SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.18 número2Profilaxia Antibiótica em Endoscopia DigestivaDa Classificação de Viena para a Nova Classificação de Montreal: Caracterização Fenotípica e Evolução Clínica da Doença de Crohn índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

Compartilhar


Jornal Português de Gastrenterologia

versão impressa ISSN 0872-8178

J Port Gastrenterol. v.18 n.2 Lisboa mar. 2011

 

Da Classificação de Viena para a Nova Classificação de Montreal

From the Classification of Vienna to the New Classification of Montreal

 

Fernando Magro

Serviço de Gastrenterologia Hospital de São João e Instituto de Farmacologia e Terapêutica, Faculdade de Medicina, Universidade do Porto. E-mail: fm@med.up.pt.

 

A estruturação das doenças em geral, e da doença de Crohn (DC) em particular, é fulcral ao permitir a classificação apropriada dos doentes em grupos bem definidos, possibilitando a inclusão homogénea de doentes em ensaios clínicos e estudos comparativos.

Em 1998, em Viena, um grupo internacional classificou a DC de acordo com a idade à data de diagnóstico (A), localização da doença no trato digestivo (L) e comportamento clínico (B)2. Posteriormente, em 2005, esta classificação foi revista, permitindo uma classificação fenotípica mais precisa3,4. O que trouxe de novo a classificação de Montreal: 1) Individualização dum grupo pediátrico (idade de 16 anos), 2) Envolvimento não restritivo do tracto digestivo superior (TDS - L4), 3) individualização da doença penetrante anal da doença penetrante abdominal e 4) definição temporal para classificação apropriada do comportamento (5 anos).

Esta estratificação revelou-se mais adequada uma vez que o grupo pediátrico caracteriza-se por serótipos e genótipos próprios4, são mais dependentes dos corticosteróides, necessitam de mais imunossupressores5,6 e têm uma maior prevalência de manifestações extra-intestinais5. Em oposição, os doentes com um diagnóstico com idade superior a 40 anos são menos corticodependentes e consequentemente necessitam de menos imunossupressores e terapêutica biológica7. Com o reconhecimento da importância da idade no diagnóstico e sabendo que a localização da DC varia minimamente no decurso da doença esta classificação criou grupos mais apropriados, com possíveis implicações prognósticas.

O grupo de trabalho da classificação de Viena classificou como L4 7% dos doentes, contudo no estudo efectuado em Portugal5 só 1% tinham envolvimento exclusivo do TDS, estando em concordância com o estudo de Freeman et al8 (0,8%). A implicação desta alteração é de relevo uma vez que os doentes mantêm a classificação prévia de localização ileal (L1), cólica (L2) e ileocólica (L3), com os pressupostos inerentes, e a esta é acrescida a extensão ao TDS (ex: L1 + L4). Esta nova estruturação vai de encontro com as recomendações da European Crohn’s and Colitis Organization (ECCO)9 que individualiza o envolvimento do TDS como uma entidade associada a pior prognóstico, beneficiando duma intervenção terapêutica precoce com imunomodulares.

O comportamento clínico da DC, ao contrário da localização, sofre flutuações temporais em que cerca de 90% dos doentes com vinte ou mais anos de evolução progridem para formas mais graves (estenoses e acontecimentos penetrantes)11,12, necessitando, por conseguinte, dum tempo mínimo para classificação – 5 anos. Acresce o facto, de a doença penetrante anal (fistulas e abcessos) ter sido incluída no grupo penetrante (B3), na classificação de Viena, e existir evidência que esta doença (penetrante anal) não está necessariamente associada com doença penetrante abdominal11. No estudo Português5 4% dos doentes tinham atingimento anal isolado, sem nenhum evento penetrante abdominal.

Fruto desta estruturação e planificação, reconhecemos, hoje, grupos de pior prognóstico como: 1) Diagnóstico anterior a 40 anos, 2) necessidade de corticosteróides aquando do diagnóstico, 3) existência de doença anal e 4) doença estenosante com emagrecimento associado.

O artigo “Da classificação de Viena para a nova classificação de Montreal: caracterização fenotípica e evolução clínica da Doença de Crohn” de Ana Rebelo e colaboradores, publicado no GE1, contem alguns dos mais relevantes aspectos da classificação de Montreal: 1) A localização da doença permaneceu estável, 2) O comportamento clínico teve oscilações temporais (3 e 5 anos), 3) A reclassificação maior foi constatada no grupo penetrante (14,8% dos doentes), 4) divergência clara entre as classificações no respeitante à cirurgia abdominal (85% em Montreal para B3 e 64% para a Classificação de Viena). Em resumo, maior valor preditivo da classificação de Montreal em relação a um endpoint cada vez mais valorizado – cirurgia abdominal.

 

REFERÊNCIAS

1. Rebelo A, Rosa B, Moreira MJ, et al. Da Classificação de Viena para a nova classificação de Montreal: caracterização fenotípica e evolução clínica da doença de Crohn. GE - J Port Gastrenterol 2011;18:15-21.        [ Links ]

2. Gasche C, Scholmerich J, Brynskov J, et al. A simple classification of Crohn´s disease: report of the Working Party of the World Congress of Gastroenterology, Vienna 1998. Inflamm Bowel Dis 2000;6:8-15.

3. Silverberg MS, Satsangi J, Ahmad T, et al. Toward an integrated clinical, molecular and serological classification of inflammatory bowel disease: report of a Working Party of the 2005 Montreal World Congress of Gastroenterology. Can J Gastroenterol 2005;19:5-36.

4. Satsangi J, Silverberg MS, Vermeire S, et al. The Montreal classification of inflammatory bowel disease: controversies, consensus and implications. Gut 2006;55:749-753.

5. Magro F, Portela F, Lago P, et al. Crohn’s Disease in a Southern European Country: Montreal Classification and Clinical Activity. Inflamm Bowel Dis 2009;15:1343-1350.

6. Jacobstein DA, Mamula P, Markowitz JE, et al. Predictors of immuno- modulator use as early therapy in pediatric Crohn’s disease. J Clin Gastroenterol 2006;40:145-148.

7. Heresbach D, Alexandre JL, Bretagne JF, et al. Crohn’s disease in the over-60 age group: a population based study. Eur J Gastroenterol Hepatol 2004;16:657-664.

8. Freeman HJ. Application of the Vienna Classification for Crohn’s disease to a single clinician database of 877 patients. Can J Gastroenterol 2001;15:89-93.

9. Dignass A, Van Assche G, Lindsay JO, et al. The second European evidence-based consensus on the diagnosis and management of Crohn's disease: Current management. J Crohns Colitis 2010;4:28-62.

10. Cosnes J, Cattan S, Blain A, et al. Long-term evolution of disease behavior of Crohn’s disease. Inflamm Bowel Dis 2002;8:244-250.

11. Louis E, Collard A, Oger AF, et al. Behaviour of Crohn’s disease according to the Vienna classification: changing pattern over the course of the disease. Gut 2001;49:777-782.