SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.22 número4Reatividade cutânea a alergénios inalantes em crianças e adolescentes alérgicos de serviço especializado: Valor do índice cutâneoUrticária papular: Revisão da literatura índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Portuguesa de Imunoalergologia

versão impressa ISSN 0871-9721

Rev Port Imunoalergologia vol.22 no.4 Lisboa dez. 2014

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Peak nasal inspiratory flow e testes de odores na rinite

Peak nasal inspiratory flow and scent test in rhinitis

 

Jorge Viana, Raquel Gomes, Carlos Loureiro, Ana Todo Bom

Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra

 

Contacto

 

RESUMO

Introdução: A rinite é uma inflamação da mucosa nasal que se caracteriza por prurido, esternutos, rinorreia e obstrução nasal e pode interferir com a função olfactiva. Para uma avaliação clínica e funcional podem utilizar‑se escalas analógicas de sintomas, rinomanometria, avaliação do fluxo inspiratório nasal máximo (PNIF) e testes olfactivos. Objectivo: Avaliar alterações do olfacto e do PNIF em doentes com rinite, asma e com as duas situações clínicas associadas e também num grupo de controlo e valorizar condicionantes como sensibilização a aeroalergénios, idade e parâmetros antropométricos. Métodos: De uma amostra aleatória de 2200 indivíduos dos 18 aos 74 anos foram seleccionados 275, tendo sido efectuada uma avaliação clínica, testes cutâneos de alergia por picada a uma bateria de 12 alergénios, determinação do PNIF e teste de odores. Resultados: Completaram o estudo 259 indivíduos com uma média de idades de 47,0±15,1 anos, tendo 185 patologia respiratória: 82 (44 %) com rinite, 67 (36 %) com asma e 36 (19 %) com asma e rinite. O grupo de controlo era formado por 74 indivíduos com uma média de idade de 47,7±14,6 anos. Observou‑se sensibilização a pelo menos um dos doze alergénios testados em 146 participantes no estudo. O índice de massa corporal no grupo de doentes foi de 27,0± 5,3, e no grupo‑controlo de 26,2± 5,3. O valor médio de PNIF foi de 85,12±27,09l; 94,10±39,24l; 79,17±31,54l e de 87,36±36,43 respetivamente para rinite, asma, asma associada a rinite e para o grupo‑controlo. O valor de PNIF correlacionou‑se com o peso (r=0,157, p=0,038). Na identificação de odores constatou‑se que apenas 42 participantes identificavam um número igual ou inferior a 8, menos de 75 % de identificações corretas. O odor laranja diferenciou o grupo controlo (95,9 %) da rinite isolada (86,6 %, p=0,042) e da rinite associada à asma (77,8 %, p <0,001). O odor rosa distingue a rinite (95,1 %) da asma (94,0 %, p=0,011) e da rinite associada a asma (75%,p=0,001). Conclusões: O grupo de resultados sugere que o PNIF e o teste dos odores constituem ferramentas a implementar na avaliação e caracterização da rinite.

Palavras‑chave: Asma, rinite, epidemiologia, débito inspiratório nasal máximo, teste de odores.

 

ABSTRACT

Introduction: Rhinitis is an inflammatory disease of the nasal mucosa, characterized by sneezing, itching, rhinorrhoea and nasal congestion that can affect the olfactory function. For clinical and functional assessment, analogue scales of symptoms, rhinomanometry, peak nasal inspiratory flow (PNIF) evaluation and olfactory tests can be used. Objective: To evaluate changes in the sense of smell and PNIF of patients with rhinitis, asthma or both and also in a control group, and to investigate their association with airborne allergen’s sensitization, age and anthropometric parameters. Methods: From a random sample of 2 200 individuals aged 18 to 74 years old, 275 individuals were selected to be submitted to clinical assessment, skin prick allergy tests to 12 allergens, determination of PNIF and a smell identification test. Results: The all study was completed by 259 individuals (with a mean age of 47,0 ± 15,1 years) including 185 with respiratory pathology: 82 (44 %) with rhinitis, 67 (36 %) with asthma and 36 (19 %) with asthma and rhinitis. Control group comprised 74 individuals with a mean age of 47.7 ± 14.6 years. Sensitization to at least to one of the 12 allergen tested was observed in 176 study participants. Body mass index of the patients group was 27.0 ± 5.3 kg.m‑2, and of the control group was 26.2 ± 5.3 kg.m‑2. The average NFIP was 85.12 ± 27.09 l; 39.24l ± 94.10; 31.54l ± 79.17 ± 36.43 and 87.36 respectively for rhinitis, asthma, and rhinitis associated to asthma and control group. PNIF correlated with weight (r=0,157, p=0,038). At the smell identification test, only 42 participants identified 8 or less scents, below 75 % of correct identifications. Orange scent differentiated the control group (95.9 %) from isolated rhinitis (86.6 %, p=0,042) and from rhinitis associated to asthma (77.8 %, p <0.001). Orange scent distinguishes rhinitis (95.1 %) from asthma (94 %,p=0,011) and from rhinitis associated to asthma (75 %,p=0,001). Conclusions: Global results suggest PNIF and Smell Identification Test as tools to be implemented in the evaluation of rhinitis.

Key-words: Asthma, rhinitis, epidemiology, peak nasal inspiratory flow, scent test.

 

INTRODUÇÃO

Define‑se rinite como uma inflamação da mucosa nasal caracterizada por sintomas como congestão nasal, rinorreia, crises esternutatórias e prurido nasal, a que se associam frequentemente sintomas oculares.

A alergia é a causa mais frequente de rinite crónica. Rinite alérgica é uma doença nasal sintomática, determinada por um processo inflamatório mediado pela IgE após exposição da mucosa nasal a um ou mais alergénios. A rinite alérgica (RA) é actualmente encarada como um factor de risco importante de asma, quer em adultos, quer em crianças.

Nos Estados Unidos, na Europa e em Portugal a rinite é uma doença crónica comum, atingindo cerca de 30 a 40 % das crianças e 20 a 30 % dos adultos1,2,3.

A sinusite está profundamente associada à rinite, sendo os sintomas destas duas situações clínicas largamente sobreponíveis, constituindo igualmente um factor condicionante da gravidade de asma4.

Cerca de 60 % a 80 % por cento dos doentes com asma têm também rinite. Mesmo na ausência de sintomas nasais que permitam caracterizar a doença estão descritas alterações imunoinflamatórias na mucosa nasal de doentes com asma5.

O mecanismo fisiopatológico subjacente à rinite mediada por IgE pressupõe uma fase de sensibilização e um contacto repetido com o alergénio que desencadeia as manifestações clínicas. A acumulação de células inflamatórias e respetivos mediadores, bem como alterações vasomotoras locais, condicionam a obstrução nasal. Os tecidos expostos a alergénios de forma crónica permanecem inflamados e hiperreativos, podendo desenvolver‑se uma resposta exagerada a estímulos não alergénios, como odores fortes, ar frio ou fumo de tabaco. De acordo com as manifestações clínicas mais marcadas, os doentes podem considerar‑se sneezers and runners se apresentam uma clínica dominante de prurido nasal, crises esternutatórias, rinorreia aquosa, congestão nasal (variável), ritmo diurno (agravamento durante o dia), muitas vezes associada a conjuntivite, ou blockers quando têm poucos espirros, muco nasal espesso (com corrimento nasal posterior), sem prurido, sendo os sintomas constantes e associados a um possível agravamento nocturno. Os sintomas moderados a graves da RA, nomeadamente de obstrução crónica e de hiperreatividade nasal, associam‑se a um forte impacto na vida diária dos doentes, traduzindo‑se em dificuldades na aprendizagem, impacto negativo no desempenho escolar/laboral, cansaço//fadiga, alterações do sono, dificuldade em adormecer e despertares nocturnos.

OBJECTIVOS

Os objectivos deste estudo foram avaliar eventuais alterações do olfacto em doentes com rinite, asma e com as duas situações clínicas associadas e ainda num grupo‑controlo sem patologia das vias aéreas superiores e inferiores. Avaliar igualmente nos grupos definidos alterações ao fluxo inspiratório nasal. Finalmente procurar correlacionar condicionantes como sensibilização a aeroalergénios, idade e parâmetros antropométricos com os dados obtidos.

MÉTODOS

O presente estudo foi realizado em Coimbra, entre 2009 e 2010, a partir de uma amostra disponível de base populacional e incluiu 2200 indivíduos com idades compreendidas entre os 18 e os 74 anos, selecionados de forma aleatória, conforme preconizado pelo protocolo da Global Allergy and Asthma European Network (GA2LEN)6.

Uma subamostra constituída por 275 indivíduos, correspondendo a 12,5 % da amostra total, seleccionados de forma aleatória mas respeitando a distribuição ponderada por patologia e controlos, realizaram testes cutâneos de alergia por picada a um grupo de 12 aeroalergénios definidos pelo protocolo do estudo, adaptados da bateria Ga2len que, sendo representativos de diferentes regiões da Europa, permitem uma identificação de mais de 95% dos doentes sensibilizados (bétula, mistura de gramíneas, erva‑timotea, gato, cão, barata, oliveira, artemísia, parietária, alternária e ácaros – Dermatophagoides pteronyssinus e Dermatophagoides farinae)7,8.

Foram convocados para participar no estudo indivíduos cujas respostas ao inquérito populacional permitiram fazer o diagnóstico de asma e/ou de rinite de acordo com a metodologia definida no estudo9. Todos os indivíduos foram submetidos a uma avaliação clínica sumária por médicos especialistas em Imunoalergologia para confirmação dos diagnósticos através da recolha da sua história clínica e a uma determinação do fluxo inspiratório nasal (peak nasal inspiratory Flow–PNIF) com debitómetro portátil de Clement Clark In‑Check Nasal. Os participantes permaneceram sentados cerca de 30 minutos antes da realização do teste. Foram sempre registadas 3 determinações consecutivas com intervalo de 1 minuto, sendo validada a melhor. A técnica foi realizada com o participante em posição ortostática, com aparelho acoplado na região anterior do nariz através de uma pequena máscara ligada a um cilindro plástico por onde passa o ar na inspiração forçada10.

Para avaliação da capacidade de descriminação de odores os indivíduos foram submetidos a um painel de testes para identificação de 48 odores sniffin sticks olfactory test adequados a uma população europeia11,12.

Estes estavam agrupados em conjuntos de 4 aromas difíceis de distinguir entre si (Quadro 1). Após uma inalação nasal profunda, cada indivíduo procedia ao registo em papel do aroma que identificava a partir das quatro opções possíveis e conhecidas em cada grupo. No final procedia‑se à avaliação do número de respostas correctamente identificadas, bem como dos odores mais identificados.

Da amostra inicial, 259 indivíduos, 92 do sexo masculino e 167 do sexo feminino, e com uma média de idades de 48 anos, completaram todas as avaliações descritas e cumpriram os critérios para ser incluídos no presente estudo.

Os dados foram analisados com o SPSS 20, considerando a população total e a divisão em grupos de acordo com patologia, alergia, sexo e grupos etários.

RESULTADOS

Dos 259 indivíduos estudados, 185, com uma média de idades de 47,0±15,1 anos, tinham patologia respiratória que se distribuía da seguinte forma: 82 (44 %) com rinite, 67 (36 %) com asma e 36 (19 %) com asma e rinite, sendo 121 (65 %) do género feminino e 64 (35 %) do masculino. Da avaliação clínica sumária foi possível confirmar que dos 118 doentes com rinite 105 tinham diagnóstico médico e que 110 cumpriam medicação com anti‑histaminicos orais e 95 corticosteróides tópicos nos períodos de agravamento. O grupo-controlo era constituído por 74 indivíduos com uma média de idades de 47,7 ± 14,6 anos, sendo 46 (62 %) do género feminino e 28 (38 %) do masculino. Relativamente aos testes de alergia foi observada sensibilização a pelo menos 1 dos aeroalergénios testados em 146 indivíduos, apresentando os 113 indivíduos remanescentes testes cutâneos negativos.

Foram considerados sensibilizados 40 doentes com rinite (48 %), 49 com asma (73 %), 23 com asma e rinite (64 %) e 34 indivíduos do grupo-controlo (45 %).

Os doentes apresentavam um índice de massa corporal de 27,0 ± 5,3; altura média de 162,6±9,3 cm e um peso médio de 71,7±16,0 kg. Os participantes do grupo‑controlo apresentavam um índice de massa corporal de 26,2 ± 5,3; altura média de 163,8±8,2 cm e um peso médio de 70,1±14,9 kg; Os doentes com rinite com uma média de idades de 49,0±14,5 apresentavam um índice de massa corporal de 26,6 ± 5,3; altura média de 160,8±8,8 cm e um peso médio de 68,9±15,3 kg; Os doentes com asma, com uma média de idades de 44,60±16,03 apresentavam um índice de massa corporal de 26,6 ± 4,9; altura média de 164,3±10,3 cm e um peso médio de 71,8±15,7 kg; Os doentes com rinite e asma com uma média de idade de 46,94±14,75 apresentavam um índice de massa corporal de 29,1 ± 5,8; altura média de 163,8±7,7 cm e um peso médio de 78,1±16,8 kg.

Todos os odores foram erroneamente identificados por alguns doentes, sendo o pão apenas mal identificado por 1 individuo, enquanto 80 participantes consideraram que a resposta correcta seria toranja para o odor que testavam, quando de facto era o limão.

O Quadro 2 discrimina o número de indivíduos que identificaram cada um dos odores testados.

Analisando os grupos de doentes foi possível observar que os doentes com rinite tiveram um índice médio de reconhecimento de odores de 9,76±1,82; os com asma 9,85±1,71, enquanto os doentes com rinite e asma tiveram um valor de 9,53±2,13. Para o grupo‑controlo foram registados valores de 10,09±1,78.

Os valores médios da melhor das três determinações sucessivas do fluxo inspiratório nasal (PNIF) para os grupos analisados foram os seguintes: doentes com rinite: 85,12±27,09 l/mim; com asma 94,10±39,24; asma e rinite: 79,17±31,54. Para o grupo‑controlo os valores foram de 87,36±36,43. No Quadro 3 estão sumariados os valores descritos mais relevantes.

Não houve diferença com significância estatística no teste de PNIF e na percentagem de odores identificados entre os diferentes grupos de analisados. Contudo, os doentes com diagnóstico de asma associada à rinite apresentaram tendência para resultados mais reduzidos no teste de odor e PNIF.

No entanto, quando se avaliou a presença de alergia em doentes com rinite (isolada ou associada a asma), observou‑se que os doentes com rinite não alérgica apresentaram resultados mais reduzidos de débitos nasais inspiratórios e um menor número de odores reconhecidos, (PNIF: 77, 18 ± 25,78 vs 88,65 ± 28,52 p = 0,029) e teste de odor (9, 04±2,19 vs10,49 ±1,34 p <0,001), comparativamente aos com rinite alérgica.

Foi observada uma correlação positiva entre o PNIF e o peso (r = 0,157, p = 0,038), com significância estatística.

Valores de débito nasal inspiratório superiores a 120 foram observados apenas em 49 dos indivíduos estudados, correspondente a 19 % da população (15 % com rinite, 16 % com rinite e asma, subindo para 20 % no grupo‑controlo e 22 % na asma) (Quadro 4).

Relativamente à identificação de odores, constatou‑se que apenas 42 participantes identificavam um número igual ou inferior a 8, ou seja, menos de 75 % de identificações correctas (Quadro 5).

A idade teve correlação negativa com o PNIF (r = ‑0,219, p <0,001) e com o teste de odor (r = ‑0,359, p <0,001).

A identificação do odor laranja no grupo‑controlo (95,9 %) foi diferente na rinite isolada (86,6 %, p = 0,042) e da rinite associada à asma (77,8 %, p = 0,003) contribuindo para discriminar as diferentes situações referidas.

O odor rosa diferencia a rinite (95,1 %) da asma (94,0 %, p = 0,011) e da rinite associada a asma (75 %, p = 0,001).

DISCUSSÃO

A rinite é uma doença que clinicamente se caracteriza predominantemente por sintomas de obstrução nasal, rinorreia, prurido e esternutos. Pode também ocorrer redução ligeira ou mesmo uma perda acentuada do olfacto com consequências negativas na qualidade de vida do doente13,14.

Na presença de sinusite ou de polipose nasal, a hiposmia ou anosmia, obstrução nasal, rinorreia, frequentemente associadas a cefaleias, adquirem maior intensidade.

No presente estudo foram incluídos apenas indivíduos que forneceram respostas aos inquéritos que permitiram o diagnóstico de rinite e de asma. Não foi convocada população com respostas que permitiam o diagnóstico de sinusite de acordo com os critérios do consenso E3POS, por se considerar que, pela sua gravidade, seriam esperadas alterações significativas nos parâmetros a analisar.

Na rinite, a intensidade dos sintomas e a interferência da doença nas actividades profissionais, escolares e lúdicas individuais vão ser determinantes para a sua classificação e consequentemente para a recomendação terapêutica.

Com efeito, a classificação proposta pelo ARIA é genericamente aceite desde que veio substituir ou pelo menos complementar a classificação tradicional em rinite sazonal e perene. Presentemente reconhecem‑se formas de rinite intermitente, com duração temporal muito reduzida, e persistente que podem ainda ser consideradas moderadas ou graves. A classificação de gravidade é suportada por inquéritos de qualidade de vida reportada pelo doente.

Para melhor caracterização dos doentes é frequente o recurso a escalas analógicas que classificam a autoperceção que cada um tem da sua doença15. Não existe no ARIA qualquer referência ao controlo da doença para a sua classificação ou instituição de terapêutica adequada. Existe ainda a convicção de que são necessários mais instrumentos que permitam de um modo simples contribuir para um melhor enquadramento das diferentes situações clínicas.

A subfenotipagem da rinite alérgica pode ajudar a caracterizar e prever a gravidade da doença, a sua progressão e resposta ao tratamento, que deverá ser adequado a cada situação específica. No entanto, na RA, essa fenotipagem clínica e funcional é, ainda, praticamente inexistente.

O PNIF inspiratório, assim como a rinomanometria, surgem como exames complementares importantes para objectivar alterações estruturais e funcionais na‑sais. A acessibilidade do primeiro tem levantado grandes expetativas relativas ao seu uso mais regular16.

No presente estudo, apesar do elevado número de indivíduos analisados, observou‑se uma tendência para valores mais reduzidos em doentes com rinite, mas a diferença observada, quer relativamente aos indivíduos saudáveis quer relativamente aos asmáticos, não foi estatisticamente significativa. Os doentes com rinite e asma e rinite apresentaram valores de 85,12±27,09 l/min e 79,17±31,54, respetivamente, mas os valores do grupo com asma e controlo foram também baixos, de 94,10±39,24 e 87,36±36,43, respetivamente.

A variabilidade deste parâmetro e a aparente estabilidade da população analisada, uma vez que o estudo foi efectuado sem qualquer prova de provocação nasal específica ou inespecífica prévia e sem indicação para suspensão da medicação que estavam habitualmente a cumprir, pode justificar os resultados encontrados. De referir ainda que os valores da população de controlo e de asmáticos foram semelhantes, mas baixos quando comparados com outros dados da literatura17,18,19,20, em que os valores médios de PFN em saudáveis podem ser de 120 l/min. Não foi objectivo deste estudo avaliar o controlo da asma nos doentes estudados.

A investigação do sentido do olfacto e da capacidade de diferenciação da função olfactiva na avaliação da hiposmia e da sua gravidade será também essencial para uma melhor definição de fenótipos de rinite. Existem trabalhos que demonstram um impacto, embora moderado, da rinite alérgica perene, no sentido do olfacto21,22,23,24.

Tem também sido reportada uma melhoria desses défices com instituição de terapêutica adequada25.

No presente trabalho a identificação de odores foi incompleta em todos os participantes, sendo, nos doentes, menor o número de odores identificados (de 9,53±2,13 nos doentes com rinite e asma), mas sem diferença estatisticamente significativa comparativamente ao grupo‑controlo (10,09±1,78).

Também aqui deve ficar claro que os doentes analisados foram identificados a partir de um estudo populacional e cumpriam medicação orientados pelas manifestações clinicas.

Aliás a classificação proposta pelo ARIA aplica‑se a doentes em situação similar, em que não são considerados a medicação a cumprir nem objectivada de forma directa a intensidade dos sintomas apresentados. Face ao presente estudo, pretender avaliar novas ferramentas e métodos de avaliação objectiva da rinite em geral, o desenho do mesmo também não incluiu estes parâmetros na classificação da rinite, o que pode ser considerada uma das limitações.

Ao contrário da nossa expectativa, foi possível distinguir grande parte dos odores testados por controlos e doentes com rinite.

A presença de alergia em doentes com rinite (isolada e associada a asma) condicionou os resultados dos exames complementares analisados. Doentes com formas não alérgicas de rinite apresentaram resultados mais reduzidos de débitos nasais inspiratórios e um menor número de odores reconhecidos (PNIF: 77, 18 ± 25,78 vs 88,65 ± 28,52 p = 0,029 e teste de odor: 9, 04±2,19 vs 10,49 ±1,34 p <0,001), comparativamente aos que apresentavam rinite alérgica.

É reconhecida a intervenção determinante do eosinófilo nestas patologias e a agressividade dos seus mediadores, contribuindo para a inflamação crónica, para a obstrução mantida e para a hiposmia progressiva.

Outras explicações possíveis podem ser alterações estruturais dos tecidos locais e adjacentes, nomeadamente fenómenos de rinossinusite26. Não há no entanto razão para se concluir que estes fenómenos possam estar confinados a situações de rinite não alérgica.

A obesidade e o excesso de peso são fortes condicionantes da permeabilidade da via aérea. Os grupos analisados apresentavam parâmetros antropométricos semelhantes. A correlação positiva e estatisticamente significativa que se estabeleceu entre o PNIF e peso pode proporcionar a esta ferramenta uma utilidade adicional na observação deste tipo de doentes. Pode pois constituir uma medida que, sendo objectiva, permita reforçar a necessidade de combater o excesso de peso em doentes com patologia obstrutiva respiratória.

Os doentes com mais idade apresentam mais queixas de obstrução nasal, quando comparados com doentes mais jovens. Apesar da componente alérgica e inflamatória continuar presente no idoso, as mudanças fisiológicas no tecido conjuntivo e vasos que ocorre ao longo da vida potenciam os sintomas obstrutivos. Para isso contribui igualmente a alteração provável da anatomia da ponta nasal e estreitamento da válvula nasal interna, estabelecida com o avançar da idade27. Estas alterações revestem‑se de particular importância porque condicionam mudanças nos padrões de sono, fadiga diurna, disfunção cognitiva, mau humor e irritabilidade28. No presente estudo a idade teve uma correlação negativa com a PNIF (r = ‑0,219, p <0,001) e com o teste de odor (r = ‑0,359, p <0,001). Não tendo sido observadas dificuldades técnicas com a sua execução, foi possível demonstrar de forma objectiva que a obstrução nasal tenderá a agravar ao longo dos anos, sendo mais uma vez reforçada a necessidade de evitar essa progressão.

Como na literatura, é por vezes adotado um nível de corte para indivíduos sintomáticos de 120 l/m, com sensibilidade e especificidade superior a 75 %29, procedemos a uma descrição da população estudada, incluindo indivíduos com patologia e grupo‑controlo que cumpria este critério. Embora não se possa extrapolar estas premissas como válidas para a população portuguesa, na comparação com dados da literatura observou‑se que apenas um quinto da população analisada, 62 % com asma ou do grupo‑controlo e 38 % com rinite tinham valores de PNIF considerados normais noutros grupos populacionais. No mesmo sentido procedeu‑se à avaliação dos poucos participantes que tinham fracas prestações nas identificações dos odores. O grupo de 42 doentes que cumpria esta premissa incluía uma percentagem discretamente mais elevada de doentes com rinite (52%).

Interessante nesta análise referir a importância de alguns odores, como laranja para a rinite e o rosa para as duas situações clínicas.

A utilidade dos sniffin tests encontra‑se amplamente revista na avaliação da capacidade olfactiva em diversas populações11,12,30. Os resultados da literatura demonstram utilidade na avaliação da anosmia e hiposmia, nomeadamente relativamente à presença de patologia nasal, inclusivamente na alérgica, com resultados interessantes compatíveis com os observados no presente estudo14,15,18,31.

Contudo, este trabalho diferencia‑se por incluir diferentes aspetos da patologia respiratória (vias aéreas superiores e inferiores), bem como incluir a diferenciação destas patologias na presença de atopia identificada num grupo amplo de indivíduos seleccionados da população em geral. Neste contexto, os presentes resultados sugerem maior importância específica de alguns odores seleccionados, como observado com os odores rosa e laranja.

 

CONCLUSÃO

Face à necessidade de uma melhor caracterização da rinite, resulta do presente trabalho que a utilização do fluxo inspiratório nasal máximo (PNIF) e testes olfactivos terão interesse e deverão ser implementados no estudo desta patologia.

São métodos simples, fáceis de manusear, pouco dispendiosos e capazes de fornecer informação relevante particularmente nas formas de rinite não alérgica. As suas alterações são aparentemente condicionadas pela idade e pelo excesso de peso. Será necessário fazer uma utilização mais generalizada para responder a questões que permanecem, nomeadamente os débitos excessivamente baixos encontrados no grupo‑controlo impeditivos de uma diferenciação relativamente à patologia nasal. Outra questão a responder consiste na escolha de odores, adaptados à população portuguesa, com os aspectos culturais e educacionais bem específicos, suficientemente eficazes para fornecer a descriminação desejável que possa contribuir para instituição dos diferentes fenótipos de rinite.

 

REFERÊNCIAS

1. Bousquet J, Van Cauwenberge P, Khaltaev N. Allergic rhinitis and its impact on asthma. J Allergy Clin Immunol 2001;108(5 Suppl): S147‑S334.         [ Links ]

2. Todo‑Bom A, Loureiro C, Almeida MM, Nunes C, Delgado L, Castel‑Branco G, et al. Epidemiology of rhinitis in Portugal: evaluation of the intermittent and the persistent types. Allergy 2007; 62: 1038‑43.         [ Links ]

3. Valero A, Pereira C, Loureiro C, Martinez‑Cocera C, Murio C, Rico P, et al. Interrelationship between skin sensitization, rhinitis, and asthma in patients with allergic rhinitis: a study of Spain and Portugal. J Investig Allergol Clin Immunol 2009;19:167‑72.         [ Links ]

4. Bachert C, Patou J, Cauwenberge V. The role of sinus disease in asthma. Curr Opin Allergy Clin Immunol 2006;6:29‑36.         [ Links ]

5. Bousquet J, Khaltaev N, Cruz AA, Denburg J, Fokkens WJ, Togias A, et al. Allergic Rhinitis and its Impact on Asthma (ARIA) 2008 update (in collaboration with the World Health Organization, GA(2)LEN and AllerGen). Allergy 2008;63 Suppl 86:8‑160.         [ Links ]

6. Jarvis D, Newson R, Lotvall J, Hastan D, Tomassen P, Keil T, et al. Asthma in adults and its association with chronic rhinosinusitis: the GA2LEN survey in Europe. Allergy 2012;67:91‑8.         [ Links ]

7. Bousquet P‑J, Burbach G, Heinzerling L M, Edenharter G, Bachert C, Bindslev‑Jensen, C., et al. GA2LEN skin test study III: Minimum battery of test inhalent allergens needed in epidemiological studiesin patients. Allergy 2009; 64: 1656‑62.         [ Links ]

8. Comert S, Demir AU, Karakaya G, Kalyoncu AF. Minimum prick test panel for adult patients with asthma and rhinitis in Ankara, Turkey. J Asthma 2014; 51:417‑22.         [ Links ]

9. Todo‑Bom A, Loureiro C, Rodrigues V, Burney, P, Pinto AM. Epidemiologia da asma e rinossinusite no Centro de Portugal. Contributo da alergia. Rev Port Imunoalergologia 2012; 20: 193‑200.         [ Links ]

10. Ottaviano G, Scadding GK, Coles S, Lund VJ. Peak nasal inspiratory flow; normal range in adult population. Rhinology 2006;44:32‑5.         [ Links ]

11. Neumann C, Tsioulos K, Merkonidis C, Salam M, Clark A, Philpott C. Validation study of the “Sniffin’ Sticks” olfactory test in a British population: a preliminary communication. Clin Otolaryngol 2012; 37:23‑7.         [ Links ]

12. Haehner A, Mayer AM, Landis BN, Pournaras I, Lill K, Gudziol V, et al. High Test‑Retest Reliability of the Extended Version of the ‘‘Sniffin’ Sticks’’ Test. Chem Senses 2009; 34: 705‑11.         [ Links ]

13. Ramakrishnan JB, Kingdom TT, Ramakrishnan VR. Allergic rhinitis and chronic rhinosinusitis: their impact on lower airways. Immunol Allergy Clin North Am 2013; 33:45<‑60.         [ Links ]

14. Bousquet J, Anto JM, Demoly P, Schünemann HJ, Togias A, Akdis M et al. Severe Chronic Allergic (and Related) Diseases: A Uniform Approach – A MeDALL – GA(2)LEN – ARIA Position Paper. In collaboration with the WHO Collaborating Center for Asthma and Rhinitis. Int Arch Allergy Immunol 2012;158:216‑31.         [ Links ]

15. Bousquet PJ, Combescure C, Neukirch F, Klossek JM, Mechin H, Daures JP, et al. Visual analog scales can assess the severity of rhinitis graded according to ARIA guidelines. Allergy 2007; 62: 367‑72.         [ Links ]

16. Bermüller C, Kirsche H, Rettinger G, Riechelmann H. Diagnostic accuracy of peak nasal inspiratory flow and rhinomanometry in functional rhinosurgery. Laryngoscope 2008;118:605‑10.         [ Links ]

17. Starling‑Schwanz R, Peake HL, Salome CM, Toelle BG, Ng KW, Marks GB, Lean ML, Rimmer SJ. Repeatability of peak nasal inspiratory flow measurements and utility for assessing the severity of rhinitis. Allergy 2005; 60:795‑800.         [ Links ]

18. Kirtsreesakul V1, Leelapong J, Ruttanaphol S. Nasal peak inspiratory and expiratory flow measurements for assessing nasal obstruction in allergic rhinitis. Am J Rhinol Allergy 2014;28:126‑30.         [ Links ]

19. Braunstahl GJ, Kleinjan A, Overbeek SE, Prins JB, Hoogsteden HC, Fokkens WJ. Segmental bronchial provocation induces nasal inflammation in allergic rhinitis patients. Am J Respir Crit Care Med 2000; 161:2051‑7.         [ Links ]

20. Ozkul HM1, Balikci HH, Gurdal MM, Celebi S, Yasar H, Karakas M, Alp A. Normal range of peak nasal inspiratory flow and its role in nasal septal surgery. J Craniofac Surg 2013;24:900‑2.         [ Links ]

21. Guilemany JM, Garcia‑Pinero A, Alobid I, Centellas S, Mariño FS, Valero A, et al. The loss of smell in persistent allergic rhinitis is improved by levocetirizine due to reduction of nasal inflammation but not nasal congestion (the CIRANO study). Int Arch Allergy Immunol 2012;158:184‑90.         [ Links ]

22. Gregorio LL, Caparroz F, Nunes LM, Neves LR, Macoto EK. Olfaction disorders: retrospective study. Braz J Otorhinolaryngol 2014;80:11‑7.         [ Links ]

23. Malaty J, Malaty IA. Smell and taste disorders in primary care. Am Fam Physician 2013;88:852‑9.         [ Links ]

24. Henkin RI1, Levy LM, Fordyce A. Taste and smell function in chronic disease: a review of clinical and biochemical evaluations of taste and smell dysfunction in over 5000 patients at The Taste and Smell Clinic in Washington, DC. Am J Otolaryngol 2013;34:477‑89.         [ Links ]

25. Bhatia S, Baroody FM, Tineo M, Naclerio RM. Increased Nasal Airflow With Budesonide Compared With Desloratadine During the Allergy Season. Arch Otolaryngol Head Neck Surg 2005;131:223‑8.         [ Links ]

26. Kaliner M. Classification of nonallergic rhinitis syndromes with a focus on vasomotor rhinitis, proposed to be known henceforth as nonallergic rhinopathy. World Allergy Organization J 2009; 2: 98‑101.         [ Links ]

27. Kjærgaard T, Cvancarova M, Steinsvåg SK. Relation of nasal air flow to nasal cavity dimensions. Laryngoscope 2008;118:1476‑81.         [ Links ]

28. Young T, Finn L, Kim H. Nasal obstruction as a risk factor for sleep‑disordered breathing. The University of Wisconsin Sleep and Respiratory Research Group. J Allergy Clin Immunol 1997;99:S757‑62        [ Links ]

29. Bermüller C, Kirschek H, Rettinger G, Riechelmann H. Diagnostic accuracy of peak nasal inspiratory flow and rhinomanometry in functional rhinosurgery. Laryngoscope 2008;118:605‑10.         [ Links ]

30. Hummel T, Sekinger B, Wolf SR, et al. ‘Sniffin’ Sticks’: olfactory performance assessed by the combined testing of odor identification, odor discrimination, and olfactory thresholds. Chem Senses 1997; 22: 39‑52.         [ Links ]

31. Klimek L, Eggers G. Olfactory dysfunction in allergic rhinitis is related to nasal eosinophilic inflammation. J Allergy Clin Immunol 1997;100:158‑64.         [ Links ]

 

Contacto:

Jorge Viana

Serviço de Imunoalergologia, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra

Av. Bissaya Barreto - Praceta Prof. Mota Pinto

3000-075 Coimbra

E-mail: viana.jorge@gmail.com

 

Declaração de conflitos de interesse: Nenhum.

 

Data de recepção / Received in: 12/08/2014

Data de aceitação / Accepted for publication in: 08/09/2014

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons