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Nascer e Crescer

versão impressa ISSN 0872-0754

Nascer e Crescer vol.21 no.3 Porto set. 2012

 

Caso endoscópico

 

Fernando Pereira1

1 Serviço de Gastroenterologia Hospital Maria Pia / CH Porto

 

ABSTRACT

We present a case of pyloric stenosis that occurred in a patient with ileocolic Crohn’s disease without significant gastric inflammation, and treated with azathioprine and messalamine. Balloon dilatation, steroid therapy, omeprazol and polymeric en­teral nutrition were successful to resolve the stenosis. Later the patient was put on infliximab with good clinical response.

 

Um rapaz de 15 anos com Doença de Crohn (DC) ileocólica com cerca de quatro anos de evolução e em tratamento com azatioprina e messalazina, foi observado na consulta de Gas­troenterologia Pediátrica por apresentar vómitos alimentares vespertinos, epigastralgias, afrontamento após as refeições e emagrecimento de cerca de 3 quilos em dois meses.

O doente tinha sido observado pela primeira vez na nos­sa consulta quatro anos antes, com quadro de emagrecimen­to, dores abdominais de localização hipogástrica, diarreia por vezes com pequena quantidade de sangue vivo. Tinha história familiar de DII, mãe com DC em tratamento. Ao exame objectivo constatou-se dor à palpação da fossa ilíaca direita sem tumefa­ções palpáveis e sem adenopatias ou organomegalias. O estudo analítico mostrou discreta anemia hipocrómica e microcítica (10 g/100ml) com valores séricos de ferro e ferritina baixos, proteina C elevada (30 mg/l) e VSG de 40 mm na 1ªhora. A radiografia do tórax era normal e a prova de tuberculina negativa. Efectuou endoscopia digestiva alta que revelou quadro de gastrite crónica do corpo e antro sem a presença de infecção pelo Helicobacter pylori (HP) e sem granulomas. A colonoscopia com ileoscopia mostrou colite ulcerativa, mais intensa na metade direita do có­lon, com lesões ulcerativas longitudinais e estreladas a par de áreas de mucosa sensivelmente normal. Os sete centímetros de ileum observados apresentavam igualmente quadro inflamatório e ulcerativo. As biópsias cólicas e ileais revelaram a presença de quadro inflamatório crónico extenso, com alguns eosinófilos e raros granulomas não caseificados. O exame cultural da mu­cosa cólica foi negativo. Em face destes achados foi colocado o diagnóstico de Doença de Crohn com envolvimento ileocólico e iniciado tratamento com prednisolona oral, polivitamínico e ferro oral, verificando-se melhoria clínica e laboratorial. Às seis sema­nas de tratamento o doente iniciou azatioprina e messalazina, com progressiva redução dos corticóides até à sua completa suspensão 12 semanas após o início do tratamento. A enteror­ressonância efectuada já após o início do tratamento revelou quadro inflamatório atingindo cerca de 12 cm do ileum terminal sem componente estenosante.

O doente manteve-se em observação periódica em consul­ta externa, cumprindo aparentemente o tratamento prescrito e mantendo valores laboratoriais estáveis, sem sinais de significa­tiva actividade inflamatória. Contudo o aparecimento dos sinto­mas acima referidos motivaram a realização de uma endoscopia digestiva alta onde observamos as imagens que apresentamos.

 

Figura 1

 

Figura 2

 

Figura 3

 

Em face destas imagens qual lhe parece ser o diagnóstico mais provável para o quadro actual do doente:

1 – Envolvimento gástrico pela Doença de Crohn

2 – Gastrite associada ao tratamento com azatioprina

3 – Gastrite crónica por Helycobacter pylori

4 – Doença de refluxo gastro-esofágico

 

COMENTÁRIOS

A observação das imagens que mostramos permitem-nos constatar o seguinte: na Figura 1 vemos a porção distal do cor­po gástrico e o antro e adivinhamos o orifício pilórico ao fundo; verifica-se existir intenso aspecto inflamatório generalizado da mucosa gástrica com algumas erosões (setas), mais acentuado na região pré-pilórica e ainda alguns restos alimentares. Não foi possível ultrapassar o piloro e observar o duodeno. Em face des­te quadro, colocamos a hipótese de se tratar de estenose pilóri­ca por envolvimento gástrico pela DII. Efectuamos dilatação do piloro com balão de 5 cm (Figuras 2 e 3), o que permitiu passar seguidamente um endoscópio de 6 mm e verificar aspecto nor­mal do duodeno. As biópsias gástricas confirmaram a presença de intenso infiltrado inflamatório crónico e a presença de alguns granulomas confirmando o diagnóstico de Doença de Crohn.

A gastrite por HP poderia apresentar-se com este aspecto mas, como se referiu na primeira endoscopia alta efectuada ao doente, não havia HP na mucosa (biópsias); a azatioprina não é habitualmente responsável por quadros de gastrite desta na­tureza.

Estavamos assim perante um quadro de DC com envolvi­mento gástrico sob a forma de estenose pilórica, situação pouco frequente, 6% na forma sintomática, por vezes de tratamento di­fícil. Optamos por fazer dieta líquida polimérica exclusiva durante duas semanas, inibidores da bomba de protões e corticoterapia Ev, verificando-se melhoria progressiva do quadro. Posterior­mente, o doente iniciou tratamento com infliximab, suspendendo a prednisolona e mantendo a azatioprina, com evolução favo­

rável. Não foi necessário proceder a mais nenhuma sessão de dilatação. O tratamento médico associado à dilatação endoscó­pica nem sempre é eficaz na resolução do quadro de esteno­se pilórica, havendo necessidade de recorrer à cirurgia (bypass gastroduodenal ou gastro-jejunal).

Conclusão: Doença de Crohn com estenose pilórica.

 

BIBLIOGRAFIA

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