SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.24 número1Revisão crítica de um artigo científicoImportância da biópsia cutânea: Um caso clínico índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Portuguesa de Imunoalergologia

versão impressa ISSN 0871-9721

Rev Port Imunoalergologia vol.24 no.1 Lisboa mar. 2016

 

ARTIGO DE REVISÃO

 

Ingestão dos alimentos cozinhados na alergia alimentar ao leite de vaca e ao ovo

Baked food ingestion in cow’s milk and egg allergy

 

Sónia Rosa1,Filipa Ribeiro2, Paula Leiria Pinto1

1Serviço de Imunoalergologia, Hospital de Dona Estefânia, Centro Hospitalar de Lisboa Central EPE

2Serviço de Imunoalergologia, Hospital de Faro EPE

 

Contacto

 

RESUMO

O leite de vaca e o ovo são responsáveis pela maioria dos casos de alergia alimentar na infância. O processamento térmico dos alimentos pode alterar a sua alergenicidade e estão publicados vários estudos que investigaram a tolerância ao leite de vaca e ao ovo cozinhados em doentes com alergia ou com sensibilização aos mesmos. Da avaliação destes estudos verificou‑se que os alimentos cozinhados são tolerados pela maioria da população incluída nos mesmos e que a sua ingestão é segura, podendo melhorar a qualidade de vida dos doentes. No entanto, a influência desta ingestão na história natural da alergia alimentar e na aquisição de tolerância ao alimento cru é discutível e necessita de mais estudos. Não foram encontrados marcadores clínicos ou imunológicos fiáveis que permitam a identificação dos doentes que toleram os alimentos cozinhados, pelo que a prova de provocação oral se mantém o único método fiável para avaliar essa tolerância.

Palavras‑chave: Alergia ao leite de vaca, alergia ao ovo, leite de vaca cozinhado, ovo cozinhado, alergenicidade, processamento térmico.

 

ABSTRACT

Cow’s milk and egg are responsible for most cases of food allergy in children. Food thermal processing can change their allergenicity and several studies investigating baked cow’s milk and egg tolerance in patients with confirmed allergy or sensitization have been published. The evaluation of those studies showed that most patients included tolerated baked food and that the ingestion is safe and can improve the patient’s quality of life. Nevertheless, the influence of such ingestion in the natural history of food allergy and in the acquisition of tolerance to the raw food is debatable and needs further investigation. Clinical or immunological markers of tolerance to the baked food were not found, so the oral provocation test remains the only way to prove tolerance.

Keywords: Cow’s milk allergy, egg allergy, baked milk, baked egg, allergenicity, thermal processing.

 

INTRODUÇÃO

A alergia alimentar afeta 2 a 10% da população geral e a sua prevalência tem vindo a aumentar sobretudo nos países desenvolvidos1. Nos Estados Unidos, a prevalência de alergia alimentar reportada na população pediátrica aumentou 18% em dez anos2.

O leite de vaca (LV) e o ovo são os alimentos responsáveis pela maioria dos casos de alergia alimentar na infância, com prevalências que variam entre os 0‑2% e entre os 0,5‑2,5%, respetivamente, em crianças sensibilizadas e sintomáticas com os mesmos3.

Estes dois alimentos estão geralmente associados a quadros de alergia alimentar transitória, que resolvem gradualmente até à idade escolar2,4,5. Dados recentes têm demonstrado uma duração mais prolongada da alergia alimentar, com uma taxa de resolução aos 16 anos de 79 % e de 68 %, para o LV e ovo, respetivamente6,7.

Vários estudos apontam para a existência de dois fenótipos clínicos distintos na alergia IgE mediada ao LV e ao ovo, associados a diferentes prognósticos: um mais ligeiro, no qual a alergia é transitória, e um mais grave, no qual a alergia é persistente812.

A identificação destes fenótipos permitiria uma abordagem clínica mais individualizada destes doentes.

Sabe‑se que a confeção de alguns alimentos utilizando elevadas temperaturas pode diminuir a sua alergenicidade, provavelmente pela destruição de epitopos conformacionais13.

A pesquisa destes epitopos só está disponível em contexto de investigação, sendo inacessível na prática clínica diária.

Os autores procederam à revisão da literatura com o objetivo de sistematizar o conhecimento sobre o efeito do processamento térmico na alergenicidade e na história natural da alergia às proteínas de LV (APLV) e ao ovo.

Processamento dos alimentos e alergenicidade

• Alergénios alimentares

Cada alimento consiste numa mistura de proteínas alergénicas que diferem na sua estabilidade térmica, propriedades fisico‑quimicas, resistência à digestão e potencial para induzir sensibilização IgE mediada13.

O processamento dos alimentos pode ser térmico (calor seco ou húmido) ou não térmico (germinação, fermentação, proteólise, ultrafiltração, armazenamento, desintegração mecânica e enzimática, descascamento, esmagamento e pasteurização)14,15.

O processamento térmico pode ser uma forma simples de reduzir a alergenicidade de alguns alimentos.

Quando uma proteína é desnaturada pelo calor, perde a maior parte da sua estrutura terciária, com a consequente destruição de vários dos locais de ligação aos anticorpos IgE16.

• Epitopos conformacionais e sequenciais

Os anticorpos IgE podem reconhecer epitopos localizados na superfície dos linfócitos B. Esses epitopos podem ser sequenciais ou conformacionais.

Os epitopos sequenciais, também conhecidos como lineares ou contínuos, envolvem um segmento proteico de aminoácidos sequenciais reconhecidos pela região variável do anticorpo. São termoestáveis, ou seja, resistentes ao processamento pelo calor.

Os epitopos conformacionais ou descontínuos compreendem aminoácidos não sequenciais, de diferentes regiões da proteína, que são aproximados pelo arranjo espacial da mesma, pelo que dependem da estrutura tridimensional proteica13. Esta dependência da estrutura tridimensional faz com que pequenas alterações nas pregas/dobras da molécula provoquem uma alteração no número de epitopos. Deste modo, se houver perda da estrutura tridimensional do alergénio, por desnaturação (pelo calor ou pela perda de pontes dissulfido) ou por digestão, verifica‑se uma diminuição da capacidade de ligação aos anticorpos IgE17,18.

Vários autores verificaram que crianças com APLV IgE mediada transitória tinham anticorpos IgE específicos para o leite, dirigidos primariamente para os epitopos conformacionais, enquanto as crianças com APLV IgE mediada persistente tinham uma proporção significativa dos seus anticorpos IgE dirigidos para epitopos sequenciais específicos 10,1820.

Jarvinen et al. também mostraram que as crianças que produzem anticorpos IgE dirigidos predominantemente para os epitopos conformacionais do ovomucoide (Gal d 1), apresentam maior probabilidade de ter alergia transitória ao ovo, enquanto as crianças com anticorpos IgE dirigidos predominantemente para os epitopos sequenciais tendem a ter alergia mais persistente10,21.

Nos doentes com alergia transitória ao ovo observou‑se uma menor ligação da IgE ao ovomucoide linearizado do que ao ovomucoide nativo. Por seu turno, nos doentes com alergia persistente ao ovo não se verificaram diferenças na ligação às duas estruturas do ovomucoide22.

Efeito do processamento térmico na alergenicidade

O processamento térmico pode alterar a alergenicidade dos alimentos, reduzindo‑a ou aumentando‑a, através de três mecanismos:

• Proteínas termolábeis vs termoestáveis

A confeção dos alimentos utilizando altas temperaturas pode reduzir a alergenicidade de muitas proteínas alimentares, provavelmente ao alterar a conformação das proteínas termolábeis, resultando na perda dos epitopos conformacionais14.

No caso do LV, a caseína (Bos d 8) e a albumina (Bos d 6) são proteínas termoestáveis, enquanto as proteínas do soro, α‑lactoalbumina (Bos d 4), β‑lactoglobulina (Bos d 5) e lactoferrina (Bos d LF) são termolábeis, sendo destruídas com o aquecimento do alimento.

Na alergia ao ovo, embora a ovalbumina (Gal d 2) seja a proteína mais abundante da clara de ovo, é sensível à desnaturação térmica, o que, consequentemente, diminui a sua alergenicidade23,24. Em contraste, o ovomucoide (Gal d 1) é termoestável e resiste à digestão das proteases, permanecendo solúvel após o seu aquecimento2326.

Sabe‑se que a tolerância ao ovo cozinhado precede a aquisição de tolerância ao ovo cru24. Um número considerável de doentes com alergia ao ovo reage à ingestão de ovo cru, mas tolera o ovo cozinhado, desde que este seja processado a elevadas temperaturas e durante um período de tempo adequado27,28.

Numa tentativa de avaliar o fator com maior influência na alergenicidade da clara de ovo, se a duração do aquecimento se a temperatura a que a clara é cozinhada, Shin et al. compararam a alergenicidade entre a clara frita e a clara cozida durante 10 minutos, cozida durante 30 minutos e cozida no forno durante 20 minutos a 170ºC.

A cozedura do ovo durante 30 minutos reduziu a alergenicidade da clara de forma mais significativa, concluindo‑se que a duração da cozedura teve uma maior influência na alergenicidade da clara do que a temperatura a que o ovo foi cozinhado26.

• Formação de pontes dissulfido

A formação de pontes dissulfido intermoleculares leva à agregação de moléculas, podendo alterar a ligação dos antigénios alimentares aos anticorpos IgE. No caso da β‑lactoglobulina, o seu aquecimento resulta na formação de pontes dissulfido e na sua subsequente ligação a outras proteínas alimentares, tornando‑a menos alergénica pela modificação da forma como é apresentada ao sistema imune14.

• Efeito matriz

A interação entre os alergénios alimentares e outros ingredientes contidos num alimento complexo, como proteínas, lípidos e hidratos de carbono, é conhecida como o efeito matriz e pode modificar a alergenicidade do alimento, aumentando‑a ou reduzindo‑a29.

Foi demonstrada uma diminuição marcada da solubilidade do ovomucoide, e assim da sua antigenicidade, quando a clara de ovo foi misturada com farinha de trigo e cozinhada a 180ºC durante 10 minutos, simulando o processo de fabrico de pão30.

Noutro estudo, verificou‑se que a adição de farinha de trigo ao ovo promoveu uma diminuição da alergenicidade do ovomucoide que variou de acordo com o tempo de cozedura. O aquecimento durante 30 minutos levou a uma redução mais significativa da alergenicidade do ovomucoide do que o aquecimento durante 10 minutos, indicando que a clara de ovo deve ser aquecida durante um maior período de tempo, mesmo na presença de farinha de trigo31.

O mecanismo que leva a esta diminuição da alergenicidade do ovomucoide, conjugando o aquecimento do ovo com a presença de farinha de trigo, ainda não é conhecido32.

Kato et al. sugeriram que o glúten presente na farinha de trigo se aglutinaria com as proteínas da clara de ovo, aumentando a insolubilidade das mesmas e, desse modo, diminuindo a antigenicidade da clara30.

Com o objetivo de examinar se o conteúdo lipídico da matriz poderia influenciar a dose cumulativa que desencadeia a reação e a gravidade da mesma em doentes alérgicos ao ovo, à semelhança do que acontece nos doentes com alergia ao amendoim29, Liebbers et al. avaliaram retrospetivamente 59 crianças submetidas a prova de provocação oral com ovo, as quais utilizaram alimentos com diferentes conteúdos lipídicos (pudim de baunilha, panqueca e carne picada). A influência do tipo de receita na dose desencadeante e na gravidade da reação não foi significativa, o que pode estar relacionado com o baixo teor lipídico do ovo quando comparado com o amendoim. O conteúdo lipídico da matriz pode não ser um fator relevante em todos os alimentos33.

O processamento térmico também pode ter o efeito oposto, aumentando a alergenicidade de alguns alimentos, quer através da formação de neoepitopos, como no caso do camarão14, quer pelo efeito matriz, como no caso do amendoim29, que pode levar à diminuição da digestão das proteínas alimentares, com a consequente preservação dos epitopos alergénicos, que ficam disponíveis para interação com o sistema imune no intestino13.

O aumento da alergenicidade do amendoim também pode resultar de um processo de glicação que induza a formação de agregados do seu alérgeno major (Ara h 2), que são mais resistentes à digestão gástrica e que se ligam mais eficazmente aos anticorpos IgE34.

Tolerância dos alimentos cozinhados na alergia ao LV e ao ovo

Na maioria das situações, a alergia ao LV e ao ovo não implica risco de vida, no entanto pode exercer uma influência negativa na qualidade de vida dos doentes e das suas famílias, pela dificuldade em manter uma dieta de evicção, sobretudo se persistir para além da infância.

A introdução de LV e de ovo cozinhados na dieta de crianças alérgicas poderia representar uma abordagem alternativa à indução de tolerância oral e à evicção total do alimento.

É apresentada uma revisão dos vários ensaios clínicos que investigaram a tolerância ao LV e ao ovo cozinhados em crianças com alergia comprovada ou com suspeita da mesma.

REVISÃO DA LITERATURA

Leite de vaca

Nos vários estudos que abordam o processamento térmico do LV foram realizadas provas de provocação oral (PPO) com LV cozinhado a doentes com suspeita de APLV.

As populações destes estudos são muito heterogéneas, tendo sido incluídos indivíduos com APLV IgE mediada, doentes sensibilizados e doentes sem história de alergia ao LV mas com valores de IgE específica (sIgE) e de testes cutâneos (TC) altamente preditivos de uma eventual reatividade clínica11,12,35. Estes valores de decisão para a sIgE e para os TC baseiam‑se em estudos previamente publicados, mas são muito variáveis entre os diferentes autores e populações3638.

Apenas num dos estudos citados, de tipo retrospetivo, todos os doentes tinham reação prévia confirmada ao LV39.

Nos doentes cuja APLV tinha sido confirmada, a reacção ao LV poderia ter ocorrido entre 6 meses11,12 a 2 anos35 antes da sua inclusão no estudo, pelo que, à data da PPO com LV cozinhado, alguns dos doentes poderiam já ter adquirido tolerância natural ao LV, o que pode ter enviesado os resultados apresentados.

As PPO foram realizadas em crianças com mais de 2 anos11,12, mais de 3 anos39 e mais de 4 anos35, o que obriga a uma interpretação cuidadosa dos resultados, dado que, de acordo com a evolução habitual da APLV, a aquisição natural de tolerância nestas faixas etárias é muito provável. Assim, os resultados obtidos não podem ser extrapolados para populações mais jovens.

Nas PPO foram utilizados muffins, waffles, piza de queijo e pudim de arroz, cozinhados entre 13 a 90 minutos e foram todas realizadas em modelo aberto. A quantidade de proteína de LV utilizada variou entre 2,6 e 4,6 g para o LV cozinhado e os 8 a 10 g para o LV cru11,12,35,3940.

Estes estudos foram desenhados de forma a reproduzir a quantidade de proteína de LV ingerida em produtos cozinhados em situações de vida real e, na prática, não é fácil criar produtos cozinhados com a mesma quantidade de proteínas utilizada nas PPO com LV cru que apresentem uma textura agradável. Os autores admitem que o facto de terem utilizado doses mais baixas de LV nas PPO com LV cozinhado relativamente às PPO com LV cru possa ter sido um fator de confundimento em alguns dos indivíduos. No entanto, mais de 80% das crianças provocadas com o LV cozinhado reagiu a doses inferiores às administradas durante as provas12.

Numa análise global, o fenótipo mais grave, no qual a APLV tem uma maior duração temporal, com alergia ao LV cozinhado e cru, foi observado em 17‑28% (Quadro 1) dos indivíduos provocados com LV cozinhado e associou‑se a uma maior frequência de reação sistémica, com necessidade de utilização de adrenalina intramuscular11,12, 3641.

A maioria dos indivíduos provocados (72‑83%) tolerou a ingestão de LV cozinhado, pelo que os vários autores concluíram que grande parte das crianças com APLV pertence ao fenótipo ligeiro11,12,35,3940.

Os doentes que reagiram ao LV cozinhado mantiveram indicação para evicção total de LV e derivados (17 a 28%).

Dois autores repetiram posteriormente a PPO a alguns destes doentes, tendo observado tolerância ao LV cozinhado em 8% dos casos ao fim de 1 ano35 e em 23% passados 3 anos11.

Apesar das limitações referidas, os resultados encontrados reforçam a premissa de que a tolerância ao LV cozinhado deverá ser considerada um marcador da heterogeneidade clinica e imunológica dos doentes com APLV12.

Preditores de tolerância ao LV cozinhado

Os vários autores tentaram definir critérios clínicos e imunológicos que permitissem identificar os indivíduos com a maior probabilidade de tolerância ao LV cozinhado.

• Preditores clínicos História clínica

No trabalho de Nowak et al., a história clínica não demonstrou ter grande utilidade na distinção entre os doentes que toleraram e os que reagiram ao LV cozinhado, uma vez que não foram observadas quaisquer diferenças clínicas entre os dois grupos12. Já o grupo de Mehr et al. identificou como fatores de risco para reatividade clínica ao LV cozinhado a existência de antecedentes de asma, de asma com necessidade de terapêutica preventiva, de reação IgE mediada a mais de três grupos alimentares e de uma história prévia de anafilaxia ao LV41.

Anafilaxia

Nowak et al. não observaram diferenças entre o grupo que reagiu com anafilaxia e a restante população do estudo relativamente a história prévia de asma, idade da criança, presença de queixas respiratórias na apresentação da APLV, história anterior de anafilaxia ao LV, diâmetro dos testes cutâneos por picada com LV ou valores de sIgE para LV12. No estudo de Meher et al., todos os doentes com anafilaxia ao LV cozinhado tinham história de asma com necessidade de terapêutica preventiva, alergia alimentar IgE mediada a mais de três grupos alimentares e antecedentes de anafilaxia a outros alimentos que não o LV41.

É referido pelos mesmos autores que algumas das discordâncias dos resultados entre estes dois estudos podem resultar da diferença da mediana de idades das coortes, de 7,5 e 5,2 anos, respetivamente41.

• Preditores imunológicos

Na série publicada por Nowak et al., verificou‑se que os doentes que toleraram o LV cozinhado apresentaram um menor diâmetro de pápula nos TC com o extracto comercial de LV e níveis mais baixos de sIgE para LV e caseína, quando comparados com a população reativa ao mesmo12.

No entanto, outro estudo não observou diferenças significativas nos resultados dos TC com LV e com caseína, nem nas sIgE para LV e caseína, entre o grupo que reagiu e o que tolerou o LV cozinhado39.

TC com o extrato comercial de LV Nowak et al verificaram que todos os doentes com um diâmetro de pápula inferior a 5mm nos TC com LV toleraram a ingestão de LV cozinhado. Contudo, este valor não pode ser utilizado de forma generalizada na prática clínica, porque, para além da grande variabilidade existente entre as diferentes populações de doentes, não foram incluídas crianças com menos de 2 anos, impedindo qualquer recomendação abaixo deste grupo etário12.

Bartnikas et al. sugerem que os TC com o extracto comercial de LV foram o melhor marcador preditivo do resultado da PPO com LV cozinhado, quando comparados com os TC com a caseína e com as sIgE para LV e caseína.

A avaliação laboratorial e dos TC foi efetuada entre 3 meses a 1 ano antes da prova de provocação oral e a tolerância prévia ao LV cozinhado era desconhecida em alguns doentes, pelo que a interpretação destes resultados levanta questões relativas à existência prévia de um verdadeiro quadro de alergia alimentar IgE mediada ao LV39.

TC com LV cozinhado em natureza

Faraj et al. realizaram TC em natureza utilizando LV cozinhado, em 14 doentes com idade superior a 5 anos e com TC positivos com o extrato comercial do mesmo.

Os TC com o alimento em natureza foram negativos em todos os doentes. Procede ‑se à introdução de LV cozinhado na dieta, que decorreu com boa tolerância em todos os casos. Apesar de a amostra ser pequena e os dados insuficientes para permitir o cálculo dos valores preditivos, da sensibilidade e especificidade do teste, os autores consideram que os resultados são promissores e que este método pode vir a ser utilizado como um marcador fiável de tolerância ao LV cozinhado42. No entanto, estes resultados não foram confirmados no estudo de Mehr et al.41.

IgE específica para LV

No trabalho de Nowak el al.12 todos os doentes com sIgE indetetável para LV toleraram o LV cozinhado, o que já não se verificou no estudo de Bartnikas et al.39, no qual um doente com sIgE negativa reagiu à sua ingestão.

Em geral, a maioria dos autores encontrou valores mais elevados nas medianas das sIgE para o LV no grupo que reagiu à PPO com o LV cozinhado, relativamente ao grupo que não reagiu, apesar de não ter sido possível avançar com valores de cut off nem pontos de decisão12,35,39,40.

Importa ainda salientar que os valores de sensibilidade e especificidade encontrados para as sIgE de LV são demasiado baixos para permitir a identificação de doentes tolerantes ao LV cozinhado39.

IgE específica para caseína

A sIgE para caseína foi identificada como o melhor componente diagnóstico da APLV IgE mediada43.

Suportando esta afirmação, o trabalho de Caubet et al. reportou que a sIgE para caseína foi mais precisa na previsão da reatividade ao LV cozinhado, quando comparada com a sIgE para LV ou para a betalactoglobulina, concluindo que a medição quantitativa da sIgE de caseína pode ser útil na monitorização dos doentes com APLV.

Fixaram como ponto de decisão positivo o valor de 20,2 KU/L, sugerindo que valores superiores aumentariam a probabilidade de reação à ingestão de LV cozinhado40.

Também Ford et al mostrou que a sIgE para caseína pode ser utilizada para diferenciar os dois fenótipos de APLV IgE mediada, porque as suas medianas apresentaram diferenças estatisticamente significativas entre os grupos.

No entanto, não avançou com quaisquer valores de referência que permitissem a distinção destas duas populações35.

Em oposição, Bartnikas et al. verificou que o doseamento de sIgE para caseína apresentou baixa sensibilidade e especificidade na identificação de indivíduos que pudessem vir a tolerar o LV cozinhado39.

Teste de ativação dos basófilos

No único trabalho que avaliou a ativação espontânea dos basófilos, comparando‑a entre doentes que toleraram e doentes que reagiram ao LV cozinhado, verificou‑se que a mesma foi maior na população que reagiu ao LV cozinhado e que tinha manifestações clínicas mais graves.

Realca‑se que não foi possível estabelecer limiares para identificar os respondedores35.

• Ingestão de LV cozinhado pelos tolerantes Segurança

A ingestão diária de LV cozinhado após PPO negativa com o mesmo demonstrou ser um procedimento prático e seguro.

Nos vários estudos avaliados, o número de reacções adversas no domicílio rondou os 10%, não havendo referência a reações graves 11,39. Os autores consideraram que as reações ocorreram pelo facto de o LV não estar devidamente cozinhado, embora apenas uma minoria tenha repetido a PPO em meio hospitalar11,39.

Qualidade de vida

É assumido pelos autores que a ingestão diária de LV cozinhado melhora substancialmente a qualidade de vida dos doentes, ao permitir uma alimentação mais diversificada e ao diminuir a ansiedade da família relativamente às ingestões acidentais11,12.

Efeitos na saúde

Não foram observados efeitos desfavoráveis no crescimento estaturoponderal destes doentes após uma avaliação seriada dos seus parâmetros antropométricos.

Numa tentativa de monitorizar eventuais respostas subclínicas de hipersensibilidade gastrointestinal, procedeu‑se à medição da depuração urinária de açúcares não metabolizados (razão lactulose/manitol), que não revelou alterações com a ingestão diária de LV cozinhado11,12.

As doenças alérgicas preexistentes (asma, rinite e eczema) não sofreram agravamento com a ingestão diária de LV cozinhado11.

No estudo de Kim et al, foi diagnosticada esofagite eosinofílica a 7 doentes, 2 incluídos no grupo ativo e 5 no grupo de controlo. Um dos dois doentes do grupo ativo estava em evicção de LV cozinhado por PPO positiva com o mesmo, pelo que 6 dos 7 doentes se encontravam em evicção total de LV à data do diagnóstico, levando os autores a concluir que a esofagite eosinofílica não estaria relacionada com o LV11.

Alterações imunológicas

O consumo de LV cozinhado associou‑se a uma diminuição estatisticamente significativa do diâmetro médio de pápula dos TC com o LV, a uma diminuição das sIgE para caseína e betalactoglobulina e a um aumento da IgG4 para caseína11,12.

Efeito na história natural da APLV: tolerância ao LV cru

A ingestão diária de produtos contendo LV cozinhado pareceu acelerar a aquisição de tolerância ao LV cru. Kim et al comparou a evolução, ao longo de 5 anos, de dois grupos de crianças, um grupo que tolerou a ingestão de LV cozinhado e recebeu a indicação de manter a sua ingestão regular e um grupo controlo, que seguiu a abordagem clássica, permanecendo em dieta de evicção de LV. No final do estudo, 59% das crianças do grupo ativo e 22% do grupo controlo toleravam LV cru, o que levou os autores a concluir que a ingestão diária de LV cozinhado poderia ter contribuído para acelerar a aquisição de tolerância ao LV cru. Estes resultados sugerem que existe vantagem na manutenção da ingestão de LV cozinhado, quando comparada com a evicção completa11.

A ingestão de LV cozinhado parece ser uma opção segura e representa uma mudança no paradigma da abordagem clássica da APLV IgE mediada, que preconizava a evicção total do LV.

Até à data não foram identificados marcadores fiáveis que permitam identificar os doentes com maior probabilidade de tolerar LV cozinhado, pelo que a PPO se mantém essencial na abordagem e diagnóstico destes doentes.

Ovo

Nos vários estudos que avaliaram a tolerância ao ovo cozinhado, entre 64 a 93% das crianças provocadas tolerou a sua ingestão (Quadro 2).

Tal como no caso do LV, deparamo‑nos com diferenças metodológicas importantes entre os estudos. As populações selecionadas são demasiado heterogéneas, mesmo dentro do mesmo estudo, tendo sido incluídos desde doentes sem sintomas com a ingestão de ovo, que estavam em evicção por sIgE elevada para clara27 ou por eczema atópico27,44, a doentes sem ingestão prévia de ovo45,46. A alergia ao ovo IgE mediada só foi documentada em alguns dos estudos e nem sempre na totalidade da amostra29,45,4750.

Dos doze trabalhos citados neste artigo, o doseamento de sIgE para ovomucoide fez‑se em cinco, para a clara de ovo em 6 e os testes cutâneos com clara de ovo em cinco. Esta disparidade de procedimentos não permite a comparação dos resultados entre os estudos.

A maioria das PPO abertas com o ovo cozinhado, foram efetuadas utilizando muffins, waffles ou bolo. As receitas podem ser encontradas em algumas das publicações4648.

Na provocação com o ovo cru foram utilizadas rabanadas, ovo mexido29 e panados50. Esta PPO foi realizada em menos de metade dos estudos (Quadro 2). O conteúdo proteico utilizado oscilou entre 2,2 a 10 g para a clara cozinhada e entre 2,6 a 6,5 g para a clara crua. Os autores tentaram utilizar uma quantidade de proteínas de ovo que se aproximasse da que é habitualmente ingerida na dieta ocidental, de modo a facilitar o dia a dia destas crianças. Embora o conteúdo proteico das PPO realizadas com ovo cozinhado seja menor do que o das PPO com ovo cru, essas quantidades são equivalentes às encontradas nos alimentos comercializados e confeccionados no domicílio29. Cerca de 71% das reações com ovo cozinhado ocorreram antes de se alcançar 50% da dose prevista para a PPO53e 75% das crianças reagiram com uma dose de ovo cru igual ou inferior à usada para a PPO com ovo cozinhado29. Em geral, o ovo foi cozinhado numa matriz de trigo.

Nos estudos que não utilizaram a matriz de trigo, as PPO foram efetuadas com clara cozida46 e clara cozida liofilizada27,52, não se tendo verificado um maior número de reações à clara cozinhada nestes doentes, quando comparados com os doentes das outras séries, o que sugere que a ausência do efeito matriz não terá influenciado negativamente o resultado das PPO.

Grande parte das PPO com a clara cozinhada foram realizadas em crianças com mais de 12 meses de idade.

Nos trabalhos que apresentam as taxas de tolerância mais elevadas à clara cozinhada, verificou‑se que 41% a 100% da população não tinha exposição prévia ao ovo, podendo estar apenas sensibilizada ao mesmo45,46. A tolerância ao ovo foi avaliada de forma repetida ao longo de 3 anos, durante os quais alguns doentes foram submetidos a mais de uma PPO47.

Preditores de tolerância ao ovo cozinhado

• Preditores clínicos História clínica

Não foi possível distinguir os doentes que reagiram à clara cozinhada dos que a toleraram com base na história clínica ou nas reações prévias à ingestão do ovo53.

Uma história clínica de anafilaxia ao ovo não foi preditiva de reação ao ovo cozinhado29,48, tendo‑se verificado que o mesmo foi bem tolerado em 71% dos doentes com este antecedente49. Por outro lado, 22% dos doentes sem história clínica de reação ao ovo tiveram anafilaxia48.

A coexistência de asma e de outras doenças atópicas não teve qualquer influência negativa nos resultados das PPO48,49.

A influência da alergia alimentar a outros alimentos nos resultados das PPO com clara cozinhada não é consensual.

Numa população com idade superior a 5 anos, a existência de alergia a outros alimentos parece ter aumentado significativamente o risco de reação ao ovo cozinhado54. Noutros estudos, não demonstrou ser um fator de risco para anafilaxia à clara cozinhada49 nem útil para prever o resultado da PPO com o ovo cozinhado48.

No entanto, a alergia alimentar a mais de três grupos de alimentos parece aumentar a probabilidade de uma PPO positiva à clara cozinhada49.

Anafilaxia

Nos diferentes estudos, a frequência de anafilaxia variou entre 2,6 e 33 % nos indivíduos reativos (esta última percentagem reporta‑se a um trabalho no qual um de três doentes teve uma reação anafilática) para o ovo cozinhado e 1,6 e 23 % para o ovo cru. Todas as PPO foram realizadas em meio hospitalar, não se tendo observado reações bifásicas44.

Na série que apresenta a taxa mais baixa de anafilaxia foi utilizada clara cozinhada liofilizada, à qual tinha sido retirado o ovomucoide, tornando‑a mais hipoalergénica27.

A tolerância ao ovo cozinhado não permitiu prever com fiabilidade a gravidade da reação ao ovo cru, uma vez que cerca de 23% dos doentes com tolerância à clara cozinhada tiveram anafilaxia após a ingestão de ovo cru29,47.

Na alergia ao ovo não parece haver efeito matriz, atendendo ao facto não se ter verificado um maior número de casos de anafilaxia nas PPO efetuadas sem efeito matriz27,46,52.

Preditores imunológicos

Os vários autores tentaram explorar a utilidade dos testes cutâneos e serológicos na predição da tolerância à clara cozinhada.

Konstantinou et al não observaram diferenças nos TC nem no doseamento de sIgE para a clara entre os doentes com tolerância e os que reagiram ao ovo cozinhado45.

Lemon‑Mule et al. também não identificaram preditores clínicos nem imunológicos de tolerância ao ovo cozinhado.

Nenhum dos parâmetros avaliados, nomeadamente uma história clinica de anafilaxia, TC com clara, sIgE para clara, ovomucoide ou ovalbumina alcançou um valor preditivo suficientemente alto para identificar as crianças com alergia ao ovo que poderiam tolerar o ovo cozinhado29.

Testes cutâneos com extrato comercial de clara de ovo

Existem resultados divergentes entre os estudos sobre a utilidade dos TC com extrato comercial de clara de ovo na distinção dos doentes que vão tolerar ou reagir à PPO com clara cozinhada.

Alguns autores verificaram que os diâmetros de pápula eram superiores nos doentes que reagiram à clara cozinhada29,44,47 e que TC com um diâmetro superior a 10 mm seriam um forte indicador de PPO positiva com clara cozinhada54. No entanto, o valor preditivo positivo dos TC com a clara, no que concerne à previsão do resultado da PPO com clara cozinhada, é baixo, pelo que a sua utilidade na prática clínica é limitada44,48.

Testes cutâneos com clara cozinhada em natureza

Faraj et al. efetuaram TC em natureza com clara cozinhada em doentes com mais de 5 anos de idade e que apresentavam TC positivos com o extrato comercial de clara. Os TC com clara cozida em natureza foram negativos em 40 doentes submetidos a PPO com clara de ovo cozinhada. A PPO foi positiva em 3 doentes, tendo sido necessário administrar adrenalina intramuscular em 2. O valor preditivo negativo dos testes cutâneos com o alimento cozinhado foi de 94,8%, pelo que os autores propuseram que este procedimento poderia vir a ser útil como marcador de tolerância ao ovo cozinhado42.

IgE específica para ovomucoide

Urisu et al. 25 avaliaram as sIgE dos doentes que realizaram PPO com clara cozinhada e mostraram que os doentes que reagiram à clara cozinhada tinham níveis mais altos de sIgE para clara e ovomucoide de que os tolerantes.

Relativamente à clara crua, os doentes com PPO positiva apresentavam sIgE mais altas para clara do que os que toleraram todas as formas de ovo e uma tendência para níveis de sIgE de ovomucoide mais altos, embora se tenha observado uma sobreposição de valores entre os dois grupos.

Por outro lado, todos os doentes que toleraram a clara crua, exceto um, tinham valores de sIgE para ovomucoide mais baixos. Os autores concluíram que a sIgE para ovomucoide poderia vir a ser usada no futuro para predizer a evolução da alergia ao ovo.

No estudo de Ando et al., o doseamento de sIgE para ovomucoide demonstrou melhor performance no diagnóstico de alergia ao ovo cozinhado, quando comparado com o doseamento das sIgE de clara e de ovalbumina.

Neste estudo, a gravidade da alergia à clara de ovo associou‑se também a níveis mais altos de sIgE para clara, ovalbumina e ovomucoide52.

Haneda et al. propuseram que os níveis de sIgE de ovomucoide fossem utilizados como um marcador de tolerância ao ovo cozinhado. Foi observado que o doseamento da sIgE de ovomucoide foi negativo em 88% dos doentes (21 em 24) com PPO negativa com a clara cozinhada.

Mesmo que a sIgE ovomucoide seja negativa, os autores recomendam a realização das PPO em meio hospitalar por razões de segurança, uma vez que três dos doentes com sIgE negativa reagiram à ingestão de ovo cozinhado com queixas cutâneas ligeiras46.

Noutro trabalho, 35% (9 em 26) dos doentes com sIgE negativa para ovomucoide reagiram à ingestão de ovo cozinhado. Todos estes doentes tinham TC positivos com clara e 78% tinham sIgE aumentada para a clara de ovo.

Não pôde ser estabelecido um valor preditivo positivo superior a 90% para a sIgE de ovomucoide. Os autores concluem que o doseamento da sIgE do ovomucoide não é superior à medição da sIgE da clara, nem aos TC com a mesma, não devendo substituir estes testes diagnósticos44.

O doseamento de sIgE para ovomucoide não permite identificar as crianças que vão tolerar o ovo cozinhado29.

IgE específica clara

Os doentes que tiveram PPO positiva com a clara cozinhada demonstraram níveis mais elevados de sIgE para clara do que os tolerantes29,47, tendo estes níveis mais altos estado associados a uma alergia mais persistente ao ovo cozido e cru47.

A sIgE para clara demonstrou inclusive uma melhor performance na identificação dos doentes que vão tolerar a clara crua do que a sIgE para o ovomucoide e para a ovalbumina52.

Lieberman et al. encontraram diferenças estatisticamente significativas nos níveis de sIgE da clara entre o grupo dos tolerantes e o grupo dos reativos à clara cozinhada, tendo avançado com valores preditivos. Verificaram que indivíduos com valores de sIgE inferiores a 2,5 KU/L, que reagiram à ingestão da clara cozinhada, tiveram apenas sintomas ligeiros, que cederam ao tratamento com anti‑histaminicos53.

Outros estudos não mostraram diferenças significativas nos valores de sIgE para clara entre os doentes com tolerância e os que reagiram ao ovo cozinhado29,45,48, uma vez que indivíduos com valores muito baixos de sIgE para clara reagiram positivamente à PPO com a mesma, incluindo uma criança com um valor de sIgE de 1,52 KU/L que teve uma reação anafilática. Os autores concluíram que este exame não pareceu ser um fator preditivo confiável do resultado da PPO com a clara cozinhada48.

• Introdução de ovo cozinhado no domicílio

Foram publicadas guidelines sobre alergia ao ovo que recomendam a introdução do ovo cozinhado do domicílio em crianças com mais de 2‑3 anos, sem asma e que tenham tido reações cutâneas ligeiras, sem sintomas respiratórios, gastrointestinais ou circulatórios55.

No entanto, outros autores recomendam que a introdução da clara cozinhada seja sempre efetuada em meio hospitalar, porque alguns doentes sem história prévia de reação grave48 ou com reações prévias ligeiras 49,53 tiveram anafilaxia na PPO com clara cozinhada.

• Ingestão de ovo cozinhado pelos tolerantes Segurança

A ingestão prolongada de clara cozinhada demonstrou ser um processo seguro e bem tolerado29,47.

De facto, na maioria dos trabalhos que avaliaram a tolerabilidade da ingestão continuada do ovo cozinhado não se observaram reacções adversas agudas no domicílio29,47.

No entanto, no estudo de Turner et al., duas de 150 crianças com PPO negativa (1,3 %) apresentaram queixas abdominais no domicílio. Não está descrito se repetiram a PPO nem se suspenderam a ingestão de ovo cozinhado49.

Qualidade vida

A ingestão de ovo cozinhado melhorou substancialmente a qualidade vida dos doentes e das suas famílias50.

Efeitos na saúde

Tal como com a ingestão de LV cozinhado, não foram observados efeitos adversos no peso, altura, índice de massa corporal e permeabilidade intestinal nos doentes que ingeriram diariamente ovo cozinhado29.

Não se verificou agravamento clínico das doenças alérgicas subjacentes (asma brônquica, rinite alérgica e eczema atópico) com a ingestão regular do ovo cozinhado29,47.

Não há relato de desenvolvimento de EE nos doentes que mantiveram a ingestão de ovo cozinhado47.

Alterações imunológicas

A evolução, ao longo tempo, do diâmetro da pápula dos TC com a clara de ovo não é unânime entre os autores, o que pode ser explicado em parte pelas diferenças de metodologias usadas.

Em dois estudos, um realizado ao longo de doze meses, sem grupo controlo, e outro com três anos de duração e com grupo controlo, o diâmetro da pápula foi diminuindo ao longo do tempo29,47.

Num estudo retrospetivo, com onze anos de duração, com um grupo controlo, no qual foi avaliada a associação entre a frequência da ingestão de ovo cozinhado e o declínio do diâmetro da pápula dos TC para o ovo e em que foram incluídos indivíduos com história clínica de reação ao ovo, não se verificou qualquer diferença na taxa média de declínio do tamanho dos TC entre o grupo que ingeriu e o que evitou o ovo50.

Relativamente à monitorização das sIgE para clara, ovalbumina29 e ovomucoide47 verificou‑se uma diminuição progressiva dos seus níveis ao longo do tempo.

Observou‑se um aumento da IgG4 da ovalbumina e do ovomucoide29,47 nestes doentes, fenómeno semelhante ao que ocorre durante a imunoterapia específica com aeroalergénios e com veneno de himenópteros. Apesar de o papel da IgG4 na aquisição de tolerância ainda ser objeto de debate, o seu aumento pode ser um indicador da mesma.

Efeito da ingestão de ovo cozinhado na tolerância ao ovo cru

Estudos recentes sugerem que a ingestão regular de ovo cozinhado pode levar a uma imunomodulação semelhante à que ocorre nos processos de desenvolvimento de tolerância, podendo ser benéfica na resolução da alergia ao ovo29,45. Estes estudos advogam que a ingestão regular de ovo cozinhado pode acelerar a aquisição de tolerância ao ovo cru; no entanto foram realizados sem grupo controlo, não permitindo avaliar o significado dos seus resultados.

Num trabalho que incluiu um grupo de controlo retrospectivo constituído por indivíduos em evicção de ovo verificou‑se que os indivíduos que toleravam o ovo cozinhado desenvolviam tolerância mais precoce ao ovo cru (cerca de 16 meses mais cedo) do que os que reagiam inicialmente ao ovo cozinhado. A maioria (60%) dos doentes reativos ao ovo cozinhado desenvolveu tolerância ao ovo cru, mais cedo e em maior proporção do que os indivíduos do grupo controlo, pelo que se concluiu que a ingestão de ovo cozinhado parece acelerar a aquisição de tolerância ao ovo cru47.

CONCLUSÃO

Após a avaliação dos resultados dos estudos citados conclui‑se que nos doentes com alergia IgE mediada ao LV e ao ovo, que tolerem os alimentos na sua forma cozinhada, a ingestão dos mesmos parece ser segura e bem tolerada, sem efeitos secundários associados, nomeadamente sem interferência no crescimento, na permeabilidade intestinal e sem agravamento das doenças alérgicas preexistentes.

Não se sabe se a ingestão de LV ou de ovo cozinhados altera a história natural da alergia alimentar quando comparada com a evicção total do alimento, nem está provado que esta ingestão acelere a aquisição de tolerância ao alimento cru.

A introdução do LV e do ovo cozinhados deve ser sempre feita em ambiente hospitalar na presença de pessoal médico especializado. Não há indicadores seguros que permitam recomendar a introdução dos alimentos cozinhados no domicílio.

Os fenótipos de APLV e de alergia ao ovo IgE mediadas não estão ainda bem definidos. Não foram encontrados bons preditores de tolerância ao LV ou ao ovo cozinhados.

Nem o doseamento de sIgE nem os TC com extrato comercial ou com o alimento cozinhado são fiáveis na identificação de crianças que possam vir a tolerar LV ou ovo cozinhados.

Dado que os preditores de tolerância ao LV e ovo cozinhados são limitados, a PPO permanece o único meio de estabelecer, de forma conclusiva, a tolerância aos alimentos.

 

REFERÊNCIAS

1. Sicherer SH. Food Allergy. Mount Sinai J Medicine 2011;78:683‑96.         [ Links ]

2. Branum AM, Lukacs SL. Food allergy among children in the United States. Pediatrics 2009; 124: 1549‑55.         [ Links ]

3. Rona RJ, Keil T, Summers C, Gislason D, Zuidmeer L, Sodergren E, et al. The prevalence of food allergy: A meta‑analysis. J Allergy Clin Immunol. 2007; 120: 638‑46.         [ Links ]

4. Wood RA. The natural history of food allergy. Pediatrics 2003; 111(6 Pt 3):1631‑7.         [ Links ]

5. Bishop JM, Hill DJ, Hosking CS. Natural history of cow milk allergy: clinical outcome. J Pediatr 1990; 116: 862‑7.         [ Links ]

6. Savage JH, Matsui EC, Skripak JM, Wood RA. The natural history of egg allergy. J Allergy Clin Immunol 2007; 120:1413‑7.         [ Links ]

7. Skripak JM, Matsui EC, Mudd K, Wood RA. The natural history of IgE‑mediated cow’s milk allergy. J Allergy Clin Immunol 2007; 120:1172‑7.         [ Links ]

8. Leonard SA, Nowak‑Węgrzyn A. Re‑defining food allergy phenotypes and management paradigm: is it time for individualized egg allergy management? Clin Exp Allergy 2011; 41, 609‑11.         [ Links ]

9. Sicherer SH, Sampson HA. Food allergy: recent advances in pathophysiology and treatment. Annu Rev Med 2009; 60:261‑77.         [ Links ]

10. Järvinen KM, Beyer K, Vila L, Bardina L, Mishoe M, Sampson HA. Specificity of IgE antibodies to sequential epitopes of hen’s egg ovomucoid as a marker for persistence of egg allergy. Allergy 2007;62;758‑65.         [ Links ]

11. Kim J, Nowak‑Wegrzyn A, Sicherer SH, Noone S, Moshier E, Sampson H . D ietary b aked m ilk a ccelerates t he r esolution of cow’s milk allergy in children. J Allergy Clin Immunol 2011; 128:125‑131.         [ Links ]

12. Nowak‑Wegrzyn A, Bloom KA, Sicherer SH, Shreffler WG, Noone S, Wanich N, et al. Tolerance to extensively heated milk in children with cow’s milk allergy. J Allergy Clin Immunol. 2008;122 (2): 342‑7.         [ Links ]

13. Nowak‑Wegrzyn A, Fiocchi A, Rare, medium, or well done? The effect of heating and food matrix on food protein allergenicity. Curr Opin Allergy Clin Immunol 2009; 9: 234‑7.         [ Links ]

14. Thomas K, Herouet‑Guicheney C, Ladics G, Bannon G, Cockburn A, Crevel R, et al. Evaluating the effect of food processing on the potential human allergenicity of novel proteins: international workshop report. Food Chem Toxicol 2007; 45: 1116‑22.         [ Links ]

15. Fiocchi A, Restani P, Riva E, Restelli AR, Biasucci G, Galli CL, et al. Meat allergy: II. Effects of food processing and enzymatic digestion on the allergenicity of bovine and ovine meats. J Am Coll Nutr 1995;14: 245‑50.         [ Links ]

16. Coombs RR, McLaughlan P. Allergenicity of food proteins and its possible modification. Ann Allergy 1984;53:592‑6.         [ Links ]

17. Pomés A. Relevant B Cell Epitopes in Allergic Disease. Int Arch Allergy Immunol 2010;152:1-11.         [ Links ]

18. Chatchatee P, Järvinen K‑M, Bardina L, Vila L, Beyer K, Sampson HA. Identification of IgE and IgG binding epitopes on β‑and κ‑casein in cow’s milk allergic patients. Clin Exp Allergy 2001;31:1256‑62.         [ Links ]

19. Chatchatee P, Järvinen KM, Bardina L, Beyer K, Sampson HA. Identification of IgE‑and IgG‑binding epitopes on alpha(s1)‑casein: differences in patients with persistent and transient cow’s milk allergy. J Allergy Clin Immunol 2001;107:379‑ 83.         [ Links ]

20. Vila L, Beyer K, Järvinen KM, Chatchatee P, Bardina L, Sampson HA. Role of conformational and linear epitopes in the achievement of tolerance in cow’s milk allergy. Clin Exp Allergy 2001;31(10):1599‑606.         [ Links ]

21. Järvinen KM, Beyer K, Vila L, Chatchatee P, Busse PJ, Sampson HA. B‑cell epitopes as a screening instrument for persistent cow’s milk allergy. J Allergy Clin Immunol 2002;110:293‑7.         [ Links ]

22. Cooke SK, Sampson HA. Allergenic properties of ovomucoid in man. J Immunol 1997;159:2026‑32.         [ Links ]

23. Teuber SS. Hypothesis: the protein body effect and other aspects of food matrix effects. Ann N Y Acad Sci 2002; 964: 111‑16.         [ Links ]

24. Gruber P, Becker WM, Hofmann T. Influence of the maillard reaction on the allergenicity of rAra h 2, a recombinant major allergen from peanut (Arachis hypogaea), its major epitopes, and peanut agglutinin. J Agric Food Chem 2005;53:2289‑96.         [ Links ]

25. Takagi K, Teshima R, Okunuki H, Sawada J. Comparative study of in vitro digestibility of food proteins and effect of preheating on the digestion. Biol Pharm Bull 2003;26: 969‑73.         [ Links ]

26. Bernhisel‑Broadbent J, Dintzis HM, Dintzis RZ, Sampson HA. Allergenicity and antigenicity of chicken egg ovomucoid (Gal d III) compared with ovalbumin (Gal d I) in children with egg allergy and in mice. J Allergy Clin Immunol 1994;93):1047‑59.         [ Links ]

27. Urisu A, Ando H, Morita Y, Wada E, Yasaki T, Yamada K, et al. Allergenic activity of heated and ovomucoid‑depleted egg white. J Allergy Clin Immunol 1997;100:171‑6.         [ Links ]

28. Shin M, Han Y, Ahn K. The influence of the time and temperature of heat treatment on the allergenicity of egg white proteins. Allergy Asthma Immunol Res 2013;5:96‑101.         [ Links ]

29. Lemon‑Mule H, Sampson HA, Sicherer SH, Shreffler WG, Noone S, Nowak‑Wegrzyn A. Immunologic changes in children with egg allergy ingesting extensively heated egg. J Allergy Clin Immunol 2008;122:977‑83.         [ Links ]

30. Eigenmann PA. Anaphylactic reactions to raw eggs after negative challenges with cooked eggs. J Allergy Clin Immunol 2000;105:587‑8.         [ Links ]

31. Kato Y, Watanabe H, Matsuda T. Ovomucoid rendered insoluble by heating with wheat gluten but not with milk casein. Biosci Biotechnol Biochem 2000;64: 198‑201.         [ Links ]

32. Shin M, Lee J, Ahn K, Lee SI, Han Y. The influence of the presence of wheat flour on the antigenic activities of egg white proteins. Allergy Asthma Immunol Res 2013;5:42‑7.         [ Links ]

33. Grimshaw KE, King RM, Nordlee JA, Hefle SL, Warner JO, Hourihane JO. Presentation of allergen in different food preparations affects the nature of the allergic reaction – a case series. Clin Exp Allergy 2003;33:1581-5.         [ Links ]

34. Libbers L, Flokstra‑de Blok BM, Vlieg‑Boerstra BJ, van der Heide S, van der Meulen GN, Kukler J, et al. No matrix effect in double‑blind, placebo‑controlled egg challenges in egg allergic children. Clin Exp Allergy 2013; 43: 1067‑70.         [ Links ]

35. Ford LS, Bloom KA, Nowak‑Węgrzyn AH, Shreffler WG, Masilamani M, Sampson HA. Basophil reactivity, wheal size, and immunoglobulin levels distinguish degrees of cow’s milk tolerance. J Allergy Clin Immunol 2013;131:180‑6.         [ Links ]

36. Garcia‑Ara C, Boyano‑Martínez T, Diaz‑Pena JM, Martin‑Munoz F, Reche‑Frutos M, Martin‑Esteban M. Specific IgE levels in the diagnosis of immediate hypersensitivity to cow’s milk protein in the infant. J Allergy Clin Immunol 2001; 107: 185‑90.         [ Links ]

37. Sampson HA, Ho DG. Relationship between food‑specific IgE concentrations and the risk of positive food challenges in children and adolescents. J Allergy Clin Immunol 1997; 100(4): 444‑51.         [ Links ]

38. Hill DJ, Hosking CS, Reyes‑Benito LV. Reducing the need for food allergen challenges in young children: a comparison of in vitro and in vivo tests. Clin Exp Allergy 2001; 31: 1031‑5.         [ Links ]

39. Bartnikas LM, Sheehan WJ, Hoffman EB, Permaul P, Dioun AF, Friedlander J, et al. Predicting food challenge outcomes for baked milk: role of specific IgE and skin prick testing. Ann Allergy Asthma Immunol 2012;109:309‑13.         [ Links ]

40. Caubet JC, Nowak‑Węgrzyn A, Moshier E, Godbold J, Wang J, Sampson HA. Utility of casein‑specific IgE levels in predicting reactivity to baked milk. J Allergy Clin Immunol 2013;131:222‑4.         [ Links ]

41. Faraj Z, Kim HL. Skin prick testing with extensively heated milk or egg products helps predict the outcome of an oral food challenge: a retrospective analysis. Allergy Asthma Clin Immunol 2012; 11;8:5.         [ Links ]

42. D’Urbano LE, Pellegrino K, Artesani MC, Donnanno S, Luciano R, Riccardi C, et al. Performance of a component‑based allergen‑microarray in the diagnosis of cow’s milk and hen’s egg allergy. Clin Exp Allergy 2010;40:1561‑70.         [ Links ]

43. Narisety SD, Skripak JM, Steele P, Hamilton RG, Matsui EC, Burks AW, et al. Open‑label maintenance after milk oral immunotherapy for IgE‑mediated cow’s milk allergy. J Allergy Clin Immunol 2009;124:610‑2.         [ Links ]

44. Bartnikas LM, Sheehan WJ, Larabee KS, Petty C, Schneider LC, Phipatanakul W. Ovomucoid is not superior to egg white testing in predicting tolerance to baked egg. J Allergy Clin Immunol Pract 2013;1:354‑60.         [ Links ]

45. Konstantinou GN, Giavi S, Kalobatsou A, Vassilopoulou E, Douladiris N, Saxoni‑Papageorgiou P, et al. Consumption of heat‑treated egg by children allergic or sensitized to egg can affect the natural course of egg allergy: hypothesis‑generating observations. J Allergy Clin Immunol 2008;122:414‑5.         [ Links ]

46. Haneda Y, Kando N, Yasui M, Kobayashi T, Maeda T, Hino A, et al. Ovomucoids IgE is a better marker than egg white‑specific IgE to diagnose boiled egg allergy. J Allergy Clin Immunol 2012;129:1681‑2.         [ Links ]

47. Leonard SA, Sampson HA, Sicherer SH, Noone S, Moshier EL, Godbold J, et al. Dietary baked egg accelerates resolution of egg allergy in children. J Allergy Clin Immunol 2012;130:473‑80.         [ Links ]

48. Cortot CF, Sheehan WJ, Permaul P, Friedlander JL, Baxi SN, Gaffin JM, et al. Role of specific IgE and skin‑prick testing in predicting food challenge results to baked egg. Allergy Asthma Proc 2012;33:275‑81.         [ Links ]

49. Turner PJ, Mehr S, Joshi P, Tan J, Wong M, Kakakios A, et al. Safety of food challenges to extensively heated egg in egg‑allergic children: a prospective cohort study. Pediatr Allergy Immunol2013;24:450‑5.         [ Links ]

50. Tey D, Dharmage SC, Robinson MN, Allen KJ, Gurrin LC, Tang ML. Frequent baked egg ingestion was not associated with change in rate of decline in egg skin prick test in children with challenge confirmed egg allergy. Clin Exp Allergy 2012;42:1782‑90.         [ Links ]

51. Clark A, Islam S, King Y, Deighton J, Szun S, Anagnostou K, et al. A longitudinal study of resolution of allergy to well‑cooked and uncooked egg. Clin Exp Allergy 2011;41:706‑12.         [ Links ]

52. Ando H, Movérare R, Kondo Y, Tsuge I, Tanaka A, Borres MP, et al. Utility of ovomucoid‑specific IgE concentrations in predicting symptomatic egg allergy. J Allergy Clin Immunol 2008;122:583‑8.         [ Links ]

53. Lieberman JA, Huang FR, Sampson HA, Nowak‑Węgrzyn A. Outcomes of 100 consecutive open, baked‑egg oral food challenges in the allergy office. J Allergy Clin Immunol 2012;129:1682‑4.         [ Links ]

54. Des Roches A, Nguyen M, Paradis L, Primeau MN, Singer S. Tolerance to cooked egg in an egg allergic population. Allergy 2006;61:900‑1.         [ Links ]

55. Clark AT, Skypala I, Leech SC, Ewan PW, Duqué P, Brathwaite N, et al. British Society for Allergy and Clinical Immunology guidelines for the management of egg allergy. Clin Exp Allergy 2010;40:1116‑29.         [ Links ]

 

Contacto:

Sónia Rosa

Hospital Dona Estefânia, Centro Hospitalar de Lisboa Central

Rua Jacinta Marto

1169‑045 Lisboa

 

Financiamento: Sem apoios financeiros a declarar.

 

Data de receção / Received in: 04/03/2015

Data de aceitação / Accepted for publication in: 20/01/2016

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons