INTRODUÇÃO
Entre as partículas biológicas presentes no ar encontram-se os grãos de pólen e os esporos de fungos que acabam por ter impactos na saúde 1,2.
Alergias e doenças respiratórias associadas representam um sério desafio de saúde de importância crescente em muitos países 2,3. As alergias ao pólen afetam até 40% da população em países industrializados e tornaram-se num problema global; 30% dos indivíduos atópicos apresentam sensibilização a um ou mais alergénios fúngicos2. Alguns Estados-Membros europeus consideram os grãos de pólen e os esporos de fungos como poluentes atmosféricos, bem como as partículas PM10, 2,5 suspensas no ar 1.
Atualmente, a monitorização de grãos de pólen e esporos de fungos do ar é assegurada por estações e/ou redes de aerobiologia dotadas de equipamentos fixos de captação de biopartículas 4.
O captador volumétrico de Hirst é o mais utilizado em todo o mundo para a monitorização de pólen e esporos do ar 4. Contudo, têm sido usadas diferentes metodologias na amostragem e análise dessas partículas biológicas 5. Como tal, e com o aumento global do número de redes relacionadas com a alergia, surgiu a necessidade de haver uma metodologia padronizada de monitorização, visando a harmonização, a validação e a confiabilidade dos dados aerobiológicos. Adicionalmente, tal padronização permite a comparação de dados de estações biogeográficas distintas e definir tendências de variação das épocas e intensidades polínicas/fúngicas.
Além disso, permite a construção de modelos de previsão, rastrear a resposta das plantas num clima em mudança e inferir a sua gravidade numa perspetiva clínica.
A RPA - Rede Portuguesa de Aerobiologia - não foi exceção, tendo adotado uma metodologia padronizada, com vista a garantir a qualidade dos dados aerobiológicos e da informação que transmite à população, residente e turística, que sofre de alergias (rinite, conjuntivite, asma e outras) e aos profissionais de saúde.
Em 2005 foi elaborado um documento técnico padronizado europeu que passou em 2019 a norma europeia, estando Portugal representado pelo Instituto Português da Qualidade. A referida norma, EN 16868:2019 1 especifica os procedimentos de amostragem contínua e análise das concentrações de grãos de pólen e de esporos de fungos presentes no ar ambiente usando o método volumétrico de tipo Hirst 6,7,8 para propósitos de redes ligadas à alergia.
Este trabalho visa descrever a metodologia que uma rede de aerobiologia ligada à alergia deve adotar, quanto à amostragem, análise de amostras, controlo de qualidade interno/externo e expressão de resultados das concentrações de grãos de pólen e/ou de esporos de fungos presentes no ar atmosférico tendo por base a atual Norma EN 16868:2019.
METODOLOGIA DE MONITORIZAÇÃO DE BIOAEROSSÓIS (GRÃOS DE PÓLEN E ESPOROS DE FUNGOS): MÉTODO VOLUMÉTRICO DE HIRST
Recolha da amostra
Segundo a Norma Europeia 16868:2019 (1), para a monitorização de grãos de pólen e/ou esporos de fungos com capacidade alergénica, as redes de âmbito alergológico devem utilizar o captador volumétrico de Hirst e a metodologia associada, basicamente o recomendado pela IAA - International Association for Aerobiology - e pela EAS - European Aerobiology Society 7,9,10 - e que a RPA segue 3,11,12.
O coletor utilizado é um captador volumétrico de tipo Hirst, um coletor de sucção baseado no princípio básico de impacto. A Figura 1 mostra um desses coletores da versão comercial BURKARD, Rickmansworth, Herst., Reino Unido. Existem comercialmente outros (fabricados pela Lanzoni s.r.l., Itália: VPPS 2000 e VPPS 2021 e fabricado pela Burkard scientific Co, Ltd, UK, o Burkard Scientific 2000). Existem 2 (duas) versões de coletores do tipo Hirst, de 7 dias e de 24 horas de amostragem (1).

Figura 1 Coletor do tipo Hirst um Burkard 7-Day Volumetric spore trap (1 catavento; 2 tampa; 3 protetor de chuva; 4 orifício; 5 bloqueio de rotações; 6 localização do motor) (13 modificado).
O coletor (Figura 1) é um aparelho de metal constituído essencialmente por três unidades: 1) motor, a bomba de vácuo; 2) unidade ou secção de impacto (“cabeça” do coletor); e 3) catavento. Este sistema completo de amostragem ou coletor terá de ser resistente à corrosão, bem preso (resistente ao vento) e sempre horizontal (ao nível da cabeça). Para fins alergológicos (1), os seguintes requisitos e condições de posicionamento do coletor devem ser cumpridos:
a) O coletor deve ser colocado numa superfície horizontal, plana e de fácil acesso. Deve estar no topo de um edifício e afastado da borda do edifício para reduzir o efeito da turbulência;
b) Garantir que os edifícios adjacentes não protegem o coletor ou influenciam o fluxo de ar. O aparelho deve ser colocado idealmente na cobertura de um edifício a mais de 2 m da bordadura; a altura acima do nível do solo depende da localidade e da altura dos edifícios vizinhos;
c) O coletor deve ser elevado entre 1 m e 1,5 m do solo do topo do edifício, para evitar o atrito entre as camadas de ar e a possível ressuspensão e/ou contaminação de partículas do solo;
d) O coletor não deve ser colocado próximo de fontes fixas ou móveis de emissão em massa de partículas biológicas ou não biológicas (neste caso, pode favorecer a presença maciça de resíduos nas amostras, dificultando a identificação).
O aparelho tem uma bomba de vácuo, de sucção motorizada que funciona 24 horas por dia, durante todo o ano, com a mesma taxa de fluxo. O fluxo é ajustado para 10 l/min (±1 l/min), quantidade similar à inspirada pelo pulmão humano, sendo verificada a cada recolha da amostra com um medidor de fluxo adaptado, um fluxímetro fornecido pelo fornecedor do captador.
A unidade de impacto compreende o orifício, um mecanismo rotativo (sistema de relojoaria, onde se insere um tambor rotativo) e uma estrutura em forma de meia-lua que protege o orifício das intempéries. O orifício consta de uma abertura retangular de 14 mm (±0,1 mm) × 2 mm (±0,1 mm), com uma profundidade > 19 mm e de uma distância ao tambor sem fita de 0,70 mm (±0,1 m). Nestas condições, é garantido que não ocorre turbulência do fluxo laminar, a mistura de ar e partículas é direcionada para o suporte revestido e a impactação é eficiente. O tambor rotativo é a unidade do aparelho onde é colocada uma fita transparente (ex.: fita de Melinex) previamente impregnada com uma substância adesiva, através da qual são obtidas as amostras. Segundo a EN16868:2019 (1), a fita tem de cumprir os seguintes requisitos: 1) ser insolúvel na água; 2) a sua espessura não deve sofrer alterações ao longo do tempo e não deverá ser afetada pelas condições operacionais (com a temperatura entre -20ºC e 50ºC ou com a humidade entre 20% e 100%); 3) deverá ser perfeitamente transparente à luz do microscópio; e 4) o comprimento superior a 336 mm.
O ar ao ser aspirado penetra pelo orifício, sofre impacto na superfície da fita e todas as partículas orgânicas e inorgânicas do ar aderem a esta, por esta estar impregnada pela solução adesiva; no caso a EAS e a IAA (9,10) recomendam o uso de uma solução de silicone (silicone n.º CAS [90337 93 2] solubilizado com um solvente específico).
Outra alternativa, segundo a EN16868 (1), é o uso de vaselina solubilizada ou pura (solubilizar a vaselina com tolueno; vaselina n.º CAS [108 88 3]). A solução de silicone é a recomendada pelas características físicas que permanecem inalteráveis entre -20º e 150ºC, e por conseguinte, se adequa à maioria das zonas bioclimáticas. A fita está colocada num tambor rotativo que gira a uma velocidade de 2 mm/h (±0,01 mm/h) por estar ligado a um mecanismo de relojoaria. A fita está exposta ininterruptamente 7 dias seguidos, findos os quais é substituída por outra. Esta troca deve ser simples e rápida para prevenir eventuais contaminações. O catavento permite a rotação permanente da “cabeça” do coletor, orientando o orifício na direção da proveniência do vento. Assim, o uso deste coletor possibilita a obtenção de amostras, quer diariamente, quer semanalmente, possibilitando a realização de contagens horárias e diárias 11.
O tambor rotativo tem um diâmetro de 110 mm a 112 mm, nele é enrolada uma fita transparente com 345 mm ± 0,5 mm a 350 mm ± 0,5 mm de comprimento. Aquando da fixação da fita ao tambor, este deverá ser limpo com álcool etílico (70%) para se retirar toda a sujidade e/ou partículas biológicas, e só depois se fixa a fita a este. A fita que reveste o tambor, no caso de não estar previamente revestida ou impregnada com a solução adesiva, deverá sê-lo. Dever-se-á aplicar uma fina e homogénea camada da solução adesiva e este processo deverá ser efetuado numa hotte e o operador deverá usar luvas de proteção/vestuário/equipamento de proteção ocular/proteção facial).
O tambor deve ser protegido do ar ambiente durante o transporte do laboratório até ao coletor, e seu retorno deve permanecer em caixa metálica própria para proteção contra choques (Figura 2). A conservação em temperatura ambiente da fita no tambor impregnada em substância adesiva não deve exceder 12 (doze) meses no caso do uso da solução de silicone e um mês para a vaselina (petróleo geleia).

Figura 2 A) Marcação do fim/início da amostragem; B), Operador a substituir o tambor; C) Operador a retirar da caixa o tambor de substituição e a colocar em seu lugar o tambor com amostra que foi retirado do coletor para transporte até ao laboratório onde se efetuará o processamento e análise do respetivo; D) Tambor com fita e caixa de proteção ou “porta-tambor”; E) Ato de dar corda ao sistema de relojoaria do coletor para assegurar a amostragem para o período seguinte; F) Medição/verificação do fluxo do coletor
Na recolha e substituição do tambor são vários os passos a cumprir. A fim de auxiliar essa tarefa, o então Centro de Coordenação da Rede Portuguesa de Aerobiologia da Universidade de Évora elaborou um documento, semelhante ao usado pela rede francesa RNSA - Reseau National de Surveillance Aerobiologique -, descrevendo os passos a efetuar (Figuras 2A-D e 3). Importa destacar que para facilitar o tratamento laboratorial, o indivíduo responsável pela troca do tambor deverá marcar o início e o fim do período de amostragem na fita, com o auxílio de um instrumento pontiagudo através do orifício do coletor (Figura 2A). Ainda, caso o caudal do último período de amostragem esteja abaixo da especificação, o responsável pelas leituras/contagens deverá considerar a validade/relevância dos dados.
O tambor é substituído semanalmente e sempre à mesma hora, e findo esse período ocorrerá sobreposição da amostra.
PROCESSAMENTO LABORATORIAL
Processamento das amostras
No laboratório, o procedimento de preparação das amostras para análise 1,11,12 realiza-se da seguinte forma:
- Limpar a bancada, a placa de aquecimento e os utensílios antes do seu uso (pinças, bisturi ou X-ato, régua) com álcool etílico a 70%;
- Colocar o meio de montagem (solução corante e de fixação) em fusão (no forno, na placa de aquecimento ou micro-ondas);
- Colocar numa folha de papel absorvente, por exemplo, 7 lâminas de vidro para microscopia (de dimensão ≥ 76 mm x 26 mm limpa, desengordurada e de uso único), identificando-as, colocando uma etiqueta com o nome da estação de monitorização e data correspondente no lado esquerdo da lâmina;
- Retirar o tambor da caixa de transporte e fixá-lo no suporte de enrolamento para que a fita possa ser retirada (Figura 4A);
- Descolar ou cortar a fita na zona de junção;
- Com o auxílio das pinças, pegar nas extremidades da fita, sem a tocar com os dedos e colocá-la na régua de corte (Figura 4B);
- Fazer corresponder o início da amostragem com uma das marcações da régua de corte;
- Cortar a fita em 7 fragmentos iguais. Cada fragmento mede cerca de 48 mm de comprimento e constitui uma amostra diária;
- Colocar 3 gotas (0,05 ml/gota) ou uma linha de meio de montagem líquido (0,15 ml) na lâmina de vidro.
- Depositar delicadamente, com auxílio da pinça, o fragmento da fita no centro da lâmina de vidro sobre o meio de montagem. O início da amostragem deverá estar do lado da etiqueta;
- Colocar 3 gotas (0,05 ml/gota) ou uma linha (0,15 ml) de meio de montagem com corante sobre o fragmento da fita ou na lamela (Figura 4C-D). No caso, utiliza-se uma solução corante de glicerogelatina ou glicerina simples com fucsina básica (nº CAS [632 99 5]) ou safranina (nº CAS [477-74 6]). De acordo com a EN 16868:2019 (1), podem ser utilizadas misturas específicas contendo gelvatol/mowiol ou outros produtos prontos a usar. O objetivo da solução corante é corar a parede dos grãos de pólen presentes na amostra para que se possa proceder à sua identificação (identificar a fonte vegetal de proveniência) com base na morfologia. A solução é específica para grãos de pólen, dado os esporos de fungos não corarem.
- Em seguida, colocar lentamente a lamela na preparação, para evitar a formação de bolhas e movimento de partículas. A lamela deve ser maior do que o tamanho da fração da fita que está sob a lamela (exemplo de uma lamela de dimensão apropriada: 22 mm x 64 mm), tem de ser transparente e de uso único;
- Deixar a preparação na placa de aquecimento de 50ºC a 60ºC para remoção de eventuais bolhas de ar e posteriormente deixar a lâmina arrefecer à temperatura ambiente durante mais de 30 minutos.
- Repetir o procedimento para os restantes fragmentos da fita (amostras diárias).

Figura 4 A) Tambor no suporte de enrolamento; B) Fita na régua de corte; C) Preparação (amostra diária); D) e correspondente ilustração esquemática
Findo o processo de preparação das amostras, limpar o tambor e a caixa metálica ou “porta-tambor” com álcool etílico 70% para eliminar eventuais partículas atmosféricas que possam ter aderido a estas estruturas, prevenindo assim uma eventual contaminação da amostra seguinte.
Posteriormente, coloca-se uma nova fita no tambor para nova amostragem e impregna-se com a solução adesiva. Aplica-se uma fina e homogénea camada da solução em ordem a reter as partículas.
A preparação das lâminas para a análise microscópica deve ser realizada à temperatura ambiente e em menos de 14 dias após a retirada do tambor do coletor (para manter a migração dos grãos de pólen o mais baixo possível).
ANÁLISE DAS AMOSTRAS AO MICROSCÓPIO ÓTICO
Metodologia de contagem (leitura das amostras)
As amostras (preparações) são examinadas ao microscópio ótico, identificando-se e quantificando os grãos de pólen e/ou esporos de fungos presentes na preparação.
Em rotina, deve-se usar uma ampliação de pelo menos 400x. As objetivas vão desde 20x a 100x e as oculares de 8x a 12,5x. Uma ampliação menor pode aumentar o erro de identificação, mas uma ampliação maior requer uma área de leitura não inferior a 10% da área do depósito (1).
A identificação deve ser feita por um operador especializado (especificamente treinado) com formação (1).
Análise quantitativa da amostra
Dado que a leitura da preparação (identificação e quantificação das partículas polínicas) consome muito tempo, normalmente realiza-se uma subamostragem na preparação. Conhecem-se vários sistemas de leitura das lâminas com amostras. Segundo a EN16868:2019 (1) podem-se utilizar varrimentos horizontais paralelos ou verticais. O número de varrimentos necessários terá que ver com a área da lâmina a examinar, e depende do tamanho do campo de visão do microscópio e da ampliação.
A área observada deverá ser no mínimo 10%. O recomendado é o sistema das 4 (quatro) linhas longitudinais (desenvolvido pela Rede Espanhola de Aerobiologia) 7 e consiste em percorrer na horizontal 4 linhas no centro da lâmina, na ampliação de 400x (ocular de 10x e objetiva de 40x), correspondendo a aproximadamente 12-13 % da preparação.
O procedimento utilizado 1,11,12 é o seguinte:
1) recorta-se um segmento da folha de acetato da dimensão de uma lâmina de microscópio.
2) Traçam-se, a azul, 24 linhas transversais no segmento da folha de acetato separadas entre si por 2 mm;
3) Coloca-se o segmento sob a lâmina, o primeiro intervalo de 2 mm entre as primeiras 2 linhas representa a hora do dia em que se inicia a análise das partículas transportadas pelo ar. O intervalo entre as linhas corresponde a uma hora de amostragem;
4) Assumindo-se que as partículas polínicas estão uniformemente distribuídas ao longo da fita, marcam-se 4 pontos a azul ao centro, próximos da primeira linha do segmento de acetato;
5) Coloca-se a objetiva sobre um dos pontos e percorre-se 48 mm de cada amostra diária ao longo da lâmina (como se se traçasse uma linha longitudinal com a objetiva) e repete-se este processo para os três outros pontos marcados;
6) Por cada 2 mm (uma hora de amostragem) da linha percorrida registam-se os grãos de pólen e/ou esporos de fungos identificados e a respetiva quantidade numa tabela com separação horária (registo manual);
7) Após a leitura, calculam-se os totais de cada tipo polínico encontrado, sendo os dados obtidos estimativas dos verdadeiros valores;
8) As contagens de grãos de pólen ou de esporos de fungos devem ser expressas como contagens médias diárias de grãos de pólen ou esporos de fungos por metro cúbico de ar. No final, o número total de grãos de pólen ou esporos de fungos contados (n) é multiplicado por um fator de conversão (FC, em inglês correction factor), que tem em consideração o volume de ar amostrado (10L/min), a área de amostragem e o tamanho do campo de visão do microscópio ótico usado na ampliação utilizada7,11,14.
A fórmula para conversão dos valores obtidos para número de partículas por metro cúbico de ar é a seguinte (tabela1):
CÁLCULO DO FATOR DE CONVERSÃO (FC)
O primeiro passo é medir o campo de visão do microscópio ótico na ampliação 400x.
Exemplo: para o diâmetro do campo de visão igual a 0,45 mm (tabela 2):
Por exemplo, se n = número total de grãos de pólen em quatro varrimentos = 250
N.º de partículas por metro cúbico de ar =
= 250 x 0,54 = 135 grãos de pólen/m3
De acordo com as necessidades, também é possível expressar os resultados em dados bi-horários/m3 de ar.
Os dados diários acumulados, nomeadamente as contagens anuais, sazonais, mensais ou semanais de pólen ou esporos de fungos são expressos como um índice com a mesma unidade. O índice é calculado somando-se as concentrações diárias durante o período estudado.
Análise qualitativa da amostra
A identificação baseia-se na estrutura e morfologia do grão de pólen, ou seja, no tamanho, forma, polaridade, número, tipo de aberturas e sua disposição na superfície e na ornamentação (escultura) da exina 15. Para a identificação dos tipos polínicos recorre-se à bibliografia da especialidade, por exemplo Smith 16,17, Reille 18, Arias et al. 19, Lacey e West 20, Trigo et al. 21, Caeiro12, Camacho e Camacho 22, à palinoteca (coleção de grãos de pólen de referência provenientes de vários taxa devidamente identificados e recolhidos a partir da flora da região) e a um documento digital, a Identification key for the pollen contente of the air da RNSA e da IAA23. A RNSA produziu o documento também na versão inglesa com os principais tipos polínicos que podem ocorrer no ar. Contém uma chave de identificação que permite a identificação de amostras frescas, sem tratamentos com ácidos, e dos principais tipos de pólen habitualmente presentes na atmosfera, e de outros grãos de pólen de interesse palinológico.
Para a terminologia polínica também se pode consultar a documentada, por exemplo, no The Air Spora de Lacey e West 20, no Glossary of Pollen and Spore Terminology de Punt et al. 24,25, no Polen y Esporas de Saenz de Rivas,26, Glosario de términos palinológicos de Laín 27, na dissertação de Caeiro 11 e no Guia ilustrado dos pólenes da Região da Madeira de Camacho e Camacho 22.
O documento da EN 16868:2019 (1) também contem a referência de vários outros manuais que podem auxiliar na identificação de grãos de pólen e de esporos de fungos, como: Charpin e Surinyach 28, Nilsson et al. 29, Jensen e Gravesen30, Ellis e Ellis 31, Mulcahy e Mulcahy 32, Iwanami et al. 33, Iversen e Faegri 34, Miskovsky e Petzold 35, Falagiani 36, Reille 18 e a referência aos websites de Internet das associações EAS e IAA. Ainda neste âmbito existe em Portugal um guia de Camacho 37.
Registo de dados
O registo de dados é feito manualmente (Figura 5), constando informações como a localização da estação de monitorização, data da amostra (o dia, mês e ano), o nome do operador de leitura e uma tabela com separação horária para registo dos tipos de grãos de pólen e esporos de fungos identificados e o seu número em cada linha de leitura. Para auxílio na contagem é utilizado um contadorde células.

Figura 5 Leitura da amostra diária ao microscópio ótico com auxílio de um contador manual e folhas de registo de dados.
Segundo a EN16868 (1), outro possível registo é através de gravação semiautomática: por reconhecimento de voz e introdução em base de dados de modo automático (software próprio desenvolvido pela RNSA).
CARACTERÍSTICAS DE DESEMPENHO
As redes de aerobiologia requerem uma metodologia normalizada para garantir a obtenção de dados fidedignos, daí a formulação desta norma (EN 16868:2019), tornando-se necessário existir um controlo de qualidade interno eficaz através da implementação de programas de qualidade.
Um aspeto fundamental para garantir a qualidade da monitorização aerobiológica é avaliar o desempenho dos técnicos especializados nas leituras, os quais contribuem com os dados diários de pólen. Esta avaliação garantirá a fiabilidade das previsões de pólen que são utilizadas diretamente por membros da comunidade, médicos e agências governamentais, visando melhorar a saúde e a qualidade de vida dos indivíduos com doenças alérgicas respiratórias.
Segundo a EN 16868:2019 (1), as características de desempenho serão avaliadas através do cálculo de indicadores de precisão e exatidão. Em aerobiologia, a precisão
(em condições de repetibilidade e reprodutibilidade) é geralmente quantificada pelo coeficiente de variação e a exatidão pelo erro absoluto ou pelo erro relativo, o qual depende da dimensão das amostras.
A Norma EN 16868:2019 (1) estabelece requisitos de desempenho e recomendações que se desenvolvem no seguimento.
REQUISITOS DE DESEMPENHO
Repetibilidade
De acordo com a EN 16868:2019 (1), o desempenho de cada técnico especializado na leitura de grãos de pólen e esporos de fungos deve ser controlado uma vez por ano através de medição em condições de repetibilidade de uma amostra (ou seja, uma lâmina de microscópio com amostra) pelo mesmo técnico, usando o mesmo método e um mínimo de três réplicas por técnico.
Os coeficientes de variação (CV) aceitáveis, calculados apenas para taxa com valor verdadeiro > 10, serão:
- Para um valor verdadeiro aceite entre 10 e 30 grãos de pólen: CV ≤ 30%;
- Para um valor verdadeiro aceite entre 30 e 300 grãos de pólen: CV ≤ 20%;
- Para um valor verdadeiro aceite > 300 grãos de pólen: CV < 10%.
RECOMENDAÇÕES DE DESEMPENHO
Reprodutibilidade e exatidão
Quando existe mais do que um técnico na equipa do laboratório, recomenda-se a avaliação da reprodutibilidade intralaboratorial. Os coeficientes de variação aceitáveis são os mesmos da repetibilidade.
Quando o laboratório está envolvido numa rede, recomenda-se também avaliar a reprodutibilidade interlaboratorial e a precisão. A precisão e exatidão devem ser avaliadas através de exercícios interlaboratoriais seguindo a metodologia proposta por Galán et al.7 e Otero et al. 5.
Sensibilidade e especificidade
A sensibilidade mede a proporção de partículas pesquisadas identificadas corretamente. Pode ser expressa como (tabela 3):
A especificidade mede a proporção de partículas não pesquisadas que são corretamente identificadas como diferentes das partículas pesquisadas. A especificidade pode ser expressa como (tabela 4):
Tanto a sensibilidade como a especificidade dependem da capacidade do técnico em reconhecer de forma adequada um determinado tipo de grão de pólen ou de esporo de fungo na amostra. Assumindo que o técnico está bem treinado, a sensibilidade e a especificidade são consideradas de 1.
De acordo com o contexto biogeográfico, deverão ser analisados os taxa mais relevantes que, por exemplo, podem ser: Alnus, Amaranthaceae, Ambrosia, Artemisia, Asteraceae, Betula, Casuarina, Castanea, Corylus, Cupressaceae, Fraxinus, Olea, Parietaria/Urtica, Pinaceae, Plantago, Platanus, Poaceae, Quercus, Rumex, Salix e Urtica membranacea.
Neste ponto a norma refere que estudos recentes classificam a família Chenopodiaceae como uma nova subfamília da família Amaranthaceae.
RESULTADOS ESPERADOS E POSSÍVEIS LIMITAÇÕES
O método volumétrico baseado no sistema de Hirst representa o método de medição mais utilizado em todo o mundo, existindo séries temporais com cerca de 50 anos de amostragem 4. É, habitualmente, utilizado para a realização de estudos de natureza clínica, para a criação e uso de modelos de previsão de pólen e informação aerobiológica divulgada. As principais vantagens deste método são: 1) dado o seu fluxo ser semelhante ao fluxo respiratório do ser humano, permite que as concentrações de pólen e/ou de esporos de fungos possam ser correlacionadas com a sintomatologia de alergia respiratória dos doentes; 2) permite a análise das concentrações de pólen e/ou esporos de fungos horárias e diárias; 3) a estação de monitorização pode cobrir uma região num raio de cerca de 100 km, dependendo da topografia e da sua localização; e 4) o preço deste tipo de coletor é baixo comparativamente com os sistemas automáticos modernos 12.
Algumas das limitações do uso desta metodologia são:
1) a necessidade de técnicos especializados bem treinados para a realização das análises 1;
2) os resultados não são obtidos em tempo real, só são obtidos dias mais tarde, assim como a sua publicação/divulgação.
Este documento será extremamente importante e útil na investigação (aerobiologia e alergologia), na clínica da imunoalergologia, na área de transferência de conhecimento, no ensino ou noutros campos de aplicação (ex.: agronomia, fitopatologia, alterações climáticas, entre outros).
O seu uso garantirá a fiabilidade dos dados aerobiológicos e das informações resultantes veiculadas à população, aos profissionais de saúde e agências governamentais, com o intuito de melhorar a saúde e a qualidade de vida dos doentes com doença alérgica respiratória.
ÉTICA E DIVULGAÇÃO
Este trabalho não implicou a utilização de amostras biológicas de natureza humana ou animal, nem suscita preocupações de índole ética, pelo que não foi submetido a nenhuma comissão de ética. A Norma EN 16868:2019 aqui descrita pode ser adaptada em outros países de língua portuguesa e divulgada em reuniões científicas de âmbito aerobiológico e alergológico.



















