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Revista Portuguesa de Imunoalergologia

versão impressa ISSN 0871-9721

Rev Port Imunoalergologia vol.22 no.3 Lisboa set. 2014

 

CASO CLÍNICO

 

Tatuagens temporárias – Inofensivas?

Temporary tattoos – Are they harmless?

 

Joana Bruno Soares, Anabela Lopes, Manuel Pereira Barbosa

Serviço de Imunoalergologia, Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte

 

Contacto

 

RESUMO

As tatuagens temporárias com hena são usadas tradicionalmente nos países islâmicos ou orientais para tingir o cabelo, as unhas e a pele e tem‑se tornado, nos últimos anos, uma prática frequente em estâncias de férias, onde se tem tornado uma prática comum pela ausência de risco infeccioso, aplicação indolor e limitada e baixo custo. Na preparação da hena podem ser usados produtos de origem natural ou parafenilenodiamina (PPDA), um potente sensibilizante. Apresenta‑se o caso de uma adolescente observada no serviço de urgência pediátrica por dermatite exuberante na mão, após aplicação de tatuagem de hena. Na sequência da investigação etiológica foi identificada sensibilização a PPDA através de testes epicutâneos. Os autores reportam o caso no sentido de alertar para esta prática, cada vez mais comum em crianças, que pode não ser tão inofensiva quanto aparenta.

Palavras‑chave: Dermatite de contacto, eczema, henna, tatuagem, PPDA.

 

ABSTRACT

Temporary tattooing with henna is traditionally used in islamic and oriental countries to dye hair, nails and skin. In recent years they have become increasingly more frequent in vacation resorts, due to its infectious risk ‑ free and painless application, limited duration and low cost. Henna can be prepared using natural ingredients or paraphenylenediamine (PPD), which is a potent sensitizer. We report the case of a teenage girl observed in the pediatric emergency department due to eczematous reaction on the hand, following a henna tattoo. During the etiological investigation she was found to be sensitized to PPD, through patch testing. The authors aim to alert for this practice which is becoming more frequent among children and might not be as harmless as it appears.

Keywords: Contact dermatitis, eczema, henna, tattoo, PPD.

 

INTRODUÇÃO

As tatuagens temporárias com hena são usadas tradicionalmente nos países islâmicos ou orientais, para tingir o cabelo, as unhas e a pele13, como parte de costumes religiosos ou culturais. A hena é obtida a partir das folhas de Lawsonia inermis e, no seu estado natural, tem a aparência de um pó verde que produz uma tinta vermelha uma vez dissolvido1. Na preparação pode ser misturado com vários produtos de origem natural (chá, café, sumo de limão, água de rosas), ou química (parafenilenodiamina – PPDA). Vários tons de castanho ou até preto são obtidos através da adição de PPDA; estes são frequentemente usados em tatuagens temporárias1. A PPDA é conhecida por ser um sensibilizante potente, muitas vezes associado a elevado risco de sensibilização activa1. A verdadeira alergia a hena, causada pelo seu ingrediente activo, Lawsone, é rara4.

A popularidade das tatuagens temporárias tem vindo a aumentar nos últimos anos, sobretudo entre turistas em estâncias balneares, onde se têm tornado uma prática comum pela ausência de risco infeccioso (vírus da imunodeficiência humana, hepatite), aplicação indolor, duração limitada e baixo custo5,6. Apesar do número de reacções adversas reportadas após aplicação de hena na pele, o seu potencial para induzir reacções alérgicas ainda é largamente subestimado. As tatuagens com PPDA são a causa mais frequente de dermatite de contacto nas crianças7.

 

CASO CLÍNICO

Adolescente do sexo feminino, 16 anos, sem antecedentes pessoais relevantes, observada no serviço de urgência pediátrica por lesão eczematosa no dorso da mão com a forma de uma flor (Figuras 1 e 2), que surgiu 9 dias após aplicação de tatuagem de hena numa estância de férias. Negou, nesse momento, contacto prévio com hena ou tintas de cabelo no passado. Foi medicada com anti‑histaminico H1 (levocetirizina 5mg/dia) e corticóide tópico (mometasona 1mg/g) durante uma semana com resolução completa, sem lesão residual.

 

 

 

 

Foi referenciada à consulta de Imunoalergologia para investigação aprofundada, onde realizou testes de contacto com a bateria standard do Grupo Português de Dermatites de Contacto, os quais foram fortemente positivos para PPDA 1%. Verificou‑se também uma reacção mais ligeira ao sulfato de níquel 5%.

Quando novamente questionada, a mãe da doente recordou‑se da aplicação de outra tatuagem semelhante, 8 anos antes, durante as férias de verão, sem qualquer reacção.

DISCUSSÃO

A frequência da dermatite de contacto alérgica devida a PPDA tem aumentado nos últimos anos. Nas crianças, as tatuagens temporárias têm sido o principal motivo7.

Estas têm maior probabilidade de induzir sensibilização do que as tintas de cabelo, dada a duração da exposição durante o procedimento, que pode durar várias horas3.

Neste contexto a PPDA é usada para estabilizar a preparação, escurecer a cor, acelerar o processo de tatuagem e produzir desenhos mais definidos8.

A PPDA habitualmente induz reacções de hipersensibilidade do tipo IV. De acordo com as leis europeias, a concentração máxima permitida nos produtos capilares é de 6% e a sua aplicação directa na pele, pestanas e sobrancelhas, é proibida6,9. No entanto, não existe legislação relativa às tatuagens temporárias e os produtos usados contêm frequentemente concentrações de PPDA mais elevadas.

No caso reportado, um primeiro contacto foi mais tarde identificado, tendo sido este provavelmente o responsável pela sensibilização primária. Contudo, pode ocorrer sensibilização activa devido à potência da PPDA, reduzindo o período de sensibilização e permitindo a ocorrência de sensibilização e reacção na mesma aplicação, sem exposição prévia10.

O termo “temporário” e o facto de a hena ser uma substância de origem natural induz falsa segurança. Os autores chamam a atenção para esta prática, cada vez mais frequente em crianças; as tatuagens temporárias podem não ser tão inofensivas quanto aparentam e podem induzir sensibilização permanente a uma substância que pode apresentar reactividade cruzada com produtos mais comuns, como tintas de cabelo e de têxteis.

 

REFERÊNCIAS

1. de Groot AC. Side ‑effects of henna and semi‑permanent “black henna” tattoos: a full review. Contact Dermatitis 2013;69:1-25.         [ Links ]

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7. Lasa EM, Cojocariu Z, Arroabarren E, Echechipía S, Marín MPL, Tabar AI. Tatuaje de henna en niños: natural y temporal? An del Sist Sanit Navar 2007;30:131-4.         [ Links ]

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9. Ramirez‑Andreo A, Hernandez ‑Gil A, Brufau C, Marín N, Jiménez N, Hernandez‑Gil J, et al. Allergic contact dermatitis to temporary henna tattoos. Actas Dermo ‑ Sifiliograficas Engl Ed 2007;98:91-5.         [ Links ]

10. Uzuner N, Olmez D, Babayigit A, Vayvada O. Contact dermatitis with henna tattoo. Indian Pediatr 2009;46:423‑ 4.         [ Links ]

 

Contacto:

Joana Bruno Soares

Serviço de Imunoalergologia do Hospital de Santa Maria

Centro Hospitalar Lisboa Norte

Avenida Professor Egas Moniz

1649‑035 Lisboa

E‑mail: joanabsoares@gmail.com

 

Financiamento: Nenhum.

 

Declaração de conflitos de interesse: Nenhum.

 

Data de recepção / Received in: 27/01/2014

Data de aceitação / Accepted for publication in: 02/02/2014

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