Introdução
A Diabetes Mellitus (DM), é uma doença crónica que tem vindo a aumentar a sua prevalência ao longo dos anos. Constitui na atualidade um grave problema de saúde pública nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, e que causa com o desenrolar da doença, uma elevada taxa de complicações, morbilidade e mortalidade, a quem foram atribuídos 1,5 milhões de óbitos no ano de 2012, (World Health Organization, 2016, p.6). Estima-se que existam cerca de 500 milhões de pessoas com diabetes em todo o mundo, número esse que pode ascender aos 693 milhões no ano de 2045, (International Diabetes Federation, 2017, p.6,7).
Em Portugal já no ano de 2015, a prevalência estimada de diabetes na população portuguesa com idades compreendidas entre os 20 e os 79 anos, foi de 13,3%, (Sociedade Portuguesa de Diabetologia, 2016, p.8). A International Diabetes Federation (2017, p.41) refere que no ano de 2017 a prevalência mundial de pessoas com diabetes foi de 8,8% com idades compreendidas entre os 20 e os 79 anos. Refere ainda que a grande maioria das pessoas com diabetes residentes nos países desenvolvidos, entre 87% e 91%, é afetada pela DM tipo 2, (International Diabetes Federation, 2017, p.43).
Alterações do estilo de vida podem diminuir o risco de DM tipo 2, bem como as suas complicações e mortalidade, (International Diabetes Federation, 2017, p.7), pelo que a educação para a saúde é um pilar na abordagem à pessoa com diabetes mellitus, visando capacitar a pessoa para que a mesma usufrua em pleno da vida, e se mantenha o mais saudável possível, numa população predominantemente envelhecida e com baixos conhecimentos e capacidades para controlar a sua DM e prevenir as possíveis complicações a ela associada.
As taxas de prevalência da doença estão a aumentar exponencialmente, em pessoas comparativamente jovens e produtivas, o que acarretará custos colossais para os diversos países, relacionados com tratamento da doença e das suas complicações, aliadas à possibilidade de elevadas taxas de absentismo.
A diabetes mellitus é uma entidade nosológica que fica para a vida pelo que urge tentar travar esta epidemia, quer por parte dos governos e das organizações de saúde, mas também da própria sociedade e de todos os cidadãos, através da modificação dos seus estilos de vida de modo a tornarem-se mais saudáveis e serem mais proativos e responsabilizados pela sua saúde.
Os profissionais de saúde, nomeadamente os enfermeiros, têm um papel basilar em todo este processo, quer capacitando os indivíduos a prevenir a doença, quer a adotar hábitos de vida saudáveis, a aderir e gerir a sua terapêutica e os seus autocuidados.
1. Enquadramento teórico
A DM descreve um distúrbio metabólico de etiologias diversas, que se manifesta por uma hiperglicemia crónica, (Filho e Barros, 2013, p. 155), com perturbação do metabolismo dos hidratos de carbono, proteínas e lípidos, resultante de irregularidades na secreção de insulina, da sua ação, ou ambos, (Seherawat, 2014, p.24).
O diagnóstico clínico de DM é frequentemente sugerido pela presença dos sintomas caraterísticos, infeções recorrentes, perda acentuada de peso, e em casos graves alterações do estado de consciência, como estupor e coma.
Os exames complementares de diagnóstico utilizados para o seu diagnóstico são análises sanguíneas laboratoriais, com pesquisa de glicemia em jejum, prova de tolerância oral à glicose (PTGO), hemoglobina glicosilada (HbA1c), e ocasionalmente uma pesquisa de glicemia capilar, (Filho & Barros, 2013, p.160).
A Direção Geral da Saúde de Portugal (DGS, 2011, p.1) define como critérios para o diagnóstico de DM, umas das seguintes situações:
Glicose plasmática em jejum ≥126 mg/dl (7,0 mmol/l). O jejum é definido como ausência de ingestão calórica nas oito horas anteriores à colheita de sangue;
Glicose plasmática após 2 horas ≥200 mg/dl (11,1 mmol/l) após uma PTGO. O teste deve ser realizado utilizando uma dose de glicose contendo o equivalente a 75 g de glicose anidra dissolvida em água;
HbA1c ≥ 6,5% (48 mmol/mol);
Glicemia ocasional ≥200 mg/dl (11,1 mmol/l), associada a sintomas clássicos de DM.
O Comité de Peritos sobre Diagnóstico e Classificação da DM, da American Diabetes Association (2017, p.13), refere a existência de valores de glicemia demasiado altos para serem considerados normais, mas que não se enquadram ainda nos critérios de diagnóstico de DM, a que denominaram de “Pré-diabetes”, para valores de HbA1c entre 5,7 a 6,4% (39-47mmol/mol).
A International Diabetes Federation, (2017, p.16), sustenta que DM pode ser classificada principalmente em três categorias:
Diabetes tipo 1, devido à destruição de células β autoimunes, levando normalmente a deficiência absoluta de insulina;
Diabetes tipo 2, originada por uma perda progressiva de secreção de insulina das células β, frequentemente tendo como fundo resistência à insulina;
Diabetes Mellitus Gestacional, diagnosticada no segundo ou terceiro trimestre da gravidez.
A hiperglicemia crónica presente na DM está associada a disfunção, a danos prolongados e à falha de diferentes órgãos especialmente os olhos, rins, nervos, coração e vasos sanguíneos, (World Health Organization, 2016, p.13).
As complicações da DM a longo prazo incluem retinopatia com potencial perda de visão; nefropatia que pode levar a insuficiência renal; neuropatia periférica com risco aumentado de úlceras nos pés, amputações e artropatia de Charcot; e neuropatia autonómica que causa sintomas gastrointestinais, genitourinários, cardiovasculares e disfunção sexual. A pessoa com DM apresenta um risco aumentado de doença aterosclerótica, cardiovascular, vascular periférica e cerebrovascular. A hipertensão e as anormalidades do metabolismo das lipoproteínas são ainda frequentemente encontradas em pessoas portadoras de DM, (American Diabetes Association, 2010, p.62).
Os objetivos do tratamento da DM são eliminar os sintomas relacionados com a hiperglicemia, e reduzir complicações a longo prazo, (Filho & Barros, 2013, p.160), pelo que a abordagem terapêutica a utilizar deverá ser diferenciada, mas global, e incluirá sempre intervenções ao nível da dieta, atividade física e medicação, de forma a manter o equilíbrio metabólico, com consequente redução do risco de complicações micro e macrovasculares, (Cruz, Leitão & Ferreira, 2016, p.189). Neste âmbito, a educação terapêutica assume-se como premissa básica e propedêutica da intervenção terapêutica.
Sendo a DM uma doença crónica complexa, que requer cuidados de saúde contínuos com estratégias de redução do risco multifatorial, além do controle glicémico a didática terapêutica deve incluir planos personalizados ao longo do ciclo vital. A educação e o apoio contínuo de auto-gestão da pessoa com DM, são fundamentais para prevenir complicações agudas e reduzir o risco de complicações a longo prazo. (American Diabetes Association, 2014, p.14).
A educação para a saúde pode ser considerada como uma parte integrante e muito importante, dos esforços para a promoção da saúde por parte de cada pessoa. Traduz-se no “empowerment” dos indivíduos, grupos e em última análise das comunidades, capacitando-os para uma análise crítica, determinantes de saúde e consequentemente uma escolha fundamentada de comportamentos saudáveis.
O papel do profissional de saúde é preponderante, daí que ao planear a educação para a saúde, o profissional terá de estar dotado de conhecimentos científicos, sendo ainda fundamentais as competências interpessoais, promotoras da identificação da necessidade, e vontade para a mudança de comportamentos pela pessoa, (Peixoto, 2013, p.101). Neste âmbito a informação proporcionada pelos enfermeiros, capacita as pessoas para atingir níveis ótimos de saúde, (Stanhope & Lancaster, 2011, p.304).
A educação e o suporte à autogestão da pessoa com DM constituem um elemento crítico de cuidados, como processo contínuo facilitador de conhecimentos e habilidades necessárias para o auto cuidado, e de atividades que ajudam a pessoa com DM a implementar e manter comportamentos necessários a gerir a sua doença de forma contínua, (Beck et al, 2017, p.1).
Cunha (2008, p.293), aponta a família e os profissionais de saúde como pilares para um melhor controlo metabólico pelas pessoas portadoras de DM tipo1, e sugere que para a promoção de um controlo metabólico, existe necessidade de se ter em consideração o incremento do apoio social à pessoa com DM, principalmente a nível informativo e instrumental, e um suporte emocional efetivo de forma a encorajar o autocontrolo. A autora enfatiza ainda a importância da manutenção de um programa de exercício físico regular, e a aprendizagem por parte das pessoas com DM, de um conjunto de estratégias de confronto com a doença do tipo instrumental, (como resolução de problemas específicos, comportamento assertivo, a procura de apoio e análise de informações relevantes), no sentido de influenciar o controle metabólico.
Os enfermeiros são os profissionais de saúde considerados como principais facilitadores do apoio educativo e do autocuidado às pessoas com diabetes, sendo que a evidência enfatiza a necessidade de intervenções centradas na pessoa, nas suas caraterísticas pessoais e no significado que as próprias atribuem à diabetes, ou à forma como a posicionam na sua vida, (Cardoso, Queirós & Ribeiro, 2015, p. 246).
A realização de educação para a saúde em pessoas com DM, mostrou melhorar o seu controle glicémico substancialmente, sendo o efeito da educação para a saúde sustentado por um período de até dois anos. De realçar que a redução de HbA1c das pessoas analisadas, foi significativamente maior em pessoas com diagnóstico de DM inferior a 1 ano, comparativamente com aqueles em que o diagnóstico de DM era superior a 1 ano, (Nicoll, et al, 2014, p.210).
Em Portugal, o Programa Nacional para a Prevenção e Controlo da Diabetes e o Processo Assistencial Integrado da diabetes mellitus tipo 2, estipula níveis de diferenciação das consultas para as pessoas com diabetes. Na base do modelo organizacional, estão as consultas especializadas de diabetologia em ambulatório, na área de residência das pessoas com DM, nas Unidades de Saúde Familiares (USF’s) e nas Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP’s), e num nível seguinte, as consultas especializadas de diabetologia a nível hospitalar nas Unidades Integradas de Diabetes (UID), no hospital de referência de cada Agrupamento de Centros de Saúde (ACeS). A promoção da interligação entre os prestadores de cuidados de saúde primários e os serviços hospitalares, compete às Unidades Coordenadoras Funcionais para a Diabetes, bem como a criação de condições para um funcionamento integrado do sistema de saúde. As UID integram especialidades médicas de endocrinologia, medicina interna e pediatria, enfermeiros com formação específica em diabetes, nutricionista ou dietista, podologia e outras especialidades médicas disponíveis (Portugal, Ministério da Saúde, 2013, p.7528).
Nas unidades hospitalares são acompanhadas todas as pessoas com diabetes mellitus tipo 1, bem como pessoas com diabetes mellitus tipo 2 referenciadas pelo médico de Medicina Geral e Familiar das USF’s e UCSP’s. São critérios de referenciação de pessoas com DM tipo 2: valor de HbA1c ≥ 8,0%, após educação terapêutica, reavaliação da história clínica e adaptação da estratégia farmacológica, sem melhoria ao fim de 6 meses; e qualquer situação clínica que se considere necessária encaminhar para apreciação nos cuidados hospitalares, no caso de labilidade e/ou comorbilidades associada (Portugal, Ministério da Saúde, Direção Geral da Saúde, 2013, p.36).
A coordenação entre os diferentes níveis de cuidados é fundamental para a melhoria dos processos assistenciais e acompanhamento da diabetes, permitindo melhoria dos indicadores clínicos, com diminuição da morbilidade e mortalidade, bem como elevados padrões de qualidade dos cuidados, com tempos de acesso adequados, prestados por equipas multidisciplinares altamente diferenciadas, com aumento do grau de satisfação da pessoa com diabetes (Portugal, Ministério da Saúde, 2013, p.7528).
A literatura científica aponta para níveis de conhecimentos insuficientes e inadequados das pessoas com DM, conhecimentos e capacidades que se revelam incapazes para a promoção da sua saúde e prevenção da doença aliados aos cuidados de saúde (Araújo et al, 2018, p.73), implicando incapacidade em atingir as metas e em ultrapassar dificuldades relativas à sua doença, culminando num aumento substancial das complicações relacionadas com a DM, que atingem cerca de metade das pessoas portadoras de diabetes (Santos, 2016, p.58-59).
2. Métodos
Face à importância do trabalho realizado pelas equipas de enfermagem que desenvolvem a sua atividade na área da DM, concetualizou-se um estudo exploratório transversal com foco retrospetivo. O desenho do estudo é de natureza descritiva, e a metodologia de análise dos dados é quantitativa. Procedeu-se ao levantamento de todas as consultas solicitadas pelas diversas unidades/serviços de diferentes especialidades, e realizadas por profissionais de Enfermagem, da Unidade de Diabetes do Centro Hospitalar Tondela-Viseu (CHTV). Foram analisados os principais motivos de solicitação para a realização das consultas, bem como das pessoas com diabetes que beneficiaram das mesmas, durante o primeiro semestre do ano de 2017.
A investigação foi orientada pela seguinte questão de investigação: Qual a tipologia das intervenções diferenciadas em educação para a saúde, realizados a pessoas com diabetes mellitus pelos enfermeiros com competências avançadas na área da diabetes?
O objetivo principal do estudo foi determinar a tipologia das intervenções diferenciadas em educação para a Saúde, realizadas pela equipa de enfermagem da Unidade de Diabetes do Centro Hospitalar Tondela-Viseu, (CHTV), no 1º semestre de 2017. Especificamente procurou-se avaliar a tipologia das intervenções solicitadas por outras/os unidades/serviços de especialidades do hospital. Como objetivos secundários procurou-se: identificar os serviços requisitantes; caracterizar as pessoas alvo de intervenção; e apurar o tipo de ensinos realizados pelas enfermeiras da unidade de diabetes.
2.1 Participantes
Para a constituição da amostra recorreu-se a uma técnica de amostragem não probabilística por conveniência, constituída por pessoas com o diagnóstico prévio ou inaugural de DM. Na determinação da amostra empregaram-se como critérios de inclusão: utentes com o diagnóstico de diabetes, internados nas/nos diversas unidades/serviços de especialidades do CHTV, no 1º semestre de 2017, e que foram alvo de ensinos para a saúde, por parte da equipa de enfermagem da Unidade de Diabetes. Ficaram excluídos todos os utentes com o diagnóstico de DM internados no referido período, que não beneficiaram dessa intervenção.
Os utentes constituintes da amostra encontravam-se internados quer pelo diagnóstico inaugural de DM, quer pela agudização de diversas patologias, em que era sobreponível o descontrolo metabólico relacionado com a diabetes nessa agudização.
Os ensinos desenvolvidos pela equipa de enfermagem da unidade de diabetes foram solicitados pela equipa médica e de enfermagem das unidades/serviços de especialidades de internamento.
2.2 Instrumentos de recolha de dados
A recolha dos dados foi suportada numa Grelha de Avaliação ad hoc criada para o efeito e teve como foco a informação existente nos processos clínicos com registo em suporte de papel, existentes no arquivo na Unidade de Diabetes do CHTV. Concretamente recorreu-se a informação existente em formulário específico para pedidos de colaboração/solicitação, por parte dos outros serviços do hospital.
O instrumento de colheita de dados ficou constituído por três grupos de questões, de forma a permitir a recolha de informação com a maior celeridade e com o mínimo de interferência e influência externa. Incluiu perguntas acerca dos dados sociodemográficos (sexo, idade e concelho de residência), dados clínicos (data do diagnóstico de DM, terapêutica em uso para a doença e serviço de internamento), e dados relativos aos ensinos realizados pela equipa de enfermagem da Unidade de Diabetes (motivo das solicitações do pedido de consultas de enfermagem e pessoa (s) alvo(s) dos ensinos pelos profissionais).
2.3 Procedimentos formais, legais e estatísticos
A Unidade de Diabetes do CHTV integra uma unidade do serviço de Medicina do CHTV. Apresenta uma direção própria, constituída pelo diretor de serviço, coordenadora da unidade e enfermeira chefe. Conta com uma equipa multidisciplinar vasta e abrangente, que contribui para um atendimento muito diferenciado aos seus utentes.
A pessoa com DM é encaminhada para a Unidade de Diabetes por outros serviços hospitalares, pelo ACeS Dão Lafões, e inclusive de outros hospitais como é o caso da Unidade Local de Saúde (ULS) da Guarda. Após a receção do pedido de consulta na Unidade de Diabetes, existe a preocupação de junto com a pessoa com diabetes, traçar um plano individualizado de intervenção atingível, face aos objetivos da própria pessoa e da equipa, em colaboração com o próprio utente e seus familiares/cuidadores, caso exista essa necessidade. As competências necessárias ao utente ou familiares/cuidadores são treinadas até à sua aquisição. Apesar de estabelecido, não existe do ponto de vista formal um protocolo ou um programa de intervenção instituído.
O estudo obteve parecer favorável do dirigente da unidade, dado ser do interesse da instituição apurar como decorre neste âmbito o processo assistencial.
Na análise estatística dos dados foi utilizado como suporte informático, o programa IBM SPSS Statistics, e foram utilizadas técnicas da estatística descritiva.
3. Resultados
O estudo envolveu um total de 81 pessoas, com idades compreendidas entre os 39 e os 95 anos, cuja média de idades é de 71,1 anos, sendo 61,7% (50 pessoas) do sexo masculino e 38,3% (31 pessoas) do sexo feminino. O sexo masculino apresenta uma idade mínima de 39 anos e uma idade máxima de 95, com uma média de idades de 69 anos (±11,7, desvio padrão), enquanto o sexo feminino apresenta uma idade mínima de 46 anos e máxima de 94 anos, com uma média de idades de 74,5 anos (±13,9, desvio padrão).
Trata-se de uma amostra predominantemente envelhecida com 59 pessoas (72,8%), com idade igual ou superior a 65 anos, contra 22 pessoas (27,2%) com idade compreendida entre os 39 e os 65 anos.
A prevalência de ensinos para a saúde foi de 100%, uma vez que foi dada resposta a todos os pedidos de solicitação pelas diversas unidades / serviços.
A quase totalidade da amostra, 98,8% (80 pessoas) possuíam DM tipo 2 e apenas 1,2% (1 pessoa) detinha diagnóstico de DM tipo 1, sendo a mesma do sexo feminino.
Um total de 57 pessoas (70,4%) tinham já o diagnóstico prévio de DM. De salientar que o diagnóstico inaugural de DM foi realizado nesse internamento a 24 pessoas (29,6%), sendo 18 pessoas (22,2%) do sexo masculino, e as restantes 6 pessoas (7,4%) do sexo feminino. Das 24 pessoas a quem foi feito o diagnóstico inaugural de DM, 10 pessoas apresentavam menos de 65 anos de e as restantes 14 tinham à altura do diagnóstico, idade igual ou superior a 65 anos de idade, (Cf. Tabela 1).
Diagnóstico de Diabetes | Sexo | Idade | Total | |||||||
Masculino | Feminino | <65anos | ≥65anos | |||||||
n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | |
Prévio | 32 | 39,5 | 25 | 30,9 | 12 | 14,8 | 45 | 55,6 | 57 | 70,4 |
Inaugural | 18 | 22,2 | 6 | 7,4 | 10 | 12,3 | 14 | 17,3 | 24 | 29,6 |
Total | 50 | 61,7 | 31 | 38,3 | 22 | 27,2 | 59 | 72,8 | 81 | 100 |
A maioria dos participantes (80,2%) estava medicada apenas com insulina, sendo que 14,8% estavam medicados apenas com antidiabéticos orais (ADO), e 4,9% tinham uma terapêutica combinada com ADO e insulina, (Cf. Tabela 2). Das pessoas com idade igual ou superior a 65 anos, um total de 49 pessoas (83,1%) estavam medicadas apenas com insulina, 6 pessoas (10,2%) estavam medicadas apenas com ADO, e 4 pessoas (6,8%) possuíam uma terapêutica combinada.
Terapêutica | Masculino | Feminino | Total | |||
n | % | n | % | n | % | |
Insulina | 38 | 46,91 | 27 | 33,33 | 65 | 80,25 |
Antidiabéticos Orais (ADO) | 9 | 11,11 | 3 | 3,70 | 12 | 14,81 |
Terapêutica combinada: Insulina + Antidiabéticos Orais | 3 | 3,7 | 1 | 1,23 | 4 | 4,94 |
Total | 50 | 61,72 | 31 | 38,27 | 81 | 100 |
Com idade inferior a 65 anos registaram-se 16 pessoas (72,7%) que estavam medicadas apenas com insulina e 6 pessoas (27,3%) medicadas apenas com ADO, não se verificando situação de terapêutica mista.
Dos participantes que tinham como tratamento a insulina, 52 (64,2%) estavam medicados apenas com insulina lenta, 11 (13,6%) com insulina lenta e insulina rápida, 4 (4,9%) com insulina mista e 2 (2,5%) estavam medicados apenas com insulina rápida.
Concelho de Residência das Pessoas com Diabetes
O concelho de residência das pessoas com diabetes com maior representatividade foi o de Viseu com 26 pessoas, seguido do concelho de Mangualde com 8, e do concelho de Castro Daire com 6. Os restantes estão distribuídos por vários concelhos como se pode observar no gráfico 1, pertencentes aos distritos de Viseu e da Guarda.
Unidades/Serviços/Especialidades clínicas requisitantes dos ensinos
O serviço hospitalar que solicitou um maior número de vezes a colaboração das enfermeiras da Unidade de Diabetes foi o serviço de Medicina com 23 pedidos de colaboração, seguido do serviço de Cirurgia com 15 e do serviço de Cardiologia com 12. (Cf. Tabela 3 e Gráfico 2).
Unidade / Serviço Requisitante | n | % |
Medicina | 23 | 28,4 |
Cirurgia | 15 | 18,5 |
Cardiologia | 12 | 14,8 |
Oncologia | 4 | 5 |
Gastroenterologia | 4 | 5 |
Serviço de Urgência Geral | 4 | 5 |
Nefrologia | 3 | 3,7 |
ORL | 3 | 3,7 |
Medicina Física e Reabilitação | 3 | 3,7 |
UCIM | 2 | 2,5 |
Urologia | 2 | 2,5 |
Cirurgia Plástica | 1 | 1,2 |
Cirurgia Vascular | 1 | 1,2 |
Hematologia | 1 | 1,2 |
Neurologia | 1 | 1,2 |
Pneumologia | 1 | 1,2 |
Unidade AVC | 1 | 1,2 |
Total | 81 | 100 |
Intervenções diferenciadas em educação para a saúde, realizados a pessoas com diabetes mellitus pelos enfermeiros com competências avançadas na área da diabetes
Motivos do pedido de Consulta de Enfermagem
A principal causa das solicitações para as intervenções diferenciadas em educação para a saúde, prendeu-se com a gestão da administração/tratamento com insulina em 86,4%. (70 ensinos), nomeadamente preparação e administração de insulina, locais a administrar, gestão do regime terapêutico e hipo e hiperglicemias; seguido da vigilância da glicemia capilar em 77,8%, (63 ensinos), cuidados a ter com os pés, e calçado da pessoa com Diabetes em 13,6% (11 ensinos). Independentemente da principal causa de solicitação, foram feitos diferentes ensinos à mesma pessoa, sendo que os ensinos relativos à alimentação foram realizados à totalidade da amostra (100%); sobre vigilância da glicemia capilar em 77,8% dos casos (63 ensinos), e foram fornecidos equipamentos (glucómetros e/ou caneta de insulina) e realizados ensinos relativos à sua utilização em 44,5% (36 ensinos), (Cf. Tabela 4).
Alvos dos Ensinos de Enfermagem
Os ensinos foram realizados à própria pessoa com DM em 31 dos casos (38,3%), havendo necessidade de realizar os ensinos ao prestador de cuidados em 32 casos (39,5%) e a ambos em 18 casos (22,2%). De referir que no sexo feminino houve necessidade da presença do prestador de cuidados em 67,7% dos ensinos, enquanto no sexo masculino o cuidador esteve presente em 58% dos ensinos realizados, (Cf. Tabela 5).
Pessoas Alvo dos Ensinos | n | % |
Pessoa com Diabetes | 31 | 38,3 |
Cuidador | 32 | 39,5 |
Ambos (Pessoa com Diabetes + Cuidador) | 18 | 22,2 |
Total | 81 | 100 |
Nas pessoas com idade igual ou superior a 65 anos, o cuidador esteve presente em 74,6% dos casos (44 consultas), tendo sido realizados ensinos apenas ao próprio em 25,4% (15 consultas), com diferença estatística significativa (x2=16,664, p=0,006), localizada entre as pessoas com diabetes com idade inferior a 65 anos, e cuidadores e idade superior ou igual a 65 anos. (Cf. Tabela 6).
Pessoas Alvo dos Ensinos | <65anos | ≥65anos | Total | Resíduos | Qui-Quadrado | |||||||
n | % | n | % | n | % | <65 | ≥65 | value | gf | p | ||
Pessoa com Diabetes | 16 | 19,8 | 15 | 18,5 | 31 | 38,3 | 3,9 | -3,9 | Pearson Chi-Square | 16,66 | 2 | 0,000 |
Cuidador | 2 | 2,5 | 30 | 37,0 | 32 | 39,5 | -3,4 | 3,4 | Likelihood Ratio | 17,77 | 2 | 0,000 |
Ambos (Pessoa com Diabetes + Cuidador) | 4 | 4,9 | 14 | 17,3 | 18 | 22,2 | -5 | 5 | Linear-by-Linear Association | 7,63 | 1 | 0,006 |
Total | 22 | 27,2 | 59 | 72,8 | 81 | 100 |
Discussão
A informação clínica registada no processo clínico é frequentemente parca, sendo com frequência referente apenas aos parâmetros analíticos. A lacuna de dados tornou inviável um estudo mais aprofundado sobre a caracterização clínica da DM e sobre a gestão do processo terapêutico pelos participantes, bem como limitou o processo de documentação da abrangência das intervenções educativas realizadas pelas enfermeiras. Dado que não se pode alterar a qualidade do que está registado, assume-se que este facto resulta em limitações para este estudo. Salienta-se porém, que os achados reportados por este estudo exploratório, constituem um contributo para melhor compreender o fenómeno da educação da pessoa com DM em contexto intra-hospitalar.
Da análise dos resultados verificou-se uma predominância de pessoas com Diabetes do sexo masculino, o que vai de encontro à realidade Portuguesa, onde ocorre uma diferença estatisticamente significativa na prevalência de Diabetes entre homens e mulheres, com uma prevalência superior no sexo masculino (Sociedade Portuguesa de Diabetologia, 2016, p.8).
A amostra é predominantemente envelhecida, com uma média de idades de 74,5 anos, à semelhança do panorama nacional, em que mais de um quarto das pessoas entre os 60 e os 79 anos tem Diabetes, (Sociedade Portuguesa de Diabetologia, 2016, p.8), sendo que a quase totalidade da amostra apresenta Diabetes tipo 2. Quase três quartos da amostra possuíam o diagnóstico prévio de DM, o que pode apontar para conhecimentos e capacidades insuficientes da pessoa com diabetes de promover a sua saúde e prevenir a doença e complicações (Araújo et al, 2018, p.73; Santos, 2016, p.58-59), atendendo à hospitalização de carácter agudo e à necessidade de ensinos relativos à sua diabetes de base, conforme identificado por outros autores, relacionado com a elevada faixa etária da amostra (Santos, 2016, p.60).
Mais de três quartos da amostra estavam medicados com insulina, e desses, 64,2% administravam tratamento de insulina lenta. A insulinização assume-se como uma escolha eficaz e muitas vezes tardia nas pessoas com DM tipo 2 (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2016, p. 250), à qual se recorre quando os antidiabéticos orais não controlam as hiperglicemias, (International Diabetes Federation, 2017, p.19).
A maior representatividade do concelho de Viseu como concelho de residência das pessoas com DM, ficará certamente a dever-se à maior densidade populacional, conforme se pode observar na figura 1.
Em 60,5% dos ensinos, os mesmos foram dirigidos à pessoa com Diabetes, tal como é expectável acontecer, de forma a apoiar a promoção de uma autogestão corresponsável ao regime terapêutico, permitindo promover a qualidade e os anos de vida, e uma melhor saúde com menores custos económicos e sociais para os cidadãos e sistemas de saúde, (Cunha et al, 2016, p.151). Em 61,7 % dos ensinos, o cuidador foi envolvido, o que é importante para a eficaz parceria de cuidados, uma vez que manter a família envolvida na educação para a saúde e cuidados instrumentais, é essencial para uma boa adesão ao tratamento da Diabetes, e permite aos profissionais de saúde uma supervisão do tratamento, (Cunha, 2008, p.293). Este valor talvez se possa ainda explicar, pela idade avançada dos participantes.
O principal motivo de solicitação para os ensinos prendeu-se, em 86,4% com a gestão da administração / tratamento com insulina, o que vai de encontro a outros estudos realizados, com padrões de atendimento da Associação Americana de Diabetes, baseados na educação para a autogestão, e que mostram melhoria dos parâmetros avaliados, nomeadamente no valor de HbA1c, (Menino, Dixe, Louro & Roque, 2013, p.142).
Consideram-se como limitações a elevada faixa etária da amostra, o carácter localizado da recolha da informação, a amostra ser de conveniência e de tamanho pequeno, e a impossibilidade de confirmar a aquisição de conhecimentos e capacidades por parte das pessoas com diabetes para controlar a sua doença.
A aplicação de um programa de intervenção direcionado para a educação terapêutica junto de um grupo de pessoas com diabetes tipo 1 seguidos na unidade de diabetes, evidenciou existir uma melhoria no conhecimento das pessoas com Diabetes, especialmente na monitorização dos valores de glicemia e na terapêutica com insulina (Cunha & Teixeira, 2015, p.256), sendo que o aumento do conhecimento sobre a diabetes se associou a uma melhor qualidade de vida em saúde (Santos, 2016, p.60).
Cunha & Teixeira (2015) defendem que o programa pode ser aplicado como medida de educação, como guia de avaliação e de auditoria de boas práticas clínicas. A avaliação da satisfação dos doentes com diabetes com a equipa de saúde, consulta e grupo de diabetes, deve integrar um indicador de avaliação da qualidade dos cuidados de saúde, uma vez que que auxilia os profissionais a satisfazer as necessidades das pessoas, e a vivenciarem a situação de doença crónica de forma mais adequada (Soares & Cunha, 2018, p.54).
Conclusões
A educação para a saúde deve ser privilegiada pelos serviços de saúde como pilar de desenvolvimento e gestão da DM, de forma a auxiliar as pessoas a obter ganhos em saúde, diminuindo as suas complicações, morbi e mortalidade, e consequentemente os custos associados, e deve ser realizada por profissionais especializados, com conhecimentos científicos aprofundados na área que vai ser objeto de intervenção, que deve estar capacitada por competências interpessoais de forma a facilitar o processo.
Este conjunto de pressupostos, faz das enfermeiras da unidade de diabetes do CHTV, as profissionais chave para a realização de educação para a saúde às pessoas com DM em situação crítica com desequilíbrio metabólico, sendo a sua importância reconhecida pelos Médicos e Enfermeiros das diversas unidades/serviços do centro hospitalar.
A frequência dos ensinos foi de 100%, e teve como foco 81 pessoas com DM, em regime de internamento ou em situação de urgência e consulta, com uma média de idades de 74,5 anos, sendo que se destacam as unidades médicas de medicina, cirurgia e cardiologia.
Os ensinos tiveram como alvo as pessoas com diabetes e os seus cuidadores na maioria dos casos (67,7%), demonstrando a importância da família/cuidadores enquanto parceiro eficaz na prestação de cuidados, facilitando a supervisão e adesão ao plano terapêutico.
Como resposta à questão de investigação e objetivo do estudo, os resultados suportam que a gestão do tratamento com insulina (86,4%), e os cuidados com os pés foram o principal assunto de educação para a saúde, o que é facilmente justificado pela evidência científica, que recomenda cuidados centrados na pessoa com DM, nomeadamente estratégias cognitivo-comportamentais para ajudar a pessoa com diabetes a alcançar mudanças de estilo de vida e praticar o auto-controlo (Classe de Recomendação I, Nível de Evidência B), e considerar equipas multidisciplinares lideradas pela enfermagem para apoiar as alterações do estilo de vida e ao auto-controlo (Classe de Recomendação IIa, Nível de Evidência B), (Rydén et al, 2014., p.43).
O percentual de ensinos solicitados à equipa de enfermagem da unidade de diabetes mostra a necessidade de dotar os profissionais de saúde, designadamente os Enfermeiros, de competências avançadas sobre as estratégias promotoras de capacitação das pessoas com Diabetes para os autocuidados específicos que a doença impõe/acarreta, e revela a importância dos profissionais de enfermagem, como elementos pivô e de dinamização dos programas de intervenção junto das pessoas com DM, (Menino, Dixe, Louro & Roque, 2013, p.142).
Assim, como implicações para a prática propõe-se a capacitação e atualização dos profissionais de enfermagem, quer com conhecimentos técnico-científicos na área da diabetes, em especial na gestão do tratamento insulínico, quer o desenvolvimento de habilidades comportamentais para intervir junto das diferentes pessoas com diabetes. Programas sistematizados de vigilância e de cuidados ao pé da pessoa com diabetes deveriam estar corretamente implementados e ser criteriosamente seguidos, nos diferentes níveis de prevenção, com intuito de adiar e evitar as complicações do pé diabético. Considera-se que seria benéfico a instrumentalização de um protocolo/programa de ensinos, suportado em normas de orientação e indicadores de avaliação, e um incremento dos sistemas de informação que facilitasse todo o processo e que permitisse perceber o real alcance das intervenções realizadas.
É fundamental fortalecer as equipas diferenciadas, quer através de recursos humanos e de competências acrescidas, quer dando visibilidade e evidenciando a todos o trabalho e a qualidade com que o mesmo é realizado, daí a razão de ser deste manuscrito.
Como futura linha de investigação, sugere-se investigar o impacto dos ensinos das enfermeiras da unidade de diabetes, nos autocuidados e autogestão da DM, medindo entre outros, o seu efeito nos valores da hemoglobina HbA1c.