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Jornal Português de Gastrenterologia
versão impressa ISSN 0872-8178
J Port Gastrenterol. v.18 n.4 Lisboa jul. 2011
Avaliação Comparativa do Teste Respiratório com Triglicerídeos Marcados com 13C no Diagnóstico não Invasivo da Insuficiência Pancreática Exócrina
Sandra Lopes1, José Manuel Romãozinho1,2, Maria Manuel Donato2, Bárbara Oliveiros3, Francisco Portela1, Pedro Figueiredo1, Maximino Correia Leitão1,2
1Hospitais da Universidade de Coimbra Serviço de Gastrenterologia; 2Centro de Gastrenterologia da Universidade de Coimbra; 3Instituto de Biofísica e Biomatemática da Universidade de Coimbra
RESUMO
OBJECTIVOS: Apurar o valor do teste respiratório com triglicerídeos de cadeia média marcados com 13C (TR TGM 13C) no diagnóstico da insuficiência pancreática exócrina (IPE) associada à pancreatite crónica (PC), comparando-o com a quantificação da elastase e da gordura fecais. Correlacionar os resultados dos testes com a gravidade da doença. Avaliar a reprodutibilidade do TR-TGM 13C e determinar o método preferido. MATERIAL/MÉTODOS: Estudo prospectivo envolvendo 30 doentes (Grupo A) com PC moderada (7) e severa (23), e 19 controlos (Grupo B). Diagnóstico e graduação da PC: critérios de Cambridge. Quantificação da gordura e elastase fecais: métodos Van de Kamer e ELISA, respectivamente. O TR-TGM 13C incluiu refeição-prova, precedida de 1 e seguida de 12 amostras de ar expirado. Acuidade dos testes avaliada pelas curvas ROC. RESULTADOS: O TR-TGM 13C revela-se significativamente superior [AUC = 0,938; (p = 0,0001)] à elastase [AUC = 0,843; (p = 0,0001)] e gordura fecais [AUC = 0,620;(p = 0,13)] na discriminação entre os grupos A e B. A acuidade superior do TRTGM 13C [AUC = 0,925;(p = 0,0001)] é sobretudo manifesta no diagnóstico da IPE moderada, comparativamente à elastase [AUC = 0,515;(p = 0,9)] e gordura fecais [AUC = 0,530;(p = 0,8)]. O TR-TGM 13C demonstra excelente reprodutibilidade (r = 0,891; p < 0,001), sendo o método preferido. CONCLUSÕES: O TR-TGM 13C é o método não invasivo preferido, reprodutível, que exibe maior acuidade no diagnóstico da IPE associada à PC, sobretudo nos casos moderados.
PALAVRAS-CHAVE: Insuficiência pancreática exócrina; pancreatite crónica; Teste respiratório com TGM 13C; Teste da elastase fecal - 1; Quantificação da gordura fecal.
Comparative Evaluation of 13C-mixed Triglyceride Breath Test as a Non-Invasive Diagnostic Test of Pancreatic Exocrine Function
ABSTRACT
AIMS: To assess the value of 13C-mixed triglyceride breath test (13C-MTG-BT) compared to faecal fat excretion and faecal elastase, in the diagnosis of exocrine pancreatic insufficiency (EPI) in chronic pancreatitis (CP). To correlate results of analysed tests with disease severity. To evaluate the reproducibility of the 13C-MTG-BT and among all which is the preferred test. MATERIAL/METHODS: Thirty consecutive patients with moderate (7) and severe (23) CP (Group A) and 19 controls (Group B) were prospectively studied. CP diagnosis and grading was done by Cambridges classification. Faecal fat and elastase: Van de Kamer and ELISA methods, respectively. 13C-MTGBT included: solid test meal, 1 breath sample before and 12 after meal. Diagnostic accuracy of each test was evaluated by ROC curves. RESULTS: 13C-MTG-BT shows the highest accuracy [AUC = 0.938;(p = 0.0001)] compared to faecal elastase [AUC = 0.843;(p = 0.0001)] and faecal fat excretion [AUC = 0.620;(p = 0.13)] in the discrimination between group A and B. The highest accuracy of the 13C-MTG-BT [AUC = 0.925;(p = 0.0001)] is above all observed in the diagnosis of moderate EPI, compared to faecal elastase [AUC = 0.515;(p = 0.9)] and faecal fat excretion [AUC = 0.530;(p = 0.8)]. 13C-MTG-BT shows high reproducibility (r = 0.891;p < 0.001) and it is the method of choice. CONCLUSIONS: 13C-MTG-BT is the preferred non-invasive and reproducible method, which shows the highest accuracy in EPI associated with CP, namely in moderate cases.
KEY-WORDS: Exocrine pancreatic insufficiency; Chronic pancreatitis; 13C-mixed triglyceride breath test; Faecal elastase-1 test; Faecal fat excretion test.
INTRODUÇÃO
A pancreatite crónica (PC) tem sido definida como uma doença inflamatória irreversível da glândula pancreática, com destruição e fibrose do parênquima exócrino e/ou endócrino1,2. Dada a dificuldade de obtenção de tecido pancreático para confirmação histológica, o diagnóstico desta entidade nosológica assenta na combinação de critérios clínicos, funcionais e imagiológicos, possibilitando estes, ainda, a graduação da severidade da doença2.
Se é verdade que nos estádios avançados da PC existe uma correlação significativa das alterações ductais (CPRE) e parenquimatosas (TC e ecografia) com a disfunção pancreática exócrina, esta é frequentemente difícil de estabelecer nas fases iniciais do processo3. Com efeito, a insuficiência pancreática exócrina (IPE) desenvolve-se em 50 a 80% dos doentes com PC, manifestando-se clinicamente por esteatorreia, a qual, todavia, apenas surge quando a capacidade exócrina do pâncreas está reduzida a menos de 10%. O referido sintoma instala-se, habitualmente, de forma muito lenta e insidiosa, em média após 13 anos de evolução da doença, sendo frequente que o doente adapte inconscientemente a sua dieta, com redução progressiva da quantidade de gordura alimentar ingerida. Por tudo isto, não é raro que o indivíduo com IPE não apresente esteatorreia4. Deste modo, a avaliação da função pancreática exócrina reveste-se duma especial importância na orientação diagnóstica e terapêutica dos doentes com PC5.
O teste de função pancreática exócrina mais sensível e específico é a prova da secretina-pancreozimina, a qual, porém, é de difícil aplicabilidade na prática clínica diária por ser invasiva (implica intubação duodenal), morosa, dispendiosa e não padronizada. Por estas razões, a sua utilização está limitada a centros especializados5. Para uso corrente estão disponíveis exames não invasivos, tais como os testes de pancreolauril e do ácido paraaminobenzoico (PABA) e a dosagem da quimiotripsina e da elastase nas fezes6. No entanto, estes testes indirectos, apesar de válidos nos estádios avançados da PC, têm uma sensibilidade limitada nos casos menos graves. Ademais, a sua especificidade é influenciável por diversos factores, incluindo medicação concomitante, aceleração do trânsito intestinal, pH luminal e cirurgia gastrointestinal5,6.
Por outro lado, como é sabido, a quantificação da gordura nas fezes, recolhidas em 3 dias consecutivos, define, quando superior a 7 g/24 horas, a presença de esteatorreia. Contudo, a ausência de esteatorreia, como atrás foi assinalado, não exclui a presença de distúrbio pancreático exócrino avançado. Para além disso, a quantificação da gordura fecal constitui um teste incómodo tanto para o doente a ele submetido como para o laboratório que o executa, apresenta taxas de sensibilidade e especificidade baixas, é influenciado pelo teor da dieta, sendo ainda incapaz de diferenciar entre maldigestão e mal absorção7.
Finalmente, os testes respiratórios, utilizando rádio-isótopos estáveis, são considerados, desde há alguns anos, métodos seguros, cómodos e de fácil aplicação na prática clínica corrente8. O seu uso, no âmbito do diagnóstico da IPE, fundamenta-se na diminuição da actividade lipolítica que se verifica na PC, particularmente nos estádios evoluídos da doença8,9.
O objectivo deste trabalho reside em apurar o valor do teste respiratório, com triglicerídeos marcados com 13C (TGM 13C), no diagnóstico da IPE, comparando-o com outros métodos não invasivos, incluindo a quantificação da gordura e da elastase nas fezes. Procedeu-se, ainda, à correlação dos resultados dos testes ensaiados com a gravidade da doença. Avaliou-se, por último, a reprodutibilidade do teste respiratório e, bem assim, qual o teste preferido pelos indivíduos incluídos no estudo.
MATERIAL E MÉTODOS
1. MATERIAL
Estudo prospectivo, desenvolvido no Serviço de Gastrenterologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra, num período de tempo compreendido entre Maio de 2005 e Novembro de 2006. Foram estudados 30 doentes (Grupo A) com o diagnóstico de PC baseado em critérios clínicos e morfológicos, de acordo com a classificação de Cambridge2. Tendo em conta os critérios acima mencionados, obtidos através da execução de diversos exames imagiológicos (ecografia abdominal externa/endoluminal, TC abdominal e/ou CPRE), considerou-se que a doença era severa em 23 casos e moderada nos restantes. O grupo controlo foi constituído por 19 voluntários (funcionários hospitalares e estudantes de medicina), clínica, laboratorial e ecograficamente normais (Grupo B). O quadro 1 revela as características demográficas e clínicas dos dois grupos investigados, comprovando-se a sua semelhança em termos de género e de idade. Foi obtido o consentimento informado de todos os participantes do estudo.
Quadro 1. Características demográficas e clínicas dos indivíduos estudados.
2. MÉTODOS
Todos os testes de função pancreática foram conduzidos sob uma dieta padrão de 100 g/dia de gordura (nos cinco dias prévios). Nos indivíduos com história de toma crónica de enzimas pancreáticas e/ou inibidores da bomba de protões, esta medicação foi suspensa nos cinco dias anteriores à execução do estudo. O mesmo ocorreu com o tabagismo no decurso da realização do teste respiratório.
Doseamento da gordura fecal
A quantificação da gordura nas fezes, colhidas em três dias consecutivos e sob a dieta padrão (100 g/dia de gordura), foi executada de acordo com o método Van de Kamer et al10. Considerou-se haver esteatorreia quando o doseamento da gordura nas fezes foi superior a 7 g/24 horas.
Teste da elastase fecal
A concentração de elastase foi determinada através do método ELISA, utilizando dois anticorpos monoclonais específicos da elastase-1 pancreática humana, que se ligam a dois diferentes epítopos dessa enzima. O limite inferior de detecção da elastase -1 foi de 1 ng/ml. Utilizou-se apenas uma amostra de 100 mg de fezes não diarreicas, diluídas a 1:500, tendo a concentração de elastase -1 (g/g de fezes) sido determinada por fotometria11. Definiu-se insuficiência pancreática como uma concentração da elastase inferior a 200 g/g de fezes.
Teste respiratório TGM 13C
O teste respiratório em análise baseia-se na administração de um substrato de triglicerídeos de cadeia média marcado com13C (TGM 13C), o qual é digerido pelas enzimas pancreáticas (lipase), sendo de seguida absorvido e metabolizado com libertação de 13CO2 para a corrente sanguínea e posterior eliminação, durante algumas horas, pelo ar expirado9.
O teste avaliado incluiu a ingestão de uma refeição sólida (100 g de pão de forma barrado com 20 g de gordura) onde foram incluídos 250 mg de TGM 13C. Esta refeição foi precedida de um jejum de 12 horas, de uma colheita de uma amostra basal de ar expirado e da administração oral de 10 mg de metoclopramida. Após a refeição-prova, procedeu-se à recolha, a cada 30 minutos e nas 6 horas subsequentes, de 12 amostras de ar expirado para outros tantos tubos de ensaio de 10 ml. A quantificação de 13CO2 (relação 13CO2/12CO2) foi levada a cabo num espectrofotómetro de infravermelhos. Os resultados do método tiveram em conta o pico máximo de 13CO2 no ar expirado e a área sob a curva de registo do teste (AUC).
Reprodutibilidade do Teste respiratório TGM 13C
Em 20 casos, procedeu-se à recolha de um segundo exemplar da amostra basal e das 12 amostras de ar expirado após ingestão da refeição-prova, conforme protocolo anteriormente explicitado.
Teste preferido
Todos os participantes do estudo responderam a um inquérito de resposta simples sobre o teste preferido em termos de comodidade, simplicidade e à necessidade de recolha de fezes.
Análise estatística
O ponto de corte para o teste respiratório foi determinado pela análise das curvas ROC, tendo sido escolhido aquele que optimizava, simultaneamente, os valores de sensibilidade e especificidade da técnica. Desta forma, determinaram-se os valores de concordância (K de Cohen), sensibilidade, especificidade, valor preditivo negativo e positivo e área sob a curva ROC (AUC), para cada um dos três testes ensaiados, tendo como referência o resultado da observação clínica e dos exames morfológicos (ecografia abdominal, TC abdominal, ecoendoscopia e/ou CPRE). Avaliou-se, ainda, a associação entre os resultados obtidos com cada teste diagnóstico e a gravidade da doença pelo teste 2, com cálculo do coeficiente de contingência de Cramer, ou pelo teste exacto de Fisher, sempre que o primeiro não cumpria os pressupostos para a sua utilização.
A reprodutibilidade do teste respiratório foi avaliada através do teste t de Student, para amostras emparelhadas, e do coeficiente de correlação de Pearson.
RESULTADOS
Determinou-se o ponto de corte óptimo para o teste respiratório com TGM 13C, tendo-se concluído que um valor igual ou inferior a 19,35 era indicador de um teste respiratório positivo, ou seja, da presença de IPE.
Os resultados obtidos nos dois grupos estudados, determinados a partir dos valores de cut-off referidos para cada teste de diagnóstico, encontram-se sintetizados no Quadro 2.
Quadro 2. Resultados dos testes ensaiados nos dois grupos estudados.
O Quadro 3 resume os parâmetros determinados para avaliação dos testes de diagnóstico ensaiados. O método que apresenta maior acuidade diagnóstica é o teste respiratório com TGM 13C [AUC de 0,938; (p = 0,0001)], com cifras de sensibilidade, especificidade, valor preditivo negativo e valor preditivo positivo de 83,3%, 100%, 79,2% e 100% (Quadro 3). No que respeita ao teste da elastase, a sua capacidade de discriminar os dois grupos estudados é inferior à do teste respiratório, ainda que esta diferença não alcance significado estatístico, respectivamente (Quadro 3). Este teste, para um valor de cut-off de 200 ng/g, apresenta cifras de sensibilidade, especificidade, valor preditivo negativo e valor preditivo positivo de, respectivamente, 69,7%, 94,7%, 66,7% e 95,2% (Quadro 3). Os dois testes anteriormente considerados revelam uma acuidade significativamente superior à do teste da gordura fecal (teste respiratório vs gordura fecal: p < 0,001; elastase vs gordura fecal: p = 0,01). De facto, este último exame apresenta uma AUC de apenas 0,620 ± 0,081, ou seja, a área sob a curva ROC não é significativamente superior a 0,500, o que indica que este método apresenta muitos falsos positivos e negativos (Fig. 1). Com efeito, para um cut-off de 7g/24 horas, as cifras de sensibilidade, especificidade, valor preditivo negativo e valor preditivo positivo são de apenas 45,5%, 84,2%, 51,6% e 83%, respectivamente (Quadro 3).
Quadro 3. Acuidade diagnóstica dos testes ensaiados.
Fig. 1. Acuidade diagnóstica: comparação dos testes ensaiados (curvas ROC).
Para reforçar os resultados expostos, e com base nas três tabelas de contingência patentes no Quadro 2, constata-se ainda que parece haver uma associação forte entre o estado do indivíduo (doente/controlo) e os resultados do teste da elastase fecal (coeficiente de contingência de Cramer de 0,517; p < 0,001), sendo ligeiramente maior quando se considera o teste respiratório com TGM 13C (coeficiente de contingência de Cramer de 0,630; p < 0,001), mas não se encontra qualquer associação para o teste da gordura fecal (coeficiente de contingência de Cramer de 0,285; p = 0,069).
Quando se procede ao estudo da correlação dos métodos avaliados com a gravidade da doença, verifica-se que o teste respiratório com TGM 13C se revela capaz de detectar e discriminar doentes com IPE moderada de não doentes [AUC de 0,925; (p = 0,0001)], ao contrário do teste da elastase fecal [AUC de 0,515; (p = 0,9)] e do teste da gordura fecal [AUC de 0,530; (p = 0,8)] (Quadro 4). Comprovou-se, assim, uma acuidade significativamente superior do teste respiratório no diagnóstico dos estados moderados de IPE, comparativamente aos testes fecais ensaiados (TGM 13C vs elastase: p = 0,002; TGM 13C vs gordura: p = 0,001) (Fig. 2).
Quadro 4. Correlação com a gravidade da pancreatite crónica estado moderado.
Fig. 2. Correlação com a gravidade da pancreatite crónica estado moderado.
Se, por outro lado, se correlacionar os resultados dos testes ensaiados com os casos de IPE de grau severo, constatasse que o teste respiratório e a elastase fecal apresentam uma acuidade significativamente mais elevada na detecção destes doentes [AUC de 0,942; (p = 0,0001)] vs [AUC de 0,943; (p = 0,0001)] comparativamente à gordura fecal [AUC de 0,648; (p = 0,08)] (Quadro 5). Os dois primeiros testes revelam, neste particular, uma capacidade discriminativa sobreponível (Fig. 3).
Quadro 5. Correlação com a gravidade da pancreatite crónica estado severo.
Fig. 3. Correlação com a gravidade da pancreatite crónica estado severo.
O teste respiratório apresenta uma excelente reprodutibilidade (Fig. 4), uma vez que os valores médios encontrados nas duas medições estão fortemente correlacionados (r = 0,891; p < 0,001) e a diferença observada nos valores médios das respectivas determinações foi de apenas 0,20 (p = 0,864).
Fig. 4. Reprodutibilidade do teste respiratório com TGM 13C.
A totalidade dos 49 indivíduos estudados preferiu o teste respiratório com TGM 13C devido à sua simplicidade e comodidade, nomeadamente, ao facto de dispensar a recolha de fezes.
DISCUSSÃO
A prova da secretina-pancreozimina continua a ser o gold standard dos testes diagnósticos da IPE. Todavia, o facto de constituir um método invasivo, dispendioso e não padronizado, determina que o seu emprego se encontre confinado a alguns (poucos) centros especializados5. Tal tem originado a procura incessante de um teste que, possuindo uma acuidade diagnóstica similar à daquela prova, seja acessível (barato e disponível) e de fácil aplicabilidade (não invasivo, simples e cómodo) na prática clínica corrente3-6.
Diversos têm sido os exames indirectos de diagnóstico da IPE ensaiados no decorrer dos últimos vinte anos3-7, desde as técnicas de doseamento urinário (pancreolauril e PABA), hoje em dia caídas em desuso pela sua reduzida sensibilidade, até aos incómodos e mal odoríferos métodos de dosagem fecal (gordura, quimotripsina e elastase), passando pelo teste respiratório com triglicerídeos marcados com 13C8,9,12, objecto do presente estudo.
Desenvolvido pelo grupo de Vantrappen, o teste respiratório com triglicerídeos marcados com 13C baseia-se na hidrólise (induzida pela lipase pancreática) sofrida pelos dois grupos ésteres daquele substrato no lúmen intestinal, a que segue a sua absorção e metabolização até 13CO2, o qual é depois excretado (e medido) no ar expirado9. Originalmente ensaiado pelo referido grupo, em 21 doentes com PC, o teste respiratório evidenciou cifras de sensibilidade e especificidade de 89 e 81%, respectivamente, na detecção de disfunção exócrina do pâncreas, tendo como referência a prova da secretina-pancreozimina9,13. Outros estudos se seguiram, a maioria dos quais incidindo sobre um número reduzido de doentes, tendo nalguns deles a sensibilidade do teste igualmente rondado os 90% 12.
No presente estudo, o teste respiratório TGM 13C revelou taxas de sensibilidade e valor preditivo negativo de 83 e 79%, respectivamente, e cifras de especificidade e valor preditivo positivo de 100%. Mais relevante, todavia, é o facto de as referidas taxas serem superiores tanto às verificadas com o doseamento da elastase fecal como às observadas com a dosagem da gordura nas fezes, alcançando a diferença, relativamente a este último teste, significado estatístico. Poder-se-á, assim, afirmar que, dos três métodos não invasivos avaliados, o teste respiratório TGM 13C é o que revela maior acuidade no diagnóstico da IPE associada à PC. Realce, ainda, para os 100% de especificidade alcançados pelo teste respiratório neste trabalho, a que não será alheia a utilização de triglicerídeos de cadeia média e a subsequente eliminação de resultados falsos positivos derivados de situações de mal absorção por parte da mucosa intestinal12.
Também, e no que respeita à correlação dos testes avaliados com a gravidade da PC, o teste respiratório TGM 13C foi o único que se mostrou capaz de detectar os estados moderados da doença, sendo, neste particular, a sua acuidade diagnóstica (taxas de sensibilidade e especificidade de 86 e 100%, respectivamente) significativamente superior à verificada quer com a dosagem da gordura nas fezes quer com o doseamento da elastase fecal. Curiosamente, e ao arrepio do referenciado na literatura14,15, no presente estudo a sensibilidade diagnóstica do teste respiratório, no subgrupo da PC de grau moderado, revelou-se superior (85,7% vs 82,6%) à verificada no subgrupo da PC de grau severo. Esta discrepância, poderá ser explicada pelo menor acerto dos exames morfológicos na graduação da disfunção exócrina da glândula pancreática, mormente quando comparado com a prova da secretina-pancreozimina.
Finalmente, o teste respiratório TGM 13C apresenta excelente reprodutibilidade, tanto em doentes como nos controlos, sendo, por outro lado, o método preferido pela generalidade dos indivíduos estudados, devido à sua simplicidade e comodidade, nomeadamente, ao facto de dispensar a recolha de fezes.
Em conclusão: Os resultados do presente estudo evidenciaram que, dos três métodos não invasivos avaliados, o teste respiratório TGM 13C é, não só o que revela maior acuidade no diagnóstico da IPE associada à PC, mas, também, o único capaz de detectar os estados moderados da doença. A estas virtudes do teste respiratório, acrescem uma excelente reprodutibilidade e a preferência conferida pela generalidade dos indivíduos estudados, fruto da sua mais valia em termos de simplicidade e comodidade de execução.
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Correspondência: Sandra Maria Fernandes Lopes; Serviço de Gastrenterologia Hospitais da Universidade de Coimbra Portugal; Praceta Mota Pinto, 3000-075 Coimbra; Telefone: 239 400 483; Fax: 239 701 517; E-mail: sandraflopes@sapo.pt;
Recebido para publicação: 06/12/2009 e Aceite para publicação: 17/02/2011