Introdução
A entrada para o ensino superior marca um período de transição para os jovens. Através desta transição, os estudantes enfrentam novos desafios, tais como tomar decisões independentes sobre as suas vidas e estudos, adaptar-se às novas exigências académicas de um ambiente de aprendizagem desconhecido e interagir com um leque diversificado de novas pessoas (Hernández-Torrano et al., 2020). Além disso, muitos estudantes saem, muitas vezes, pela primeira vez, das suas casas e distanciam-se das suas redes de apoio. Estes desafios podem afetar a saúde mental e o bem-estar dos estudantes do ensino superior (Hernández-Torrano et al., 2020). De facto, há evidências de que uma tensão sobre a saúde mental é colocada nos estudantes quando estes iniciam o seu novo ciclo de estudos e, embora diminua ao longo dos seus estudos, não regressa aos níveis pré-universitários. Além disso, as probabilidades de vivenciarem problemas psicológicos, tais como a depressão, a ansiedade e o stresse, aumentam durante a adolescência e atingem um pico na idade adulta por volta dos 25 anos, o que torna os estudantes do ensino superior uma população particularmente vulnerável (Hernández-Torrano et al., 2020).
O interesse pela saúde mental e bem-estar dos estudantes do ensino superior tem crescido exponencialmente nas últimas décadas, o que se deve particularmente a três desafios inter-relacionados. Em primeiro lugar, embora os estudantes apresentem níveis de saúde mental semelhantes aos dos seus homólogos não universitários, estudos recentes sugerem um aumento e gravidade dos problemas mentais e comportamentos de procura de ajuda em estudantes do ensino superior de todo o mundo na última década (Lipson et al., 2019). Alguns investigadores referem-se a estas tendências como uma emergente “crise de saúde mental” no ensino superior (Hughes & Evans, 2018). Em segundo lugar, a angústia psicológica no início da idade adulta está associada a resultados adversos a curto prazo, tais como a frequência, o desempenho, o compromisso e a conclusão da faculdade e outros a longo prazo, tais como relações disfuncionais, problemas recorrentes de saúde mental, abandono da universidade, taxas de emprego mais baixas e rendimentos pessoais reduzidos (Antaramian, 2015). Em terceiro lugar, existe um acordo generalizado de que as instituições do ensino superior oferecem oportunidades únicas para promover a saúde mental e o bem-estar dos jovens adultos, uma vez que proporcionam um único ambiente integrado que engloba atividades académicas, profissionais e sociais, juntamente com serviços de saúde e outros serviços de apoio. Contudo, a maioria dos estudantes universitários com problemas de saúde mental e baixos níveis de bem-estar não recebem esse apoio e, enquanto as instituições do ensino superior continuam a expandir-se, existe uma preocupação crescente de que os serviços disponíveis para prestar apoio aos estudantes não estejam a desenvolver-se a um ritmo equivalente (Lipson et al., 2019).
O presente trabalho tem como objetivos: descrever os níveis da inteligência emocional dos estudantes do ensino superior; e apurar os preditores de inteligência emocional em estudantes do ensino superior.
1. Enquadramento teórico
A inteligência emocional refere-se a uma capacidade cognitiva de atenção, compreensão e regulação das emoções, ou seja, todas as competências que permitem o desenvolvimento de uma vida mais saudável (Salovey et al., 1995). Por sua vez, a autoeficácia académica, uma construção da teoria cognitiva social de Bandura (1982), é definida como as crenças e expectativas que as pessoas têm relativamente à sua capacidade de planear, organizar e executar atividades específicas de desempenho académico (Domínguez-Lara & Merino-Soto, 2017).
A inteligência emocional é um fator protetor do bem-estar (Hussien et al., 2020; Bermejo-Martins et al., 2021) e contribui direta e indiretamente para melhorar as variáveis psicoeducacionais nos estudantes. Contribui para o desenvolvimento da resiliência, bem-estar e saúde mental em estudantes (Iqbal et al., 2021) e permite desenvolver estratégias de coping mais saudáveis, evitando o sofrimento emocional (Sánchez-Ruiz et al., 2021). Alguns estudos baseados na inteligência emocional e no cuidado em estudantes do ensino superior relatam uma diminuição dos sintomas de ansiedade e depressão (Sturgill et al., 2021). Outra intervenção baseada na melhoria da inteligência emocional através de workshops e seminários para estudantes do ensino superior melhorou os seus níveis de desempenho académico e autoeficácia. Os autores desta intervenção sugerem a importância de incluir a formação em educação socioemocional no currículo universitário (Moreno-Fernández et al., 2020).
A capacidade de uma pessoa para identificar, compreender, utilizar e gerir emoções fornece a base para os tipos de competências sociais e emocionais que são importantes para o sucesso em todas as áreas da vida. Por esse motivo é que se afirma que quanto mais complexo é o trabalho, mais importante é a inteligência emocional. O uso ativo da inteligência emocional e outros componentes contribuem para o desenvolvimento de qualidades profissionais e pedagógicas, competências, formação e melhoria do sistema de ensino como um todo. Estudos demonstraram que os estudantes que obtêm notas mais elevadas nos testes de inteligência emocional têm melhores competências interpessoais e são avaliados mais positivamente pelos seus pares, o que se traduz num melhor bem-estar e numa melhor interação social no contexto académico (Ryff et al., 2021). Os estudantes emocionalmente inteligentes são agentes de mudança, autoconscientes, empáticos, equilibrados, curiosos e sabem como trabalhar. Assim, a inteligência emocional é reconhecida como um requisito altamente relevante e importante para a vida académica no ensino superior (Ryff et al., 2021).
O papel das emoções no envolvimento dos estudantes tem sido alvo de estudo. Ainda assim, pouco se sabe sobre a forma como a inteligência emocional está relacionada com o envolvimento e outros resultados de aprendizagem chave no ensino superior. Para preencher esta lacuna, Zhoc et al. (2020) realizaram um estudo que concluiu que a inteligência emocional promoveu resultados chave de aprendizagem e satisfação dos estudantes com o ensino superior. Conclui-se que as emoções podem ter um efeito adaptativo ou mal adaptativo sobre a aprendizagem, o empenho e a realização dos estudantes. As emoções positivas associam-se ao empenho, persistência e desempenho. Inversamente, as emoções negativas estão associadas à desmotivação e mal-estar psicológico, com reflexos negativos no desempenho das aprendizagens (Zhoc et al., 2020). Embora algumas emoções negativas (por exemplo, a ansiedade) possam também ter efeitos adaptativos no aumento da motivação extrínseca para evitar o fracasso, estas emoções negativas podem prejudicar os estudantes ao nível da capacidade de atenção e funcionamento cognitivo, afetando assim negativamente o seu envolvimento e os seus resultados da aprendizagem (Zhoc et al., 2020).
A inteligência emocional relaciona-se com o envolvimento dos estudantes, uma vez que engloba diferentes capacidades emocionais que facilitam o desempenho académico e social dos estudantes. Por exemplo, alguns estudos verificaram que a inteligência emocional está positivamente associada ao autodirecionamento e à resiliência no meio académico, persistência orientada por objetivos, melhores redes de apoio educativo e qualidade das relações sociais (Zhoc et al., 2020).
2. Métodos
2.1. Tipo de estudo
Este estudo é de natureza quantitativa observacional, com análise descritivo-correlacional e foi conduzido de acordo com as guidelines definidas pela iniciativa STrengthening the Reporting of OBservational studies in Epidemiology (STROBE; Elm et al., 2007).
2.2. Amostra
A amostra é do tipo não probabilístico por conveniência ou acidental, constituída por estudantes portugueses do ensino superior com idade superior aos 18 anos à data do preenchimento do instrumento de recolha de dados. A amostra foi obtida entre 17 de dezembro de 2021 e 2 de maio de 2022.
2.3. Colheita de dados
Para a recolha dos dados foi elaborado um questionário sociodemográfico para caracterizar a amostra, e utilizada a Escala de Inteligência Emocional (EIES; Schutte et al., 1998) e a Escala de Medida de Manifestação de Bem-Estar Psicológico (EMMBEP; Monteiro et al., 2012).
A EIES é constituída por 33 itens e quatro subescalas: perceção das emoções, lidar com as próprias emoções, lidar com as emoções dos outros, e utilização das emoções. É uma escala de autorresposta para medir a perceção da Inteligência Emocional, do tipo likert de 5 pontos, variando de 1 (discordo totalmente) a 5 (concordo totalmente). A interpretação da pontuação obtida é feita tendo por base o princípio de que, quanto maior a pontuação obtida maior será a Inteligência Emocional do sujeito (Schutte et al., 1998). Tem uma consistência interna muito boa (α =0,90).
A EMMBEP é formada por 25 itens e cinco subescalas: felicidade, sociabilidade, controlo de si e dos acontecimentos, envolvimento social, autoestima e equilíbrio. É uma escala de resposta tipo likert de 5 pontos, variando de 1 (não me descreve) a 5 (descreve-me muito bem). Quanto mais elevado for o total obtido (dado pela soma das pontuações de todos os itens) maior será o bem-estar psicológico percebido. Tem uma boa consistência interna, variando entre .67 (envolvimento social) e .89 (felicidade) (Monteiro et al., 2012).
2.4. Procedimentos éticos e deontológicos
Foram garantidos todos os procedimentos éticos e deontológicos e o estudo teve parecer favorável da Comissão de ética do Instituto Politécnico de Viseu, com a referência n.º 64/sub/2021.
Os dados foram recolhidos através de um questionário de autopreenchimento online, previamente fornecido a partir do Google Forms, não existindo qualquer identificação dos participantes, preservando-se a confidencialidade e o anonimato das respostas e a natureza voluntária da participação.
Os dados foram guardados online e protegidos por uma palavra-passe apenas partilhada pela equipa de investigação, no período temporal necessário ao cumprimento das finalidades para que são recolhidos, sendo posteriormente eliminados na totalidade.
2.5. Análise estatística
Para a caracterização, descrição e análise inferencial dos dados foi usado o programa IBM® SPSS® Statistics 28.0. Recorreu-se à estatística descritiva para calcular as frequências absolutas (n), percentuais (%), as medidas de tendência central (Média - M) e as medidas de dispersão (Desvio padrão - Dp) e o Coeficiente de variação (CV%). Este compara a dispersão em torno da média de uma variável de natureza quantitativa, sendo os valores de referência: 0-15% - dispersão baixa; 16-30% - dispersão moderada; >30% - dispersão alta (Marôco, 2021).
Na escolha das técnicas estatísticas, atendeu-se à natureza e características das variáveis envolvidas. Para além da estatística descritiva, fez-se também uso da estatística inferencial, com recurso aos testes paramétricos, designadamente ao teste t (comparação de médias de uma variável quantitativa em dois grupos de sujeitos diferentes) e a ANOVA (comparação de médias de uma variável quantitativa em três ou mais grupos de sujeitos diferentes) (Marôco, 2021).
Para avaliar a consistência interna foi usado o Alpha de Cronbach (α) e considerados os valores de referência: >.9 muito boa; .8 -.9 boa; .7 - .8 média; .6 - .7 razoável; .5 - .6 má; <.5 inaceitável (Marôco, 2021).
Foi realizado um modelo de regressão linear multivariado tendo por base a aplicação do método Forward, que incluiu todas as variáveis em estudo, para identificar os preditores da inteligência emocional. Previamente os pressupostos da normalidade e da multicolinearidade foram confirmados. O achatamento apresentou um intervalo de variação entre -.5 a -.07 e a curtose um intervalo de variação entre -.5 a 1.45. Os Variance Inflation Factor (VIF) foram inferiores a 4.1 para todas as variáveis incluídas no modelo (Marôco, 2021). Por fim, foi considerado estatisticamente significativo um p<.05.
3. Resultados
A amostra de 538 estudantes do ensino superior é maioritariamente do género feminino (74.2%), com uma média de idades de 21.53±4.53 anos, com um mínimo e um máximo a oscilarem entre os 18 e os 52 anos. Mais de metade da amostra (53.7%) reside em meio urbano, não tem estatutos no presente ano letivo (87.2%), nem quaisquer benefícios sociais (59.7%) e encontram-se deslocados da residência habitual (63.9%). Quando questionados sobre a regularidade com que estudam a maioria refere ser 3 vezes por semana (57.4%) (c.f. Tabela 1).
Variáveis | n | % |
---|---|---|
Sexo | ||
Masculino | 139 | 25.8 |
Feminino | 399 | 74.2 |
Idade | M | Dp |
21.53 | 4.35 | |
Tipologia da residência habitual | n | % |
Urbano | 289 | 53.7 |
Rural | 249 | 46.3 |
No presente ano letivo tem algum dos seguintes estatutos | ||
Trabalhador-estudante | 46 | 8.6 |
CPLP | 4 | .7 |
Sem estatuto | 469 | 87.2 |
Grupos Politécnico de Viseu | 13 | 2.4 |
Dirigente associativo | 6 | 1.1 |
Benefícios sociais a que tem direito no presente ano letivo | ||
Nenhum | 321 | 59.7 |
Bolsa de estudo | 177 | 32.9 |
Bolsa de estudo + alojamento | 38 | 7.1 |
Alojamento/residência unitária | 2 | .4 |
Estar deslocado da residência habitual | ||
Não | 194 | 36.1 |
Sim | 344 | 63.9 |
Regularidade com que estuda | ||
Diariamente | 140 | 26.0 |
3 vezes por semana | 309 | 57.4 |
Ocasionalmente | 89 | 16.5 |
A maioria dos estudantes frequenta o Curso de Licenciatura em Enfermagem (n=238, 44.2%), seguindo-se os que frequentam o Curso de Licenciatura em Medicina Dentária (n=58; 10.8%), o Curso de Licenciatura em Educação Social (n=41; 7.6%), o Curso de Licenciatura em Gestão (n=29; 5.4%) e por fim, o Curso de Mestrado Integrado em Medicina Dentária (n=25; 4.6%).
3.1. Consistência interna dos instrumentos aplicados
O estudo da consistência interna da EIES revelou um α global de .86 sugestivo de uma boa consistência interna. Os valores de alfa de Cronbach por fator variam de bons a fracos, com um alfa global de .83 a .54 (c.f. Tabela 2).
Itens | Média | Dp | r/item total | α sem item | α global |
---|---|---|---|---|---|
Fator 1 - Perceção das próprias emoções | |||||
1. Sei quando falar acerca dos meus problemas pessoais para os outros. | 29.13 | 25.01 | .48 | .81 | .83 |
7. Tenho consciência das minhas emoções à medida que as experiencio. | 28.78 | 25.43 | .59 | .80 | |
9. Quando sinto uma emoção positiva, sei como fazê-la durar. | 29.43 | 24.55 | .56 | .80 | |
11. Estou consciente das mensagens não-verbais que envio para os outros. | 29.22 | 25.70 | .44 | .82 | |
14. Sei porque é que as minhas emoções mudam. | 29.19 | 25.96 | .43 | .82 | |
16. Tenho controlo sobre as minhas emoções. | 29.61 | 24.31 | .55 | .81 | |
17. Reconheço facilmente as minhas emoções à medida que as experiencio. | 28.99 | 24.61 | .68 | .79 | |
18. Motivo-me a mim próprio/a imaginando um bom resultado para as tarefas que assumo. | 29.14 | 24.20 | .58 | .80 | |
25. Uso a boa disposição para me ajudar a continuar a tentar a enfrentar obstáculos. | 28.81 | 25.99 | .48 | .81 | |
Fator 2 - Componente sociocognitiva das emoções | |||||
2. Quando me deparo com obstáculos, lembro-me de situações em que enfrentei obstáculos semelhantes e os ultrapassei | 29.32 | 19.99 | .45 | .72 | .75 |
4. Alguns dos maiores acontecimentos da minha vida, levaram-me a reavaliar o que é ou não importante. | 28.91 | 22.00 | .32 | .74 | |
5. Quando o meu humor muda vejo novas possibilidades. | 29.70 | 20.06 | .43 | .73 | |
6. As emoções são uma das coisas que fazem a minha vida valer apena. | 29.19 | 19.61 | .52 | .71 | |
8. Gosto de partilhar as minhas emoções com os outros. | 29.98 | 19.35 | .40 | .73 | |
10. Organizo eventos e atividades que as outras pessoas apreciam. | 30.04 | 19.78 | .35 | .74 | |
12. Quando estou bem-disposto/a resolver problemas é fácil para mim. | 29.37 | 20.90 | .37 | .73 | |
15. Quando estou bem-disposto/a, consigo ter novas ideias. | 29.19 | 20.60 | .52 | .71 | |
21. Quando sinto que as minhas emoções mudam, tendo a encontrar novas ideias. | 29.87 | 19.81 | .54 | .71 | |
2. Quando me deparo com obstáculos, lembro-me de situações em que enfrentei obstáculos semelhantes e os ultrapassei | 29.32 | 19.99 | .45 | .72 | |
Fator 3 - Perceção das emoções dos outros | |||||
13. Reconheço as emoções que as pessoas estão a sentir, olhando para as suas expressões faciais. | 18.42 | 8.87 | .56 | .71 | .76 |
19. Tenho consciência das mensagens não-verbais que outras pessoas enviam. | 18.64 | 9.04 | .49 | .73 | |
20. Quando outra pessoa me fala acerca de um acontecimento importante na sua vida, quase que sinto como se estivesse a experienciar este evento eu próprio/a. | 18.80 | 8.91 | .42 | .75 | |
23. Sei o que as outras pessoas estão a sentir só de olhar para elas. | 19.01 | 8.28 | .58 | .71 | |
24. Ajudo as outras pessoas a sentirem-se melhor quando estão em baixo. | 18.11 | 9.58 | .43 | .75 | |
26. Consigo dizer como é que as pessoas se sentem, ouvindo o tom da sua voz. | 18.61 | 8.66 | .56 | .71 | |
Fator 4 - Dificuldade na compreensão das emoções | |||||
3. É-me difícil compreender as mensagens não-verbais das outras pessoas. | 4.98 | 3.19 | .33 | .46 | .54 |
22. Quando me confronto com um desafio, desisto porque acredito que irei falhar. | 5.28 | 3.24 | .31 | .50 | |
27. É-me difícil compreender porque é que as pessoas sentem aquilo que sentem. | 4.79 | 3.21 | .41 | .35 |
O estudo da consistência interna da EMMBEP revelou um α global de .96 sugestivo de uma consistência interna muito boa. Os valores de alfa de Cronbach por fator variam de muito bons a razoáveis, com um alfa global de .92 a .74 (c.f. Tabela 3).
Itens | Média | Dp | r/item total | α sem item | α global |
---|---|---|---|---|---|
Fator 1 - Felicidade | |||||
5. Senti-me emocionalmente equilibrado. | 23.63 | 35.09 | .57 | .92 | .92 |
12. Senti-me bem a divertir-me, a fazer desporto e a participar em todas as minhas atividades e passatempos preferidos. | 23.95 | 34.74 | .66 | .91 | |
20. Estive bastante calmo. | 23.77 | 33.25 | .76 | .90 | |
21. Tive a impressão de realmente gostar e viver ao máximo. | 23.71 | 32.81 | .83 | .90 | |
22. Senti-me bem, em paz comigo próprio. | 23.75 | 32.94 | .80 | .90 | |
23. Achei a vida excitante e quis aproveitar cada momento. | 23.70 | 33.41 | .81 | .90 | |
24. A minha moral esteve boa. | 23.90 | 34.56 | .68 | .91 | |
25. Senti-me saudável e em boa forma. | 23.91 | 33.77 | .73 | .91 | |
Fator 2 - Sociabilidade | |||||
13. Ri-me com facilidade. | 11.45 | 5.95 | .77 | .82 | .87 |
14. Tive um grande sentido de humor, tendo feito os meus amigos rir facilmente | 11.53 | 5.78 | .76 | .82 | |
15. Fui capaz de estar concentrado e ouvir os meus amigos. | 11.41 | 6.64 | .69 | .85 | |
16. Relacionei-me facilmente com as pessoas à minha volta. | 11.58 | 6.18 | .70 | .85 | |
Fator 3 - Controlo | |||||
17. Estive capaz de enfrentar situações difíceis de uma forma positiva. | 6.73 | 3.12 | .79 | .87 | .90 |
18. Perante situações complexas, fui capaz de as resolver com clareza. | 6.68 | 3.27 | .82 | .84 | |
19. Fui capaz de encontrar resposta para os meus problemas sem preocupações. | 6.89 | 3.16 | .79 | .86 | |
Fator 4 - Envolvimento Social | |||||
9. Tive objetivos e ambições. | 6.49 | 3.31 | .54 | .68 | .74 |
10. Tive curiosidade e interesse em todo o tipo de coisas. | 6.81 | 2.85 | .67 | .53 | |
11. Envolvi-me em vários projetos | 7.46 | 2.88 | .50 | .75 | |
Fator 5 - Autoestima | |||||
1. Senti-me confiante. | 10.50 | 5.49 | .69 | .83 | .86 |
2. Senti que os outros gostavam de mim e me apreciavam. | 10.41 | 5.75 | .65 | .84 | |
3. Senti-me satisfeito com o que fui capaz de alcançar, senti-me orgulhoso de mim próprio. | 10.37 | 5.18 | .74 | .81 | |
4. Senti-me útil. | 10.30 | 5.20 | .75 | .80 | |
Fator 6 - Equilíbrio | |||||
6. Fui igual a mim próprio, natural em todas as circunstâncias. | 6.93 | 3.64 | .47 | .78 | .75 |
7. Vivi a um ritmo normal, não tendo cometido excessos. | 7.26 | 2.90 | .63 | .61 | |
8. A minha vida foi bem equilibrada entre as minhas atividades familiares, pessoais e académicas. | 7.40 | 2.73 | .65 | .58 |
3.2. Análise descritiva e inferencial
Os resultados relativos à inteligência emocional indicam que o valor médio mais elevado corresponde à perceção das próprias emoções (M=32.78(5.57), onde o mínimo encontrado é 15.00 e o máximo 45.00, seguindo-se a componente sociocognitiva das emoções (M=32.27(4.87), sendo o valor mais baixo o obtido na dificuldade na compreensão das emoções (M=7.52(2.42). Os coeficientes de variação oscilam entre uma dispersão baixa a elevada (c.f. Tabela 4).
Inteligência emocional | N | Min | Max | M | DP | CV (%) |
---|---|---|---|---|---|---|
Perceção das próprias emoções | 538 | 15.00 | 45.00 | 32.78 | 5.57 | 16.99 |
Componente sociocognitiva das emoções | 9.00 | 44.00 | 32.27 | 4.87 | 15.09 | |
Perceção das emoções dos outros | 7.00 | 30.00 | 22.31 | 3.49 | 15.64 | |
Dificuldade na compreensão das emoções | 3.00 | 15.00 | 7.52 | 2.42 | 32.18 | |
Score Global | 42.00 | 135.00 | 95.82 | 12.12 | 12.64 |
Pela análise dos resultados apresentados na tabela 5, infere-se que o género não está associado estatisticamente à inteligência emocional (p=.21), com exceção da dimensão Perceção das próprias emoções (p=.01). Ainda assim, os estudantes do género masculino revelam um score mais elevado de inteligência emocional para o score global e para as dimensões específicas (c.f. Tabela 5).
Fatores | Masculino | Feminino | t | p | ||
---|---|---|---|---|---|---|
Média | Dp | Média | Dp | |||
Perceção das próprias emoções | 33.80 | 5.42 | 32.43 | 5.58 | 2.52 | .01* |
Componente sociocognitiva das emoções | 32.40 | 5.12 | 32.23 | 4.79 | .35 | .73 |
Perceção das emoções dos outros | 22.00 | 3.86 | 22.43 | 3.35 | -1.25 | .21 |
Dificuldade na compreensão das emoções | 7.79 | 2.52 | 7.42 | 2.38 | 1.55 | .12 |
Score global | 96.93 | 12.82 | 95.43 | 11.86 | 1.25 | .21 |
* Estatisticamente significativo.
Pela análise dos resultados apresentados na tabela 6, infere-se a inexistência de diferenças estatisticamente significativas entre o tipo de zona de residência e a inteligência emocional (p>.05). Ainda assim, são os estudantes que residem em meio urbano que apresentam um score global de inteligência emocional mais elevado.
Fatores | Urbano | Rural | t | p | ||
---|---|---|---|---|---|---|
Média | Dp | Média | Dp | |||
Perceção das próprias emoções | 33.00 | 5.79 | 32.53 | 5.30 | .97 | .33 |
Componente sociocognitiva das emoções | 32.37 | 4.87 | 32.16 | 4.89 | .50 | .62 |
Perceção das emoções dos outros | 22.37 | 3.53 | 22.25 | 4.45 | .41 | .68 |
Dificuldade na compreensão das emoções | 7.50 | 2.53 | 7.55 | 2.28 | -.23 | .82 |
Score global | 96.15 | 12.37 | 95.43 | 11.83 | .69 | .49 |
Infere-se que a regularidade com que os estudantes estudam está associado estatisticamente com duas subescalas da inteligência emocional, nomeadamente na Perceção das próprias emoções (p=.002) e na Componente sociocognitiva das emoções (p=.001), bem como com o score global (p=.002). Os estudantes com um score global mais elevado de inteligência emocional são os que estudam diariamente, tendo também pontuado mais na Perceção das próprias emoções e na Componente sociocognitiva das emoções (c.f. Tabela 7).
Fatores | Diariamente | 3 vezes por semana | Ocasionalmente | F | p | |||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
M | Dp | M | Dp | M | Dp | |||
Perceção das próprias emoções | 33.32 | 5.28 | 33.08 | 5.62 | 30.89 | 5.51 | 6.32 | .002* |
Componente sociocognitiva das emoções | 32.77 | 4.95 | 32.56 | 4.60 | 30.49 | 5.31 | 7.40 | .001* |
Perceção das emoções dos outros | 22.73 | 3.42 | 22.16 | 3.27 | 22.20 | 4.25 | 1.35 | .26 |
Dificuldade na compreensão das emoções | 7.35 | 2.38 | 7.68 | 2.49 | 7.24 | 2.18 | 1.61 | .20 |
Score Global | 97.12 | 11.97 | 96.40 | 11.77 | 91.75 | 12.79 | 6.31 | .002* |
* Estatisticamente significativo.
O controlo, o envolvimento social, a autoestima, o equilíbrio e a felicidade revelaram ser variáveis preditoras da inteligência emocional, explicando 49% da variação.
Pelos coeficientes padronizados beta, verifica-se que o controlo, o envolvimento social, a autoestima e a felicidade estabelecem uma associação positiva com a inteligência emocional, sugerindo que quanto mais controlo, envolvimento social, autoestima e felicidade têm os estudantes mais inteligência emocional possuem. O equilíbrio estabelece uma associação negativa, indicando que quanto menos equilíbrio os estudantes possuem maior a sua inteligência emocional (c.f. Tabela 8).
Variáveis independentes | Coeficientes não standardizados | Coeficientes standardizados | t | p | VIF |
---|---|---|---|---|---|
Constante | 39.11 | 13.76 | <.001* | 3.199 | |
Controlo | 2.97 | .21 | 3.84 | <.001* | 1.313 |
Envolvimento social | 2.01 | .14 | 3.10 | .002* | 1.973 |
Autoestima | 2.01 | .13 | 2.43 | .02* | 2.764 |
Equilíbrio | -2.30 | -.16 | -3.43 | <.001* | 2.172 |
Felicidade | 2.68 | .18 | 2.92 | .004* | 4.055 |
Variável dependente: Inteligência Emocional - score global. R = .69; R2 = .49; Erro padrão da estimativa = 8.72. *Estatisticamente significativo.
4. Discussão
Os resultados indicam que a regularidade com que os estudantes estudam está associada com a perceção que têm sobre a sua inteligência emocional, no score global (p=.002) e especificamente na Perceção das próprias emoções (p=.002) e na Componente sociocognitiva das emoções (p=.001). Estes dados em parte são justificados pelo apontado por Fonseca (2016, p. 366), que refere que “as emoções são adaptativas”, na medida em que “preparam, predispõem e orientam comportamentos para experiências positivas ou negativas”. Neste sentido, as emoções proporcionam informações acerca da relevância dos estímulos exteriores e interiores à pessoa, bem como acerca das “situações-problema onde os indivíduos se encontram envolvidos num determinado contexto”. Pode afirmar-se que o facto de estudantes com mais perceção das suas próprias emoções e mais componente sociocognitiva das emoções poderão ter mais preocupação com o seu sucesso escolar, o que os leva a estudar diariamente (Fonseca, 2016).
Os resultados permitem ainda constatar que o controlo, o envolvimento social, a autoestima, o equilíbrio e a felicidade são variáveis preditoras da inteligência emocional, sendo que o controlo, o envolvimento social, a autoestima e a felicidade estabelecem uma associação positiva com a inteligência emocional, sugerindo que quanto mais controlo, envolvimento social, autoestima e felicidade têm os estudantes mais inteligência emocional possuem; e o equilíbrio estabelece uma associação negativa, indicando que quanto menos equilíbrio maior a inteligência emocional dos estudantes. O estudo de Alam et al. (2021) suporta estes achados pois a inteligência emocional tem impacto no stresse, desempenho académico e bem-estar psicológico percebido. É relevante considerar as competências emocionais como variáveis psicoeducativas que podem ter impacto no funcionamento psicossocial adequado dos estudantes, ou seja, com o bem-estar psicológico autopercebido como indicador de saúde mental (Ryff et al., 2021). Os estudantes emocionalmente inteligentes são agentes de mudança, autoconscientes, empáticos, equilibrados, curiosos e sabem como trabalhar. A inteligência emocional é reconhecida como um requisito altamente relevante e importante para a vida académica no ensino superior, um fator preditor de bem-estar psicológico (Ryff et al., 2021). No estudo de Di Fabio e Kenny (2016), onde foi estudada a competência emocional como variável potencial para melhorar o bem-estar e o desempenho entre os estudantes do ensino superior, mais especificamente, as contribuições de modelos de inteligência emocional baseados em capacidades e traços, avaliados através de medidas baseadas em índices de bem-estar hedónico e eudaimónico, os resultados destacam as contribuições da inteligência emocional na explicação do bem-estar hedónico e eudaimónico, após o controlo dos efeitos da inteligência emocional e dos traços de personalidade.
Por fim e no que concerne às limitações é de referir que embora a amostra seja ampla e tenha obedecido a rigorosos critérios de seleção, os seus resultados não são passíveis de generalização dado não ser probabilística. Nesse sentido, sugere-se a sua replicação em outros contextos nacionais e internacionais, eventualmente recorrendo a técnicas de amostragem mais robustas.
Conclusão
A inteligência emocional pode ser considerada um conceito central para potenciar o bem-estar psicológico percebido dos estudantes do ensino superior, pois influencia a tomada de decisões, o seu equilíbrio e o pensamento crítico-reflexivo.
Conclui-se que os scores de inteligência emocional mais elevados correspondem à perceção das próprias emoções e à componente sociocognitiva das emoções e que os estudantes com um score global mais elevado de inteligência emocional são os que estudam diariamente. O controlo, o envolvimento social, a autoestima e a felicidade estabelecem uma associação positiva com a inteligência emocional, sugerindo que quanto mais controlo, envolvimento social, autoestima e felicidade têm os estudantes mais inteligência emocional possuem. O equilíbrio estabelece uma associação negativa, indicando que quanto menos equilíbrio os estudantes possuem maior a sua inteligência emocional.
Como implicações para a prática os resultados indicam a necessidade de desenvolver programas de apoio psicológico aos estudantes do ensino superior, dando provas efetivas da melhoria da sua autoconfiança e bem-estar psicológico, não descorando, no entanto, a importância de desenvolver programas ao nível da inteligência emocional. Os estudantes devem desenvolver a sua inteligência emocional, uma vez que esta, no seu todo, contribui positivamente para relações interprofissionais e com todos os membros da comunidade académica, onde aceitar as emoções e a validação dessa experiência é determinante para a autoconfiança e bem-estar psicológico.
Agradecimentos
Os autores agradecem a contribuição dos estudantes que integraram o estudo. De igual forma, agradecem o apoio da Escola Superior de Saúde de Viseu (ESSV) e da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem (UICISA: E), acolhida pela Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC) e financiada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).
Este estudo integra o projeto “Inteligência Emocional, Empatia, Relações Interpessoais, e Perceção de Bem-Estar em Estudantes do Ensino Superior” (Ref. PROJ/I&DI/CI&DEI/003) inscrito no Centro de Estudos em Educação e Inovação.
Contribuições dos autores
Conceptualização, E.S., M.F., C.F., A.P.C, M.C. e S.C.; tratamento de dados, E.S.; análise formal, E.S., M.F., C.F., A.P.C, M.C. e S.C.; investigação, E.S., M.F., C.F., A.P.C, M.C. e S.C.; metodologia, E.S., M.F. e S.C.; administração do projeto, M.F. e S.C.; recursos, M.F. e S.C.; programas, E.S.; supervisão, M.F. e S.C.; validação, E.S., M.F., C.F., A.P.C, M.C. e S.C.; visualização, E.S., M.F., C.F., A.P.C, M.C. e S.C.; redação - preparação do rascunho original, E.S., M.F. e S.C.; redação - revisão e edição, E.S., M.F., C.F., A.P.C, M.C. e S.C.