1. Introdução
A Educação Física, contextualizada no universo da escola, busca, através das diversas contribuições das ciências físico-biológicas, e das ciências socio culturais, entender o corpo como linguagem passível de ser compreendida e assumida como forma de manifestação, comunicação e expressão por parte dos alunos, através do ensino de conteúdos universalmente reconhecidos na história da humanidade. Assim sendo, entende-se que há cinco conteúdos por excelência que devem ser abordados e desenvolvidos durante a formação dos alunos no contexto da intervenção da Educação Física: jogos, desportos, danças, lutas e ginástica (Brasil, 2016).
A Lei Municipal nº 6.577/2019 assegura que, no município do Rio de Janeiro, as escolas particulares e públicas, que ministrem aulas de educação infantil e ensino fundamental, implantem programas educacionais que possi bilitem a prática da Educação Física adaptada. Essa lei busca desenvolver a inclusão dos alunos com deficiência (Brasil, 2019). Numa perspetiva de educa ção inclusiva, as características (capacidades e necessidades de apoios) dos alunos devem ser levadas em consideração, sendo preciso reequacionar-se conteúdos, estratégias e materiais diversificados. Nesse sentido, o computador aparece como um instrumento de alto potencial cognitivo e motivacional (Leite & Léon, 2018).
Na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) consta a proposta da utilização de jogos eletrónicos, os quais podem ser uma ferramenta interes sante para identificar as transformações que os jogos impõem à sociedade, através dos avanços das tecnologias e nas possibilidades de exigências corpo rais oferecidas por esse tipo de atividade. Cabe destacar que, apesar de não angariar coesão entre os professores de Educação Física, a BNCC disponibiliza uma gama de opções para valorizar as vivências das crianças, jovens e adultos na Educação Básica, favorecendo o reconhecimento de diversas nuances das mais variadas áreas do conhecimento (Brasil, 2018). Desta forma, a BNCC apresenta:
Saberes corporais, experiências estéticas, emotivas, lúdicas e agonistas, que se inscrevem, mas não se restringem, à racionalidade típica dos saberes científicos que, comumente, orienta as práticas pedagógicas na escola. Experimentar e analisar as diferentes formas de expressão que não se alicerçam apenas nessa racionalidade é uma das potencialidades desse componente na Educação Básica (Brasil, 2018, p. 213).
A utilização de recursos mediáticos nas aulas de Educação Física vem ao encontro da evolução tecnológica, apesar de algumas tecnologias, como os jogos digitais tradicionais, serem criticadas por não permitirem interação ou movimento corporal e por serem associadas à introversão social, comportamento agressivo (Alves & Carvalho, 2011), sedentarismo, obesidade e maus hábitos alimentares (Enes & Slater, 2010). Alguns estudos (Finco & Fraga, 2012; 2013; Marchetti et. al, 2011; Perez et. al, 2014) destacam uma nova plataforma de videogames ativos com possibilidades de comunicações motoras, os exergames.
Sinclair et. al (2007) afirmam que os exergames são uma combinação da atividade física com o jogo eletrónico, permitindo que o fascínio pelos games seja tão aproveitado quanto a prática de exercícios físicos. Outros termos são também utilizados para definir a interação da pessoa com o computador, sendo sinónimos para exergames1: exertion interfaces, physically interactive game, sports interface, sports over a distance, active videogame, exergaming, exertion games, bodily interfaces e embodied interfaces (Höysniemi, 2006).
Para Cruz Junior (2017), os exergames estão entre as principais formas de expressão e entretenimento da atualidade. Com popularidade entre crianças, jovens e adultos, os exergames apresentam-se como típicos da cultura digital e encontram-se entre os artefatos com os quais os alunos interagem, mesmo fora da escola (Almeida & Silva, 2011). Assim sendo, observa-se o sur gimento de uma nova classe de jogos digitais, que proporcionam ao usuário o desenvolvimento de habilidades sensoriais e motoras, graças à possibilidade de emulação percetiva, propiciada por mecanismos de realidade virtual e tecnologias de rastreio e atuação (Vaghetti & Botelho, 2010).
A tecnologia dos exergames coloca novos desafios e discussões para a Educação Física, tendo em vista que incorpora a ação de “mover-se para jogar”, o que se contrapõe à passividade e inatividade do jogador (Baracho et. al, 2012). Desse modo, os exergames podem servir de auxílio aos professores de Educação Física, que, diversas vezes, encontram obstáculos para incluir os alunos nas atividades propostas em aula (Vaghetti & Botelho, 2010). Tais re cursos associados a estratégias de ensino podem possibilitar ao aluno, sem ou com deficiência, a experiência de sensações e emoções do jogo digital ativo, contribuindo para a motivação e participação de todos os alunos nas aulas (Baracho et. al, 2012).
Todavia, mesmo com os direitos da pessoa com deficiência garanti dos em leis, processos dialéticos e antagónicos, como inclusão e exclusão, apresentam-se regularmente no âmbito escolar, incluindo as aulas de Educa ção Física. Conforme Santos e Fonseca (2011), o processo de construção de um sentido inclusivo requer um constante avaliar e repensar de posições, um pro blematizar de representações e, consequentemente, espera-se, um transformar de atitudes de um sentido excludente a um sentido inclusivo.
Baseado no exposto, o objetivo desta revisão integrativa foi analisar os exergames como possibilidade de recurso pedagógico motivador para o aumento da prática de exercícios físicos e gasto energético nas aulas de Edu cação Física.
2. Metodologia
A revisão integrativa da literatura é um método de pesquisa que visa conden sar informações sobre determinado assunto, permitindo a inclusão de estudos diversos para o entendimento do fenómeno estudado (D’Avila et. al, 2017). Trata-se de um estudo descritivo que contribui para compreender e evidenciar o conhecimento atualizado sobre uma temática específica, uma vez que a revi são integrativa é elaborada com o objetivo de sintetizar, comparar, analisar e discutir estudos independentes sobre um mesmo tema (Souza et. al, 2010).
As buscas foram realizadas nas bases de dados eletrónicas MedLine (via PubMed) (National Library of Medicine, Estados Unidos), ERIC (Education Resources Information Center, do Institute of Education Science, Estados Unidos), Scopus (Elsevier, Holanda), SciELO (Scientific Eletronic Library Online), Redalyc (Red de Revistas Científicas de América Latina y el Caribe, España y Portugal), Campbell Collaboration (vinculada à Cochrane Collaboration) e Google Scholar. Foram utilizados os descritores: “Educação Física”, “exergames”, “videogames”, “jogos eletrónicos”, “inclusão”. Esses termos e seus sinónimos foram combinados utilizando os operadores booleanos OR (entre os sinónimos) e AND (entre os termos) para formar a frase de busca. A consulta foi realizada em artigos originais, em português e inglês. Dois avaliadores conduziram a busca de forma independente nas bases eletrónicas mencionadas. Em caso de divergência na extração dos dados ou na inclusão dos estudos, um terceiro avaliador foi consultado.
Como critério de inclusão, foram utilizados: a) estudos que versas sem o conceito de jogos digitais em que há interação por meio de movimentos corporais; b) estudos que abordassem os exergames como instrumento peda gógico na Educação Física; c) estudos que utilizassem os exergames como estratégia para a prática de atividades físicas; d) arco temporal entre 2006 e 2019. Justifica-se o início do arco temporal em 2006 devido ao lançamento dos videogames ativos, mesmo ano que surgiu o aumento de estudos com jogos di gitais.
Após o grande sucesso do Dance Dance Revolution ® (DDR), inven tado em 1998, game que inclui dança, jogo e música, foram criados três sistemas de consolas bem conhecidos, sobretudo pelos nativos digitais. Em 2006, a Nintendo® lançou o Nintendo Wii®, trazendo controlos sem fio capazes de detetar o movimento e permitir que os jogadores controlem os personagens por meio de movimentos realizados com o corpo. Em 2010, com mesmo con ceito de controlo por movimento, a Sony® lançou o PlayStation 3 Move®. No mesmo ano, a Microsoft© inovou os jogos, apresentando o Xbox Kinect 360®, que utiliza um dispositivo com uma câmara para scanear e transferir as ações corporais para os games, permitindo que o jogador esteja com as mãos livres (Dill, 2013).
Foram excluídos: a) estudos que não relacionaram a utilização dos jogos digitais ativos com a área da educação e/ou da saúde; b) estudos não estratificados pelo Qualis Periódicos2.
3. Resultados
A busca identificou 1038 artigos científicos (Figura 1) sobre a aplicação dos exergames e a prática de atividade física. Desse total, 813 foram descartados por se encontrarem em duplicidade, restando 225 artigos. Após a leitura dos títulos e resumos, 186 estudos estavam em desacordo com os critérios de ele gibilidade. Com a leitura na íntegra de 39 artigos, foram selecionados 16 (nove em português e sete em inglês), categorizados em três secções: cinco sobre exergames e a influência motivadora; sete sobre exergames e gasto energético; quatro sobre exergames e alunos com deficiência (dificuldade motora; parali sia cerebral; Trissomia 21).
A Tabela 1 exibe os cinco estudos que apresentaram as contribui ções dos exergames no processo de ensino-aprendizagem e a influência motivadora dos exergames nas aulas de Educação Física.
Araújo et. al (2011) analisaram os processos de virtualização desportiva, ligados aos exergames, sua interferência na cultura corporal e as possíveis implicações para a Educação Física. Foi adotada a pesquisa qualitativa descritiva de campo, em que foram realizadas entrevistas com 30 alunos entre 11 e 15 anos de idade do ensino fundamental II de duas escolas da rede pública e privada do estado da Paraíba, Brasil. Presentes no quotidiano dos voluntários, os exergames apresentaram-se como mecanismos de socialização, diversão e aprendizado.
Gao et. al (2013) analisaram, durante os anos de 2009 e 2010, o im pacto do exergame DDR na aptidão física e melhoria no rendimento escolar dos alunos. As intervenções foram feitas nos intervalos das aulas, durante 30 mi nutos e três vezes por semana. A pesquisa constatou que os exergames contribuíram para o processo de ensino-aprendizagem através da melhoria no desempenho escolar. Os autores sustentam que os exergames influenciaram na atividade cerebral.
Segundo Baracho et. al (2012), a cultura digital, na qual estão presentes os exergames, é uma via inevitável, um caminho a ser percorrido pela atual e futura geração. Na pesquisa, 117 alunos de Diamantina/MG, Brasil, responderam a questionários sobre a presença das tecnologias da informação e comunicação e o fenómeno da virtualidade no quotidiano. Em seguida, seleci onaram oito destes participantes, que nunca tinham jogado exergames, para praticar o jogo beisebol no Wii Sports em horário extracurricular e, posterior mente, realizaram o beisebol real. Observou-se que o exergame contribuiu para dinamizar o processo de ensino-aprendizagem, pois incorporou possibi lidades de novas experiências corporais de movimento, apontando interações e utilização da ferramenta de maneira reflexiva e estratégica.
Finco et. al (2015) submeteram, por um período de três meses, 24 alunos desmotivados com as aulas regulares de Educação Física a um labora tório de exergames (consola Xbox Kinect Sports e Kinect Adventures), onde uma das aulas semanais era realizada por esta via, e a outra no local regular da prá tica da Educação Física. Cada sessão teve duração de uma hora e no máximo quatro alunos poderiam, na mesma hora, utilizar o laboratório. A coleta dos dados deu-se a partir de anotações num diário de campo para identificar as contribuições dos exergames na prática de exercícios físicos e no desenvolvi mento de habilidades sociais. Notou-se que os exergames podem ser uma alternativa para a cooperação e de envolvimento com o exercício físico para esses alunos desmotivados.
Sun (2012) explorou o impacto dos exergames na motivação do inte resse situacional dos alunos em comparação com as atividades tradicionais de Educação Física. Foi aplicada uma escala do tipo Likert3 para avaliar o interesse situacional. Foram selecionados 74 alunos de 9 a 12 anos de idade, que realizavam atividades com exergames duas vezes por semana por 30 minutos. No total, foram 32 intervenções em duas unidades de ensino. Verificou-se que tal interesse foi maior na unidade com exergames quando comparados com os jogos tradicionais realizados na “sala de aula” de Educação Física. Entretanto, constatou-se que a unidade com atividades tradicionais foi mais efetiva na melhoria da condição cardiorrespiratória dos alunos.
Sun (2012) recomenda que os professores utilizem os exergames de maneira intercalada com as atividades reais. Isto é, os exergames devem ser utilizados como estratégia para introduzir ou iniciar a vivência de alguma mo dalidade ou exercício, que posteriormente será abordado no ambiente natural, possibilitando maior adesão ao conteúdo.
A Tabela 2 apresenta sete artigos que utilizaram os exergames como instrumento de aumento do gasto energético e da atividade física. Esses estudos revelaram que os exergames, quando comparados com os jogos digitais tradicionais (sem requisição da ação do movimento do usuário), podem ser usados como instrumento de aumento da prática de exercícios físicos nas aulas de Educação Física e enfrentamento da inatividade física e do sedentarismo.
A pesquisa de Graves, Stratton, Ridgers e Cable (2008) objetivou comparar o gasto energético de adolescentes enquanto praticavam jogos digi tais tradicionais e os exergames. Os resultados apontaram que o gasto energético com os exergames foi superior ao dos jogos digitais tradicionais. Graves, Ridgers e Stratton (2008) também realizaram avaliações sobre os mo vimentos corporais com adolescentes, enquanto estes utilizavam jogos digitais tradicionais e exergames. Os pesquisadores observaram que os exergames au mentaram o gasto energético e a frequência cardíaca por meio dos movimentos dos membros superiores, bastante solicitados nas intervenções com o Wii Sports (bólingue, ténis e boxe).
A experiência de Lanningham-Foster et. al (2009) testou a hipótese de que tanto crianças quanto adultos gastariam mais calorias quando partici pavam de jogos exergames comparado com os jogos digitais tradicionais. Após realizar a pesquisa com 22 crianças e com 20 adultos, ambos saudáveis, os re sultados mostraram que o gasto energético foi significativamente maior em todas as atividades das crianças e dos adultos que jogaram o Nintendo ® Wii, medido pela acelerometria. No entanto, as crianças movimentaram-se ainda mais que os adultos. O estudo conclui que promover atividades por meio dos exergames colabora potencialmente para o aumento do movimento e do gasto energético de adultos e principalmente de crianças.
Lwin e Malik (2014) introduziram mensagens educativas sobre sa úde, tentando influenciar o comportamento das crianças em relação à prática de exercícios físicos. A pesquisa contou com 398 alunos divididos por três es colas de Singapura, separados em distintos grupos. Um designado para a condição experimental - classe com exergames - e outro para controlo - classe com jogos digitais tradicionais. A análise foi feita durante seis semanas de in tervenção com sessões de 45 minutos. Percebeu-se que o tempo gasto assistindo televisão ou jogando videogames tradicionais contribuiu para a di minuição do nível de atividade física. Mas, o uso dos exergames aliado às mensagens educativas sobre saúde surtiu efeito positivo ao estimular os alu nos na realização de exercícios físicos.
Fogel et. al (2010) e Shayne et. al (2012) realizaram intervenções pa recidas. Os alunos realizaram exercícios com exergames duas vezes por semana durante um ano letivo. Ambos estudos compararam os efeitos da uti lização de exergames com a prática de atividades tradicionais numa classe de Educação Física. A diferença entre as pesquisas foi que Fogel et. al (2010) uti lizaram como amostra crianças inexperientes com exergames, inativas, com sobrepeso e pouco condicionamento físico, enquanto Shayne et. al (2012) uti lizaram como amostra crianças com experiência em exergames, ativas, com massa corporal dentro da normalidade e com bom condicionamento físico.
Nos dois protocolos, houve aumento no nível de exercícios físicos em comparação aos índices de atividades físicas tradicionais anteriores à in tervenção. Todavia, quanto à melhoria no condicionamento cardiorrespirató rio, não foram obtidos resultados conclusivos, coletados e observados pelos avaliadores que utilizaram uma espécie de diário de campo, semelhante à escala de Borg4, onde eles mesmos, e não os praticantes dos exercícios, analisaram e su geriram valores para a escala de perceção subjetiva de esforço.
A preocupação em melhorar o currículo da Educação Física através da inclusão dos exergames está presente no estudo de Quinn (2013). O autor utilizou seis semanas para incorporar os exergames numa sala de aula tradici onal. Foram cinco sessões por semana, com duração de 42 minutos. A amostra foi composta por 86 alunos, e os professores tiveram treino para utilizar os exergames. O efeito da experiência foi medido com testes pré e pós-interven ções. Os alunos participaram de jogos reais e jogos nos exergames. Os resultados indicaram que os alunos foram significativamente mais ativos nas aulas depois da intervenção com exergames. A utilização desse dispositivo con tribuiu, também, para influenciar a prática de atividades físicas nos momentos de lazer.
A Tabela 3 apresenta quatro artigos que apontaram o uso dos exergames especificamente em pessoas com deficiência.
A experiência de Medeiros et. al (2018) analisou o efeito de um pro grama de intervenção motora com exergames em 64 crianças com idades entre 8 e 10 anos de ambos os sexos, com risco e dificuldade significativa de movi mento. Foram feitas 18 sessões de 45 minutos. Para identificar as crianças com risco e dificuldade motora, foi usada a Bateria MABC-25. De entre os principais resultados, observou-se que, após a sessão motora usando os exergames, kinect sports (futebol e atletismo) e kinect sports (esqui, ténis e tiro ao alvo), houve melhoria significativa no desempenho motor do grupo experimental, bem como a retenção da aprendizagem, indicando um efeito positivo do pro grama de intervenção. Além disso, o número de crianças em risco e com dificuldade significativa de movimento diminuiu, a maioria passou a ser cate gorizada sem dificuldade de movimento. Com isso, sugere-se que os exergames podem ser ferramentas úteis para a melhoria do desempenho motor, além de oferecer subsídio para uma opção de estimulação do movimento.
Santos et. al (2013) realizaram um estudo de caso com duas crianças (11 e 12 anos de idade) com Síndrome de Down (Trissomia 21). O estudo avaliou a eficácia do exergame como recurso incentivador para a atividade física e redução do deficit de equilíbrio. As intervenções, com 20 minutos cada uma, foram realizadas por dois meses. Para a recolha de dados foi utilizada a Escala de Equilíbrio de Berg 6 antes e após a utilização do game Wii balance board (plataforma de equilíbrio) do Nintendo® Wii Fit Plus. Os resultados apresen taram discreta melhoria na pontuação da escala de equilíbrio de Berg, aproximação dentro da normalidade do centro de massa corporal e, ainda, me lhores pontuações nas provas físicas da consola. Os autores concluíram que o exergame é um recurso que favorece a reabilitação funcional, além de ser bem aceite entre as crianças.
Pereira et. al (2013) também realizaram um estudo de caso. A amos tra contou com uma criança com Trissomia 21. O objetivo foi verificar as alterações cardiorrespiratórias antes e durante a utilização do Nintendo® Wii. Os exergames selecionados envolveram o basquete, socos e corrida. Foram re alizadas 12 sessões com frequência de três vezes por semana. Antes das intervenções, em repouso, foi medida a saturação de oxigénio e, durante as in tervenções, foram medidas a frequência cardíaca e a frequência respiratória. Concluiu-se que o ambiente virtual, que exigiu precisão e coordenação ao exe cutar os desafios dos games, através da incorporação do movimento da criança, contrariando a ideia do sedentarismo, da passividade e da inatividade, foi capaz de gerar alterações agudas saudáveis ao sistema cardiorrespiratório.
O estudo de Dionísia e Ventura (2016) verificou a importância dos exergames na motivação de práticas de exercícios físicos em crianças e jovens de 10 a 20 anos com algum tipo de paralisia cerebral, que frequentavam a As sociação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) da cidade de Americana/SP, Brasil, com dificuldades e desinteresse pela prática de ativida des físicas convencionais. Os games utilizados para a observação foram o Just Dance 4, o futebol e o vólei do Kinect Sports, que tiveram uma ótima aceitação pelos participantes, pois eles vibraram e ativamente queriam participar cada vez mais. A conclusão a que se chegou foi que os exercícios físicos feitos com o uso dos exergames são eficientes e produtivos, uma vez que as crianças e os jovens ficaram motivados e foram participativos através do interesse pela mú sica e das atividades dinâmicas, despertando o desenvolvendo dos aspetos motor, cognitivo, afetivo, emocional e criativo.
4. Discussão
Os resultados dos estudos apresentados nesta revisão, de modo geral, sugerem que o uso dos exergames como intervenção pode ser um recurso pedagógico motivador e ferramenta de aumento do gasto energético na prática de exercí cios físicos nas aulas de Educação Física, pois abarcam o movimento corporal conjugado à ludicidade e incitação, sendo bem aceite pelos alunos sem ou com deficiência.
Grübel e Bez (2006) comentam que a força pedagógica dos exergames consiste em desenvolver habilidades e transmitir conhecimentos de forma lúdica e prazerosa. Os jogos digitais têm-se tornado uma atividade bastante difundida na sociedade. Muitos jovens utilizam-nos como entreteni mento nos mais variados locais, como escola, casa, autocarro, carro e praia. Para Quiroga et. al (2009), muitos jogos estão sendo desenvolvidos com o obje tivo de educar ou de treinar alguma habilidade humana e envolvem principal mente as áreas da educação e da computação.
Alguns autores (Di Tore et. al, 2012; Sgrò et. al, 2013) apontam que a plataforma Xbox 360 ® é a ferramenta eletrónica mais aconselhada para as aulas de Educação Física. Isso deve-se ao Kinect representar a solução mais útil para compartilhar experiências de exergames no ambiente educacional. Além disso, tem alta difusão entre os jovens, flexibilidade tecnológica e custo acessí vel. A partir de suas características básicas - imersão, interação e envolvi mento - é possível pensar a utilização dos exergames como meio de ampliação das formas de ensino-aprendizagem dos diversos conteúdos da Educação Física (Baracho et. al, 2012).
Semelhantemente aos estudos que apresentaram as contribuições dos exergames no processo de ensino-aprendizagem e a influência motivadora dos exergames nas aulas de Educação Física, Costa et. al (2015) ressaltam que os (exer)games podem ser ferramentas eficazes como forma de aumentar a ca pacidade do cérebro para a aprendizagem, pois favorecem o controlo cogni tivo, perceção cinestésica, autodomínio, autoconfiança, desejo de aprender, motivação e excitação.
Nesse mesmo sentido, Fardo (2013) relata que os elementos dos exergames possuem mecanismos que proporcionam experiências significati vas no meio escolar ou em outro âmbito de aprendizagem, potencializando a motivação e participação dos inseridos nesses ambientes. Conforme Finco et. al (2012), os exergames são envolventes, apresentam desafios, possibilitam realizar atividades físicas e permitem interação com outras pessoas. No entanto, não se deve assumir os exergames como substituto do ambiente real de aprendizagem, mas sim como artefacto de inovação que, nesse caso, expande as possibilidades do movimento humano (Baracho et. al, 2012).
Corroborando os estudos que utilizaram os exergames como instru mento de aumento do gasto energético e da prática de exercícios físicos nas aulas de Educação Física, Bekker et. al (2010) constatam que, ao contrário dos jogos digitais tradicionais classificados como atividades reforçadoras do se dentarismo, os exergames vêm-se tornando um novo recurso para a área da Educação Física, já que a particularidade principal desses games é o movi mento humano. Os exergames são videogames ativos que necessitam do movimento do jogador para que sejam alcançados os objetivos. Esse movi mento é captado por sensores de movimento, como plataformas, joysticks (controlos) e kinects (câmaras) (Lieberman et. al, 2011).
A utilização dos exergames analisados na Educação Física está rela cionada, principalmente, com o entretenimento e formas alternativas de exercício físico. Algumas escolas nos EUA adotaram o uso desses games nas aulas de Educação Física, pois é uma atividade que proporciona gasto energé tico junto com a ludicidade. Entretanto, também podem ser utilizados como ambientes virtuais de aprendizagem para novos movimentos, gestos desporti vos ou simplesmente como arcabouço para incrementar e aumentar a prática de exercícios e o nível de atividades físicas (Vaghetti & Botelho, 2010).
Em relação aos estudos que usaram os exergames com alunos com deficiência, entende-se que os exergames fazem parte das novas tecnologias que estão sendo usadas para a criação de ambientes virtuais de aprendizagem, amplamente discutidas no campo das ciências em educação digital. O uso dessa ferramenta possibilita a criação de softwares educativos e a aprendiza gem através da simulação em ambientes de realidade virtual, nos quais as possibilidades de visualização de conteúdos se tornam ilimitadas. Indepen dentemente da marca do aparelho, os games disponibilizados, entre tantas possibilidades, simulam a prática de diferentes modalidades desportivas, que podem ser utilizados em diversos conteúdos pedagógicos (Patel et. al, 2009).
De acordo com Maia et. al (2014), é necessário disponibilizar alternativas pedagógicas e de acessibilidade que minimizem as barreiras à participação e aprendizagem. Richter et. al (2011) afirmam que é importante fazer com que as crianças evidenciem as diferentes possibilidades de movi mentos, materiais historicamente criados e culturalmente desenvolvidos que compõem a herança e/ou o património das práticas corporais, visto que, tra tando-se de educação, os professores podem promover situações pedagógicas intencionais, possibilitando aos alunos experiências formativas que abranjam a expressão das múltiplas linguagens. Estas situações devem conter formas de se relacionarem consigo mesmo, com o outro, com os materiais, com os espa ços, com os tempos e, principalmente, que os aproximem das produções culturais.
Em termos pedagógicos, é no jogo que as brincadeiras são realizadas; ele é que possibilita a fantasia e a imaginação, e são as regras do jogo que permitem relações entre objeto e indivíduo, entre aluno e professor. As características do jogo são: regras, objetivo, desafio, competição, interação, re presentação, resultados e feedbacks (Moita, 2007).
Para Baracho et. al (2012), os jogos digitais ativos podem ser um recurso que potencializa o espaço da sala de aula tradicional, possibilitando estimular os alunos, uma vez que são dotados de alto poder de ilustração, cons tituindo um mecanismo educacional que possibilita diferentes experiências.
Huizinga (2014) percebe o jogo como um elemento da cultura hu mana, constatando que o ato de brincar esteve sempre presente na sociedade, com os brinquedos e jogos em constante desenvolvimento, acompanhando e envolvendo o ser humano. O jogo tem repercussões morais, estéticas e sociais. O aluno percebe-se a si mesmo como unidade indissociável, criando e recri ando formas novas de jogar; logo, o jogo apresenta-se como espaço fecundo de liberdade criadora, situando os sujeitos como construtores e reconstrutores de sentidos das suas vidas, possibilitando-lhes a prática da autonomia e da ou sadia (Retondar, 2011).
5. Considerações finais
Compreende-se que os exergames podem ser utilizados como alternativa pe dagógica motivadora nas aulas de Educação Física com alunos sem ou com deficiência. Além do caráter do divertimento, os exergames podem ser instru mento facilitador para o ensino-aprendizagem. O mundo fantasioso criado pela ludicidade dos jogos digitais, que requerem realização de atividades físi cas, aumenta o gasto energético e colabora na aprendizagem e desenvolvi mento motor, podendo contribuir para a aquisição cognitiva na construção de novos saberes; cooperar nos processos afetivos de socialização, comunicação e expressão; e promover melhorias na habilidade motora.
Contudo, é preciso ter cautela, pois a maioria dos estudos analisa dos apontaram respostas meramente descritivas no uso dos jogos digitais ati vos, não possuindo ainda base teórica consolidada e metodológica solidificada dirigida aos exergames nas escolas. Necessitam-se investigações de cunho epistemológico que descrevam e conceituem o fenómeno com maior rigor me todológico, assim como estudos de cunho empírico que identifiquem e mensu rem as suas reais capacidades.
Além disso, nota-se que grande parte das escolas brasileiras não estão apetrechadas com os equipamentos necessários à prática dos exergames e, ainda, percebe-se que para haver eficácia e eficiência na inserção dos exergames no âmbito escolar, são necessários espaços informatizados e ade quados para a instalação das consolas e kinects, que scaneiam os movimentos dos alunos-jogadores e os aplicam nas ações dos games. É também preciso que haja professores capacitados com conhecimentos prévios e aprofundados sobre a dinâmica dos videogames ativos. O emprego desses componentes em atividades de ensino-aprendizagem nas aulas de Educação Física deve ser pla neado e sistematizado a fim de que possam atender às expectativas do currículo existente, levando em consideração as especificidades dos alunos, sem ou com deficiência.
Porém, destacam-se como pontos fortes desta revisão integrativa a premissa de que os exergames em posse de professores qualificados e inseri dos na cultura digital podem permitir aos alunos diferentes experiências num ambiente virtual, que possibilita ao aluno-jogador ter inúmeras vivências mo toras e esforços físicos similares aos exercícios físicos das aulas tradicionais ou mesmo de um desporto, mas, podendo, ainda, unir virtualmente cada um dos diversos alunos-jogadores em qualquer parte do mundo, independente mente do credo, raça, condição social e divergência política, potencializando novas maneiras de adquirir conhecimento. Devido à interação e ao envolvi mento exigidos, o aluno-jogador torna-se agente ativo, e esse protagonismo pode ser um aspeto positivo para o ensino-aprendizagem.
Recomenda-se que trabalhos futuros investiguem a influência dos exergames na aprendizagem motora de alunos com diferentes condições soci oeconómicas, envolvendo pesquisas que incluam linhas pedagógicas da Educação Física e problemáticas, como políticas públicas, violência, género, racismo e intolerância.