1. INTRODUÇÃO
A importância das soft skills tem vindo a ser cada vez mais realçada no mundo laboral, sendo um elo de ligação entre as organizações e os profissionais, já que não basta saber-fazer, e o saber-estar é cada vez mais valorizado (Teixeira & Luz, 2014). Embora não exista uma definição unânime para soft skills, a de Hurrell et al. (2013) diz tratar-se de competências não-técnicas, não dependentes de raciocínio abstrato, envolvendo habilidades inter e intrapessoais que facilitam o desempenho dos indivíduos em determinados contextos. Podem ser entendidas como competências, traços de personalidade, atitudes e habilidades comportamentais, pessoais e interpessoais, essenciais para o desenvolvimento pessoal e o sucesso na profissão, relevantes para o desempenho eficaz das funções de trabalho. Dizem respeito a competências não-técnicas que, embora necessárias para o desenvolvimento da carreira, são transversais e transferíveis de um contexto para outro ao longo do ciclo de vida.
Os estudos sobre as competências necessárias para o mundo laboral salientaram tradicionalmente as competências técnicas ou hard skills. Contudo, hoje é claro que estas, por si só, não são suficientes para o bom desempenho de todas as funções laborais e os líderes das organizações enfatizam cada vez mais o seu interesse pelas soft skills e a importância destas no momento de contratar novos colaboradores (James & James, 2004). Os estudos desenvolvidos com o objetivo de perceber o peso de cada uma destas competências para o sucesso no local de trabalho (Klaus, 2010; Mitchell et al., 2010; Nealy, 2005; Smith, 2007) concluíram que cerca de 75% a 85% do sucesso se deve às soft skills. Embora as competências técnicas que constituem as hard skills sejam uma componente essencial para o desempenho das funções laborais, as competências interpessoais, que constituem o conjunto de soft skills do profissional, assumem uma importância preponderante e decisiva para a manutenção e/ou progressão na carreira.
A importância desta dimensão pessoal justifica que seja relevante investigar também a sua especificidade no trabalho com crianças e famílias, e analisar quais as competências não técnicas que se destacam na Intervenção Precoce na Infância (IPI), já que surgem imensos desafios ao profissional de IPI que requerem a aplicação das suas competências técnicas como também as suas capacidades não técnicas, enquanto pessoa.
Dunst (1998) realçou que a combinação e articulação da qualidade técnica, características e representações do profissional e do seu envolvimento participativo constituem elementos importantes do perfil do profissional de IPI. Ao longo das últimas décadas, a IPI tem assumido uma importância preponderante no cuidado das crianças com perturbações do desenvolvimento, ou em grave risco, passando de uma perspectiva de estimulação, centrada nos problemas, para uma abordagem centrada na família. Tal tem implicado uma mudança significativa na prática dos profissionais, tanto ao nível técnico como ao nível das suas interações e transações com a criança e com os seus pais.
Nos anos 60, a intervenção começou por se dirigir exclusivamente à criança, abordagem que se revelou, no entanto, insuficiente face às necessidades apresentadas e às novas concepções sobre o desenvolvimento infantil. A criança passou a ser considerada no seu todo e, consequentemente, a intervenção passou a ser dirigida a um contexto mais abrangente: criança, família e comunidade (Almeida, 2004).
A IPI diz, pois, respeito a uma prática que engloba os serviços, apoios e recursos essenciais para responder às necessidades das crianças. Ocorre através de atividades e oportunidades que promovem a sua aprendizagem e desenvolvimento, implicando o pleno envolvimento das respetivas famílias, uma vez que elas são o principal agente potenciador e gerador de mudança (Dunst & Bruder, 2002). Caracteriza-se como uma intervenção centrada na família, realizada em contextos naturais de aprendizagem, tendo em conta as rotinas da família e os recursos da comunidade, e realizada por uma equipa com um funcionamento transdisciplinar, coordenando e integrando serviços e recursos (Franco, 2015; Carvalho et al., 2016). É destinada a crianças até aos 6 anos de idade, com alterações no desenvolvimento, ou em risco de as vir a apresentar, e respetivas famílias, tendo como objetivo intervir o mais precocemente possível nas suas necessidades transitórias ou permanentes.
A IPI tem dois objetivos fundamentais que se aliam: promover o máximo desenvolvimento pessoal e potenciar a máxima inclusão. Seja intervenção direta com a criança, intervenção com a família ou no contexto, todas devem contribuir para o desenvolvimento de capacidades, competências, autonomia ou aprendizagens da criança (Franco, 2015).
A abordagem centrada na família é um dos principais eixos das práticas recomendadas em IPI. Uma intervenção centrada na família implica o envolvimento por parte dos intervenientes (profissionais e família), que se traduz numa relação de ajuda no sentido de promover a capacitação da família para que possa potenciar o máximo desenvolvimento da criança. A IPI constitui-se como uma relação de ajuda quando é experienciada como uma oportunidade de desenvolvimento e fortalecimento das competências das crianças e respetivas famílias. Para que isto ocorra, é fundamental a perceção da validação das suas expectativas, preocupações e necessidades, exigindo que os profissionais adotem uma postura compreensiva e se mostrem sensíveis às necessidades identificadas pelas famílias (Carpenter, 2007; Dunst et al., 2010; Fuertes & Luís, 2014; Pimentel, 2005; Simeonsson et. al., 1996).
Diferentes estudos (Drake, 1994; Lambert & Ogles, 2004; Orlinsky et al., 2004) identificaram o respeito mútuo, aceitação, confiança, compreensão, atitude amigável, colaboração, honestidade e empatia como características fulcrais num relacionamento de ajuda, nomeadamente no trabalho com famílias. Drake (1994) e Lee e Ayón (2004) concluíram que um bom relacionamento entre o profissional e a família, conduz a melhorias no cuidado físico, disciplina e no cuidado emocional das crianças e, consequentemente, no modo como os pais enfrentam a situação. A família tende ainda a divulgar informação de forma mais honesta, proporcionando um clima de maior apoio, aumentando a precisão das avaliações e facilitando o processo de intervenção.
Quando se fala em bem-estar infantil, boas relações de ajuda são, no geral, boas relações humanas. Para isso, é fundamental que surjam atitudes de bondade, respeito, dignidade, honestidade, genuinidade e um elevado esforço para entender e trabalhar em colaboração (Boer & Coady, 2007).
Dunst e Trivette (1987, 1988 citados por Dunst, 1998) realizaram uma extensa pesquisa com o objetivo de identificar as práticas características da prestação de ajuda eficaz por parte dos profissionais. Desta pesquisa resultaram as três componentes que caracterizam as práticas de ajuda eficazes e, portanto, o perfil do profissional: qualidade técnica; características e representações do profissional; e envolvimento participativo.
A qualidade técnica diz respeito aos conhecimentos teóricos e práticos do profissional, resultantes da sua formação e da experiência profissional. São exemplos da qualidade técnica: possuir conhecimentos na área do desenvolvimento infantil; saber identificar patologias do desenvolvimento; conhecer e dominar a prática de instrumentos de avaliação; e ser conhecedor das práticas recomendadas e baseadas na evidência (Carvalho et al., 2016).
As características e representações do profissional dizem respeito a práticas de ajuda relacionais como escuta ativa, compaixão, empatia, independência de julgamentos, autenticidade, flexibilidade, responsividade, cordialidade e respeito. Referindo-se todas à componente da relação interpessoal, envolvendo, sobretudo, a comunicação. Esta dimensão contribui para o incrementar de crenças positivas relativas às capacidades e potencialidades da família, identificando os seus pontos fortes e respeitando os seus valores e crenças. Escutar as angústias da família é exemplo de uma prática de ajuda relacional (Coogle et al., 2013; Dempsey & Dunst, 2004; Dunst et al., 2002; Dunst et al., 2007; Espe-Sherwindt, 2008; Roper & Dunst, 2003 citado por Carvalho et al., 2016).
Por seu lado, o envolvimento participativo está relacionado com práticas de ajuda participativas: práticas de cariz individual, flexível e responsivas às preocupações e prioridades da família, com a finalidade de se alcançarem os objetivos estabelecidos e os resultados ambicionados. No fundo, aquilo que caracteriza esta dimensão de ajuda é o envolvimento da família e o seu papel de liderança no processo de intervenção, através de práticas que proporcionam às famílias oportunidades para analisar opções de intervenção, benefícios e limitações das suas escolhas, a disponibilização de informações com vista à tomada de decisão, envolvimento numa relação de colaboração com o profissional/equipa, e o envolvimento ativo na implementação e execução das opções tomadas (Dempsey & Dunst, 2004; Dunst et al, 2002; Dunst et al, 2007; Machado, 2019; Machado et al., 2017). Esta abordagem implica que o profissional seja capaz de se descentrar do seu papel, embarcando num trabalho colaborativo que se repercuta na sua formação profissional e na sua prática diária (Matos & Pereira, 2011).
As características do profissional são determinantes para uma relação de ajuda eficaz. Este deverá possuir capacidade para trabalhar com famílias e com profissionais de outras formações e serviços, ver mais além da problemática da criança e ter capacidade de responder com criatividade a novos problemas que emerjam da evolução social (Almeida 2004; Pimentel, 2005). Estudos realizados com famílias envolvidas em processos de IPI (Coogle et al., 2013; Fordham et al., 2011; Pighini et al., 2014; Zheng et al., 2016; Ziviani et al., 2014) relatam que as características interpessoais dos profissionais que mais influenciam a relação de ajuda são: ser amigo, atencioso, compassivo, agradável, útil, gentil e organizado. No que respeita às competências de comunicação, as famílias destacam a importância de o profissional transmitir confiança, respeito, empatia, compreensão, ser simpático e ter atitudes de escuta ativa.
O estudo realizado por Milheiriço e Seixas (2016), em que foram inquiridos educadores/docentes de Educação Especial que exercem as suas funções em IPI, acerca das dimensões afetivas e éticas sentidas pelos técnicos de IPI, concluiu que as competências mais valorizadas foram a escuta ativa, a empatia, a confidencialidade e a maleabilidade. Estrela (2010) corrobora estes resultados, considerando que as competências emocionais, como é o caso da escuta ativa, constituem o que caracteriza uma relação ética de respeito e atenção para com o outro. No estudo de Matos e Pereira (2011), os participantes destacam a importância de qualidades relacionais, como equilíbrio psicológico, autorreflexão, sinceridade e respeito para a construção da “profissionalidade” em IPI.
Embora a importância das soft skills na área da IPI tenha vindo a ser cada vez mais sublinhada, este reconhecimento ainda se encontra numa fase embrionária, enfatizando a necessidade de estudos que aprofundem esta temática e comprovem a sua importância.
2. METODOLOGIA
2.1. OBJECTIVOS
Este estudo tem como objetivo verificar quais as soft skills que os profissionais de IPI consideram mais pertinentes para o desempenho das suas funções, tendo em consideração que esta é uma profissão que assenta numa relação de ajuda, envolvendo o trabalho com famílias, crianças, comunidade e os outros membros da equipa. Pretende-se verificar quais das soft skills referidas na literatura são mais valorizadas e consideradas mais importantes para o trabalho em IPI, segundo a avaliação dos profissionais.
2.2. PARTICIPANTES
Participaram nesta investigação 257 profissionais de IPI, sendo 96,1% (N=247) do sexo feminino, com idades compreendidas entre os 22 e os 65 anos (M=43; DP=9,639) (Tabela 1). Foi utilizada uma amostragem de conveniência, constituída pelas respostas obtidas a partir do convite à participação voluntária de todos os profissionais que integram o SNIPI (Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância) a nível nacional.
Em relação à formação base, 17,9% (N=46) são Educadores de Infância, 16% (N=41) Psicólogos, 14,8% (N=38) Terapeutas da Fala, 12,5% (N=32) Assistentes Sociais, 10,9% (N=28) Enfermeiros, 9,3% (N=24) Professores, 7,4% (N=19) Terapeutas Ocupacionais, 6,2% (N=16) Fisioterapeutas, 4,3% (N=11) têm outra profissão e 0,8% (N=2) são Médicos.
Os participantes têm uma experiência profissional em IPI que varia entre 1 mês e 35 anos de serviço (M=9; DP=7,033). No que diz respeito ao distrito onde trabalham, 20,6% pertencem a equipas do distrito de Lisboa (N=53), 14,8% (N=38) de Setúbal, 14% (N=36) de Santarém, 8,6% (N=22) do Porto, 7,4% (N=19) de Aveiro, 6,6% (N=178) de Leiria, 5,4% (N=14) de Beja, 4,7% (N=12) de Évora, 3,9% (N=10) de Braga, 3,9% (N=10) de Viseu, 3,1% (N=8) de Coimbra, 2,3% (N=6) de Portalegre, 2,3% (N=6) de Viana do Castelo, 1,6% (N=4) de Castelo Branco, 0,4% (N=1) de Bragança, 0,4% (N=1) da Guarda.
2.3. ESTUDO PRELIMINAR
Começou por ser realizado um estudo preliminar com o objetivo de aperfeiçoar e avaliar o questionário a ser utilizado (Vaz et al., 2022). Participaram oito especialistas da área de IPI, que foram escolhidos com base na sua experiência na área.
No questionário preliminar foram integradas todas as soft skills encontradas na literatura, de forma a verificar quais poderão estar relacionadas com a prática em IPI, sendo constituída uma lista inicial de 50 soft skills com respetivas definições. Esta listagem foi apresentada aos especialistas, a quem foi solicitada a avaliação de cada um dos itens relativamente à clareza (adequação, compreensão e objetividade) e pertinência (importância para a prática do profissional de IPI) do conceito e respetiva definição.
Face às respostas, foram excluídos os itens que apresentaram, em simultâneo, percentagens de pertinência e clareza iguais ou inferiores a 75% e foram alvo de revisão os itens que apresentaram um dos valores igual ou inferior a 75%.
Em resultado desta avaliação, foram excluídas três soft skills e foi introduzido, por sugestão dos especialistas, o conceito de “não-diretividade”. Desta avaliação decorreu, também, a revisão de alguns conceitos e de uma das designações, resultando um total de 48 soft skills que constituíram o questionário utilizado neste estudo.
2.4. PROCEDIMENTOS
Num primeiro momento, foi contactada a Comissão de Coordenação Nacional do SNIPI e, uma vez obtida a sua concordância e aprovação, foram contactadas as cinco Subcomissões de Coordenação Regional (Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve). Obtida a anuência e colaboração das Subcomissões, elas próprias encaminharam o questionário para todas as Equipas Locais de Intervenção (ELI) da sua região que, por sua vez, o fizeram chegar a todos os profissionais que as constituem.
Respeitando os princípios éticos de uma investigação, foram assegurados os direitos dos participantes à privacidade, anonimato e confidencialidade, de modo que nem os investigadores nem as entidades envolvidas na divulgação do estudo tiveram acesso a qualquer identificação dos participantes.
2.5. INSTRUMENTO
Na primeira secção do questionário, que foi usado numa versão online, os participantes foram elucidados relativamente ao âmbito e objetivo do estudo e informados da duração estimada da resposta. Nela declararam o conhecimento e a aceitação dos termos do estudo e deram o seu consentimento informado.
Na segunda secção, foram recolhidos dados sociodemográficos sobre: género, idade, formação base, distrito da ELI onde o participante desempenha funções e experiência de trabalho em IPI.
Na terceira secção, foi solicitado aos participantes a avaliação de cada uma das soft skills (Anexo A) quanto à sua importância na prática do profissional de IPI, numa escala de tipo Likert de 1 a 5, em que 1 corresponde a “nada importante” e 5 a “extremamente importante”.
3. RESULTADOS
Na Tabela 2 são apresentados, para cada uma das soft skills, a pontuação média, o desvio-padrão e a distribuição das respostas relativas ao nível de importância percebida. A média geral das soft skills é de 4,51, apontando, desde logo, para uma grande importância de todas elas.
O valor médio mais elevado foi alcançado pelas soft skills “empatia”, “escuta ativa” e “trabalho em equipa”, com uma média de 4,84 cada uma, com 84,4% dos participantes a considerarem-nas “extremamente importantes”, indicando serem as competências consideradas como mais significativas para a prática em IPI.
Por outro lado, “falar em público” obteve uma média de 3,98, a menor média observada, revelando-se a soft skill menos significativa de acordo com a opinião dos participantes.
De forma geral, as 10 soft skills que obtiveram maior percentagem de nível de importância percebido no desempenho das funções de profissional de IPI foram: empatia, escuta ativa, trabalho em equipa, ética, autorreflexão, cooperação, ser de confiança, autodesenvolvimento, amistoso e responsabilidade.
Tendo-se analisado a relação entre as variáveis, verificou-se que todos os itens possuem correlações positivas entre si. A grande maioria destas correlações é significativa, sendo que a mais forte, ainda que moderada, se verifica entre as soft skills “ser de confiança” e “responsabilidade” (rs=,657) e a correlação mais fraca se verifica entre “amistoso” e “responsabilidade” (rs=,122).
Foi também analisada a eventual existência de diferenças significativas entre grupos, relativamente às variáveis sociodemográficas: género, idade, formação de base, experiência profissional e proveniência geográfica. De um modo geral, as diferenças são pontuais e de pouco significado.
No que respeita ao género, verificou-se não existirem diferenças estatisticamente significativas, sendo todas as soft skills percecionadas como altamente relevantes, tanto por homens como por mulheres (que são a grande maioria dos participantes). O mesmo acontece quanto à localização geográfica da ELI do profissional.
Relativamente à comparação entre faixas etárias, apenas foram evidenciadas diferenças significativas em “autonomia” (p=,014), “construção de parcerias” (p=,040), “empatia” (p=,021) e “inteligência emocional” (p=,009), sendo o grupo de maiores de 51 anos aquele que se diferencia, valorizando mais estas quatro soft skills.
No que se refere à formação base dos profissionais, apenas se verificaram diferenças significativas relativamente a “atitude positiva” (p=,018), “pontualidade” (p=,007) e “trabalhar em equipa” (p=,020). Tais diferenças são observadas na comparação das formações em Ciências da Educação e Ciências Sociais e Humanas: os primeiros valorizam mais a “atitude positiva” e “pontualidade”. Relativamente ao “trabalhar em equipa”, as diferenças revelam-se na comparação dos participantes com formação base em Ciências da Saúde e em Ciências da Educação, sendo que os primeiros a valorizam significativamente mais. Estes resultados poderão alertar para o facto de a formação base ter tendência a orientar o desempenho dos profissionais de diferentes áreas, mesmo que o seu contexto de intervenção seja semelhante, como no caso dos profissionais de IPI (Mendes, 2010).
Relativamente à experiência profissional, também existem diferenças apenas em dois itens. Quanto à “inteligência emocional”, as diferenças estatisticamente significativas encontram-se entre o grupo com +16 anos de serviço e o grupo com experiência profissional entre 11 e 15 anos, sendo que o grupo com mais anos de serviço a valoriza mais. No que respeita à “transparência”, as diferenças revelam-se significativas na comparação do grupo com experiência profissional de um a cinco anos e o grupo com experiência de 11 a 15 anos, sendo que o primeiro valoriza mais esta competência. Ainda relativamente à “transparência”, na comparação entre o grupo com +16 anos de serviço e o “de 11 a 15 anos”, aquele que detém maior experiência profissional considera que esta competência é mais importante.
4. CONCLUSÕES
A avaliação da importância atribuída às soft skills pelos profissionais de IPI revelou que todas são consideradas como muito relevantes para o desempenho das suas funções laborais, aproximando-se a pontuação média do nível de importância máximo. Isto vai ao encontro do referido por James e James (2004) e Robles (2012), que salientam o carácter fulcral das soft skills na qualidade do desempenho.
Foi possível identificar uma lista de 10 soft skills consideradas mais relevantes pelos profissionais, a qual é grandemente corroborada por estudos anteriores de carácter teórico que abordam as características do profissional de IPI, e que levam a destacar competências como amistoso (e.g. Carvalho et al., 2016), autorreflexão (e.g. Dunst et al., 1994), ser de confiança (e.g. Carvalho et al., 2016), empatia (e.g. Dunst et al., 2007), escuta ativa e trabalho em equipa (e.g. Fuertes, 2011); bem como por estudos realizados com a amostra constituída unicamente por profissionais de IPI (Estrela, 2010; Matos & Pereira, 2011; Milheiriço & Seixas, 2016). Estes resultados assumem especial preponderância na relação de ajuda, uma vez que, em estudos anteriores (Coogle et al, 2013; Fordham et al, 2011; Pighini et al., 2014; Zheng et al., 2016; Ziviani et al., 2014) se verificou que as famílias consideram que as soft skills supracitadas são fundamentais para uma intervenção bem-sucedida por parte do profissional de IPI.
Estes resultados vêm também consolidar a conceção da IPI como trabalho de equipa e enquanto relação de ajuda centrada na família, uma vez que as três soft skills a que foi atribuído um maior nível de importância (empatia, escuta ativa e trabalho em equipa) são destacadas como sendo das competências que melhor caracterizam as relações desta natureza, potenciando substancialmente os seus resultados (Klass, 2008 citado por Carvalho et al., 2016; McWilliam, 2010, 2012).
Aquelas três competências mais destacadas são, precisamente, as que remetem para a importância da qualidade da relação de ajuda estabelecida com o público alvo e para o sucesso da intervenção. Salienta-se a relevância da capacidade de se colocar no lugar do outro e entendê-lo profundamente, procurando compreender os seus pensamentos, sentimentos e comportamentos, o que corresponde à manifestação, por parte do profissional, de uma total disponibilidade para escutar as crianças e respetivas famílias, de modo que estas se possam expressar de forma espontânea e livre de crítica. O trabalho em equipa revela-se uma prática de elevada importância, quer pelo investimento do profissional, quer pelo envolvimento que requer das crianças e respetivas famílias, garantindo que participam ativamente e significativamente em todo o processo e, consequentemente, se considerem parte integrante das mudanças que se pretende que contribuam para uma qualidade de vida superior.
O presente estudo pode ser considerado pioneiro neste âmbito, dada a falta de estudos semelhantes, e também ser relevante na medida em que a identificação das soft skills mais importantes poderá assumir-se duplamente significativa. Por um lado, a nível individual, pode contribuir para que os profissionais se possam autoavaliar, verificando em que medida possuem essas competências e, no caso de não estarem munidos delas, delinearem estratégias para as desenvolver.
Por outro lado, a nível organizacional, permitirá a identificação das competências que mais precisam de ser promovidas e, consequentemente poderá ajudar a organizar a formação dos profissionais e as mudanças no funcionamento das ELI. Desta forma, o presente estudo será relevante para a construção do perfil do profissional de IPI, uma vez que fornece evidências relativas a uma das componentes que o constitui, a dimensão relacional.
Em futuros estudos neste âmbito poderá ser importante analisar a aplicação destas soft skills na prática profissional em IPI, tendo em consideração que a presença das mesmas se assume determinante para uma intervenção bem-sucedida. Será fundamental analisar a perceção que os profissionais têm relativamente às competências pessoais que norteiam o seu desempenho e que se vão desenvolvendo, consolidando e aprimorando ao longo do tempo, com base quer nos referenciais teóricos, quer na sua experiência no terreno junto de crianças e famílias apoiadas em IPI. Desta forma, será possível dotar esses profissionais de mais ferramentas e competências, contribuindo para que sejam mais qualificados. A maior capacitação dos profissionais de IPI favorece também os próprios, ao contribuir para que sejam mais confiantes e autónomos relativamente às suas práticas de intervenção, ao modo como asseguram os direitos e a satisfação das necessidades das crianças e famílias fornecendo, assim, as bases para uma intervenção responsável, assertiva e confiável. Deste modo, as competências não-técnicas do profissional de IPI determinam em grande escala o sucesso da intervenção com as crianças e respetivas famílias, sendo, por isso, importante dar continuidade a esta linha de investigação, promovendo o conhecimento da realidade dos profissionais e contribuindo para o aperfeiçoamento das práticas recomendadas em Intervenção Precoce na Infância.