Introdução
O stresse ocupacional tem sido considerado um problema marcante dos finais do século passado e do momento atual, com consequências na saúde e no bem-estar de pessoas e organizações (Quick & Henderson, 2016). O stresse ocupacional representa, numa perspetiva transacional, o desequilíbrio que a pessoa percebe entre determinadas exigências do trabalho e as suas capacidades para responder às mesmas (Lazarus & Folkman, 1987) e enquadra, segundo o modelo holístico de stresse (Nelson & Simmons, 2011), tanto respostas positivas (eustress) como negativas (distress) a agentes de stresse de trabalho, com repercussões positivas e negativas, respetivamente, na satisfação no trabalho.
As instituições de ensino superior em Portugal têm passado por significativas transformações, o que têm determinado o aumento do stresse dos seus professores, com consequências daí decorrentes.
O stresse dos professores, resultante das dificuldades percecionadas em lidar com as diversas alterações que têm ocorrido nos contextos de ensino, constitui de há alguns anos para cá uma fonte de preocupação para os professores, comunidade educativa em geral, investigadores, responsáveis políticos e para a sociedade em geral (Mota -Cardoso, Araújo, Ramos, Gonçalves, & Ramos, 2002; Travers & Cooper, 1996). Diversos estudos têm procurado estudar o fenómeno do stresse nos professores, focando -se na vertente tradicional da prevenção dos aspetos negativos do stresse e poucos estudos têm sido desenvolvidos sobre o stresse ocupacional, numa perspetiva holística, e sobre a sua relação com a satisfação no trabalho dos professores do ensino superior.
Assim, com o propósito de aprofundar conhecimentos sobre o stresse dos professores do ensino superior numa perspetiva mais abrangente, este estudo visa, avaliar a qualidade do ajustamento do modelo holístico de stresse em professores do ensino superior português.
Enquadramento teórico
Das mudanças ocorridas no ensino superior (políticas, económicas e sociais, reestruturações curriculares e estatutárias, novas políticas de contratação, downsizing e cortes orçamentais) decorrem alterações consideráveis no estatuto e funções dos professores deste nível de ensino e outras mudanças se vislumbram num futuro próximo. Como demonstram e salientam diversos estudos realizados em diferentes países, estas mudanças têm contribuído para o aumento e propagação do stresse nos professores do ensino superior, (Gillespie, Walsh, Winefield, Dua, & Stough, 2001; Kinman, Jones, & Kinman, 2006; Jordão & Aragão, 2013; Winefield et al., 2003). As conclusões destes estudos demonstram que as instituições de ensino superior já não oferecem ambientes de trabalho com baixos níveis de stresse como outrora (Gillespie, Walsh, Winefield, Dua, & Stough, 2001; Kinman, Jones, & Kinman, 2006; Jordão & Aragão, 2013; Winefield et al., 2003). Estes estudos têm considerado apenas as respostas negativas ao stresse e os seus efeitos nefastos (insatisfação, doença, burnout, etc.) (Cooper & Cartwright, 1994), contudo, estudos realizados com outros profissionais (p. ex., enfermeiros), têm salientado também a existência de respostas positivas ao stresse e dos seus efeitos benéficos para o indivíduo (satisfação no trabalho, bem-estar subjetivo, saúde, etc.) (Gillespie et al., 2001; Nelson & Simmons, 2011; Simmons & Nelson, 2007).
O stresse ocupacional é atualmente entendido, numa perspetiva transacional, como uma transação entre o ambiente de trabalho e as caraterísticas do indivíduo que, em determinado momento, e por um processo de avaliações cognitivas da situação e dos recursos de coping disponíveis, verifica que as exigências do trabalho excedem a sua capacidade em lidar com as mesmas (Lazarus & Folkman, 1987). Assente nesta perspetiva e nos pressupostos da Psicologia Positiva (Seligman & Csikszentmihalyi, 2000), surge o Modelo Holístico de Stresse que dá conta quer das respostas negativas (distress) quer das respostas positivas ao stresse (eustress). Segundo este modelo, a vertente positiva ou negativa dos agentes de stresse depende da avaliação cognitiva do individuo, que determina a forma como lida com o distress (coping) ou o aprecia (savoring) e o efeito que este terá será diferente (p.ex., na saúde, no bem-estar, na satisfação) (Nelson & Simmons, 2011; Simmons & Nelson, 2007). De acordo com este modelo, a valência negativa e/ou positiva dos agentes de stresse depende da avaliação cognitiva do indivíduo. Estas formas de avaliação concorrem para identificar até que ponto cada acontecimento é avaliado como perigoso ou ameaçador e/ou desafiante. Desta forma, os fatores promotores de stresse raramente são percebidos como puramente positivos ou negativos. Os autores apresentam resultados de vários estudos empíricos que mostram que um mesmo agente de stresse pode desencadear no mesmo indivíduo, e mesmo simultaneamente, respostas negativas e positivas de stresse, ou seja, de distress e de eustress respetivamente (Nelson & Simmons, 2011; Simmons & Nelson, 2007).
No caso dos professores do ensino superior, as principais fontes de stresse que têm sido identificadas são as características do trabalho, o clima organizacional, a carreira profissional e as condições de trabalho (Jordão & Aragão, 2013). Perante os agentes de stresse o indivíduo realiza uma avaliação cognitiva que determina a vivência de distress ou eustress. O distress será a resposta negativa dada a um agente de stresse, evidenciada através de estados psicológicos negativos, e o eustress será a resposta psicológica positiva dada a um agente de stresse, como indicador da presença de estados psicológicos positivos, refletindo em que medida a avaliação cognitiva de uma situação é vista como benéfica para o indivíduo ou como potenciando o seu bem-estar (Nelson & Simmons, 2011; Simmons & Nelson, 2007). O modelo holístico destaca ainda dois outros conceitos, o de coping e o de savoring. Estes são moderadores da relação entre o distress e as suas consequências e entre o eustress e as suas consequências, respetivamente. Assim, o coping representa o conjunto das estratégias utilizadas pelas pessoas para facilitar o ajustamento ou adaptação individual face a acontecimentos indutores de stresse (Lazarus & Folkman, 1987) e o savoring como o processo através do qual as pessoas alcançam ativamente prazer e satisfação face à experiência positiva (Bryant & Veroff, 2007). Nelson e Simmons (2011) sugerem como consequências potenciais do stresse (distress e eustress) a saúde, o desempenho, qualidade conjugal, envolvimento na comunidade, entre outros. No contexto de trabalho dos professores do ensino superior, diversos autores têm sugerido que existe uma relação entre o stresse e a satisfação no trabalho, podendo ela ser significativa e inversa, assim, à medida que o stresse aumenta a satisfação no trabalho tende a diminuir (Chaudhry, 2012; Travers & Cooper, 1996), ou positiva, ou seja, que quando o stresse aumenta a satisfação também aumenta (Chaudhry, 2012).
Neste sentido, o trabalho realizado e que se apresenta de seguida, procurou explorar a relação entre o stresse ocupacional dos professores do ensino superior e a sua satisfação para com o trabalho, tendo por base o Modelo Holístico de Stresse.
Métodos
No sentido de responder à questão de estudo Qual a relação entre o stresse ocupacional dos professores do ensino superior e a sua satisfação para com o trabalho? realizou-se um estudo do tipo não-experimental e transversal (Sampieri, Collado, & Lucio, 2006), com recurso à metodologia de análise de equações estruturais (Structural Equation Modeling - SEM).
Amostra
A amostra do nosso estudo foi recolhida por conveniência e contou com a participação de 439 professores do ensino superior, 60.8% (n=267) do sexo feminino, com idades compreendidas entre os 22 e os 76 anos (M=44.8 e DP=8.766). A maioria são casados (62.6%). A maioria dos participantes possui o grau de doutor (59.9%), com contrato por tempo indeterminado (62.2%) e exercem funções de docência no ensino superior há uma média de, aproximadamente, 15 anos (M=15.44, DP=8.432). Os professores da nossa amostra distribuem-se pelas categorias profissionais da seguinte forma: 27.8% de assistentes, 26.4% de professores auxiliares, 7.5% de professores associados, 2.1% de professores catedráticos, 29.6% de professores adjuntos, 5.2% de professores coordenadores e 1.4% de professores com outras categorias profissionais (Monitor, Leitor, Consultor). 344 (78.4%) dos participantes encontram-se a exercer funções em tempo integral e que 316 (72%) exercem essas funções em regime de exclusividade. Dos professores que se encontram a exercer funções em tempo parcial e/ou sem exclusividade 75 (65.8%) afirmaram exercer outra profissão para além da de professor do ensino superior. 81.1% dos professores participantes no estudo exercem funções em instituições de ensino superior públicas (18.9% privadas) e 53.5% exercem funções em instituições politécnicas (46.5% universitárias).
Instrumentos de recolha de dados e procedimentos
Para a recolha de dados no presente estudo utilizou-se o método do inquérito, com recurso à técnica do questionário autoadministrado, que integrou um conjunto de questões pessoais e profissionais e seis escalas: I. Escala de Fontes de Stresse na Docência Universitária (Jordão & Aragão, 2013); II. Eustress scale (O’Sullivan, 2011, adaptada e validade por Fonseca & Jordão, 2014); III. Perceived Stress Scale (Cohen, Kamarck, & Mermelstein, 1983, adaptada e validada por Mota-Cardoso, Araújo, Ramos, Gonçalves & Ramos, 2002); IV. Ways of Savoring Checklist (Bryant & Veroff, 2007, adaptada e validada por Menezes Santos, Carvalho, & Marques Pinto, 2008 para a população portuguesa e validada para professores por Fonseca, 2014); V. Brief Cope (Carver, 1997, adaptada e validada por Pais Ribeiro & Rodrigues, 2004); VI. PMI-ST - Pressure Management Indicator - Subescala de Satisfação no Trabalho (Williams & Cooper, 1996, adaptada e validada por Mota-Cardoso, Araújo, Ramos, Gonçalves & Ramos, 2002).
A Escala de Fontes de Stresse na Docência Universitária integra um grupo de questões que se destinam a avaliar potenciais fontes de stresse na profissão e é constituída por 20 itens, distribuídos por 4 fatores: caraterísticas do trabalho, clima organizacional, carreira profissional e condições de trabalho que explicam no seu conjunto 64.6% da variância total. Os quatro fatores apresentam valores de consistência interna muito satisfatórios para os fatores 1 e 2 (α >.80) e satisfatórios para os fatores 3 e 4 com valores alpha situando-se entre 0.70 e 0.8. Os itens da escala são avaliados numa escala de tipo Likert de 6 pontos em que: 1 = Quase nunca é fonte de stresse e 6 = Quase sempre é fonte de stresse. A Escala de eustress apresenta propriedades psicométricas adequadas no que concerne à sua consistência interna (α =.93), é unidimensional e é constituída por 7 itens (5 itens que saturam o fator e 2 questões de despiste). Os itens são avaliados numa escala de tipo Likert de 6 pontos em que: 0 = Nunca 1 = Quase Nunca 2 = Às Vezes 3 = Frequentemente 4 = Muito Frequentemente 5 = Sempre. A PSS - Perceived Stress Scale é constituida por 14 itens e revela uma adequada fiabilidade e validade (α =.863). Os scores nesta escala são obtidos revertendo as respostas dos sete itens positivamente formulados (e.g., 0=4, 1=3, 2=2) e depois somando todos os itens da escala. Os itens são avaliados numa escala de tipo Likert de 5 pontos em que: 0 = Nunca 1 = Quase nunca 2 = Às vezes 3 = Com alguma frequência 4 = Com muita frequência. A Ways of Savoring Checklist é constituída por 11 itens agrupados em três fatores (Comportamento Manifesto - itens 2, 6, 7 e 9; Construção de Memórias - itens 5, 8, 10 e 11; e Partilha com os Outros - itens 1, 3 e 4), que na totalidade explicam 62.7% da variância total. Todos as subescalas apresentam valores de alpha de Cronbach bastante respeitáveis (entre 0.70 e 0.80). Os itens são avaliados numa escala de tipo Likert de 7 pontos em que: 1 = Não se aplica de todo 4 = Aplica-se em parte 7 = Aplica-se totalmente. O Brief Cope é composto pelas seguintes 14 subescalas, com dois itens cada: coping ativo; planear; utilizar suporte instrumental; utilizar suporte social emocional; religião; reenquadramento positivo; auto culpabilização; aceitação; expressão de sentimentos; negação; auto distração; desinvestimento comportamental; uso de substâncias (medicamentos/álcool); e humor. As 14 subescalas apresentam valores de consistência interna satisfatórios (entre 0.6 e 0.9). A resposta a cada item da escala é dada através de uma escala tipo Likert de quatro pontos em que 0 corresponde a “Nunca faço isto”, 1 corresponde a “Faço isso por vezes”, 2 corresponde a “Em média é isto que faço” e 3 corresponde a “Faço quase sempre isto”. O PMI-ST é constituído por 12 itens divididos por dois fatores, a satisfação com a organização (satisfação com o modo como a organização está estruturada e como funciona) e a satisfação com o trabalho (satisfação com as tarefas e funções desempenhadas), apresentando estes fatores valores de consistência interna bons (0.89 e 0.83). A escala total apresenta, por sua vez, uma boa consistência interna (0.84). A resposta a cada item da escala é dada através de uma escala tipo Likert de seis pontos: 1 = Muitíssimo insatisfatório; 2 = Muito insatisfatório; 3 = Algo insatisfatório; 4 = Algo satisfatório 5 = Muito satisfatório; 6 = Muitíssimo satisfatório.
Para viabilizar a recolha de dados, foi solicitada autorização aos autores para a utilização dos instrumentos a incluir no questionário de recolha de dados. Foram ainda garantidas e salvaguardadas as questões do anonimato e confidencialidade dos dados, através de um texto introdutório ao questionário. Foi criado digitalmente o questionário de recolha de dados e foi enviado o pedido de colaboração e de divulgação do link de acesso ao questionário de recolha de dados junto de todos os professores via e-mail (através de contactos pessoais e contactos institucionais resultantes de pesquisa na internet - instituições de ensino superior da rede pública e privada, constantes da página da internet da DGES- e através do contacto de e-mail geral e/ou dos diretores/presidentes das instituições de ensino superior públicas e privadas). O link de acesso ao questionário foi ainda divulgado através das redes sociais (Google+, Facebook, LinkedIn).
Análise estatística
Os dados foram analisados através do software estatístico AMOS - Structural Equation Modeling to Test Relationships, versão 20.0, tendo sido adotado o grau de confiança de 95%, valor de referência em estudos da área das Ciências Sociais e Humanas (Marôco, 2010). O ajustamento do modelo foi avaliado através de índices comparativos de ajustamento, concretamente o NFI - Normed Fit Index (valores inferiores a 0.80 serão indicadores de um mau ajustamento, valores entre 0.80 e 0.90 indicam um ajustamento sofrível e valores superiores a 0.90 indicam um bom ajustamento), PNFI - Parsimony Normed Fit Index (valores inferiores ou iguais a 0.60 indicam um mau ajustamento, valores entre 0,60 e 0,80 indicam um ajustamento razoável e valores superiores a 0.80 são indicadores de um bom ajustamento), CFI - Comparative Fit Index (valores inferiores a 0.90 indicam um mau ajustamento, valores entre 0.90 e 0.95 indicam um ajustamento bom e valores superiores ou iguais a 0.95 indicam um ajustamento muito bom), PCFI - Parsimony Comparative Fit Index (valores inferiores ou iguais a 0.60 indicam um mau ajustamento, valores entre 0.60 e 0.80 indicam um ajustamento razoável e valores superiores a 0.80 são indicadores de um bom ajustamento), RMSEA - Root Mean Square Error of Approximation (o ajustamento do modelo é inapropriado quando a estimativa pontual é superior a 0.10, o ajustamento é considerado medíocre entre 0.08 e 0.10, bom entre 0.05 e 0.08 e muito bom quando a estimativa é inferior a 0.05) (Marôco, 2010).
A construção do modelo e validação do modelo estrutural teve por base a metodologia de análise de equações estruturais (structural equation modeling - SEM). O método que se utilizou para a estimação dos parâmetros desconhecidos, das diferentes trajetórias do modelo, foi o da máxima verosimilhança (maximum likelihood), que forneceu as estimativas dos coeficientes estandardizados das trajetórias (uma estimativa superior a 0.50 em valor absoluto indica uma associação forte), o desvio padrão e o p-value (valores de p<.05 foram considerados como indicativos de trajetórias significativas).
Resultados
O modelo proposto neste estudo designou-se de Modelo de Stresse e Satisfação no Trabalho dos Professores do Ensino Superior, descreve as relações entre o eustress e o distress na satisfação no trabalho, considerando a influência moderada das estratégias de coping e de savoring, em professores do ensino superior em Portugal e resulta da revisão da teoria e da investigação na área. Na Figura 1 apresentamos a representação gráfica do modelo desenvolvido e os resultados dos parâmetros estimados.
Os índices de bondade de ajustamento global obtidos para o modelo (χ2(586)= 17218.247; p= 0.000; χ2/gl= 29.38; NFI= 0.28; PNFI= 2.63; CFI= 0.29; PCFI= 0.27; RMSEA= 0.26) indicam que o ajustamento global à matriz de covariância dos dados dos professores da nossa amostra é pobre, devendo, por isso, ser rejeitado.
Decorrente da análise dos valores dos parâmetros estimados para o modelo procedeu-se a uma especificação do modelo (Figura 2), removendo a trajetória não significativa (ST ( EU). Considerou-se ainda nesta nova especificação alguns índices de modificação, sugeridos pelo próprio software (AMOS), nomeadamente, procedeu-se à alteração da trajetória do efeito de moderação das estratégias de savoring na relação entre o eustress e a satisfação no trabalho para relação entre o eustress e a satisfação com o trabalho.
A análise das trajetórias entre as variáveis revelou, assim, que a trajetória ‘EU ( FS’ é a que apresenta maior peso (β= 0.81; p= 0.000), seguida pela trajetória ‘DS ( FS’ (β= 0.64; p= 0.000) e da trajetória ‘ST ( DS’ (β= -0.50; p= 0.000) que se apresenta como negativa. Estas trajetórias descrevem o efeito das fontes de stresse no eustress e no distress e o efeito direto do distress na satisfação no trabalho. A trajetória ‘EU ( DS’ surge como negativa (β= -1.76; p= 0.000) e com maior peso do que a trajetória ‘DS ( EU’ que é positiva (β= 1.50; p= 0.000). Estas duas trajetórias descrevem um efeito de feedback entre o eustress e o distress. Podemos ainda observar que o efeito moderador produzido pelas estratégias de savoring (β= 0.14; p= 0.000) e estratégias de coping (β= 0.11; p= 0.033) não é muito elevado e que o efeito das estratégias de savoring modera a relação entre o eustress e a satisfação com o trabalho e é superior ao efeito das estratégias de coping na relação entre o distress e a satisfação no trabalho.
Os índices de bondade de ajustamento global dos Modelo de Stresse e Satisfação no Trabalho dos Professores do Ensino Superior respecificado (χ2(387)= 2117.683; p= 0.000; χ2/gl= 5.472; NFI= 0.887; PNFI= 0.789; CFI= 0.905; PCFI= 0.805; RMSEA= 0.101), permitem concluir que o referido modelo revelou uma qualidade de ajustamento boa, ou seja, ajusta-se aos dados da nossa amostra. O valor de NFI indica um ajustamento sofrível, mas muito próximo dos valores que indicam um bom ajustamento (valores superiores a 0.90); o valor de CFI indica um ajustamento bom; os valores dos índices de parcimónia (PNFI e PCFI) indicam um bom ajustamento; e a estimativa RMSEA indica um ajustamento medíocre, contudo, o valor desta estimativa é especialmente importante quando a dimensão da amostra é pequena, o que não se verifica no nosso estudo (Marôco, 2010).
Discussão
A avaliação do modelo proposto neste trabalho aponta para a existência de uma influência direta das fontes de stresse no eutress e no distress. Estes resultados estão de acordo com o Modelo Holístico de Stresse (Nelson & Simmons, 2011). Os resultados indicam ainda, através das trajetórias significativas que surge entre as fontes de stresse e o eustress e o distress, a premissa de que um mesmo agente de stresse pode desencadear no mesmo indivíduo, e mesmo simultaneamente, respostas positivas e negativas de stresse (Nelson & Simmons, 2011; Simmons & Nelson, 2007).
Os nossos resultados confirmam, também, a existência de uma relação recíproca entre o eustress e o distress, tal como sugerem Nelson e Simmons (2011), contudo, ela é apenas negativa na trajetória ‘EU ( DS’, indicando que a perceção de distress diminui a perceção de eutress, mas esta aumenta a perceção de distress.
Os nossos resultados indicam que o efeito positivo do eutress na satisfação no trabalho dos professores do ensino superior não é significativo. Este resultado permite-nos perceber que o efeito produzido pelo eustress na satisfação no trabalho é apenas um efeito moderado pelas estratégias de savoring.
Os resultados confirmam que existe um efeito negativo do distress na satisfação no trabalho, sendo este resultado congruente com o Modelo Holístico de Stresse (Nelson & Simmons, 2011) e a literatura existente na área (Chaudhry, 2012; Gillespie et al., 2001; Mota-Cardoso et al., 2002; Travers & Cooper, 1996).
Os resultados confirmam o efeito de moderação das estratégias de savoring na relação entre o seu nível de eustress e a sua satisfação com o trabalho, contudo este efeito apenas se verifica ao nível da satisfação com o trabalho e não ao nível da satisfação com a organização. Este resultado pode ser explicado pelo facto dos professores revelarem maior satisfação em relação aos aspetos inerentes ao seu trabalho do que aos aspetos associados ao contexto da própria organização (Gillespie et al., 2001; Travers & Cooper, 1996; Winefield et al., 2003), sendo que, em última instância, os professores procurarão desfrutar desses aspetos relacionados com o trabalho.
Os resultados do nosso estudo confirmam o efeito de moderação das estratégias de coping na relação entre o distress e a satisfação no trabalho indo ao encontro da literatura revista (Gillespie et al., 2001; Nelson & Simmons, 2011).
Estes resultados permitem-nos assim, concluir que o Modelo de Stresse e Satisfação no Trabalho dos Professores do Ensino Superior final (respecificado) revelou uma qualidade de ajustamento boa, o mesmo será dizer que o mesmo se ajusta aos dados da nossa amostra (Marôco, 2010), reforçando a importância e a necessidade de desenvolvermos modelos holísticos de análise que apresentem visões integrais do stresse ocupacional, servindo de base para intervenções, que promovam vivências de eustress em detrimento de vivências de distress e que potenciem a utilização de estratégias de savoring e de coping para moderar, de forma positiva e vantajosa, a relação entre o stresse e satisfação no trabalho.
Conclusões
Do trabalho desenvolvido e dos resultados obtidos importa destacar os principais contributos, por um lado, e refletir sobre as limitações, as quais nos permitem explanar algumas questões e sugerir pistas para investigações futuras. Assim, reforçamos os contributos mais relevantes deste trabalho nomeadamente, o seu carácter pioneiro, assente na perspetiva holística do stresse ocupacional, que conjuga a vertente positiva e negativa do stresse, acompanhando a crescente valorização atribuída à Psicologia Positiva, e considerando os professores do ensino superior em Portugal.
Da análise dos dados obtidos importa destacar a avaliação da qualidade do ajustamento de um modelo das relações que se estabelecem entre o eustress e o distress na satisfação para com o trabalho, considerando a influência das estratégias de coping e de savoring, em professores do ensino superior em Portugal, que apresenta um bom ajustamento e que face ao modelo teórico inicialmente proposto, apresenta algumas alterações, das quais destacamos, a existência de um efeito positivo do eustress no distress, a inexistência de um efeito direto entre o eustress e a satisfação no trabalho e a existência de um efeito moderador das estratégias de savoring, especificamente ao nível da satisfação com o trabalho.
De acordo com o modelo final obtido, podemos concluir que o eustress e o distress são conceitos distintos, mas complementares, na determinação das respostas dadas aos agentes de stresse, que a vivência de distress faz diminuir a vivência de eustress, mas esta, por seu lado, faz aumentar a vivência de distress, que as mesmas fontes de stresse potenciam a vivência de eutress e distress, contribuindo mais para a vivência do eustress do que o distress e estes produzem impacto na satisfação no trabalho. Sendo que, o impacto do eustress será positivo, na satisfação com o trabalho, quando moderado pelas estratégias de savoring e o efeito do distress na satisfação no trabalho será direto e negativo, podendo ser moderado pelas estratégias de coping.
Podemos, assim, concluir que o modelo avaliado, em termos globais, reitera o racional teórico no qual se enquadra, importando salientar que os resultados das análises desenvolvidas nos permitem afirmar que o modelo em análise constitui uma tentativa plausível de integração da teoria e da investigação no domínio.
No futuro importa desenvolver estudos mais específicos que permitam compreender o efeito positivo produzido pela trajetória ‘EU ( DS’, contrariamente ao definido na literatura, para tal sugerimos, a replicação do estudo numa nova amostra de professores do ensino superior e que se conjuguem metodologias quantitativas e qualitativas, que permitam explorar esta e outras questões plausíveis e apontar indicadores mais específicos acerca do fenómeno em análise (Sampieri et al., 2006).