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Jornal Português de Gastrenterologia

versão impressa ISSN 0872-8178

J Port Gastrenterol. v.17 n.5 Lisboa set. 2010

 

História natural dos tumores mesenquimatosos do tubo digestivo superior e ecoendoscopia

Natural history of mesenchymal tumors of the upper digestive and tract hchoendoscopy

 

Helena Lomba Viana

helenaviana555@gmail.com

 

Lemos com interesse o artigo original “História Natural dos Tumores Mesenquimatosos do Tubo Digestivo Superior e Ecoendoscopia”.

Trata-se de um estudo rectrospectivo e muito pertinente sobre este tema, uma vez que aborda a utilização da ecoendoscopia na tentativa da caracterização e previsão da evolução deste tipo de tumores. Os autores apresentam uma revisão do seguimento por ecoendoscopia de 82 doentes com tumores mesenquimatosos do tubo digestivo superior, por um período mínimo de 30 meses ou até indicação cirúrgica.

Existem na verdade poucos trabalhos publicados na literatura, que focam a evolução no tempo da alteração das características deste tipo de lesão. Note-se que estes tumores são normalmente pouco diagnosticados nos doentes vivos, uma vez que a sua detecção é um achado nas endoscopias efectuadas por outra indicação. O aspecto endoscópico é variável, desde pequenas protrusões da mucosa até à presença de massas de aspecto polipoide e francamente procidente da parede.

Até ao momento, não existem dados precisos da incidência dos tumores mesenquimatosos e de outras lesões submucosas do tracto gastrintestinal, uma vez que na maioria dos casos eles permanecem assintomáticos ou não diagnosticados durante toda a vida1. Estudos de autópsia detectaram tumores mesenquimatosos esofágicos, essencialmente leiomiomas, em 5% dos casos, e tumores mesenquimatosos gástricos em 50% de todos os doentes que morreram com idade acima dos 50 anos2.

O trabalho apresentado chama a atenção para a dificuldade de previsão da evolução dos tumores mesenquimatosos digestivos, atendendo à sua heterogeneidade. Os autores detectaram alteração das características ecoendoscópicas, no período em que durou o estudo, relativas ao tamanho (mais de 5 mm), ao aspecto ecográfico e à localização.

Da literatura constata-se que os autores são unânimes em considerar que tumores mesenquimatosos com diâmetro superior a 4 cm, contornos irregulares, ecogenicidade heterogénea e índice mitótico superior a 5 mitoses por 50 campos de ampliação, têm maior risco de malignidade. Para Berman3 e Miettinen4 o risco de comportamento maligno está directamente associado ao tamanho e ao índice mitótico da lesão. No entanto, a fronteira entre benignidade e malignidade não é clara. Existem tumores mesenquimatosos gastrintestinais com diâmetro inferior a 2 cm e com baixo índice mitótico que têm comportamento maligno e metastizam à distância, e outros, com diâmetro superior a 4 cm e que se mantêm inalterados durante toda a vida5.

O contributo da punção aspirativa por agulha fina guiada por ecoendoscopia foi uma grande aquisição para a ecoendoscopia, uma vez que acrescentou a possibilidade da obtenção de material directamente do tumor, permitindo a sua caracterização citológica, histológica, e imunohistoquímica. No entanto, também este procedimento tem algumas limitações, nomeadamente: a dificuldade encontrada por vezes em penetrar a lesão, ou porque é muito endurecida, ou porque é diminuta, ou porque está num local de difícil acesso, ou ainda porque se move à frente da agulha dificultando a sua penetração; e a colheita de quantidade de material suficiente para análise e para calcular o índice mitótico. Da avaliação do trabalho apresentado constata-se que a punção aspirativa não foi efectuada a todos os doentes, situação essa que resulta de se tratar de um trabalho rectrospectivo e portanto apenas é possível recuperar os dados do que foi efectuado. Neste sentido, também não é possível saber o índice mitotico das lesões detectadas nos 82 doentes do estudo, impossibilitando assim a análise deste factor. Para Akahoshi 6, a punção aspirativa por agulha fina permite uma taxa de diagnóstico da histologia das lesões em 71% das que têm diâmetro inferior a 2 cm, 86% das que têm diâmetro entre 2 a 4 cm, e de 100% das que têm diâmetro superior a 4 cm.

Os autores do trabalho alertam também para a estabilidade das características destes tipos de tumor, nomeadamente fazendo a comparação da percentagem de doentes cujas lesões sofreram alterações, (14,6%), com os encontrados por outros autores em trabalhos recentemente efectuados (até 20%). Neste sentido, é questionável o tipo e duração de seguimento a efectuar nestes doentes, uma vez que as lesões tendem a manter as suas características inalteradas ao longo dos anos.

Segundo Jensen1, no seguimento destes doentes, o tumor não deve mostrar aumento do tamanho, nem alteração das ecoestruturas. Para este autor, a indicação cirúrgica coloca-se quando existem dois critérios de malignidade entre: desenvolvimento de sintomas, aumento significativo do tamanho (mais de 10 mm), alteração do aspecto ecográfico, ou alteração dos critérios citológicos, histológicos, ou imunohistoquímicos de eventual malignidade.

Bruno7 alerta que o aumento em tamanho das lesões com aspecto benigno não pode ser considerado por si só como indicativo de malignidade e propõe uma vigilância periódica deste tipo de tumor.

Saftoiu5 propõe a ressecção endoscópica submucosa como uma alternativa para o diagnóstico e tratamento dos tumores submucosos com diâmetro inferior a 3 cm.

Segundo Akahoshi6 todos os GIST são considerados potencialmente malignos e portanto poderão todos ter indicação cirúrgica, mesmo as pequenas lesões intramurais do tracto gastrintestinal. Ainda segundo o mesmo autor, a ressecção cirúrgica completa dos GIST menores que 2 cm permite uma percentagem de 100% de cura.

A exérese da totalidade das lesões submucosas apresenta-se como um processo radical, intervencionista por um lado e dispendioso por outro. Sem dúvida que nós partilhamos a ideia dos autores deste trabalho, quanto à proposta de vigilância deste tipo de lesão.

Pensamos que a estabilidade das características ecográficas  por um período de 5 anos é suficiente para que se interrompa o seguimento no final desse período.

Por outro lado, achamos que a vigilância dos doentes com alteração das características ecoendoscópicas deve ser mantida para lá dos 5 anos, uma vez que durante esse período podem apresentar apenas alterações ligeiras dessas características, mas com o passar do tempo elas serem mais marcadas e haver necessidade de indicação cirúrgica numa fase posterior.

Queremos realçar a importância deste trabalho e a necessidade de outros no futuro, para ajudar ao esclarecimento do comportamento deste tipo de tumores e à sua evolução ao longo do tempo.

 

REFERÊNCIAS

1. Jenssen C, Dietrich CF. Endoscopic ultrasound in subepithelial tumors of the gastrointestinal tract, in: Christoph Frank Dietrich Editor, Endoscopic Ultrasound, Stuttgart-New York, 2006 Georg Thieme Verlag: 121-154.

2. Van Stolk RU. Subepithelial lesions, in: Van Dam J, Sivak M V, Editors. Gastrointestinal Endosonography. Philadelphia Saunders, 1999;153-165.

3. Berman J, O’Leavy TJ. Gastrointestinal stromal tumors workshop. Hum Pathol 2001;32:578-582.        [ Links ]

4. Miettinen M, El-Rifai W, Sobin LH, et al. Evaluation of malignancy and prognosis of gastrointestinal stromal tumors: a review. Hum Pathol 2002;33:478-483.

5. Saftoiu A, Ciurea T, Georgescu CV, et al. Curative endoscopic ultrasound-assisted submucosal resection of a gastric stromal tumor – case presentation. Rom J Gastroenterol 2005;14:177-182.

6. Akahoshi K, Sumida Y, Matsui N, et al. Preoperative diagnosis of gastrointestinal stromal tumor by endoscopic ultrasoundguided fine needle aspiration. World J Gastroenterol 2007;13:2077-2082.

7. Bruno M, Carucci P, Repici A, et al. The natural history of gastrointestinal subepithelial tumors arising from muscularis própria: an endoscopic ultrasound survey. J Clin Gastroenterol 2009; 43:821-825.