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Jornal Português de Gastrenterologia

versão impressa ISSN 0872-8178

J Port Gastrenterol. v.18 n.2 Lisboa mar. 2011

 

Macrofístula Esófago-Pleural

Esophago-Pleural Fistula

 

Liliana Santos, Isabel Sousa, Ricardo Rio-Tinto

Serviço de Gastrenterologia, Hospital de Santo António dos Capuchos, Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE;

Correspondência

 

Doente do sexo feminino, 40 anos, caucasiana, sem abrigo, com consumo etanólico superior a 120 g/dia, internada no Serviço de Cirurgia por ascite sob tensão e dificuldade respiratória. Na admissão, realizou radiografia de tórax que mostrou derrame pleural bilateral, mais evidente à direita (Fig. 1a). A TC toraco-abdomino-pélvica mostrava hidropneumotórax à direita e derrame pleural à esquerda; volumosa lesão expansiva ocupando a cavidade pélvica, em provável relação com atípia anexial; micronodularidade do grande epiploon.

 

Fig. 1. Radiografia de tórax na admissão que mostra derrame pleural bilateral (1a). Após a colocação de dreno torácico à direita, observa-se redução do volume do derrame (1b).

 

Foi colocada drenagem torácica à direita com saída de líquido turvo, cujo exame citoquímico foi compatível com exudado e apresentou elevado teor de amilase (9247 UI/L) (Fig. 1b). O exame bacteriológico, micobacteriológico e a pesquisa de Bacilo de Koch por técnicas de amplificação de DNA no líquido pleural foram negativas. A citologia mostrou abundantes neutrófilos não se tendo identificado células neoplásicas.

Após início de alimentação oral, constatou-se a presença de resíduos alimentares no conteúdo da drenagem pleural, pelo que realizou radioscopia com administração oral de gastrografina que confirmou existência de fístula esofago-pleural (FEP) de grande calibre (Fig. 2).

 

Fig. 2. Fístula esófago-pleural demonstrada na radioscopia torácica após ingestão de gastrografina. Observa-se a passagem de contraste do lúmen esofágico para a pleura (seta).

 

A endoscopia digestiva alta identificou orifício com cerca de 30 mm imediatamente acima da transição esofago-gástrica, que permitia a observação da cavidade pleural (Fig. 3).

 

Fig.3. Imagens endoscópicas de fístula esofago-pleural de grandes dimensões (seta), que permite a observação da cavidade pleural (asterisco).

 

A doente faleceu ao 20º dia de internamento, sob antibioterapia empírica de largo espectro e alimentação parentérica total.

A fístula esofago-pleural é uma situação rara que se associa a elevada morbimortalidade, particularmente quando diagnosticada tardiamente. É mais frequente pós-pneumectomia estando descrita em até 1% dos casos1. Outras etiologias são: tuberculose, neoplasias, úlceras, pós-radioterapia, traumática (pós-colocação de sonda nasogástrica) e após procedimentos endoscópicos (dilatação, escleroterapia, colocação de balão Sengstaken-Blakemore). Foram descritos casos de rotura espontânea do esófago com formação posterior de FEP2.

Os sinais clínicos e radiológicos são subtis e inespecíficosdada a ausência na maioria dos casos de envolvimento directo do mediastino, uma vez que a drenagem do conteúdo esofágico se faz directamente para o espaço pleural. A dor torácica é o sintoma mais frequente, podendo associar-se a dispneia, tosse, febre, disfagia e hemorragia digestiva alta. Ao exame físico, a presença de crepitações subcutâneas é típica mas rara3.

A radiografia e a TC torácica mostram a presença de líquido, ar, alimentos ou bário no espaço pleural (sendo os dois últimos achados patognomónicos), podendo ainda revelar alargamento do mediastino, condensação pulmonar, enfisema subcutâneo ou espessamento localizado da parede esofágica. A esofagografia confirma o diagnóstico3.

Tipicamente, o líquido pleural apresenta elevado teor de amilase e pH diminuído. No exame bacteriológico é frequente o isolamento de flora bacteriana da orofaringe e de leveduras. A endoscopia pode permitir o diagnóstico etiológico e o tratamento.

O tratamento da causa subjacente promove o encerramento da fístula. Nos doentes em que não é possível o tratamento dirigido, a colocação endoscópica de próteses auto-expansíveis recobertas ou a cirurgia têm demonstrado bons resultados3.

 

REFERÊNCIAS

1. Wechsler R, Steiner R, Goodman L, et al. Iatrogenic esophagealpleural fistula: subtlety of diagnosis in the absence of mediastinitis. Radiology 1982;144:239-243.        [ Links ]

2. Darbari A, Tandon S. Spontaneous oesophago-pleural fistula with empyema. Indian J Surg 2006;68:111-112.        [ Links ]

3. Wechsler R. CT of esophageal-pleural fistulae. AJR 1986;147:907-909.        [ Links ]

4. Marques P, Alves I. Secondary esophageal stricture after successful closure of a benign esophago-pleural fistula managed with a polyester stent: case report. GE - J Port Gastrenterol 2000;13:280-283.        [ Links ]

 

Correspondência: Liliana Santos, Hospital de Santo António dos Capuchos, Serviço de Gastrenterologia, Alameda Santo António dos Capuchos, 1169-050 Lisboa – Portugal; Telefone: +351 213 136 300; E-mail: llilibrazao@gmail.com.

 

Recebido para Publicação: 18/12/2009 e Aceite para Publicação: 29/11/2010.