Introdução

O efeito do migrante saudável aponta que indivíduos em situação de migração, inclusive os refugiados, tendem a estar entre os grupos mais saudáveis nos seus países de origem e, comparativamente à média dos indivíduos já estabelecidos nos seus países de acolhimento, também costumam ter melhores indicadores de saúde (^{Kennedy, McDonald, & Biddle, 2006}).

Habitualmente, os migrantes apresentam menos condições crónicas quando comparados com os nativos do país de chegada. Isso é devido às características dos migrantes, que têm predominantemente um perfil jovem e a estarem “mais laboralmente aptos”. Contudo, este efeito é rapidamente atenuado após a migração (^{Fennelly, 2007}).

O migrante experiencia uma rápida deterioração do seu estado de saúde logo após o estabelecimento no seu novo país, devido às mudanças radicais no seu estilo de vida, de que é exemplo o novo “ritmo laboral”, a ausência de rede de suporte familiar e o processo adaptativo a toda “uma nova realidade” social e cultural (^{Moniz, 2018}). Desta forma, muitos fatores contribuem para a perda do efeito do migrante saudável, sendo todos eles normalmente associados aos diferentes processos de aculturação (^{Kennedy et al., 2006}).

Por outro lado, independentemente do status de migrantes ou refugiados, os recém-chegados enfrentam desafios comuns pós-migração, que podem afetar a sua saúde mental. A extensão destes efeitos não é uniforme entre os diversos grupos, tendo entre si fatores diferenciadores, como idade, etnia, razões para migrar, entre outros. Estas diferenças entre os grupos são uma constante em qualquer fluxo migratório (^{Kennedy et al., 2006}; ^{Moniz, 2018}). Assim, interessa discutir as condições encontradas nos países de acolhimento que possibilitam um processo de aculturação “mais ténue e mais facilitadora” em comparação com os países em que esse processo apresenta melhores indicadores de sucesso, no sentido de ser menos prejudicial à saúde mental do migrante (Moniz, 2018; ^{Pussetti, 2010}).

Especificamente no contexto europeu, a crise migratória no Mediterrâneo em 2015 não só alarmou a União Europeia, como também tornou óbvias as limitações estruturais da política de migração (^{Comissão Europeia, 2015}). Este aspeto constitui uma oportunidade para a União Europeia encarar a necessidade de rever a sua política de migração e, neste sentido, além da proteção aos migrantes e refugiados, é essencial que se construa uma melhor gestão dos obstáculos impostos ao processo de aculturação, de forma a mitigar os potenciais danos ao migrante e em especial à sua saúde mental (^{Moniz, 2018}; ^{Pussetti, 2010}).

Apesar de existir um grande volume de estudos focados na temática da saúde mental de migrantes e refugiados em diferentes contextos, poucos são exclusivos dos países europeus. Para além disso, uma pesquisa preliminar na JBI Database of Systematic Reviews and Implementation Reports, Cochrane Database of Systematic Reviews, PROSPERO, PubMed e CINAHL revelou que atualmente não há outra revisão (publicada ou em curso) sobre este tema específico. Assim, esta revisão scoping pretende identificar as razões associadas a processos de aculturação de menor impacto à saúde mental de migrantes nos países europeus. Para tal definimos como objetivo: Mapear e sintetizar a existência de impactos negativos na saúde mental de migrantes e refugiados após a sua chegada ao país de acolhimento.

1. Métodos

Este protocolo foi redigido tendo por base o Preferred Reporting Items for Systematic reviews and Meta-Analyses for systematic review Protocols (PRISMA-P) (^{Moher et al., 2015}) e projeta a a realização de uma revisão scoping através do método proposto pelo Instituto Joanna Briggs (^{Tricco et al., 2018}).

A pesquisa será realizada nas bases de dados PubMed, Scopus, CINAHL Complete e Web of Science, e serão incluídos estudos em língua inglesa, portuguesa e espanhola, com data de publicação de 1 de janeiro 2008 à data da realização da revisão. A escolha que motivou este intervalo de tempo da pesquisa deve-se ao impacto que a grande crise financeira de 2008 teve nas leis sobre imigração no contexto da União Europeia, e também pelo facto da crise migratória que atingiu o seu pico em 2015 ter alterado drasticamente o perfil migratório europeu (^{Oliveira, Peixoto, & Góis, 2017}).

Apresentamos, na Tabela 1, um exemplo de estratégia de pesquisa realizada na PubMed.

Após a pesquisa, todas as citações identificadas serão transferidas para o Endnote V7.7.1 (Clarivate Analytics, PA, EUA) e os duplicados removidos. A fim de avaliar a sua elegibilidade para o corpus de artigos que irão integrar a revisão, os títulos e os resumos serão analisados por dois revisores independentes (SS e ES). Na ausência de consenso será incluído um terceiro revisor como critério de desempate (MC). Os artigos completos serão analisados com base nos seguintes critérios de inclusão:

PARTICIPANTES: Esta revisão scoping irá considerar todos os estudos com enfoque em migrantes e refugiados adultos (com idade igual ou superior a 18 anos). Para este efeito, os migrantes são compreendidos como indivíduos em processo de deslocamento ou movimento voluntário e os refugiados como os indivíduos que passam por esse processo involuntariamente (^{ACNUR, 2016}).

CONCEITO: Serão considerados todos os estudos que identifiquem qualquer doença mental dos migrantes e refugiados adquirida após a sua chegada ao país de acolhimento.

CONTEXTO: Serão considerados estudos no contexto dos países da União Europeia, nomeadamente os incluídos no acordo de Schengen (^{Comissão Europeia, 2019}). Devido ao acordo de fronteiras, estes países compartilham muitos pontos semelhantes quanto às leis de imigração o que permite uma análise mais sensível.

TIPO DE ESTUDOS: Todos os tipos de estudos, nomeadamente revisões sistemáticas, estudos quantitativos, qualitativos e de métodos mistos.

Os dados serão extraídos por dois revisores independentes (SS e ES). Na presença de desacordo entre os revisores será incluído um terceiro revisor (MC). Por fim, os resultados serão agrupados numa tabela e acompanhados por uma síntese narrativa.

2. Resultados/discussão

Com a realização desta revisão scoping esperamos um mapeamento amplo que demonstre que o migrante pode estar exposto a uma rápida deterioração do seu estado de saúde em geral logo após o estabelecimento no seu novo país devido às mudanças radicais no estilo de vida. É expectável que esse fenómeno seja devido a desafios comuns pós-migração que podem afetar a sua saúde mental e impor impactos negativos. Adicionalmente, esperamos que a análise sistemática dos artigos incluídos contribua para um conhecimento mais profundo sobre o tema em apreço podendo aportar intervenções para minimizar/ mitigar os seus riscos.

Conclusão

A realização desta revisão scoping será essencial para sintetizar a existência de impactos negativos na saúde mental de migrantes e refugiados após a sua chegada ao país de acolhimento e contribuir para se identificarem intervenções que os minimizem.