Introdução
A hipertensão arterial (HTA) define-se por valores de pressão arterial sistólica (PAS) superiores ou iguais a 140mmHg e/ou valores de pressão arterial diastólica (PAD) superiores ou iguais a 90mmHg para indivíduos com 18 ou mais anos (Williams et al., 2018; Sociedade Portuguesa de Cardiologia, 2018). A HTA simultaneamente é uma doença crónica e um fator de risco cardiovasculçar (Williams et al., 2018; Sociedade Portuguesa de Cardiologia, 2018; Figueiredo & Asakura, 2010). O 5º Inquérito Nacional de Saúde, realizado em Portugal em 2014, estimou uma prevalência de HTA de 24,5% (Portugal, Instituto Nacional de Estatística, 2016), no entanto, estudos anteriores com avaliação da PA estimaram uma prevalência de HTA próxima de 42,2%, superior no sexo masculino (44,4% vs. 40,2%) (Polonia, et al., 2014). No ano de 2014 a Organização Mundial de Saúde (OMS) estimou, para Portugal, uma prevalência de HTA de 29,0%, sendo esta de 31,8% no sexo masculino e de 26,3% no sexo feminino (World Health Organization, 2014). O primeiro Inquérito Nacional de Saúde com Exame Físico (INSEF), realizado em Portugal em 2015, com uma amostra de 4911 indivíduos, com idade compreendida entre 25 e 74 anos, estimou uma prevalência de hipertensão arterial de 36,0% (IC95%:34,3-37,7), tendo sido observados valores mais elevados no sexo masculino [39,6%; (IC95%:36,5- 42,8)] e no grupo etários dos 65 aos 74 anos [71,3%; (IC95%:65,7-76,4)] (Rodrigues et al., 2017). Um estudo realizado em Aveiro e denominado ‘primary care based cohort (pcb-Cohort)’ revelou que a hipertensão foi a comorbidade mais frequente no pcb-Cohort, estando presente em 351 (61,8%) dos 568 utentes, com uma prevalência maior nos homens (62,0% vs. 61,7%) (Rosa et al., 2020). Na Europa, a prevalência de HTA tem registado valores de 44% (38%-55%), nos Estados Unidos da América (EUA) de 30% e no Canadá de 27%. Na Europa estes valores são influenciados pelas diferenças na gestão e adesão ao tratamento e controlo. Nos EUA e Canadá 23% dos hipertensos estão controlados, proporção que desce para 8% (5%-9%) nos países europeus (Serafim, et al. 2019). Em Portugal, estima-se que apenas 39% dos doentes hipertensos estão medicados com fármacos anti-hipertensores e, destes, 28,9% estarão controlados (Polonia et al., 2014).
Como referido, a HTA é o fator de risco mais prevalente e relevante para doenças cardiovasculares (Polonia et al., 2014). Diversos estudos epidemiológicos têm demonstrado a associação da HTA à doença coronária, Acidente Vascular Cerebral (AVC) e insuficiência renal (Kannel et al., 1996; Lim et al., 2012). As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte e incapacidade a nível mundial, sendo que a HTA contribui para 45% do total de mortes por doenças cardíacas e até 51% das mortes por acidente vascular cerebral (Lim et al., 2012) e nos Estados-membro da União Europeia representou cerca de 36% das mortes em 2010 (Serafim et al., 2019). Em Portugal, em 2015 as doenças cardiovasculares atingiram uma percentagem de óbitos de 29,7% (Portugal, MS, DGS, 2017) e a HTA é responsável por 32% do total dos óbitos (Portugal, MS, DGS, 2013).
Portanto, a elevada prevalência e mortalidade da doença cardiovascular prevê a urgente necessidade de alterar a intervenção dos profissionais de saúde, designadamente dos enfermeiros, sustentada pelas alterações demográficas, pelo envelhecimento da população e pela alteração da dinâmica familiar. A monitorização da prevalência de HTA, dos indivíduos com controlo da mesma e o conhecimento dos fatores envolvidos é fundamental para a definição de estratégias na comunidade, nomeadamente, no que respeita à identificação de grupos de risco e avaliação de programas de saúde, com ganhos em saúde como a diminuição das complicações, dos internamentos e das taxas de mortalidade e morbilidade. Neste contexto, a patologia cardiovascular é uma das áreas prioritárias do Plano Nacional de Saúde 2012-2016 e da sua Revisão e Extensão a 2020. A elevada prevalência de fatores de risco associados às doenças do aparelho circulatório, nomeadamente a HTA e a hipercolesterolémia relacionada com o tabagismo e o sedentarismo, impõem que seja dada especial atenção à prevenção, bem como à adoção de medidas integradas e complementares, que potenciem a redução do risco de contrair essas doenças e a concretização do seu rápido e adequado tratamento. A HTA necessita de ações preventivas, terapêuticas e de vigilância, sendo importante não esquecer que a descontinuação da terapêutica, absoluta ou intermitente, pode associar-se a um agravamento da situação clínica (Portugal, MS, DGS, 2013).
A evidência tem mostrado que o grande obstáculo para o controlo da pressão arterial é a não adesão ao tratamento e a manutenção de comportamentos de risco, ou seja, a não adoção de práticas saudáveis e comportamentos preventivos de controlo ou diminuição de risco de doença, sendo um problema de saúde pública (WHO, 2013). A não adesão à terapêutica pode associar-se à complexidade do regime terapêutico e à memória do doente, podendo ocorrer devido ao esquecimento da toma do medicamento ou à dificuldade em saber como e quando tomar o medicamento de forma correta. De facto, a não adesão ao tratamento nas doenças crónicas, estimando-se que cerca de 30% a 50% dos doentes não aderem à terapêutica, apresenta uma dimensão global e um problema de saúde preocupante, independentemente da doença, do tratamento e do prognóstico (Sabaté, 2003).
A OMS tentou uniformizar o conceito de adesão e, para tal, adotou a definição de adesão (adherence) à terapêutica de longo prazo ou crónica, resultante da combinação das definições de Haynes (1979) e de Rand (1993): “Extensão em que o comportamento da pessoa, na toma da medicação, no seguimento de uma dieta e/ou a execução de mudanças no estilo de vida, coincide com as recomendações de um prestador de cuidados de saúde (Sabaté, 2003). Então, adesão é um sinónimo de concordância, compreendendo a aceitação e intervenção ativa e voluntária do doente, que assume e partilha a responsabilidade do tratamento com a equipa de profissionais de saúde que o segue (WHO, 1998). Ou seja, ‘adesão’ significa mais do que respeitar as instruções médicas, depende da adoção e manutenção de comportamentos terapêuticos e de autogestão da doença (Catela, 2010). A adesão ao tratamento tornou-se um tema de grande importância na área da gestão da doença crónica e gestão de cuidados de saúde, sendo que esta desencadeia a melhoria ou não do estado de saúde do indivíduo e de utilização dos serviços de saúde (Páscoa, 2010). Isto implicou uma mudança do modelo tradicional, orientado para a doença, para uma visão holística dos cuidados de saúde, centrados no indivíduo / doente (Ahmed, & Aslani, 2014).
Ainda, referir que a adesão ao tratamento é influenciada por fatores individuais, pela relação interpessoal do indivíduo com os membros da equipa multiprofissional de saúde e do contexto socioeconómico (Figueiredo & Asakura, 2010). E uma boa adesão ao tratamento diminui a mortalidade, as comorbilidades, internamentos e permite a melhoria da qualidade de vida (Simpson et al., 2006).
Compreender os fatores sociodemográficos e familiares envolvidos na adesão ao regime terapêutico permite, em simultâneo, perceber como podem os enfermeiros contribuir para melhorar os comportamentos de adesão ao tratamento, bem como desenvolver estratégias que possibilitem às pessoas integrar comportamentos de autogestão da doença crónica na sua vida diária, aumentando os ganhos em saúde.
Perante este problema formulou-se a seguinte questão de investigação: Que variáveis sociodemográficas e familiares interferem na adesão ao tratamento em hipertensos em contexto comunitário? Assim, delineámos como objetivo: identificar as variáveis sociodemográficas e familiares que interferem na adesão ao tratamento em pessoas com hipertensão arterial na comunidade.
1. Métodos
Realizámos um estudo transversal analítico. A colheita de dados foi efetuada entre setembro e novembro de 2015 na população abrangida pela Unidade Móvel de Saúde (UMS) de Castro Daire. De entre os recursos em saúde existentes na área geodemográfica em estudo realçamos a Unidade Móvel de Saúde (UMS), uma iniciativa da Autarquia, financiada pelo Programa Leader (2004), que alia a saúde e a ação social. A UMS dispõe de um profissional de enfermagem que presta cuidados de saúde primários, na área da prevenção da doença, promoção e educação para saúde. Num concelho do interior onde impera o envelhecimento populacional o recurso comunitário da UMS é essencial para uma melhor acessibilidade aos cuidados de saúde permitindo, entre outros aspetos, o controle e a gestão da doença crónica. A intervenção da consulta de enfermagem no âmbito da UMS tem por base um serviço de proximidade, deslocando-se às localidades distantes das instituições / unidades locais de saúde, com o objetivo de colmatar as dificuldades sentidas pela população, principalmente a mais idosa, devido ao comprometimento da mobilidade e aumento da dependência, com o intuito de aumentar o grau de satisfação e acessibilidade dos munícipes aos cuidados de saúde (Município de Castro Daire, s.d.).
A população com HTA da UMS de Castro Daire era de 1708 indivíduos. A amostra foi não probabilística, por conveniência, e ficou constituída por 235 pessoas com HTA do concelho de Castro Daire utilizadores da UMS, correspondendo a 13,76% da população inscrita na UMS com diagnóstico de HTA.
Considerámos como critérios de inclusão no estudo, residência no concelho de Castro Daire; diagnóstico clínico de hipertensão arterial de acordo com a norma nº020/2011 atualizada em 2013 da DGS; idade ≥ 18 anos; inscritos na Unidade Móvel de Saúde; inscritos nas unidades funcionais do Centro de Saúde de Castro Daire e aceitar voluntariamente participar no estudo. Como critérios de exclusão considerámos as pessoas com demência e pessoas com dificuldades de comunicação. Foi realizado pedido de Parecer à Comissão Nacional de Proteção de Dados, com resposta favorável (Deliberação nº 1412/2015) e pedido de autorização para efetuar colheita de dados à Câmara Municipal de Castro Daire - UMS igualmente com resposta positiva (Ofício nº11761). Foi preenchida a respetiva declaração de consentimento informado pelo participante/representante com entrega prévia ao protocolo de avaliação.
Os dados foram recolhidos através de um questionário aplicado a 257 indivíduos. Contudo, somente 235 eram hipertensos, pelo que houve a exclusão de 22 questionários. O instrumento de colheita de dados era composto por variáveis sociodemográficas, pela escala de Apgar Familiar e pela escala de Medida de Adesão aos Tratamentos (MAT), criada por Morisky, Green e Levine (1986), traduzida, adaptada e validada para Portugal por Delgado e Lima (2001). A MAT é constituída por sete itens, respondidos numa escala tipo Likert de 6 pontos, desde 1=Sempre a 6=Nunca. A soma dos valores de cada item e a sua divisão pelo número de itens permite obter um nível de adesão aos tratamentos. A pontuação varia entre 1 e 6. Pode ser convertida numa escala dicotómica: nunca (6) e raramente (5) da escala de Likert passam a não (1) da escala dicotómica; por vezes (4), com frequência (3), quase sempre (2) e sempre (1) da escala de Likert passam a sim (0) da escala dicotómica. Neste caso, a pontuação varia entre 0 e 1. Em ambos os casos, valores mais elevados significam maior nível de adesão. Para avaliar a funcionalidade familiar foi utilizada a Escala de Apgar Familiar de Smilkstein (1978) (Smilkstein, Ashworth & Montano, 1982), Versão Portuguesa de Azeredo e Matos (1989). É uma escala constituída por cinco questões que quantificam a perceção que o indivíduo tem do funcionamento da sua família. Cada questão permite três tipos de resposta: “quase sempre”, “algumas vezes” e “quase nunca”, sendo as cotações de 2, 1 e 0 pontos, respetivamente. O resultado final da escala obtém-se pela soma das pontuações atribuídas a cada uma das questões e varia entre zero (0) e dez (10) pontos. O total das pontuações permite classificar o tipo de relação familiar em: família altamente funcional - 7 a 10 pontos, família com disfunção leve - 4 a 6 pontos e família com disfunção severa - 0 a 3 pontos.
O tratamento estatístico descritivo e inferencial foi processado através do programa Statistical Package for the Social Science (SPSS) versão 23.0 (2015) para Windows. A análise dos dados efetuou-se com o recurso à estatística descritiva e inferencial. Com a estatística descritiva, determinámos frequências absolutas e percentuais, medidas de tendência central como médias, medidas de dispersão como desvio padrão. Na análise inferencial foram aplicados os testes Teste de U Mann Whitney (UMW) para comparação de médias de uma variável quantitativa em dois grupos de sujeitos diferentes; análise de variância a um fator (ANOVA) ou teste de Kruskall Wallis (KW) para comparação de médias de uma variável quantitativa em três ou mais grupos de sujeitos diferentes, com recurso aos testes Post-hoc de Tukey, para determinarmos quais as médias que se diferenciam entre si. A significância estatística foi obtida com os respetivos intervalos de confiança a 95% e/ou nível de significância p<0,05.
2. Resultados
A maioria da amostra é do sexo feminino (Feminino: 63,8% vs. Masculino: 36,2%) e apresenta uma idade mínima de 43 anos e máxima de 91 anos (média de 75±8,14 anos). Nos homens a idade mínima foi de 50 anos e máxima de 89 anos, enquanto para no sexo feminino foi de 43 anos e a máxima de 91 anos. Os homens são em média mais velhos (Masculino 77±7,41 anos vs. Feminino 73±8,42 anos). A totalidade dos indivíduos referiram viver em aldeia. De acordo com a Tabela 1, no total da amostra, 45,1% apresenta idade ≥76 anos; 44,3% apresenta entre 64 e 75 anos e apenas 10,6% ≤64 anos. Quanto ao estado civil constatamos que a maioria das pessoas inquiridas são casadas ou em união de facto (62,6%). Relativamente às habilitações literárias, a maioria da amostra possui o 1º ciclo (58,3%), com maior percentagem no sexo masculino (Masculino 68,2% vs. Feminino 52,7%). A maioria está reformada (87,7%), verificando-se esta constante para ambos os sexos. Segue-se os desempregados com 9,8%, sendo o desemprego mais frequente no sexo feminino (11,3%) e ainda 1,3% da amostra está empregada ou apresenta outra situação laboral. A maior percentagem de indivíduos (66,8%) mencionou que aufere rendimentos mensais entre os 250 e 500 euros, sendo que a auferir rendimentos inferiores a 250 euros encontrámos uma percentagem de 26,4%, e a menor percentagem recai nos que obtêm rendimentos superiores a 500 euros (6,8%). Relativamente ao género consta-se que os menores rendimentos recaem sobre as mulheres (30,0%), enquanto rendimentos mais elevados são na sua maioria auferidos pelos homens (14,1%). Mais de metade dos participantes (53,2%) referiu viver com o conjugue. Realça-se, entretanto, que 27,7% da amostra vive sozinha sendo a percentagem mais elevada entre as mulheres (34,0%). Constatou-se que mais de metade da amostra vive apenas com uma pessoa (55,7%), 27,7% vivem sozinhas e apenas 16,6% vivem com ≥ 2 pessoas. No que concerne ao apoio social; a grande maioria da população não usufrui de apoio social (92,3%).
Variáveis | Masculino | Feminino | Total | Residuais | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
n (85) | % (36,2) | n (150) | % (63,8) | n (235) | % (100,0) | Masc | Fem | |
Grupo etário | ||||||||
≤ 64 | 6 | 7,0 | 19 | 12,6 | 25 | 10,6 | -1,3 | 1,3 |
65-75 | 31 | 36,5 | 73 | 48,7 | 104 | 44,3 | -1,8 | 1,8 |
≥ 76 | 48 | 56,5 | 58 | 38,7 | 106 | 45,1 | 2,6 | -2,6 |
Estado civil Solteiro Casado/União de facto Divorciado/Separado/viúvo | 3 67 15 | 3,5 78,8 17,7 | 8 80 62 | 5.3 53,4 41,3 | 11 147 77 | 4,7 62,5 32,8 | -0,6 3,9 -4,6 | 0,6 -3,9 4,6 |
Habilitações literárias Não sabe ler/escrever Sabe ler/escrever 1.º Ciclo >1.º Ciclo | 13 11 58 3 | 15,3 13,0 68,2 3,5 | 48 19 79 4 | 32,0 12,6 52,7 2,7 | 61 30 137 7 | 25,9 12,8 58,3 3,0 | -2,8 0,1 2,3 -0,1 | 2,8 -0,1 -2,3 0,1 |
Situação laboral | ||||||||
Empregado | 2 | 2,3 | 1 | 0,7 | 3 | 1,3 | 1,1 | -1,1 |
Desempregado | 6 | 7,1 | 17 | 11,3 | 23 | 9,8 | -1,1 | 1,1 |
Reformado | 77 | 90,6 | 129 | 86,0 | 206 | 87,6 | 1,0 | -1,0 |
Outro | - | 0,0 | 3 | 2,0 | 3 | 1,3 | -1,3 | 1,3 |
Rendimentos | ||||||||
<250 | 17 | 20,0 | 45 | 30,0 | 62 | 26,4 | -1,7 | 1,7 |
250-500 | 56 | 65,9 | 101 | 67,3 | 157 | 66,8 | -0,2 | 0,2 |
> 500 | 12 | 14,1 | 4 | 2,7 | 16 | 6,8 | 3,3 | -3,3 |
Reside | ||||||||
Sozinho | 14 | 16,5 | 51 | 34,0 | 65 | 27,7 | -2,9 | 2,9 |
Conjugue | 55 | 64,7 | 70 | 46,7 | 125 | 53,2 | 2,7 | -2,7 |
Conjugue e filhos | 8 | 9,4 | 8 | 5,3 | 16 | 6,8 | 1,2 | -1,2 |
Filhos | 5 | 5,9 | 15 | 10,0 | 20 | 8,5 | -1,1 | 1,1 |
Família alargada | 3 | 3,5 | 6 | 2,6 | 9 | 3,8 | -0,2 | 0,2 |
Elementos com quem vive | ||||||||
0 | 14 | 16,5 | 51 | 34,0 | 65 | 27,7 | -2,9 | 2,9 |
1 | 58 | 68,2 | 73 | 48,7 | 131 | 55,7 | 2,9 | -2,9 |
≥ 2 | 13 | 15,3 | 26 | 17,3 | 39 | 16,6 | -0,4 | 0,4 |
Apoio social | ||||||||
Não | 75 | 88,2 | 142 | 94,7 | 217 | 92,3 | -1,8 | 1,8 |
Sim | 10 | 11,8 | 8 | 5,3 | 18 | 7,7 | 1,8 | -1,8 |
Os participantes percecionam uma relação familiar que integra a família altamente funcional (83,4%). Apenas 13,2% referem ter uma relação familiar com disfunção leve e 3,4% uma relação familiar com disfunção severa. Esta tendência verifica-se em ambos os sexos (Tabela 2).
Masculino | Feminino | Total | Residuais | |||||
n (85) | % (36,2) | n (150) | % (63,8) | n (235) | % (100,0) | Masc | Fem | |
Apgar Familiar | ||||||||
Disfunção severa | 2 | 2,4 | 6 | 4,0 | 8 | 3,4 | -0,7 | 0,7 |
Disfunção leve | 12 | 14,1 | 19 | 12,7 | 31 | 13,2 | 0,3 | -0,3 |
Altamente funcional | 71 | 83,5 | 125 | 83,3 | 196 | 83,4 | 0,0 | 0,0 |
Em relação à HTA, observa-se que a maioria dos indivíduos não apresentava a pressão arterial controlada (65,5%), ou seja, apresentavam valores de pressão arterial superiores a 140mmHg para TAS e/ou superiores a 90mmHg para a TAD. Quanto ao género esta percentagem é mais notória no género masculino (71,8% vs. 62,0%) (Tabela 3).
Masculino | Feminino | Total | Residuais | |||||
n (85) | % (36,2) | n (150) | % (63,8) | n (235) | % (100,0) | Masc | Fem | |
Hipertensão | ||||||||
Controlada | 24 | 28,2 | 57 | 38,0 | 81 | 34,5 | -1,5 | 1,5 |
Não controlada | 61 | 71,8 | 93 | 62,0 | 154 | 65,5 | 1,5 | -1,5 |
Para a totalidade da amostra, na adesão ao tratamento verifica-se que o valor mínimo é de 3,86 e o máximo de 6 (M=5,66 ± 0,49). Através da Escala de Medida de Adesão ao Tratamento dicotómica, constata-se que 56,2% da amostra é classificada como aderente e 43,8% não aderente às medidas terapêuticas (Tabela 4).
Relativamente à adesão ao tratamento dos participantes no estudo face aos grupos etários, os resultados obtidos com a aplicação do teste de Kruskal Wallis (KW), ressaltam que o grupo etário com idade ≤ 64 anos é o que revela maior adesão ao tratamento, contudo as diferenças entre os grupos etários não são significativas para a adesão ao tratamento (p=0,922). Quanto ao estado civil e a adesão ao tratamento, verificámos que as ordenações médias são superiores nos indivíduos sem companheiro, mas sem diferenças significativas (p=0,170). Os indivíduos sem habilitações literárias têm índices médios mais elevados de adesão ao tratamento, mas as diferenças encontradas não são significativas (p=0,268). Analisando a situação laboral, foi realizado o teste de UMW, e as ordenações médias são superiores nos indivíduos reformados sem diferenças significativas (p=0,931). Relativamente à adesão ao tratamento e o rendimento auferido, os resultados obtidos com a aplicação do teste de KW, ressalta que os indivíduos com rendimentos inferiores a 250 euros são os que revelam maior adesão ao tratamento sem significância (p=0,613). Verificámos também que as diferenças não são significativas quando analisamos a adesão ao tratamento e com quem reside e os elementos com que reside. Não encontrámos variáveis sociodemográficas e familiares associadas com a adesão ao tratamento.
Adesão ao tratamento | ||||
Ordenação Média | Análise estatística | p | ||
Género | ||||
Feminino | 116,82 | UMW = 6197,500 | 0,711 | |
Masculino | 120,09 | |||
Idade | ||||
≤ 64 anos | 120,74 | KW= 0,162 | 0,922 | |
65-75 anos | 116,15 | |||
≥ 76 anos | 119,17 | |||
Estado civil | ||||
Sem companheiro | 125,53 | UMW = 5805,000 | 0,170 | |
Com companheiro | 113,49 | |||
Habilitações literárias | ||||
Sem habilitações | 123,92 | UMW = 6013,000 | 0,268 | |
Com habilitações | 114,26 | |||
Situação laboral | ||||
Reformado | 118,14 | UMW = 2958,500 | 0,931 | |
Outros | 117,02 | |||
Rendimentos | ||||
< 250 euros | 122,90 | KW = 0,975 | 0,613 | |
250-500 euros | 117,36 | |||
> 500 euros | 105,25 | |||
Reside | ||||
Sozinho | 126,52 | UMW = 4971,500 | 0,215 | |
Com família | 114,74 | |||
Com quantas pessoas vive | ||||
0 elementos | 126,52 | KW = 3,060 | 0,217 | |
1 elemento | 111,38 | |||
≥ 2 elementos | 126,05 |
Em relação à adesão ao tratamento e o apoio social, foi realizado o teste de UMW e os resultados mostraram que os indivíduos com apoio social apresentam índices médios mais elevados de adesão ao tratamento, contudo as diferenças não são significativas (p=0,152) (Tabela 6).
Relacionando a adesão ao tratamento com a funcionalidade familiar obteve-se, com a aplicação do teste de KW, que os indivíduos com uma disfunção familiar leve são os que revelam menor adesão ao tratamento, uma vez que apresentam a ordenação média mais baixa. As pessoas hipertensas com uma família altamente funcional são os que apresentam ordenações médias superiores. Contudo, as diferenças com a funcionalidade familiar não são significativas (p=0,554) (Tabela 7).
3. Discussão
No presente estudo a amostra foi de 235 pessoas, maioritariamente do sexo feminino e com uma idade média de 75±8,14 anos. O estudo de Ferreira, Graça e Calvinho (2016) utilizou uma amostra de 332 pessoas com hipertensão arterial e o sexo feminino apresentou maior percentagem e com uma média de idade de 64,33±12,38 anos. O perfil sociodemográfico da amostra da presente investigação caracteriza-se por pessoas maioritariamente casadas/união de facto, com o 1.º ciclo de escolaridade, a viver com conjugue e reformadas. Num estudo realizado com uma amostra de 117 pessoas com hipertensão verificaram-se resultados semelhantes (Ribeiro, 2013). Os participantes apresentavam idades compreendidas entre os 31 e os 94 anos (65,4 ±12,1 anos), sendo 61,5% do género feminino, 60,7% casados, 44,4% possuíam o 1º ciclo de escolaridade, 65,8% reformados e 50,4% viviam com o marido/esposa (Ribeiro, 2013).
No total da amostra, apenas 34,5% das pessoas apresentavam níveis de pressão arterial controlada, sendo esta percentagem maior no género feminino. Estes resultados poderão ser explicados pelos fatores de risco a que a população em estudo está exposta, designadamente viver em meio rural, que dedicam a sua atividade laboral à agricultura e com escassez de recursos socioeconómicos. Muitas vezes com hábitos de vida não saudáveis, havendo um grande consumo de carnes vermelhas e um consumo excessivo de bebidas alcoólicas. Resultados semelhantes são encontrados no estudo de Macedo e Ferreira (2013), sobre a análise epidemiológica nos Cuidados de Saúde Primários que revela uma prevalência do controlo da HTA de 35,6%, sendo no sexo masculino de 33,1% e no feminino de 37,4%. No Portuguese HYpertension pertension and SAlt Study (PHYSA) a prevalência do controlo da HTA foi de 55,7% com percentagem maior no sexo feminino (Polonia et al., 2014). Um estudo realizado com 5023 indivíduos com idades compreendidas entre os 18 e os 90 anos sobre prevalência, conhecimento, tratamento e controlo da hipertensão em Portugal revelou que a prevalência do controlo da HTA foi de 28,6%, sendo superior no sexo feminino e em indivíduos mais jovens (Macedo et al., 2007). Todos os estudos analisados corroboram com o presente ao mostrarem que é o género feminino que melhor controla a sua pressão arterial. Contudo, ao longo dos anos analisados observou-se um aumento progressivo da proporção de indivíduos hipertensos com valores de TA controlados (PAP, 2003: 11,2%; PHYSA, 2011-2012: 42,5%; INSEF, 2015: 71,3%). Em 2019, o presidente da Sociedade Portuguesa de Hipertensão referiu “Em Portugal, apesar de quase 75% dos hipertensos estar sob medicação, o controlo chega a pouco mais de 40%, e numa grande fatia este problema é causado pelo incumprimento da terapêutica” e explica “infelizmente, muitos doentes não cumprem a medicação ou abandonam a mesma o que, por conseguinte, vai dificultar o controlo da doença. Abandonar a medicação porque já se está bem ou porque não se sentiu bem com os comprimidos ou ainda porque se sente bem com a tensão alta são alguns do mitos e equívocos responsáveis pela descontinuação do tratamento para a HTA”.
Quando analisamos a adesão ao tratamento, os resultados da MAT revelaram um valor mínimo de 3,86 e máximo de 6 (5,66 ±0,49). Outros estudos apresentam resultados comparáveis. No estudo de Ferreira, Graça e Calvinho (2016) os valores obtidos na adesão ao tratamento variaram entre dois e seis (5,63 ±0,46). Outro estudo, com uma amostra de 61 hipertensos, obteve um valor mínimo de 2,14 e um valor máximo de 6 pontos, com uma média de 5,14 (Pinto, 2012). Da aplicação da escala MAT concluímos que 56,2% da amostra adere às medidas terapêuticas. Pinto (2012) no seu estudo encontrou que 50% dos participantes revelou uma adesão ao tratamento. Através dos resultados apresentados constatamos que os indivíduos com maiores níveis de adesão ao tratamento são do sexo masculino, pertencentes ao grupo etário com idade ≤ 64 anos, sem companheiro, a viverem sozinhos, sem habilitações literárias, reformados, com rendimentos inferiores a 250 euros/mensais e com apoio social, contudo sem diferenças significativas. Noutros estudos as variáveis sociodemográficas revelaram-se preditoras da adesão ao tratamento. Segundo Sousa (2005) um estudo exploratório e correlacional com 108 pessoas com hipertensão arterial, a idade foi uma variável preditiva da adesão (p<0,001), evidenciando que a adesão às recomendações alimentares sugeridas aumenta à medida que aumenta a idade dos participantes, também os reformados apresentavam um score médio de adesão à alimentação mais elevado (p<0,001). Noutro estudo, o sexo feminino apresentava melhores níveis de adesão ao tratamento (Ribeiro, 2013). Oller et al. (2016) também verificou em pacientes com hipertensão arterial que o escore médio da MAT foi de 5,3 em um intervalo de 1 a 6, demonstrando alta adesão ao tratamento medicamentoso. Os dados mostraram que 86 (85,2%) dos participantes foram classificados na categoria adesão e 15 (14,8%) na categoria de não adesão (Oller et al., 2016).
Relativamente à funcionalidade familiar constatou-se que 83,4% dos participantes têm uma família altamente funcional, seguindo-se a família com disfunção leve (13,2%). Embora o tipo de família altamente funcional apresente melhores níveis de adesão, não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre a funcionalidade familiar e a adesão ao tratamento. Num estudo transversal e analítico realizado no distrito de Viseu com uma amostra de 98 participantes revelou que o tipo de relação familiar mais representativa foi, igualmente, a família altamente funcional com 75,5% e verificaram existir diferenças estatisticamente significativas (p=0,018) entre a funcionalidade familiar e a adesão ao tratamento, ou seja, quanto maior a funcionalidade familiar melhor a adesão à terapêutica (r=0,283; p=0,005) (Lopes, Gonçalves & Dias, 2012).
Conclusão
Torna-se crucial melhorar a adesão ao tratamento. Neste contexto, o presente estudo propôs-se descrever a influência das variáveis sociodemográficas e contexto familiar na adesão ao tratamento na pessoa com HTA. Encontrámos uma adesão ao tratamento elevada, contudo não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre as variáveis sociodemográficas e de contexto familiar e a adesão ao tratamento. Sendo a HTA um fator de risco para o aparecimento de doenças cardiovasculares e, em simultâneo, uma doença crónica, é fundamental investir na educação para a saúde e literacia em saúde das pessoas com HTA, com o objetivo de reduzir as doenças cardiovasculares, as complicações da HTA e enfatizar a importância do controlo adequado da PA. Apesar da elevada adesão observada, os valores de pressão arterial são elevados, o que coloca em causa a eficiência das medidas intervenção terapêutica, revelando-se importante o impacto que as medidas não farmacológicas podem ter no tratamento da hipertensão arterial.
Melhorar a adesão ao regime terapêutico permitirá a obtenção de melhores níveis tensionais. Para o efeito, os enfermeiros, dada a sua proximidade com as populações, devem intervir no sentido de melhorar a adesão ao tratamento, de modo a visar a promoção da saúde efetiva. Neste sentido, os enfermeiros especialistas em enfermagem comunitária que têm como foco o indivíduo, família e comunidade detêm uma posição privilegiada para a vigilância epidemiológica, identificação de necessidades de intervenção, capacitação das comunidades promovendo a saúde e prevenindo a doença.