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Revista de Ciências Agrárias

versão impressa ISSN 0871-018Xversão On-line ISSN 2183-041X

Rev. de Ciências Agrárias vol.45 no.4 Lisboa dez. 2022  Epub 01-Dez-2022

https://doi.org/10.19084/rca.28542 

Artigo

Impacto do fogo controlado na estabilidade da agregação do solo em áreas de matos do Parque Natural de Montesinho, NE Portugal

Impact of prescribed fire on soil aggregate stability in shrub areas in Montesinho Natural Park, NE Portugal

Israel Santos1 

Tomás Figueiredo1 

Ana Caroline Royer1 

Denise Szymczak2 

Felícia Fonseca1 

1Centro de Investigação de Montanha (CIMO), Instituo Politécnico de Bragança, Campus de Santa Apolónia, 5300-253, Bragança, Portugal

2Cordenação de Engenharia Ambiental (COEAM), Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campus Francisco Beltrão, 85601-970, Paraná, Brasil


Resumo

O solo é um recurso indispensável para a manutenção da vida. No entanto, com o tempo, vem sofrendo impactos negativos capazes de reduzir a sua qualidade, comprometendo a manutenção dos ciclos naturais dependentes deste meio. Neste sentido, o fogo é considerado uma atividade que pode interferir com o estado de conservação do solo. Devido à utilização do fogo controlado em Portugal como ferramenta de gestão da vegetação, torna-se importante a realização de estudos que contribuam para o conhecimento dos seus efeitos no solo. Assim, o presente estudo teve como objetivo avaliar o impacto de um fogo controlado aplicado no Parque Natural de Montesinho, NE Portugal, na estabilidade da agregação do solo dois e sete meses pós-fogo, comparando com o solo original. As amostras foram coletadas em 11 pontos nas profundidades 0-3, 3-6, 6-10 e 10-20 cm ao longo de dois transetos, com aproximadamente 15 m de distância entre pontos e transetos. Após a avaliação da estabilidade da agregação, foram comparadas as condições do solo antes e depois do fogo. O fogo contribuiu para a redução da estabilidade da agregação ao longo do tempo e da profundidade do solo, mostrando os agregados de maiores dimensões menor estabilidade. Estes efeitos podem traduzir-se num aumento da erodibilidade do solo.

Palavras-chave: fogo contolado; agregação do solo; Portugal

Abstract

Soil is an indispensable resource for the maintenance of life. However, over time, it has undergone changes that may reduce its quality, compromising the maintenance of natural cycles dependent on this system. In this sense, fire is considered an activity that can interfere with the state of soil conservation. Due to the high use of controlled fire in Portugal as a vegetation management tool, it is important to carry out studies that contribute to the knowledge of its effects on the soil. Thus, the present study aimed to evaluate the impact of a controlled fire applied in the Montesinho Natural Park, NE Portugal, on the soil aggregate stability two and seven months after fire, compared to the original soil. Samples were collected in 11 points at depths 0-3, 3-6, 6-10, and 10-20 cm along two transects, with approximately 15 m of the distance between points and transects. After evaluating the aggregate stability, the soil conditions before and after the fire were compared. Fire contributed to the reduction of aggregation stability over time and soil depth, with larger aggregates showing less stability. These effects can translate into an increase in soil erodibility.

Keywords: prescribed fire; soil aggregation; Portugal

INTRODUÇÃO

A existência do solo é um fator essencial para o sustento da vida tal como é conhecida, pois está associada à manutenção de processos naturais, como os ciclos biogeoquímicos, assim como o ciclo e qualidade da água

Segundo Bradford et al. (2016) e Luo et al. (2015), parâmetros físicos e químicos são aspectos capazes de traduzir o estado em que o solo se encontra. E estes, podem sofrer alterações através de ações naturais ou antrópicas (Debiasi e Franchini, 2012).

Neste sentido, uma atividade que apresenta grande potencial de dano para o solo é o fogo, pois é capaz de alterar, dentre diversas características, a estabilidade da agregação do solo (Giovannini et al., 1987; Diaz-Fierros et al., 1990; Josá, 1994).

Diante dos severos focos de incêndios florestais observados em Portugal, e devido aos seus impactos na redução do teor de matéria orgânica, esta, reponsável por auxiliar na agregação das partículas do solo, é importante conhecer os efeitos do fogo na estabilidade da agregação do solo.

Fatores como tamanho, forma e arranjo das partículas, juntamente com os espaços vazios, constituem os poros. Estes, são responsáveis por manter um bom arejamento, propiciando melhores condições de estrutura e agregação do solo.

Segundo Lal (1991) e Franzluebbers (2002), a estabilidade da agregação promove a fertilidade do solo, melhorando a produção agronómica, e diminuindo os índices de erodibilidade. Um solo estável apresenta maior proteção da matéria orgânica e menores efeitos dos processos erosivos.

Neste contexto, o presente estudo tem como objetivo avaliar os efeitos de um fogo controlado aplicado no Parque Natural de Montesinho, NE Portugal, na estabilidade da agregação do solo.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho decorreu no Parque Natural de Montesinho, NE Portugal, próximo da aldeia de Aveleda, Bragança (41°53′57.06″N, 6°40′55.39″O) (Figura 1), onde a 22 de março de 2021 foi realizado um fogo controlado numa área de matos de cerca de 5 ha, com vista à gestão da vegetação e consequente proteção de um povoamento de Pinus pinaster contra a possível ocorrência de incêndios florestais.

Figura 1 Localização geográfica da área de estudo. 

A fim de avaliar os efeitos a curto prazo deste método de gestão e os impactos gerados nas características do solo, foram realizadas coletas do solo em 11 pontos antes da aplicação do fogo (SO), dois meses (2MPF) e sete meses (7MPF) após o fogo controlado.

As amostras foram coletadas ao longo de dois transetos, às profundidades 0-3, 3-6, 6-10 e 10-20 cm, com distância de aproximadamente 15 m entre pontos e transetos.

Após coletadas, as amostras foram secas em estufa a 45°C durante um período de 48 horas e, posteriormente, crivadas em crivos de malha de 2 mm e 1 mm. Para a avaliação da estabilidade dos agregados utilizou-se apenas as partículas que ficaram retidas natruralmente no crivo de 1 mm, ou seja, partículas com dimensões entre 1 e 2 mm.

Na avaliação da estabilidade dos agregados, utilizou-se crivos de malha 0,4 mm e 0,25 mm (classes de agregados). Os ensaios para cada classe de agregados ocorreram num equipamento denominado “estabilizador de agregados”, e foram realizados separadamente, isto é, primeiro determinou-se a estabilidade dos agregados maiores (crivo 0,4 mm) e depois a dos menores (crivo 0,25 mm).

Para cada amostra foram adicionadas 4g de solo no crivo e 100mL de água destilada em recipientes adaptados ao equipamento. Em sequência, o equipamento ficou em atividade por 3 minutos. Após este período, o material instável foi levado à estufa a uma temperatura de 105°C durante 24 horas.

O mesmo processo foi realizado em sequência, porém, com a utilização de hexametafosfato diluído em água destilada e durante um período de 10 minutos, afim de auxiliar a desagregação das partículas. Foram realizadas 4 repetições para cada amostra.

Para interpretar os resultados, foi aplicada a análise de variância ANOVA a p<0.05 e em sequência o teste Tukey para avaliar se existiam diferenças significativas entre os períodos estudados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Efeito do fogo

Ao comparar os períodos antes e depois da aplicação do fogo controlado, constatou-se que existem diferenças significativas entre as médias das duas classes de agregados (0,4 e 0,25 mm). Além disto, foi possível verificar uma maior estabilidade da agregação no solo original (não ardido) (Figura 2).

Figura 2 Estabilidade dos agregados nos períodos não ardido e ardido para cada classe de agregados (0,25 e 0,4mm). Valores nas colunas seguidos de letras diferentes diferem significativamente (p < 0,05). 

A identificação de maior estabilidade na área não ardida comparativamente à ardida, está ligada aos impactos causados pelo fogo em atributos físicos e químicos do solo, tal como o teor de matéria orgânica e carbono orgânico total (Badía-Villas et al., 2014). Autores como Thomaz (2011), Mataix-Solera et al. (2011), Chen et al. (2016) e Nunes et al. (2019), abordam os impactos da temperatura na estabilidade dos agregados.

Efeito da profunidade

Na Figura 3 é possível observar a estabilidade da agregação em profundidade nos diferentes períodos de amostragem. Nota-se um padrão de maior estabilidade da agregação no solo original (SO), quando comparado aos períodos pós fogo, principalmente nas camadas superiores (0-6 cm) com diferenças significativas relativamente aos períodos pós-fogo (2MPF e 7MPF).

No entanto, quando se compara os períodos 2MPF e 7MPF entre si, normalmente não apresentam diferenças significativas. Tendo variação apenas na profundidade 10-20 cm, na classe 0,25 mm, onde a maior estabilidade está relacionada ao período de 2MPF.

Figura 3 Estabilidade dos agregados em profundidade, nos diferentes períodos de amostragem (SO, 2MPF e 7MPF) para cada classe de agregados. Letras diferentes nas colunas indicam diferenças significativas (p < 0,05). 

Conforme Junior et al. (2012), a presença de vegetação sobre o solo é um fator que contribui significativamente para a manutenção de uma boa estabilidade da agregação. Também Salton et al. (2008), propõem que a disposição de raízes, tecidos vegetais mortos e a liberação de agentes cimentantes provenientes da vegetação presente são aspetos que melhoram, sobretudo, a agregação em camadas superiores do solo.

Classes dos agregados ao longo do tempo

Conforma a Figura 4, nota-se que a estabilidade do solo diminui após sofrer a ação do fogo e é significativamente superior para a classe de agregados de 0,25 mm, comparativemente à classe de agregados 0,4 mm.

Figura 4 Estabilidade dos agregados conforme a classe de agregados (0,25mm e 0,4mm) independente do período (SO, 2MPF e 7MPF). Valores seguidos de letras diferentes diferem significativamente (p < 0,05). 

Pádua et al. (2015) afirma que o tamanho dos agregados do solo influencia a estabilidade da agregação. Pois agregados menores tendem a ser mais estáveis, enquanto agregados maiores tendem a possuir maior instabilidade.

CONCLUSÕES

A estabilidade da agregação apresenta valores significativamente superiores no solo original quando comparado com as avaliações realizadas nas áreas ardidas. Quando se compara individualmente os períodos e as profundidades, é possível concluir que os momentos dois meses (2MPF) e sete meses (7MPF) pós-fogo tendem a apresentar menor estabilidade da agregação, independentemente da profundidade, em relação ao solo original (SO). Conclui-se também que a estabilidade dos agregados é sempre superior na classe 0,25 mm, comparativamente a 0,4 mm.

Agradecimentos

TERRAMATER- Innovative preventive recovery measures in burnt areas, 0701_TERRAMATER_1_E, co-funded by FEDER through Interreg V-A España-Portugal (POCTEP) 2014-2022.

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