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Millenium - Journal of Education, Technologies, and Health

versão impressa ISSN 0873-3015versão On-line ISSN 1647-662X

Mill  no.esp5 Viseu jun. 2020  Epub 30-Jun-2020

https://doi.org/10.29352/mill0205e.c.00338 

Editorial especial

A investigação quantitativa: da clássica dicotomia quantitativo-qualitativo à complementaridade metodológica

Quantitative investigation: from classic quantitative-qualitative dichotomy to methodological complementarity.

Investigación cuantitativa: de la clásica dicotomía cuantitativo-cualitativo a la complementariedad metodológica

Ana Paula Cardoso1 

1 Instituto Politécnico de Viseu, Escola Superior de Educação, CI&DEI, Viseu, Portugal


A investigação quantitativa: da clássica dicotomia quantitativo-qualitativo à complementaridade metodológica

A complexidade do mundo que nos rodeia constitui um dos maiores desafios que o ser humano enfrenta nos dias de hoje e, por isso, a compreensão dos fenómenos deve basear-se em informação atualizada e fidedigna, atributos inerentes ao conhecimento científico. Este expressa-se em forma de leis, modelos e teorias, cuja função principal é a de integrar os dados existentes, obtidos através de um processo de investigação rigoroso, sistemático e controlado, que permite a obtenção de um saber replicável e apoiado na evidência científica.

Os termos quantitativo e qualitativo são usados frequentemente para identificar diferentes abordagens de investigação no âmbito das Ciências Sociais. A distinção mais óbvia reside na forma de apresentação dos dados. A investigação quantitativa apresenta resultados estatísticos em termos numéricos, enquanto que a investigação qualitativa apresenta dados de uma forma mais descritiva. No entanto, as distinções ultrapassam esta simples constatação. Especialistas neste domínio, como é o caso de McMillan e Schumacher (2001), referem diferenças mais profundas que se prendem com a visão do mundo, o propósito da investigação, os métodos utilizados, o papel do investigador e a importância do contexto no estudo.

O paradigma quantitativo, herdeiro das ciências físico-naturais, baseia-se no que os autores apelidaram de filosofia “lógico-positivista”, que admite a existência de uma única realidade social, independente e externa ao investigador, que pode ser descrita com objetividade, tal como se apresenta, como qualquer fenómeno natural. Este paradigma, de cariz positivista, privilegia as observações empíricas quantificáveis, as medições efetuadas através de instrumentos de fidelidade comprovada e as análises estatísticas rigorosas, procurando as causas e a explicação dos fenómenos. O estabelecimento de generalizações universais independentes de um determinado contexto constitui uma das suas principais motivações.

Preocupação central deste paradigma é a de garantir a validade interna (o rigor do plano de investigação) e a validade externa (a generalização dos resultados) da investigação, através da eliminação de um maior número de ameaças à sua validade. O esforço de minimização de possíveis erros e enviesamentos tem sido um compromisso de numerosos investigadores, ao longo de mais de um século, e isso tem contribuído para a credibilidade e afirmação da investigação quantitativa no panorama científico.

Derivado das humanidades, o paradigma qualitativo funda-se numa filosofia “naturalista-fenomenológica”, admitindo a existência de múltiplas realidades, construídas pelos indivíduos e abordáveis através da vivência, da convivência e empatia, como todo o fenómeno social, tal como é referido pelos autores supracitados (McMillan & Schumacher, 2001). A investigação qualitativa carateriza-se por uma abordagem naturalista e interpretativa do seu objeto de estudo e está sobretudo preocupada com a compreensão dos fenómenos socias tendo em conta a perspetiva dos participantes. O âmbito da investigação tende a ser mais circunscrito, em termos de abrangência, e mais focalizado em assuntos específicos e relacionados com a vida (local e regional) das populações.

A forte ligação aos contextos da investigação qualitativa acarreta dificuldades na comparação dos dados obtidos em estudos distintos e conduzidos por diferentes investigadores e limita a sua generalização. A natureza contextual torna mais difícil a utilização de instrumentos estandardizados e das técnicas de controlo de possíveis fontes de erros, características dos estudos quantitativos (Vieira, 1999). Talvez por isso, durante muito tempo, a investigação qualitativa foi criticada pela dificuldade em estabelecer a validade dos seus estudos e em demonstrar a legitimidade das conclusões obtidas, aspeto que tem vindo, no entanto, a ser ultrapassado.

Nos últimos anos do século XX e início do século XXI emergiram os Mixed Methods Research (MMR), métodos mistos de investigação, uma abordagem metodológica em que o investigador combina métodos e técnicas quantitativas e qualitativas num mesmo estudo. Trata-se de uma proposta em processo de construção e consolidação, encarada por uns como uma metodologia e por outros como um novo paradigma, uma terceira via (Dias López, 2014).

Sem querer aprofundar esta questão, salientaríamos apenas que a conceção dos designs mistos de investigação vem demonstrar que há uma panóplia de recursos metodológicos à disposição dos investigadores e que esta pluralidade não deve ser encarada de forma dicotómica, mas antes complementar. O ideal será mesmo combinar a utilização da metodologia quantitativa e qualitativa num único estudo para abordar um problema em particular, na medida em que esta diversidade enriquece e complementa o conhecimento da realidade.

Só a contribuição de várias metodologias é que nos poderá ajudar a compreender os diversos cambiantes de uma realidade multifacetada. Nem sempre é conveniente utilizar desenhos experimentais ou quase experimentais; nem sempre é desejável a mensuração das variáveis e o emprego de planos correlacionais. A utilização de um método ou de outro vai depender da natureza do problema a investigar e do grau de conhecimento que se tem sobre o mesmo. Nas palavras sábias de Simões (1990, p. 48), “não há, aliás, métodos perfeitos, sejam eles quantitativos ou qualitativos. O controlo absoluto das variáveis não passa de um ideal inatingível: cada método, em certos aspetos, é mais ou menos eficaz do que outros. E é em relação a um problema particular que um deles pode ser melhor do que outro”.

Referências

Dias López, S. (2014). Los métodos mixtos de investigación: Presupuestos generales y aportes a la evaluación educativa. Revista Portuguesa de Pedagogia, 48 (1), 7-23. Acedido em http://dx.doi.org/10.14195/1647-8614_48-1_1 [ Links ]

McMillan, J., & Schumacher, S. (2001). Research in education: A conceptual introduction (5.ª ed.). Glenview, Illinois: Scott, Foresman and Company. [ Links ]

Simões, A. (1990). A investigação-acção: Natureza e validade. Revista Portuguesa de Pedagogia, 24, 39-51. [ Links ]

Vieira, C. M. (1999). A credibilidade da investigação científica de natureza qualitativa: Questões relativas à sua fidelidade e validade. Revista Portuguesa de Pedagogia, 2, 89-116. [ Links ]

Recebido: 08 de Maio de 2020; Aceito: 26 de Maio de 2020

Autor Correspondente Ana Paula Cardoso Escola Superior de Educação de Viseu Rua Maximiano Aragão 3504 - 501 Viseu - Portugal a.p.cardoso@esev.ipv.pt

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