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Nascer e Crescer
versão impressa ISSN 0872-0754
Nascer e Crescer vol.23 no.4 Porto dez. 2014
EDITORIAL
Avaliação cardíaca para desporto
Sílvia ÁlvaresI
IServiço de Cardiologia Pediátrica, CHPorto. E-mail: silvia.c.alvares@gmail.com
Os benefícios da actividade física no estado de saúde e na qualidade de vida das populações são amplamente reconhecidos. Também é consensual que a prática de exercício físico na vida adulta é condicionada por hábitos adquiridos durante a infância, o que tem conduzido ao desenvolvimento de programas de promoção de atividade física de lazer e de competição em idade pediátrica. Contudo e apesar de rara, a maior incidência de morte súbita (MS) no atleta levanta questões relativas ao tipo de rastreio cardiovascular pré competição e à segurança do exercício físico. A avaliação cardíaca tem como objetivos identificar a população em risco de morte súbita (figura 1), e estabelecer estratégias de prevenção nomeadamente através da proibição temporária ou defi de competição ou do tratamento de condições que possam ser potencialmente fatais, de que é exemplo a colocação de cardiodesfibrilhadores em determinadas patologias genéticas. A controvérsia surge relativamente ao melhor método de rastreio que possa individualizar os indivíduos com doença. Indiscutivelmente, a história clínica e exame físico completos e pormenorizados são importantes na deteção de doença cardíaca, mas há situações clínicas como o Sindrome de Wolf Parkinson White ou as canalopatias, em que se revela fundamental para o diagnóstico a realização do electrocardiograma de 12 derivações (ECG), já que nestes casos a história clínica e exame físico podem ser normais. Por outro lado a presença de sopro cardíaco na criança sem outros sintomas corresponde frequentemente a sopro inocente e queixas como palpitações e dor precordial são frequentes entre os adolescentes, o que dificulta a valorização destes achados clínicos.
Com o objetivo de melhorar a qualidade da história clinica e do exame físico, e aumentar a capacidade de deteção de doença cardiovascular, a American Heart Association (AHA) a utilização de um protocolo de avaliação pré-competição que inclui 12 itens (quadro I), sendo que a positividade de qualquer um dos parâmetros implica uma investigação adequada. A presença de sintomas com o esforço, uma história familiar de doença cardíaca severa ou de morte precoce é relevante. Uma das dificuldades na criança é a distinção entre um sopro cardíaco inocente ou funcional do sopro patológico. Os sopros inocentes caracterizam-se por serem mais facilmente audíveis nos estados circulatórios hipercinéticos, serem vibratórios, de curta duração (protomesossistólicos) e de baixa intensidade (<3/6), e de intensidade variável com a mudança de posição da criança, nunca ocorrerem isoladamente na diástole (são sistólicos ou contínuos, no caso do zumbido venoso). Não se associam a frémito ou a ruídos acessórios (estalidos, cliques) e localizam-se numa área pequena e bem definida.
A Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC), para além da anamnese cuidadosa preconiza também a realização do ECG. Esta abordagem baseia-se nos resultados obtidos por Corrado na região de Veneto, na avaliação pré-participação desportiva, o que se traduziu na redução significativa de mortalidade (cerca de 90%) nos atletas jovens. A AHA, embora reconheça o interesse do ECG em determinadas situações, entende que como método de rastreio tem pouca sensibilidade e especificidade (cerca de 80% dos atletas apresentam alterações no ECG relacionadas com adaptações cardíacas induzidas pelo exercício) e elevado custo, para além de considerar raras as patologias de risco e a morte súbita.
A ESC defende que a realização de ECG pode identificar patologias como a cardiomiopatia hipertrófica e dilatada, o síndrome de WPW, o síndrome de QT longo, o síndrome de Brugada, doenças que representam cerca de 2/3 das causas de morte subita no jovem atleta. A adopção de critérios rigorosos e estandartizados na avaliação do ECG, adaptados a esta população é fundamental para melhorar a acuidade deste exame. Os critérios de Seatle recentemente propostos pretendem uniformizar a interpretação do ECG no atleta, distinguindo as alterações funcionais das alterações patológicas.
Em Portugal o rastreio pré-competição inclui a história clínica e exame físico e a realização de ECG. A avaliação cardíaca é repetida anualmente.
Esta abordagem está de acordo com as recomendações europeias que se fundamentam no seguinte:
1. O risco de MS no desporto é um problema de saúde importante
2. O rastreio com ECG permite identificar atletas não sintomáticos e com doença cardiovascular com risco de MS
3. Existem estratégias de abordagem que podem incluir tratamento ou restrição de competição
4. A deteção precoce e a orientação destes atletas permite a redução de MS.
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Recebido a 15.10.2014 | Aceite a 15.12.2014