 bc | 2,3 bc | 14,5 d | 2,1 d |
50 t ha-1 | 16,4 b | 2,6 b | 17,6 c | 3,1 c |
75 t ha-1 | 18,3 a | 3,2 a | 19,9 b | 3,9 b |
100 t ha-1 | 18,3 a | 3,1 a | 21,9 a | 4,9 a |
C.V. (%) | 4,8 | 10,4 | 5,7 | 5,4 |
Sm (±) | 0,451 | 0,156 | 0,556 | 0,095 |
Fertilidade do solo
A aplicação do corretivo orgânico originou um aumento do teor de matéria orgânica que foi estatisticamente significativo (p≤0,01) no caso do ensaio com o Luvissolo (Figura 3). Registou-se também, em ambos os solos, um aumento significativo do pH, provocando uma alteração da reação do solo mais intensa no caso do Podzol, passando de pouco ácida a neutra (Figura 4). Os níveis de fósforo (ext. pelo método de Égner-Rhiem) sofreram acréscimos altamente significativos (p≤0,001) com a aplicação de quantidades crescentes de composto orgânico, tendo sido os tratamentos experimentais responsáveis por cerca de 97% da variação total observada em ambos os ensaios (Figura 5). É principalmente relevante o aumento do fósforo no solo podzólico observando-se um acréscimo de cerca de 10 vezes para a dose mais elevada em relação à testemunha. Ocorreram ainda acréscimos significativos no grau de saturação de bases no Podzol, principalmente devido ao acréscimo no teor de cálcio de troca provocado pela adição das quantidades crescentes de composto rico neste nutriente (2,96%).
Os micronutrientes cobre e zinco foram os únicos a apresentar efeitos significativos à aplicação do composto, nos dois solos, refletindo a riqueza do mesmo nestes elementos (155 e 219 mg kg-1) (Figuras 6 e 7).
CONCLUSÕES
Através da compostagem dos subprodutos do olival e estrume de ovino, realizada na própria exploração agropecuária, conseguiu-se obter um corretivo orgânico de qualidade, cuja utilização contribuiu para um aumento da produção da planta teste, não produzindo efeitos de fitotoxicidade, mesmo quando usado em quantidades muito elevadas.
A aplicação deste fertilizante orgânico originou uma melhoria da fertilidade dos solos testados, principalmente devido ao aumento nos teores de MO, P, Zn e Cu.
Os efeitos da aplicação do corretivo orgânico dependeram das caraterísticas do solo recetor, sendo mais evidentes no solo com menor capacidade tampão (PZ).