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Sociologia
versão impressa ISSN 0872-3419
Sociologia vol.36 Porto dez. 2018
ARTIGOS
Papel da Sociedade Civil em prol da Boa Governação o caso de Moçambique
Role of Civil Society in favour of Good Governance the case of Mozambique
Rôle de la Société Civile en faveur de la Bonne Gouvernance - le cas du Mozambique
Rol de la Sociedad Civil en La Buena Gobernación: el caso de Mozambique
Pedrito Carlos Chiposse Cambrão
Universidade Lúrio, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Centro de Estudos Culturais e Religiosos do Oceano Índico
Endereço de correspondência
RESUMO
Com este artigo, pretende-se perceber até que ponto a Sociedade Civil moçambicana tem sido preponderante na luta pela Boa Governação, no âmbito da Democracia Participativa. O papel da Sociedade Civil tem sido demonstrado através de vários documentos, como a Agenda 2025 e o Plano de Alívio e Redução da Pobreza Absoluta, bem como no estabelecimento de mecanismos participativos: Observatórios de Pobreza/ Desenvolvimento; Mecanismo Africano de Revisão de Pares. Contudo, o seu compromisso e o desejo de participação em prol da Boa Governação, de forma efetiva e sustentada, são confrontados com problemas de acesso à informação, de limitado conhecimento técnico e conceptual. Daí a necessidade de trabalhar muito mais unir-se e (in)formar-se , para melhorar o lugar onde, atualmente, se encontra.
Palavras-chave : Sociedade Civil; Boa Governação; Democracia Participativa.
ABSTRACT
With this essay, we intend to perceive to what extent the Mozambican Civil Society has been important in fight for the Good Governance, in the scope of Participatory Democracy. The role of Civil Society has been shown through various documents such as Agenda 2025 and the Absolut Poverty Relief and Reduction II Plan, as well as in the establishment of participatory mechanisms: Poverty/Development Observatories, African Peer Review Mechanism. However, its commitment and willingness to participate on behalf of the Good Governance, in an effective and sustainable way, are confronted with problems of access to information, with limited technical and conceptual knowledge. Hence, the need of working much more to be united and to be (in)formed itself , in order to improve the place where it actually is.
Key-words : Civil Society, Good Governance; Participatory Democracy.
RÉSUMÉ
Avec cet article, nous avons l’intention de comprendre dans quelle mesure la société civile mozambicaine a été prépondérante dans la lutte pour la bonne gouvernance, dans le cadre de la Démocratie Participative. Le rôle de la société civile a été démontré à travers divers documents, tels que l’Agenda 2025 et le Plan de Secours et Réduction de la Pauvreté, ainsi que dans la mise en place de mécanismes participatifs : Observatoires de la Pauvreté/du Développement, Mécanisme Africain d’évaluation par les pairs. Cependant, leur engagement et leur volonté de participer à une bonne gouvernance sont confrontés à des problèmes d’accès à l’information avec des connaissances techniques et conceptuelles limitées. D’où la nécessité de travailler beaucoup plus - de s’unir et de s’informer pour améliorer le lieu où, actuellement se trouve.
Mots-clés : Société Civile, Bonne Gouvernance, Démocratie Participative.
RESUMEN
Con este artículo se pretende comprender hasta qué punto la sociedad civil mozambiqueña suele ser preponderante en lucha por una buena gobernación, en el ámbito de la Democracia Participativa. El rol de la Sociedad Civil ha estado siendo demostrado mediante una multiplicidad de documentos, como la agenda 2025 y el Plan de Alivio y Reducción de la Pobreza/Absoluta II, así como en el establecimiento de mecanismos participativos: Observatorios de la Pobreza/Desarrollo, Mecanismo Africano de Revisión de Parejas. Sin embargo, su compromiso y deseo de participación en beneficio de la buena gobernación, de forma efectiva y sostenible, se confrontan con problemas de acceso a la información, de limitado conocimiento técnico y conceptual. De allí, la necesidad de trabajar mucho más- uniéndose e (in) formándose- para mejorar el lugar donde, actualmente, se encuentra.
Palabras claves : Sociedad Civil, Buena Gobernación, Democracia Participativa
Introdução
Considerando que a reflexividade é o apanágio do cientista social, quisemos fazer jus a esse espírito reflexivo rumo a uma democracia e sociedade desejadas. Quisemos pensar de forma diferente dos radicais e extremistas, dos que conduzem os seus partidos políticos para um fechamento fundamentalista partidarite ou partidarismo1 - dos economistas triunfalistas, que navegam em indicadores e modelos macroeconómicos e avaliam-se pelos resultados projetados, mesmo quando estes não se repercutem na vida do cidadão e não se confirmam posteriormente, ou seja, dos que se preocupam, apenas, com o Produto Interno Bruto (PIB) e outros indicadores estatísticos de cariz mais normativo do que instrumentos de aproximação à realidade social, não tendo em conta outros instrumentos, por exemplo, da autoria da Organização das Nações Unidas, especialmente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
A democracia começa por admitir a diferença no pensar a realidade social. Os conflitos políticos e sociais começam, geralmente, com a negação de visões diferentes sobre a mesma realidade e exacerbam-se como em Moçambique na intolerância e na consequente exclusão dos outros: partidos políticos, sociedade civil (organizada), confissões religiosas relutantes, académicos e/ou intelectuais irreverentes. Por isso, acreditamos que o cidadão como indivíduo tornado sujeito livre, pensante, responsável e ator do seu desenvolvimento e da sociedade na qual está inserido é capaz de falar e de agir quando for capaz de pensar no direito e na responsabilidade da sua liberdade. Sem essa liberdade de pensamento, o cidadão não se torna sujeito, isto é, ator capaz de transformar a sua vida em ação livre. Neste mesmo diapasão, Severino Ngoenha anota que “devemos ter a coragem de nos interrogarmos em profundidade sobre o que emperra o nosso andamento, para podermos perspetivar uma democracia melhor” (Ngoenha, 2015: 136).
Por sua vez, Touraine (1992) lembra que democracia é o reconhecimento de que os indivíduos e coletividades têm o direito de ser os atores da sua história. Diz, ainda, que a democracia está ao serviço dos seres humanos como sujeitos, isto é, criadores de si mesmos, da sua vida individual e coletiva. É aqui onde a Sociedade Civil exerce um papel fulcral, pois é o espaço em que o cidadão partilha e luta com outros cidadãos pelos mesmos objetivos e pela satisfação das suas necessidades individuais e coletivas. É assim que as Organizações da Sociedade Civil (OSCs) são chamadas à participação política, tendo em conta a Boa Governação.
A Sociedade Civil assume, normalmente, um papel importante na flexibilidade do processo de Boa Governação, vista como transparência na gestão da coisa pública e no domínio do “accountability” ou da prestação de contas, ética, responsabilidade, equidade, integridade, rigor, imparcialidade. Isso é possível com a existência de uma Sociedade Civil forte, interventiva e proactiva. Porém, em Moçambique, o limitado número de organizações que intervêm na área da Boa Governação, no âmbito da democracia participativa havendo mais organizações viradas para a provisão de serviços e advocacia em setores como educação e saúde , não ajuda para a efetivação deste propósito, ou desiderato!
Portanto, com este artigo queremos fazer perceber o estágio de participação das OSCs moçambicanas em prol da Boa Governação, os seus constrangimentos e potencialidades e por via disso, o que se pode fazer para uma intervenção profícua rumo ao bem-estar social.
1. Contextualização e problematização do tema
Atualmente, vivemos num mundo de enormes desequilíbrios sociais como vários analistas tem vindo a defender (Milanovic, 2012; Piketty, 2014; Atkinson, 2016; Africa Progress Panel, 2012). De ano para ano, as fortunas de alguns aumentam face à maioria que não tem o essencial para (sobre)viver. As nossas sociedades (re)produzem engenhos de exclusão numa espiral sem fim. A “crise” dos mercados mundiais tem abrangido todas as classes sociais, abalando inclusivamente a “classe média” com consequências nefastas, tais como o desemprego, a pobreza, a vulnerabilização da vida familiar, a exclusão social (OCDE, 2011 e 2018). O mundo misterioso dos mecanismos do “mercado”, das empresas e contas bancárias offshore, da especulação e das transações financeiras fictícias representa os interesses irresponsáveis de uma minoria - oligarcas, experts financeiros/banqueiros, dirigentes políticos (Berber, 2016). De igual modo, assistem-se a fortes desequilíbrios, na qualidade ambiental, na justiça social, na estabilidade das economias e dos sistemas políticos que comprovam a necessidade de Mudança (PNUD, 2013).
Entendemos, assim, que embora seja indispensável o fomento do crescimento económico, é, também fundamental que haja (re)distribuição (equitativa) dos benefícios ou justiça social. As gigantescas potencialidades de recursos naturais de que Moçambique dispõe podem, por um lado, elevar a capacidade de receitas do Estado, tornando mais eficiente o apregoado combate à pobreza absoluta e à exclusão social, mas, por outro, aumentar as desigualdades sociais e políticas o que acontece, infelizmente, resvalando em manifestações populares e até bélicas.
Face a este contexto nacional, sentimo-nos impelidos a contribuir para uma economia solidária e inclusiva e para um desenvolvimento sustentável como condição sine qua non para ultrapassar ou amainar os efeitos nocivos do crescimento económico sem desenvolvimento. Reconhecemos a necessidade de mudanças nas instituições que nos governam a nível (inter)nacional, no sentido de se orientarem para uma proteção dos mais frágeis e vulneráveis ou mesmo excluídos, das minorias e dos grupos marginalizados, tomando os seres humanos e a sua circunstância como centro das nossas preocupações e participação política e social.
De acordo com a OCDE (2009), não obstante o aumento do investimento em Moçambique, a exclusão social permanece e a redução da pobreza (absoluta) estagnou. O principal problema de exclusão reside na dificuldade de associar o grande número de bens materiais aos serviços sociais: educação, saneamento básico, proteção social. A título ilustrativo, de um total de 187 países no mundo, Moçambique ocupava a posição 178 segundo o relatório do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH, 2014).
O relatório de autoavaliação, publicado pelo Fórum Nacional do Mecanismo de Avaliação (MARP, 2009) demonstra que o número de pessoas abaixo da linha de pobreza está a crescer e que o fosso entre ricos e pobres aumenta, criando um potencial de exclusão e de conflitos. Neste mesmo diapasão, o Índice Multidimensional de Pobreza (IMP)2, em 2011, mostrou que 70,2% da população moçambicana é multidimensionalmente pobre.
Um outro estudo divulgado pelo FMI (2014) admite que o país falhou no objetivo de reduzir a pobreza até 42%, preconizado no Plano de Acção da Redução da Pobreza (PARP) de 2011 a 2014, colocando esse indicador em 54%.
Por sua vez, o relatório do Banco Mundial (2015), intitulado Análise da Despesa Pública de Moçambique, aponta que o Estado dá mais aos ricos do que aos pobres. O relatório mostra que 40% da população mais pobre beneficiou-se menos do crescimento em relação a 20% da população mais rica, nos últimos 10 anos. Portanto, temos poucas pessoas cada vez mais ricas e muitas cada vez mais pobres.
Na mesma senda, o Presidente da República, Filipe Jacinto Nyusi, na II Conferência Nórdico-moçambicana sobre o crescimento inclusivo, realizada em 2015, afirmou que, “apesar de Moçambique estar a registar um nível de crescimento económico robusto e sustentado nos últimos anos, a taxa da pobreza continua inalteravelmente elevada”3.
Como se pode depreender, os vários relatórios e/ou documentos que apresentamos fornecem fortes indicadores de vulnerabilidade sistémica. Logo, os brutais e fabulosos números de crescimento económico, assentes na indústria extrativa, são dados estatísticos ainda sem correspondência social. Há crescimento económico sem desenvolvimento social e, muito menos, inclusão social.
Olhando, agora, para a perceção sobre a participação da Sociedade Civil na Boa Governação, há que dizer o seguinte:
- 1. De acordo com o primeiro estudo sobre o Índice da Sociedade Civil Moçambicana (2007), levado a acabo pela Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC) em parceria com outras organizações, o estágio de mais de cinco mil OSCs, no respeitante a mecanismos de avaliação das ações de desenvolvimento social, é frágil. Todavia, há vozes que discordam dos resultados deste estudo, o caso de Soiri (1999) e de Negrão (2003) que advogam que a influência das OSCs nas políticas sociais é significativa, pois na ausência ou na fraqueza da representação do Estado, são as OSCs (inter) nacionais que preenchem o vazio de muitas comunidades, como forma de “descentralização por defeito”; 2. Para Homerim (2005), as atividades das OSCs de âmbito social são bem aceites e até incentivadas pelo governo. Porém, quando se trata das que penetram na esfera política, o governo mostra-se reservado. Mais ainda, a estudiosa considera que a principal característica destas organizações é a sua fragilidade institucional: más condições materiais; dependência financeira para com os doadores; baixo nível de qualificação do pessoal, dificuldades em se situar, de forma credível, face às autoridades públicas; 3. Um outro fenómeno que caracteriza as OSCs é a ambivalência que existe entre estas e o Estado. Observa-se uma permeabilidade entre a esfera do poder de decisão política e as OSCs. Há, ainda, uma outra observação governamental que as olha como executores de agendas externas, prolongamento dos partidos da oposição ou, então, negócios em forma de projetos. Neste contexto, e partindo das díspares constatações dos diversos autores acima referidos, procuramos questionar o presente da Sociedade Civil moçambicana quanto a sua participação na Boa Governação e contribuir (com alternativas) para uma Sociedade Civil forte, isto é, mais (particip)ativa, e um Moçambique melhor: justo, inclusivo, sustentavelmente desenvolvido. Com efeito, parece-nos pertinente formular a seguinte questão: qual tem sido a influência da Sociedade Civil organizada nas políticas sociais em geral, e, sobretudo, na Boa Governação, no âmbito da Democracia Participativa? A nossa pesquisa incidiu sobre a cidade e província de Maputo, bem como sobre a província de Gaza. Maputo, por ter a maior concentração de OSCs e as suas sedes. Gaza, pelo facto de ter o Fórum das Organizações Não-Governamentais de Gaza (FONGA) relativamente ativo, numa província tida como bastião do Partido no poder, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO). Em termos metodológicos optamos pela abordagem qualitativa (Guerra, 2006; Bryman, 2012; Belloti, 2015) por ser a mais adequada ao nosso objeto de estudo. A análise documental4 as entrevistas semiestruturadas5 e a observação em workshops foram as técnicas de recolha e tratamento de informação. No entanto, antes de entrarmos na análise dos resultados da nossa pesquisa, importa rever sinteticamente os conceitos de Democracia Participativa, Boa Governação e Sociedade Civil, sobretudo, a relação que existe entre si.
2. Democracia Participativa, Boa Governação e Sociedade Civil
Durante muito tempo, acreditou-se que o direito de voto era a única via de expressão do Povo, através do qual, este podia decidir sobre a vida do país. Porém, governos há que, mesmo com esse privilégio assegurado, continuam a governar os seus povos com mão de ferro. Alguns destes casos espelham-se nos governos da Europa do Leste (Geórgia, Letónia e Lituânia, só para citar alguns), bem como alguns governos africanos (Guiné-Bissau, como um caso bem recente e elucidativo e, porque não, Moçambique). Daí que surjam conceitos como “sociedade civil organizada”, que pretende limitar os poderes abusivos do Estado e do governo, ajudando, por um lado, a construir uma sociedade menos desigual em termos políticos, económicos e sociais e, por outro, chamando a atenção para os excessos praticados pelo governo e Estado, com vista a garantir os demais direitos e deveres dos cidadãos.
Se é certo que a democracia representativa foi um progresso em relação a sistemas despóticos e autocratas, também não é menos verdade que ela, hoje, desvela lacunas, incoerências e até paradoxos. Por isso, a democracia participativa é um imperativo para os nossos tempos, pois é ampliação da prática democrática para além da mera expressão do voto eleitoral. Como diz Ngoenha:
“Temos o mau hábito de confundir e reduzir a democracia à competição entre os partidos para a tomada de poder. Na realidade, a democracia é um processo que regride ou progride, essencialmente, em função do papel que a cidadania joga no sistema político, e na soldadura entre o sistema político e os outros sistemas sociais, e entre todos os sistemas e o conjunto das instituições e potestades reunidas no Estado” (Ngoenha, 2015: 162).
Portanto, a Democracia Participativa tem em vista a participação dos cidadãos no bem da “res publica”. Por outras palavras, é a participação no processo político para influenciar a formulação das políticas sociais, a recetividade do governo às demandas da população e a transparência com que trata os seus assuntos que são indicadores da qualidade da democracia (Dahl, 1992). Ela é o reconhecimento da importância da participação direta dos cidadãos a partir de uma articulação entre Estado e Sociedade Civil para a criação de espaços de resolução através de mecanismos de democracia liberal representativa.
Há necessidade de reconhecer que a democracia supõe e nutre a diversidade de interesses, assim como de ideias. O respeito pela diversidade significa que a democracia não pode ser identificada com a ditadura da maioria sobre as minorias; deve, antes, comportar o direito das minorias e dos contestadores à existência e à expressão, e deve permitir a expressão das ideias heréticas e desviantes. Assim como é necessário proteger tanto a diversidade das espécies para salvaguardar a biosfera, assim também se deve garantir a diversidade de ideias e opiniões, bem como a diversidade de fontes e meios de informação para salvaguardar a vida democrática.
A democracia necessita, simultaneamente, de conflitos de ideias e de opiniões, que lhe confiram vitalidade e produtividade. Mas, a vitalidade e a produtividade dos conflitos só podem expandir-se em obediência às regras democráticas que regulam os antagonismos substituindo as lutas físicas pelas lutas de ideias , e que determinam, por meio de debates e de eleições, o vencedor provisório das ideias em conflito, aquele que tem, em troca, a responsabilidade de prestar contas da aplicação de suas ideias.
Portanto, a atual democracia deve ser reconfigurada, de modo a responder aos desafios da sociedade de hoje. O que se pretende não é o derrube das democracias existentes, mas a sua democratização ou, na expressão lapidar de Boaventura de Sousa Santos (2003) “democratizar a democracia”.
A democratização da democracia não significa a queda na anarquia nem no populismo. Pelo contrário demanda o respeito pela expansão dos direitos e pela afirmação de uma cidadania (pro)ativa. A maior incidência de análise sobre democracia não implica a rejeição do Estado, mas do estatismo. Se a República salienta os valores do Estado, a democracia desenvolve as ideias da Sociedade Civil. O Estado não deve desempenhar funções que pertencem aos indivíduos e à sociedade, sobretudo quando se apropria de atividades, não para as fazer funcionar melhor, mas para aumentar o seu poder. A situação agrava-se com a politização do Estado, ou Partidarização do Estado caso típico de Moçambique. Para tal, é necessário, como indica Ngoenha, que:
“ultrapassemos a democracia como simples participação eleitoral e que se desenhem formas de participação e de controle social, através das quais os direitos, nas suas várias articulações, e os deveres pelo que devem ser, encontrem um terreno de efetividade. Isso é válido não só para o sistema político-administrativo, mas também para o sistema económico e mesmo cultural. Significa, pois, que todos os sistemas, mesmo o económico, devem submeter-se a um controlo democrático” (Ngoenha, 2015: 164).
Por isso, a Democracia Participativa é um imperativo para os nossos tempos, na medida em que é ampliação da prática democrática para além da mera expressão do voto eleitoral (Fernandes, 2014). Por outro lado, embora o conceito de “Sociedade Civil” seja tomado, por alguns, como confuso, corrompido, que justifica agendas ideológicas das elites..., consideramos ser uma das grandes ideias deste século, pois não existe solução para os problemas socioeconómicos e políticos sem a participação política no âmbito da Democracia Participativa.
Assim sendo, a democracia é entendida como uma gramática de organização da sociedade e da relação entre o Estado e a sociedade (Santos, 2003). Ela propõe uma mudança que restaura a capacidade de resiliências dos sistemas, a partir da capacitação das populações, potenciando o seu capital humano e social. Nesse processo de capacitação, as OSCs assumem um papel central. Porém, as suas iniciativas só serão efetivas se, em primeiro lugar, se centrarem nas pessoas com que trabalham ou seja, na adoção da máxima “trabalhar com e não para” e, em segundo lugar, cooperarem ativa e produtivamente entre si e com as entidades do setor público e privado, ou seja, praticar o trabalho em rede/parceria.
É dentro da Democracia Participativa que se pode almejar a Boa Governação, que tem a ver com a participação popular na governação, na transparência na gestão da “res publica”, alicerçada em resoluções tomadas sempre de acordo com a lei, regras e informação inteligível ao cidadão, equidade e inclusão, com particular atenção aos mais vulneráveis da sociedade, prestação de contas (“accountability”) e combate à corrupção, parcimónia na gestão do erário público, independência dos poderes públicos para o controlo interinstitucional. A Boa Governação é vista, portanto, como um novo protótipo de regulação social que veio suprir o paradigma previamente em vigor baseado no papel privilegiado do Estado, enquanto ente soberano. Mas, antes de nos debruçarmos sobre a Boa Governação, há que falar, de uma forma sucinta, da governação per se.
Governação é geralmente entendida como um sistema de valores, políticas e instituições, através dos quais uma sociedade gere os seus negócios públicos, económicos e sociais, por via da interação entre o Estado, a Sociedade Civil e o mercado/setor privado. Dito de outra forma, a Governação é o processo de tomada de decisões e o meio através do qual as decisões são ou não implementadas. Nestes termos, as instituições públicas conduzem os assuntos públicos, gerem os recursos públicos e garantem a realização dos direitos humanos. Por sua vez, a Boa Governação materializa esse fim de uma forma que é essencialmente livre de abuso de poder e de corrupção, obedecendo devidamente às normas de direito estabelecidas.
É de salientar, ainda, que o conceito de Boa Governação aparece como um instrumento de institucionalização da Governação “Governance”6 e é tido como condição indispensável na promoção da solidez social e do desenvolvimento sustentável. Manifesta-se em diversas áreas fundamentais para a edificação do Estado de Direito, nomeadamente: a separação de poderes, o respeito pelos direitos humanos, a prestação vertical e horizontal de contas, a transparência na governação eleitoral e na gestão financeira e no controlo da corrupção. Nesta ordem de ideias, o entendimento comum aventa que países com um alto desempenho em cada uma destas áreas têm melhores condições para a consolidação democrática, defesa do bem comum e criação de condições de bem-estar social.
De acordo com Alcántra (1998: 8) a Governance é um instrumento para conceber um sistema mais efetivo de autoridade e regulação no quadro da economia global, o que aventa ser a precondição para a sobrevivência da democracia nos Países em vias de Desenvolvimento (PvDs). Ela concebe governação como a reinterpretação da agenda neoliberal para as instituições internacionais apoiarem o investimento público-privado nos PvDs. No contexto da democratização, globalização e organização supranacional, ainda na esteira desta autora, o discurso da governação visa resolver não apenas os problemas dos PvDs, mas, também, a crise internacional sobre o bem-estar e a governação no mundo. Esta abordagem centra-se sobre questões atuais de desenvolvimento, tais como processos de financiamento, observância da lei, democratização, participação de cidadãos na formulação de políticas e outros.
Desde 1980, a Governação, a que o Banco Mundial chamou “Governance”, goza de uma reputação florescente. Ela aproveita do desencanto crescente em relação à política, ao governo tradicional e à democracia representativa. De facto, os governos dececionam, porque parecem deixar de controlar a realidade, sobre os desafios e os problemas das pessoas. A Boa governação tem como objetivo lutar contra ou resistir à globalização hegemónica que exclui muitas pessoas no processo de “design” de políticas de governação. Ela luta contra o contrato social de exclusão da minoria, da diversidade cultural, do ambiente, etc. Em abono da verdade, a Boa Governação procura aliar a exigência de participação e de inclusão.
Depois do colapso do bloco soviético (1989-1991), os líderes dos países ocidentais proclamaram a Boa Governação como o fator decisivo para determinar os futuros parceiros de Cooperação. O conceito de “Boa Governação” determina se um país consegue gerir os assuntos públicos de forma justa e eficaz. O uso deste termo leva automaticamente a um juízo de valor, baseado na perceção ocidental de justiça. Assim, um país com Boa Governação deve garantir ao povo: estabilidade política e ausência de violência; liberdade de expressão e comunicação; capacidade reguladora do Governo; cumprimento da lei e controlo da corrupção. O uso destas dimensões faz com que os países sejam escolhidos consoante a adoção - ou não - de valores e ideias de governo ocidentais, facto que levou a críticas.
Depois deste breve trajeto, podemos dizer que por Democracia Participativa e Boa Governação se tem em vista colocar o cidadão como agente participante e responsável do processo. Trata-se de tomar consciência sobre os problemas sociais e intervir proficuamente com ideias construtivas e sustentáveis diante do poder instituído e não só. Como afirma Viegas, com a Democracia Participativa torna-se:
“mais direta e alargada a participação dos cidadãos na vida política, contribuindo, assim, para a afirmação e consolidação do exercício de cidadania por parte de todos os indivíduos; por outro lado, melhorar as instituições políticas na sua eficácia e transparência de funcionamento, de modo a aumentar a sua credibilidade junto dos cidadãos” (Viegas, 2000: 142).
O Estado é chamado a interagir com a Sociedade Civil na definição de Políticas Sociais7, cuja finalidade é responder a situações de desigualdade social, na sua maioria situações traduzidas em situações de pobreza e exclusão social, o que nos remete invariavelmente para uma perceção alargada de proteção social. Por outras palavras, num mundo ou numa época em que o dogma economicista da “sustentabilidade financeira” parece substituir ou ocultar a fundamental perspetiva da “ sustentabilidade social”, é imperioso que se fale/discuta a urgente e incontornável necessidade de Políticas Sociais. Assim, o Estado, através do Governo faz da Boa governação/ “Governance” um poder especial de conformação de rumos, objetivos e meios, com atenção aos pormenores, persuasão junto dos parceiros sociais e procura de consensos que lhe afiancem a anuência franca dos destinatários das Políticas Públicas no momento em que se passar à concretização dessas políticas (Amaral, 2014: 309).
Boaventura de Sousa Santos (2013) assevera que, nos dias que correm, há necessidade de renovação da teoria democrática. Afirma o mesmo autor que é necessário formular os critérios democráticos para que não se confinem apenas ao ato de votar. Por renovação da teoria democrática, se quer dizer:
“a articulação entre a democracia representativa e a democracia participativa”. Para que tal articulação seja possível, é necessário que “o campo político seja redefinido e ampliado”, pois, “a teoria política liberal transformou o político numa dimensão sectorial e especializada da prática social o espaço social e confinou-o ao Estado. Do mesmo passo, todas as outras dimensões da prática social foram despolitizadas e, com isso, mantidas imunes ao exercício da cidadania” (Santos, 2013: 225).
Em suma, a Sociedade Civil surge para incentivar e revitalizar a democracia corroída, quer pelo desespero esquerdista fornecedor de bens sociais, quer pela direita convicta de que o crescimento económico é suficiente para produzir e distribuir benefícios. Baseia-se em princípios e valores como a solidariedade, a justiça social, a participação, e é constituída por um conjunto de organizações que visam desenvolver um projeto de mudança e transformação social, exigindo uma atuação estratégica que se baseie em princípios de qualidade, eficiência e eficácia, bem como uma gestão assente em processos cada vez mais participados e, sobretudo, democráticos.
A Democracia Participativa propicia a Boa Governação. Ela mostra que as formas públicas de monitoramento dos governos e os processos de deliberação pública podem substituir parte do processo de representação e deliberação tal como foram engendrados no modelo dominante da democracia (Santos, 2003). Assim, como a ciência avança porque há crítica, questionamentos e discordâncias, acreditamos que só assim criticando, questionando e discordando a sociedade avança/melhora rumo ao bem-estar social ou à defesa do bem comum, ou da “res publica”.
A transparência, por sua vez, é um dos principais pivôs para a Boa Governação, pois ela significa uma tomada e aplicação de decisões segundo as regras e procedimentos pré-estabelecidos e a disponibilidade, acessibilidade e compreensão da informação pelos destinatários das decisões (Tiny, 2005 apud Janaina, 2005: 6). Por outras palavras, a transparência é a obrigatoriedade a que as instituições públicas e os atos governativos têm de ser sujeitos e compreendidos através de um vidro cristalino, nítido e imaculado.
3. Sociedade Civil Moçambicana na luta pela Boa Governação
Feita a apresentação, revisão e clarificação dos principais conceitos usados neste trabalho, agora vamos apresentar a análise dos resultados da pesquisa, baseados na leitura e análise de documentos e relatórios bem como na análise das entrevistas.
Olhando para a realidade moçambicana, numa perspetiva histórica, torna-se difícil indicar a génese da Sociedade Civil. Mas, com base nas definições acima referidas, podemos dizer que a Sociedade Civil existiu sempre antes e depois da independência e qualitativamente terá crescido nos dias de hoje. Antes da independência (1975), constatamos que, nas zonas rurais, as comunidades sempre se organizaram em torno da sociedade tradicional e em grupos, resolvendo assuntos de interesse coletivo. No tempo colonial, no norte de Moçambique, por exemplo, há registos de grupos de caçadores, pescadores, construtores de casas de material local e de camponeses com escalas determinadas para trabalhar, alternadamente, na lavoura ou colheita em machambas8 de um e do outro. Pode pensar-se que foi com base no reconhecimento da efetiva existência e utilidade da Sociedade Civil tradicional que, como estratégia para legitimar a sua autoridade sobre as populações, o Estado colonial criou os regulados e regedorias como mobilizadores das populações para os propósitos do governo da época.
O marco mais importante do surgimento das OSCs foi a Constituição de 1990 e a subsequente Lei nº 8/91 (Lei das Associações), dois instrumentos legais que permitiram, pela primeira vez na história de Moçambique, aos cidadãos, poderem, por direito, organizar-se em associações prosseguindo objetivos comuns lícitos. Até 1990, em Moçambique, não estava plasmada a liberdade de pensamento, de associação e de reunião, apesar do país estar independente havia 15 anos. Em conformidade com a Lei das Associações, os cidadãos têm o direito de formar OSCs, incluindo as que abordam questões de Boa Governação e anticorrupção. Esta Lei enfatiza, no seu artigo 5º, a importância das associações no processo de democratização da sociedade, ao referir que, uma vez reconhecida, a associação é um ator social de grande peso, podendo exercer o seu potencial poder em várias esferas governamentais.
As formas organizadas da Sociedade Civil, reconhecidas inicialmente pela sua contribuição na provisão de assistência humanitária, evoluíram, nos últimos anos, para assumirem o papel de promotoras de desenvolvimento e participarem ativamente em ações de pesquisa e advocacia que visam monitorizar e influenciar políticas públicas e de desenvolvimento das comunidades. Para transformar organizações, que outrora estiveram ligadas a questões de assistencialismo, em organizações que possam questionar o Estado, mobilizar a sociedade para um confronto de ideias até ao ponto de participarem na definição de Políticas Sociais e Públicas, e em processos eleitorais, leva o seu tempo em termos de transição, pois não é só uma questão de transição institucional, mas de ação política e de mentalidades.
Portanto, com os ventos da mudança da década de 1990 (revisão da Constituição), que permitiria o pluralismo político e a criação de mais espaços de participação na vida pública, aparece uma Sociedade Civil cada vez mais estruturada e com tendência a “desligar-se” do poder político, o que tem vindo a criar uma certa conflitualidade em certos momentos com o Partido na vanguarda, ao ponto de ser apelidada de “apóstolos de desgraça”, “executores de agendas ocultas”, “agitadores”, “frustrados”, “antipatriotas”, “anti-desenvolvimentistas”... uma vez que a obediência que se verificava no sistema monopartidário deixou de ter a mesma importância ou peso.
Mas, se é verdade que, no âmbito do processo de transição e consolidação democráticas, o país obteve alguns progressos que facilitaram a criação de espaços de participação para partidos políticos e OSCs, também não deixa de ser evidente que os espaços criados no âmbito do processo de democratização do país estão cada vez mais controlados e até asfixiados pelo sistema de partido dominante. Esse controlo apresenta-se como um desafio para o processo de consolidação da incipiente democracia e consubstancia-se, entre outros aspetos, com as contínuas e sistemáticas revisões da lei eleitoral, com a instabilidade político-militar e das instituições da administração eleitoral, com a transformação de OSCs em meros espaços de consulta, enfim, com uma aberta partidarização do Estado e consequente défice de inclusão sociopolítica.
Por outras palavras, embora exista um enquadramento jurídico-constitucional da liberdade de expressão e de associação um compromisso assumido para a participação dos cidadãos na governação , estes elementos formais, porém, confrontam-se com uma cultura e uma prática que funcionam contra o exercício dessas mesmas liberdades. Por exemplo, a falta de acesso à informação e de conhecimento de direitos, legislação e procedimentos, no que diz respeito às associações, é um problema geral, especialmente para OSCs locais9.
Ao longo do processo de emergência das OSCs, surgiram dos tipos de “espaços” para a manifestação cívica ou social: “espaços criados”10 e “espaços conquistados”11. Os espaços criados que o governo estabeleceu para fornecimento de informações e diálogo foram absorvidos pelo partido no poder (FRELIMO), para legitimar as decisões tomadas pelo governo e, por conseguinte, para consolidar o seu poder político e não para colaborar verdadeiramente com as OSCs. Os Observatórios de Pobreza e de Desenvolvimento uma iniciativa do governo apoiada pelos parceiros de desenvolvimento para incentivar e apoiar o diálogo nacional sobre políticas relativas a pobreza e desenvolvimento são controlados pelo governo e não são, de facto, um espaço de debate aberto e inclusivo12.
Todavia, alguns espaços conquistados têm tido êxito na identificação e tratamento de problemas de má gestão por parte do governo, através de contactos informais com o Partido no poder, as autoridades tradicionais e os líderes religiosos, e através da prática de apontar e envergonhar pessoas por parte dos meios de comunicação social independentes.
Contudo, o principal sucesso da participação e influência da Sociedade Civil na formulação e avaliação de Políticas Sociais foi a advocacia de políticas mais formalmente organizadas, feita por OSCs, que trazem factos documentados para o diálogo através da investigação. Este espaço conquistado foi construído pelo viés da consolidação dos esforços das OSCs, do desenvolvimento de plataformas partilhadas e através de parcerias estratégicas com Organismos Internacionais da Sociedade Civil (OISCs).
Ao longo das últimas décadas, surgiram várias organizações motivadas, muitas vezes, pelas possibilidades de financiamento que apareceram no final da guerra civil (1992)13 A maioria dessas organizações tinha a prestação de serviços como enfoque principal. As organizações dedicadas à discussão de políticas são muito recentes e surgiram essencialmente na última década. Estas foram criadas com atribuições claras de diálogo sobre Políticas Sociais, muito embora a maior parte delas não tenha base associativa: Liga dos Direitos Humanos (LDH); Centro de Integridade Pública (CIP); Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE); Mecanismo de Ajuda a Sociedade Civil (MASC); Observatório do Meio Rural (OMR); Grupo Moçambicano da Dívida (GDM) e Justiça Ambiental. Apesar da falta de uma base associativa, elas não deixam de ser organizações que defendem interesses legítimos, uma vez que, na maior parte dos casos, os problemas que discutem coincidem com as preocupações mais importantes da sociedade.
4. Dificuldades da Participação Política
O conceito de “Boa Governação” é relativamente novo no país e, embora estando a aumentar a contribuição da Sociedade Civil para a Boa Governação, esta contribuição é ainda limitada. Daí que faça todo o sentido, quando Ngoenha refere que:
“No quadro do nosso sistema, não temos nenhum controlo sobre oque se faz em termos e políticas, não há nenhuma discussão sobre o vasto mundo da acção governativa e do uso dos recursos públicos. Nós somos mudos e impotentes diante da articulação concreta da vida do Estado e não sabemos o que se faz com o nosso dinheiro. É exatamente aqui onde a cidadania, enquanto coordenadora de deveres e direitos, deveria ter os seus princípios de verificação. É aqui onde deveríamos mudar a relação de submissão em relação de união, na passagem de subordinados a cidadãos. Em suma, é aqui onde a democracia encontra todo o seu sentido” (Ngoenha, 2015: 164).
foi o facto de a RENAMO não ter concordado com a ideologia política adotada pela FRELIMO, após a independência o Marxismo Leninismo bem como o ter optado pelo sistema monopartidário. Foi uma guerra fratricida que matou milhões de moçambicanos, criou muitos deslocados e refugiados e deixou muitos órfãos e sequelas ou cicatrizes psicofísicas.
Nota-se, portanto, falta de competências concetuais e conhecimento. A maior parte das OSCs não concebe que a avaliação e advocacia se podem centrar em todo o ciclo das políticas, desde a análise de necessidades até à planificação, implementação e revisão de políticas. Muitas OSCs não compreendem o papel que podem desempenhar na formulação e implementação de políticas sociais, e não veem a importância e o potencial impacto desse trabalho para a sua organização e para os indivíduos que dizem representar. Por outras palavras, especialização, profissionalismo, acesso à informação e sua utilização são insuficiências que caraterizam as organizações. A maior parte das organizações não têm pessoas com competências técnicas para monitorar áreas específicas de governação. Daí que careçam, muitas vezes, de credibilidade para poderem defender a sua causa e manter um diálogo equilibrado com o governo, que possui pessoal mais qualificado e profissional.
Feita a análise dos documentos, bem como das entrevistas, chegamos a conclusão que os elementos abaixo concorrem para a fragilidade das OSCs moçambicanas na participação política rumo a Boa Governação. Ora vejamos:
- 1. Fator histórico: é preciso notar que as OSCs moçambicanas ainda demonstram os efeitos de um legado de 15 anos de regime de partido único; daí que muitas delas estejam ainda a tentar adaptar-se ao novo cenário económico e político e, não poucas vezes, funcionem como meros apêndices de organizações civis internacionais que as financiam. As OSCs parecem ter adotado uma “cultura de subordinação” ao governo, num contexto em que predomina a perceção, quanto a nós errada, de que ser crítico do sistema no poder é sinónimo de ser confuso e subversivo. A herança institucional do regime autoritário e a trajetória do próprio Estado de Moçambique no período pós-transição deram origem a uma configuração do campo político, marcada por aquilo que se chama sistema de poder dominante, caraterizado pela dificuldade em distinguir o Estado do partido no poder. 2. Fraqueza técnica: o contributo ou a participação das OSCs moçambicanas em prol da Boa Governação continua muito fraco, porque muitas delas não estão ainda à altura de discutir seriamente com os técnicos e assessores que trabalham para o governo sobre a premência ou não de uma ou outra ação com impacto direto ou indireto sobre os cidadãos. Por via disso, poucas vezes o governo se viu confrontado com situações bem fundamentadas de manifestação por parte das OSCs, em termos de inviabilidade de algumas das suas políticas públicas. Muitas das OSCs nacionais não possuem, a título de exemplo, pessoal que saiba profundamente como é que as políticas públicas são elaboradas, daí que sejam promovidos diálogos sem diálogos; em muitos casos, as OSCs são consultadas somente para efeitos de legitimação das ações governamentais. 3. Secretismo e ameaças: os dirigentes governamentais investem mais tempo em argumentos buscando conspiradores, do que a perceber a essência da origem dos problemas, por forma a adotar mecanismos de resolução, o que representa um total contrassenso num Estado de direito democrático. Claramente, isto revela que os atores políticos de Moçambique ainda não têm cultura democrática, o que denota um desajuste entre o discurso e a prática. Há quase total restrição ao acesso à informação, podendo verificar-se o mesmo em relação às práticas intimidatórias utilizadas pelas autoridades governamentais, principalmente ao nível do governo local; em consequência, vem aumentando o medo de as partes interessadas da Sociedade Civil participarem na definição de políticas sociais. Os atores da Sociedade Civil são frequentemente acusados de pertencer aos Partidos da Oposição, sobretudo a Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO) e o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), ou de estar ao serviço de agenda oculta de organizações ou países internacionais, conforme se fez alusão previamente14. 4. Falta de recursos financeiros: as OSCs tendem a alinhar as suas atividades com as prioridades dos parceiros internacionais de desenvolvimento, ficando as oportunidades de implementação das suas próprias agendas relativamente limitadas. As OSCs moçambicanas são relativamente livres de angariar fundos de várias fontes para tentarem alcançar os seus objetivos, todavia, na prática, são influenciadas pelas prioridades dos seus parceiros de desenvolvimento internacionais. A forte dependência aos fundos dos parceiros de desenvolvimento pode significar que as OSCs tenham de seguir as políticas e as agendas estratégicas dos parceiros, dado que as suas atividades são, por necessidade, modeladas de maneira a encaixar nas prioridades dos Parceiros de Desenvolvimento e nos fundos disponíveis15.
5. Prospetivas para uma Participação (pro)ativa
Em Moçambique, a dinâmica de participação nem sempre foi uma verdadeira participação política, isto é, onde os cidadãos são verdadeiramente consultados e seus apelos escutados e, possivelmente, tomados em conta pelos decisores políticos. A partidocracia tem mais poder do que a democracia. É verdade que há uma abertura legal e institucional para a participação política, como fizemos referência ao longo do trabalho. A Constituição de 1990 e a Constituição em vigor, Lei 8/2003, Decreto 15/2000, Decreto 15/2005 e outros dispositivos legais são exemplos dessa abertura. Porém, urge melhorar o espaço de debate que realce a necessidade de se alcançar verdadeira e efetiva participação dos cidadãos e que contribua para a formulação políticas sociais e sustentáveis.
As OSCs necessitam de ser habilitadas com conhecimentos específicos para fortificação das capacidades dos cidadãos em matérias relacionadas com governação, direitos e deveres, bem como do aprofundamento dos valores da democracia para estancar o medo que carateriza a maioria dos moçambicanos. Para tal, há que saber que: “
Sem organização não há luta, perde-se o sentido do coletivo no “salve-se quem puder”, somos desapossados do nosso poder de cidadão. O medo, manipulado como é, corrói a ação democrática, torna as pessoas obedientes e assustadas ” (Ana Benavente apud Casa-Nova et al, 2012: 73).Nesta perspetiva, eis algumas propostas para a eficácia da Sociedade Civil em prol da Boa Governação:
- 1. Conhecimento conceptual e técnico: todos os processos de tomada de decisão e participação política requerem conhecimento e informação. Sem conhecimento e informação correta e relevante, os cidadãos e os “policy makers” não podem tomar decisões sábias; os representantes políticos não prestam contas aos cidadãos, e estes, por seu turno, não podem dizer aos seus representantes políticos como querem ser governados. Sendo assim, para potenciar as OSCs, é fundamental que se criem e se apoiem os canais de fontes de informação para se tornarem facilmente acessíveis; 2. Consolidação da democracia: a condição sine qua non para a consolidação da incipiente democracia moçambicana, e não só, é a criação de uma democracia à altura do momento histórico uma democracia participada económica e politicamente, uma democracia que sai do “palácio” (parlamento) e entra na cultura de toda a gente passando, assim, a ser uma democracia diferente, mas quotidiana e incisiva; 3. Pesquisa e advocacia: esta posição é um instrumento utilizado, principalmente, por organizações urbanas de pesquisa e advocacia, com uma boa base de factos documentados e uma rede alargada de contactos entre pessoas influentes na estrutura do governo (e, obviamente, do Partido no poder FRELIMO) na Assembleia da República e na comunicação social. No entanto, também há líderes e personalidades locais influentes a serem contactados por OSCs locais para ganhar influência. É necessário, sim, investir na criação de capacidade de pesquisa, de monitoria e de advocacia. É preciso quebrar barreiras e tabus. Por fim, é de salientar que o ambiente político, em Moçambique, está a deteriorar-se e as vozes críticas são, cada vez mais, vítimas de intimidação e ameaças. Porém, a visibilidade pública através de ligações com indivíduos influentes, selecionados ou representantes pró-OSCs do Partido no poder tem dado bons resultados. Estas parcerias são uma dimensão de visibilidade e de proteção, mas são também uma abordagem estratégica para reforçar a credibilidade e a confiança das OSCs nacionais.
Conclusão
Nos dias de hoje, o nacionalismo originário (Estado-nação) é substituído por aquilo que Habermas (1990) chama “pluralismo constitucional”. Devem ser assegurados não apenas os direitos de segurança social, como também o reconhecimento das diferentes formas de vida cultural democracia participativa e pluralista (Fernandes, 2014). Anthony Giddens (2012) fala da democracia dialógica, cujo fim é moldar os programas de ação e as atividades dos cidadãos na vida política. O diálogo, como capacidade de gerar confiança ativa, estende-se às diversas modalidades da vida social. A política dialógica entra no processo de “democratização da democracia” (Santos, 2013), como veículo de representação de interesses numa arena mais alargada do campo político.
Em Moçambique, embora haja um enquadramento jurídico-constitucional da liberdade de expressão e de associação, um compromisso assumido para a participação dos cidadãos na governação, estes elementos formais, porém, confrontam-se com uma cultura e uma prática que funcionam contra o exercício dessas mesmas liberdades. Por exemplo, a falta de acesso à informação e de conhecimento de direitos, legislação e procedimentos, no que diz respeito às associações, é um problema geral, especialmente para OSCs locais ou OCBs17.
Notamos que muitas OSCs locais de pequenas dimensões não têm capacidade académica para lidar com questões complicadas, como monitoria do orçamento e revisões jurídicas, p. ex. Por outras palavras, a fraqueza financeira e o baixo nível de cidadania, isto é, a falta de conhecimento sobre direitos e deveres, e a ineficácia de quadros legais e de funcionamento de instituições governamentais, são fatores limitadores e insustentáveis para que muitas OSCs possam participar ativamente na definição e avaliação de Políticas Sociais. Há um grande vazio na Sociedade Civil moçambicana na produção de políticas alternativas; são muito poucas as OSCs nacionais que pressionam e propõem soluções, que sejam fruto de estudos pertinentes ou análises credíveis de cada situação.
O conhecimento é potenciador e a sua falta é debilitadora. O conhecimento e o acesso à informação são poder. Sem isso, não se é, realmente, um verdadeiro cidadão. Sem o conhecimento da nossa cultura e da nossa história, sem informação sobre o que se passa no nosso país e no resto do mundo; sem o conhecimento sobre os nossos direitos e deveres acabamos, de facto, não fazendo parte da sociedade, pois resvalamos para o passivismo, o inexistencialismo como cidadãos, sem controlo das nossas vidas e, sobretudo, sem nenhuma influência sobre os acontecimentos da nossa comunidade.
Há quatro séculos, Francis Bacon já exaltava o valor intrínseco da informação ao escrever que “informação é poder”. Nos dias de hoje, as pessoas estabelecem as suas relações a todos os níveis, nos quais a informação se dissemina entre as fronteiras e faz com que todas as transações necessárias se concretizem. A Sociedade Civil global, mais do que nunca, procura a todo o custo a informação, porque, afinal, estamos na era da informação. A Sociedade Civil moçambicana, fazendo parte deste mundo globalizado, necessita, mais do que nunca, de se (in)formar, pois ela desempenha um papel imprescindível na promoção da democracia (participativa) e na participação política (dos cidadãos) na vida pública. Para o efeito, a partilha de informação entre as diferentes OSCs torna-se um imperativo, pois a união faz a força.
Não se pretende, com a presente análise, propor a eliminação, pura e simplesmente, dos partidos políticos. É-lhes reconhecida a função, mas não excessiva nem determinante. Eles (partidos políticos) devem ser colocados ao lado de atores políticos que, com eles, possam competir. Aliás, o parlamento sobretudo o moçambicano , onde reina a cultura de ditadura do voto partidário ou a chancela de agendas partidárias sem relevância para a vida do cidadão, para além de ser uma autêntica “escolinha do barulho”, precisa, também, de formas de controlo para que desempenhe cabalmente as suas funções.
Os partidos políticos, por outro lado, conhecem um forte desgaste, enredados como estão, por vezes, em ideologias serôdias das quais têm dificuldades em se libertar. Esses mesmos partidos são portadores de interesses, não raro espúrios, e a própria atividade política tornou-se fonte e fator de corrupção. Uma tal situação não deixa de ser, ela mesma, contagiante na vida social. Os partidos políticos não poderão, por isso, continuar a ser os únicos atores no sistema político. Muito ganharia a democracia se se abrisse a candidatura política, desde logo, a cidadãos individuais que se apresentem como representantes das diversas modalidades da vida associativa na comunidade. O critério seria sempre a preocupação de assegurar a relação entre a vida concreta das pessoas e a gestão das coisas públicas.
A democracia, realidade em constante (re)construção, realiza-se sempre ao ritmo das populações. Para que seja real, não se compadece com estruturas rígidas que espartilham a vida e as atividades das comunidades. Em vez de se dar prevalência ao sistema, impõe-se uma atenção maior à sociedade. É por causa disso que se organiza o Estado. A Sociedade Civil tem o papel fiscalizador e complementar. Por isso, Rifkin (1996) diz ser a sociedade é o 1º (primeiro) setor, porque, quando se estabeleceu a civilização, primeiro estabeleceu-se a comunidade (capital social), depois surgiu o comércio/mercado e, por fim, o Estado/governo. Logo, a sociedade não é o terceiro setor como comummente se alude.
Sem a Sociedade Civil forte e interventiva, a cidadania e os direitos humanos correm certos riscos. Face aos apelos e solicitações daquela sociedade, o aparelho governamental, em estado de stress devido à crise de racionalidade e legitimidade, responde com violência simbólica, quando não com a força física como é o caso de Moçambique. Se a orientação socialista pretendendo satisfazer mais necessidades do que méritos acaba por confiscar a liberdade e por operar uma nova forma de servidão, a perspetiva liberal/capitalista tendendo a privilegiar a liberdade deixa no desamparo largas camadas da população. Impõe-se o triunfo dos direitos sobre os privilégios, escapando-se aos erros de cálculo do liberalismo assim como às ilusões do socialismo. A via aberta consiste na permanente invenção do social e na sua autonomização. A existência da democracia passa também pela redução de paixões políticas e pela inovação do social, sendo desta inovação que se (re)faz a sociedade (Fernandes, 2014).
Finalmente, esta nossa contribuição na perceção do atual estágio da Sociedade Civil moçambicana na luta pela Boa Governação não significa, nunca, que a nossa opinião doxa seja melhor que a dos outros; significa, sim, que queremos participar com as nossas análises e reflexões sociológicas, cientes de que vozes discordantes são pilares de uma verdadeira democracia (desejada/participativa). Queremos, portanto, ajudar a formação de uma Sociedade Civil forte, civilizada, interventiva, proactiva, depois que se sabe que ela é precarizada, fragilizada, cooptada, manipulada. Queremos, sim, contribuir para uma Sociedade Civil onde os cidadãos estão e são (in)formados, têm liberdade de expressão e de associação, participam nas decisões da sociedade, sobretudo em questões que lhes dizem respeito. Por outras palavras, queremos ajudar a consolidar a incipiente e deficiente democracia, pois, como diz Habermas, “quanto mais o cidadão participar na construção do projeto social de desenvolvimento e das resoluções fundamentais, tanto mais se vincula, a sociedade mais se estrutura e as instituições sociais melhor trabalham” (Habermas, 1990: 65). Ou, então, queremos comungar com a filosofia africana, “I partake, therefore I am” (John Mbiti), do que um simples “Cogito, ergo sum” (Rene Descartes).
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Endereço de correspondência Pedrito Carlos Chiposse Cambrão. Universidade Lúrio, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Centro de Estudos Culturais e Religiosos do Oceano Índico (Nampula, Moçambique). Endereço de correspondência: Reitoria: Bairro Marrere, Rua nº 4250, km,2, Nampula, Moçambique. E-mail: pcambrao@unilurio.ac.mz
Artigo recebido em 3 de novembro de 2017. Aceite para publicação em 20 de julho de 2018.
Notas
1 O filósofo Severino Ngoenha (2015: 16) introduz o conceito de “ aparatocracia”, isto é, “os partidos transformaram-se em máquinas de poder que aspiram, antes de tudo, a sua auto-sustentação e a acumulação de mais poder. Não é de admirar que os programas dos partidos sejam intercambiáveis, o que leva o autor a perguntar se os partidos políticos são supérfluos, afinal das contas? Se não o são, para que servem então? Inicialmente, a função de um partido era juntar os cidadãos dispostos a engajarem-se para promover certos objetivos sociais ou políticos que lhes pareciam prioritários. Hoje, os partidos se limitam a atrair, com ´espetáculos` mediáticos, a atenção e o aplauso do público. Difamar o(s) concorrente(s) faz parte do jogo. O que conta é o poder do ´aparato`”.
2 Mede o empobrecimento a nível das famílias, centrando-se em indicadores-chave nas áreas da educação, saúde e dos padrões de vida.
3 Jornal O País, 14 de outubro de 2015.
4 Relatório de Avaliação do Mecanismo Africano de Revisão de Pares (MARP, 2009), Índice Multidimensional de Pobreza (IMP, 2011), Plano de Acção da Redução da Pobreza (PARP, 2011, 2014), Relatório do Banco Mundial: Análise da Despesa Pública de Moçambique (2015); Relatório da OCDE (2009), Relatório do IDH (2014), Discurso do Presidente da República de Moçambique, Filipe Nyusi, na II Conferência Nórdico-moçambicana (2015).
5 Quinze representantes da sociedade civil/OSCs, dez representantes do governo e um grupo focal (composto por dez participantes sendo: cinco membros das OSCs, três representantes do governo e dois académicos).
6 Um modelo de regulação social e económica assente no papel central do Estado para um outro assente em parcerias e outras formas de associação entre organizações governamentais, para-governamentais e não-governamentais, nas quais o aparelho de Estado tem apenas tarefas de coordenação enquanto “primus inter pares”.
7 São um “ conjunto de políticas públicas voltadas para o campo da proteção social, ou para a defesa dos direitos sociais” (F.C. da Silva, 2013. Políticas sociais têm como objetivo a promoção do bem-estar social, tanto a nível coletivo como pessoal. Com as políticas sociais têm-se em vista a continuidade e melhoria do bem-estar social, onde os benefícios de crescimento económico devem alcançar todas as pessoas de forma justa. Defendem, por isso, a solidariedade, a redistribuição, a justiça social e económica (correção das desigualdades sociais) rumo a uma sociedade mais justa e solidária.
8 Designação que se aplica aos campos agrícolas em Moçambique.
9 Foi-nos indicado que as OCBs (Organizações Comunitárias de Base) de menores dimensões têm uma fraca noção de cidadania e têm, por isso, dificuldades em saber onde e como aceder a informação. Entrevista feita a um jurista e membro da União Nacional dos Camponeses (UNAC).
10 Espaços criados (“Invited Spaces”) são fóruns ou plataformas estabelecidas por iniciativa do Governo e/ou PDs, para os quais a Sociedade Civil é convidada para dialogar. São espaços cedidos, daí que também se chamem espaços fechados, quando são estritamente controlados, como são o caso de consultas parlamentares oficiais, ou espaços criados mais abertos, como são o caso de consultas públicas. Esse tipo de “espaço” é, muitas vezes, descrito como controlado “de cima”.
11 Espaços conquistados (“Claimed Spaces”), ao contrário dos Espaços Criados, são fóruns ou plataformas estabelecidas por iniciativa da Sociedade Civil. São espaços que a Sociedade Civil conquista por si mesma (ou “de baixo”), por exemplo, através de lobbying, campanhas, educação, manifestações populares e ações litigiosas em prol do interesse público, entre outros.
12 Embora se tenha registado um aumento da participação da Sociedade Civil e da sua influência no Observatório do Desenvolvimento, a nível nacional, no início de 2012, e nos Observatórios do Desenvolvimento provinciais, em 2011, em Gaza, Manica, Inhambane e Tete, a agenda e a calendarização continuam a ser controladas pelo governo.
13 Guerra movida pela Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO) contra o governo da FRELIMO de 1977 a 1992 (assinatura do Acordo Geral de Paz), cuja motivação segundo rezam os anais da história
14 Entrevista a um jornalista da rádio comunitária em Moamba Maputo e a um gestor duma OSC em Xai- Xai Gaza. Também confirmado por Forquilha (2011)
15 O Censo do INE de 2003 mostrou que cerca de 70% dos fundos das OSCs provinham de Parceiros de Desenvolvimentos estrangeiros.
16 Interação que é feita pelo Presidente da República com a população nos comícios populares ou “showmícios” (como vulgarmente aqui se diz), onde ele dá espaço a um dado número de pessoas para apresentar/exprimir os seus problemas ou suas satisfações. É de salientar que, em alguns lugares, as pessoas são escolhidas e “doutrinadas”, atempadamente, para falar o politicamente correto. Todavia, há casos em que essa “doutrina” não é acatada, o que faz com, consequentemente, as pessoas apresentem/exprima o que, de facto, sentem ou vivem.