Introdução
Recorrentemente tem sido proclamada a ideia, por vezes de uma forma algo alarmista, de que os jovens são politicamente apáticos e pouco participativos (Menezes et al., 2019; Garcia-Albacete, 2014; O’Toole, 2004), sendo retratados como causa e sintoma das atuais crises de representação dos sistemas políticos (Bastedo, 2015). De facto, este grupo etário tem-se afastado da participação política formal (Fernandes-Jesus et al., 2015; Sloam, 2016; Menezes, 2011): votam menos (Smets, 2012; Henn e Weinstein, 2006; Kimberlee, 2002) e militam menos em partidos políticos (Costa et al., 2022; Lisi e Cancela, 2019; Lobo, Ferreira e Rowland, 2015; Quintelier, 2007). Este afastamento não é exclusivo dos jovens: também na população em geral encontramos um crescente ceticismo em relação à atuação e práticas dos partidos políticos, que se expressa numa crescente abstenção eleitoral (Cancela e Vicente, 2019; Ferreira et al., 2017; Henn e Weinstein, 2006; Freire e Magalhães, 2002). Estaríamos, assim, perante uma crise crescente de participação e legitimidade dos sistemas políticos das sociedades ocidentais, comprometendo a democracia. Convém, por isso, questionarmo-nos sobre as novas formas de participação política dos jovens, nomeadamente qual a relação que estes estabelecem com o sistema político e os seus atores.
Neste artigo pretendemos contribuir para essa discussão. Para tal partimos de dados recolhidos, através de entrevistas realizadas no âmbito de um projeto nacional que envolveu jovens que podemos definir como ativistas. Abordámos este conceito de forma muito genérica, envolvendo formas de intervenção cívica em torno de certas causas, como a climática, antirracista, feminista, LGBTQIA+, e na categoria Politik (que integra os direitos humanos, anticapitalismo, movimento estudantil) e/ou a participação em coletivos organizados com esse fim. Consequentemente, o projeto não visava estudar a relação dos jovens com o sistema político ou com os atores políticos tradicionais. De uma forma geral, percebemos uma distância significativa em relação aos partidos políticos. No entanto, nem todos estão afastados dessas estruturas ou desvalorizam totalmente a sua importância. Nesse sentido iremos centrar-nos no discurso destes jovens ativistas que, ao longo da sua trajetória (Grasso et al., 2018), tiveram ou têm ligações com partidos políticos, e que foram ou ainda são militantes e simpatizantes destas organizações.1
Temos como objetivo principal deste artigo compreender as trajetórias e representações sociais dos jovens ativistas em torno dos partidos políticos, debatendo como as diferentes experiências com estas instituições influenciaram as suas práticas atuais de ativismo. Em suma, a nossa questão de partida neste artigo é a seguinte: Como é que a experiência dos jovens nos partidos políticos, entendida no quadro da sua socialização política, molda a sua prática atual de ativismo e de que forma implicou processos de aproximação, complementaridade e afastamento destas organizações?
Consideramos que, em muitos casos, os partidos são determinantes nos processos de socialização política dos jovens, transmitindo-lhes diversas ferramentas de trabalho, imbuindo-os de utensílios conceptuais e ideológicos para o desenvolvimento do pensamento político, promovendo a formação de redes entre indivíduos empenhados nas mesmas lutas (Pickard, 2019; Ekström, 2015; Gordon e Taft, 2011). Concluímos que os jovens apresentam diversas visões acerca dos partidos. Alguns ressaltam os partidos como espaços fundamentais de consciencialização, aprendizagem e encontro com outros jovens, particularmente em juventudes partidárias (Malafaia, Menezes e Neves, 2018). Outros salientam a importância da complementaridade com movimentos sociais contemporâneos (Earl, Maher, e Elliott, 2017, Epstein, 2001), em redor de causas específicas ou interseccionais (Ferreira et al., 2017; Soler-i-Martí, 2015). Nalguns casos consubstanciando uma visão que atravessa grande parte dos discursos dos jovens ativistas, encontramos um afastamento progressivo (Lisi e Cancela, 2019), que acompanha a sua aproximação a coletivos ativistas informais em redor do feminismo, antirracismo e clima, entre outros.
Juventude e participação política
A juventude corresponde a uma fase de vida marcada por mudanças biológicas e comportamentais, mas também pela progressiva incorporação de papéis sociais, envolvendo o desenvolvimento de competências políticas (Earl, Maher, e Elliott, 2017; Andersson, 2015; Ekström, 2015; Lee, Shah e McLeod, 2013; McIntosh e Youniss, 2010). O papel socialmente atribuído aos jovens determina que estes sejam olhados como cidadãos em construção. São vistos como “protocidadãos, ou cidadãos em formação, com responsabilidades, mas nem todos os direitos”. (Pickard, 2019: 125). Como tal, o seu empenhamento político tende a ser frequentemente menorizado, olhado de viés ou alvo de censura (Ekman e Amnå, 2012). Recorrentemente, quando os jovens participam ativamente, são rotulados como extremistas, como no caso dos movimentos antiglobalização (Stiglitz, 2017; Epstein, 2001), de defesa radical do veganismo e dos direitos dos animais (Cherry, 2015; Wood, 2006) ou através de formas artísticas vistas como perigosas como o Gangster Rap (Kelley, 2020; Gordon e Taft, 2011). Todas estas visões sobre a juventude são marcadas por estereótipos e preconceitos adultocêntricos, que questionam seriamente a sua capacidade de avaliação, análise e decisão política. A partir desta visão parcial e centrada no olhar adulto sobre os jovens fica claro que as definições e compartimentações deste universo político, construídas a partir de uma cosmovisão normativa, fazem pouco sentido para compreender a participação dos jovens nas questões cidadãs (Sloam e Henn, 2019).
Formatos de participação política
A literatura parece ser razoavelmente consensual no diagnóstico que faz, que aponta para um gradual afastamento dos jovens da política institucional. Se alguns entendem que isto deriva da apatia e desinteresse dos jovens, outros consideram que existe uma espécie de viragem que aponta para a gradual valorização de novos formatos de intervenção política que ocorrem à margem do campo institucional. Neste sentido, os jovens não apenas se constituem como novos atores, como recorrem frequentemente a formas inovadoras de organização, não hierárquicas e diretas, de natureza fragmentada e fluida, alargando a noção de agência política, que vai além da participação em partidos e juventudes partidárias, nos sindicatos ou nas associações formais (Campos e Martins, 2023; Matos et al., 2023; Costa et al., 2022; Campos e Sarrouy, 2020; Menezes et al., 2019; Pitti, 2018; Malafaia, Menezes e Neves, 2018; Ferreira et al., 2017; Cammaerts et al., 2016; Sloam, 2016; Gordon e Taft, 2011; Quintelier, 2007).
Os estudos têm revelado que os jovens apresentam um profundo descrédito, pessimismo e desconfiança face à eficácia, à visão, às práticas e normas burocráticas, aos resultados das instituições ligadas à política institucional (Bastedo, 2015). Sentem que as suas demandas ou não são atendidas, ou são instrumentalizadas (Cammaerts et al., 2016; Gordon e Taft, 2011; McIntosh e Youniss, 2010). Defendem, genericamente, formas de intervenção e uma visão de natureza interseccional, implicando uma ligação das diferentes lutas e ao nível global (Soep, 2014; Amnå et al., 2009).
A proximidade a partidos políticos oscila e é, muitas vezes, fluida e efémera, dependendo das fases de vida, articulando-se com as trajetórias ativistas: um conjunto de decisões, escolhas, eventos e experiências significativas que moldaram os jovens e que influenciaram as suas dinâmicas ativistas, assim como a sua identidade. De notar que muitos dos jovens ativistas passaram por um conjunto de experiências traumáticas associadas à sua origem social e de classe, pertença étnica ou origem nacional, pertença sexual ou de género, que irão influenciar significativamente a sua mundivisão, sentido de justiça e de reparação. São decorrentes do contacto com outros, mas também de processos de autoavaliação, muitas vezes marcadas por uma apreciação negativa feita por outros ou por eles mesmos.
A literatura mais recente demonstra que os jovens se mobilizam em torno de certos combates e causas de ação coletiva de forma criativa (Pickard, 2019) e performativa (Isin, 2017), através de formas de experimentação artística, muitas vezes disruptiva (Pitti, 2018; Höppner, 2017; Ferreira et al., 2017; Isin, 2017). Consubstanciam uma dimensão estética e simbólica, ao ressaltar e sensibilizar formas de resistência social (Campos, 2023; Martins e Campos, 2023). Inscrevem-se numa agenda política pós-materialista (Buechler, 1995; Abramson e Inglehart, 1987) em redor de causas como o consumo e a sustentabilidade ambiental (Earl, Maher, e Elliott, 2017), os direitos humanos (Youniss et al., 2002), as questões culturais e identitárias (Harris, 2015), ou da intimidade e estilos de vida (Ekman e Amnå, 2012). Encaram estas causas como fundamentais, como respostas aos desafios do seu tempo (Grasso et al., 2018; Ekström, 2015; Andersson, 2015), que muitas vezes são desvalorizadas ou ignoradas pelo sistema político (Weiss, 2020; Cammaerts et al., 2016; Amnå et al., 2009).
Verificamos, também, que as novas causas de ação coletiva dos jovens são construídas com base em formas alternativas de acesso à informação. Em particular nas redes sociais e plataformas digitais, cruzando as esferas online e off-line, em que a dinâmica visual é determinante: partilham imagens espetaculares de performances em manifestações, que emocionem e cativem outros jovens a aderirem à sua causa (Loader, Vromen e Xenos, 2014; Soep, 2014). Mas também partilham mensagens com os seus pontos de vista, geralmente acompanhadas de palavras-chave (hashtags), que favorecem a sua disseminação digital (Chayinska, Miranda e González, 2021; Rambukkana, 2015). Através de programas de estudo e estágio no estrangeiro, mas também de lazer, contactam com novas realidades em que a participação e o ativismo estão mais acesos, favorecendo a radicalização de posições e a passagem à ação (Earl, Maher, e Elliott, 2017). Estes contactos permitem a criação de uma comunidade de interesses e de partilha, mas também de sociabilidades pessoais, em que os seus membros são simultaneamente amigos (Ekström, 2015; Lee, Shah e McLeod, 2013; Gordon e Taft, 2011).
A literatura também demonstra que os jovens se envolvem de modo mais individualizado e intermitente. As suas ações têm fronteiras imprecisas, cruzando dimensões de ordem afetiva, lúdica ou artística (Soler-i-Martí, 2015; Norris, 2009). Ao afastarem-se das entidades ligadas à política institucional, da sua lógica hierarquizada, horizontal e fidelizada, aproximando-se dos movimentos sociais (Earl, Maher, e Elliott, 2017; Loader, Vromen e Xenos, 2014; Epstein, 2001; Buechler, 1995). Defendem, desta forma, a constituição de grupos políticos não formalizados, muitas vezes de natureza pós-materialista, interseccional e fluida (Pickard 2019; Earl, Maher, e Elliott, 2017; Buechler, 1995; Abramson e Inglehart, 1987).
Em grande medida, estes movimentos sociais mais informais são importantes para os jovens como plataformas de expressão de opiniões e preocupações sobre as questões que os afetam diretamente, de aprendizagem e acesso à informação (Lee, Shah e McLeod, 2013; Gordon e Taft, 2011). Nestes espaços desenvolvem práticas políticas procurando alcançar objetivos comuns, uma comunidade de interesses e de encontro, de pressão sobre as instituições políticas formais e de ação concreta (Andersson, 2015; McIntosh e Youniss, 2010). Diríamos mesmo que este não é um exclusivo dos jovens, estaríamos perante a dinamização de uma “sociedade de movimentos” (Earl, Maher e Elliott, 2017: 6), com novas formas de identidade ativista (Horowitz, 2017), com novas táticas e expressões de descontentamento: através de petições, manifestações espetaculares, boicotes a produtos de empresas com comportamentos insustentáveis ao nível social e ambiental, mais ações diretas no espaço público (Menezes, 2011; Magalhães e Moral, 2008).
Socialização política
Para melhor entender as opções e trajetórias políticas dos mais jovens (Grasso et al., 2018), importa pensar os seus processos de socialização política, de forma complexa e interligada. A socialização política é um processo localizado, contextual e situacional (Andersson, 2015), envolvendo diversos atores, como a família (Lee, Shah e McLeod, 2013), a escola (McIntosh e Youniss, 2010) e os pares (Ekström, 2015; Campos e Martins, 2023). Este processo depende de conjunturas históricas particulares, de maior ou menor conflitualidade, marcadas por problemas específicos. (Matos et al., 2023; Malafaia, Menezes e Neves, 2018; Magalhães e Moral, 2008)
É durante o processo de socialização política que os jovens constroem conhecimento acerca do mundo: adquirem um conjunto de valores e visões acerca das práticas de ação e mobilização política, aprendem a importância dos direitos pessoais e coletivos, desenvolvem pontos de vista, discursos, matrizes ideológicas e alianças políticas, valores e comportamentos, que terão efeitos na sua visão política como futuros adultos (Shah, McLeod, e Lee, 2009). Falamos de processos dinâmicos e de interação social, momentos fundamentais de aprendizagem e vivência democrática (Gordon e Taft, 2011), de esclarecimento e tomada de posição, ensaiando formas futuras de ativismo e participação (Rodrigues, Menezes e Ferreira, 2018; Höppner, 2017). A construção deste tipo de conhecimentos é faseada. Inicialmente marcada por um conjunto de ideias resultantes de uma interpretação do mundo partilhada, mais ou menos consensualizada, resultante das suas experiências e do acesso à informação. Progressivamente avançam para relações mais complexas, integrando-as num sistema mais global e passando à ação, sendo este processo profundamente diverso. (Earl, Maher, e Elliott, 2017; Ekström, 2015; Lee, Shah e McLeod, 2013).
A tradição recente do estudo dos processos de socialização política dos jovens, tem sido enredada em dois erros fundamentais de leitura. Por um lado, é vista como um momento de aprendizagem dos processos políticos formais (Neundorf e Smets, 2017), de educação cívica sobre os mecanismos institucionalizados de participação política (Youniss et al., 2002). Por outro lado, uma visão demasiado centrada nas aprendizagens feitas no contexto familiar (Ekström, 2015) e escolar (Menezes et al., 2019), foco principal da formação das suas identidades políticas (Pickard, 2019; Horowitz, 2017). Ambas as tradições são apresentadas como leituras centradas nos adultos e não nos processos desenvolvidos pelos jovens, algo que eles fazem por eles mesmos e para si.
A nossa abordagem acerca da importância da socialização política no contacto, afastamento ou complementaridade dos jovens com os partidos políticos leva-nos a defender uma posição conciliadora destas diferentes tradições: num momento inicial a família é um elemento fundamental, mas os processos de rutura ou de complementaridade são tomados durante a juventude, no contacto direto com associações juvenis (em particular nas associações de estudantes) e noutros espaços de encontro não formal, em que os seus amigos e pares são determinantes (Ekström, 2015). Deste modo os partidos políticos podem desempenhar um papel importante, também, nesta socialização política dos jovens, em confluência com os outros agentes sociais que são determinantes neste campo, como a família e os pares.
Metodologia
Este artigo resulta de um projeto de investigação nacional, decorrido entre 2019 e 2022, em redor dos territórios não institucionais de construção da cidadania dos jovens, com especial incidência no campo cultural e artístico como espaço de intervenção cívica, procurando entender de que forma a agência criativa dos jovens se pode articular com a sua agência política. Desenvolveu-se um modelo metodológico qualitativo, cruzando etnografia e entrevistas aprofundadas para a recolha de testemunhos, através do encontro e proximidade com um universo de pesquisa particularmente dinâmico e em constante transformação. No trabalho de campo foi determinante a presença em manifestações, workshops e encontros dedicados às diferentes causas, mas também em eventos de natureza artística e criativa promovidas por estes jovens.2
Nas entrevistas em profundidade foi utilizado um guião muito amplo, abrangendo questões de caráter biográfico, nomeadamente no que toca às práticas ativistas iniciais numa pluralidade de entidades, como as associações de estudantes, grupos de jovens religiosos, juventudes partidárias, redes internacionais de jovens, mas também pequenos grupos locais, com intervenção no campo da assistência social, pobreza, ou mesmo de preservação ambiental e proteção de animais. Quisemos também saber mais sobre as suas práticas ativistas atuais e as suas representações em torno do universo da política e do ativismo.
A escolha dos entrevistados foi efetuada através da técnica de “bola de neve”, abrangendo um total de 74 indivíduos, sendo escolhidas para a análise deste artigo 50 entrevistas captando, tanto quanto possível, uma elevada heterogeneidade de causas de intervenção política e cívica. Das entrevistas escolhidas para o artigo, 46% dos jovens tinham até 25 anos; 22% entre os 26 anos e os 30 anos e 32% entre os 31 e os 35 anos. De entre as causas defendidas encontramos uma forte prevalência das causas de género / feministas (24%), climática (22%), mas a larga maioria dos jovens apresentava uma visão interseccional no seu discurso (34%), congregando várias causas na sua intervenção.
As relações dos jovens com os partidos políticos em Portugal
Os jovens em Portugal, apesar de bastante críticos, apresentam níveis de satisfação com a democracia maiores do que a média nacional, mas valorizam menos os conceitos de esquerda e direita (Lobo, Ferreira e Rowland, 2015; Fernandes-Jesus et al., 2015). Num estudo de 2017 acerca da chamada Geração Milénio (Ferreira et al., 2017), cujos dados foram recolhidos em 2015, poderemos aceder a mais informação sobre a relação dos jovens com os partidos e a sua evolução desde 2007.
A análise do gráfico da figura 1 apresenta-nos uma visão claramente descrente dos jovens face aos partidos políticos em todos os indicadores apresentados. Recorrendo aos dados apresentados para a população geral (Ferreira et al., 2017: 135), percebemos um comportamento semelhante ao dos jovens: a restante população também tem vindo a distanciar-se progressivamente dos partidos políticos. Nesse sentido, não estaríamos perante uma questão geracional, específica da juventude portuguesa, mas de elementos mais profundos, associados a um descontentamento generalizado de todos os estratos etários em Portugal em relação à qualidade do regime político (Cancela e Vicente, 2019; Freire e Magalhães, 2002).
Em comparação com os seus congéneres europeus, os jovens portugueses apresentam um comportamento eleitoral mais baixo, mas sem apresentarem uma discrepância elevada. De entre os 15 países europeus participantes no European Social Survey (ESS), apenas a Irlanda, o Reino Unido e a França apresentam uma percentagem de votação mais baixa entre os jovens (18-24 anos). Encontramos comportamentos eleitorais progressivamente reduzidos, com processos decrescentes de participação política em todos os estratos etários, não sendo este um exclusivo português. Também nestes contextos é discutido se a questão geracional é ou não determinante para pensar os comportamentos de participação política mais geral, e o comportamento eleitoral em particular. A generalidade da literatura rejeita este efeito geracional, indicando que os jovens, apesar de se afastarem das instituições políticas mais tradicionais, convocam outras práticas, causas e formas de organização políticas alternativas (Sloam, 2016; Garcia-Albacete, 2014; Smets, 2012; Quintelier, 2007; O’Toole, 2004; Kimberlee, 2002).
Segundo os dados de um estudo desenvolvido pela Fundação Calouste Gulbenkian, intitulado “A Participação Política da Juventude em Portugal” (Costa et al., 2022) os jovens não são aqueles que mais reduziram a sua participação eleitoral, sendo essa redução mais significativa entre os adultos, em particular entre os 60 e os 80 anos. Para os autores, a participação eleitoral dos jovens manteve-se estável, apesar de baixa. Neste campo, e segundo os autores, dimensões como a educação, o rendimento ou o posicionamento ideológico não são fundamentais para alterar este afastamento do voto.
Na verdade, este grupo etário apresenta uma forte desconfiança em relação “à ‘maquinaria democrática’, isto é, em relação aos partidos políticos, e não face aos princípios democráticos, contrariando o argumento da despolitização ou da apatia da juventude” (Costa et al., 2022: 5). Preocupam-se em particular com os resultados ineficazes da gestão pública e com a corrupção. Defendem que os partidos têm mensagens, formas de comunicação e de mobilização, mas também estratégias desadequadas aos interesses dos jovens, não dispondo de canais adequados. Os mais críticos, referem que os partidos são antiquados, aborrecidos, verticais e opacos e que não valorizam as suas opiniões. De entre os jovens que militavam em estruturas partidárias, a sua participação é justificada com base em “dois elementos: a pertença a uma comunidade e a intervenção, tendo em vista o progresso e o bem comum” (Costa et al., 2022: 5). Nesse sentido apresentam uma visão instrumental dos partidos, como porta-vozes das suas ideias, reafirmando mais uma vez a dinâmica individual que já declarámos.
Com base noutro estudo, desenvolvido pela Universidade Católica no Porto, junto de jovens entre os 14 e 30 anos, a pedido do Conselho Nacional de Juventude, com o título “Participação Política Juvenil em Portugal: Resultados de Um Inquérito Online e de Grupos de Discussão com Jovens” (Matos et al., 2023), encontramos mais alguns elementos para a caracterização das relações entre este grupo etário e os partidos políticos. O estudo indica que 89,6% dos jovens já participaram, pelo menos uma vez, em eleições, sejam elas legislativas (81,8%), autárquicas (79,1%), presidenciais (76,6%) ou europeias (45,6%). Apenas 2,0% são sindicalizados e cerca de 17,5% participam em partidos políticos, não sendo claro se na modalidade de militantes ativos. Cerca de 22,7% participam em campanhas eleitorais e 34,7% em associativismo. Em termos de posicionamento político, o estudo aponta que a maioria dos jovens se identificam ideologicamente com a esquerda (46,0%), mas apenas 15,5% desse universo refere pertencer a partidos políticos. De entre os jovens que se identificam com a direita (20,4%), há uma maior prevalência da participação em partidos políticos, cerca de 29,0% desse universo.
Da análise dos trabalhos de Matos et al. (2023), Costa et al. (2022) e Ferreira et al. (2017), percebemos uma clara perda de influência dos partidos políticos entre os jovens em Portugal. Por outro lado, os jovens têm apresentado práticas de participação política mais fugazes, associadas a grupos políticos não formalizados, que apesar de serem reconhecidos no ambiente ativista, não estão formalizados como associações (Lisi e Cancela, 2019; Magalhães e Moral, 2008). Apesar desta visão maioritariamente negativa dos partidos políticos, ainda poderemos encontrar, em particular em Portugal, jovens que participam ativamente nas suas organizações juvenis. Malafaia, Menezes e Neves (2018) ressaltam que nestes espaços eles desenvolvem um conjunto de debates, adquirem capacidades de pensamento crítico e de aprofundamento ideológico. Ocorrem particularmente em momentos efervescentes e de elevada conflitualidade política, como nas campanhas eleitorais ou manifestações. Participam ativamente nas diferentes esferas políticas, decidindo os momentos, estratégias e orientações da ação política, aprofundando o conhecimento sobre a sociedade e as suas dinâmicas. Justificam a sua adesão às juventudes partidárias com base nas suas representações políticas e nas experiências anteriores em grupos menos formais, negando uma visão estereotipada que associa estas organizações como escolas de futura profissionalização política. Estas juventudes partidárias
Constituem-se como ambientes de participação cívica e políticas de qualidade. De facto, os participantes estão envolvidos em atividades pessoalmente significativas, nas quais têm a oportunidade de se envolver em processos de decisão destinados a resolver problemas da vida real. [Malafaia, Menezes e Neves, 2018: 72]
Os mesmos autores defendem que este aprofundamento político é complementado com uma dinâmica de socialização juvenil, em que os aspetos lúdicos e de interação entre pares são determinantes. Desenvolvem relações de amizade e afeto, companheirismo e proximidade, de mobilização e organização, muitas vezes num ambiente festivo.
Análise dos discursos dos jovens ativistas sobre os partidos políticos
Como já referimos anteriormente, o projeto que serve de base a este artigo não teve como foco central a participação política formal e, muito menos, a relação dos jovens com o sistema partidário. Pretendemos com este artigo demonstrar as experiências individuais de envolvimento político de alguns jovens ativistas, e de que forma os partidos políticos influenciaram o seu processo de socialização política, levando a relações de complementaridade com outros movimentos, mas também de rutura.
Ao questionarmos os indivíduos entrevistados acerca das suas práticas de envolvimento político, ainda precoces, assim como as suas visões subjetivas acerca destes temas, os partidos surgiram na entrevista, enquanto objeto de discurso, referindo a sua importância e o seu papel na sua socialização política. Alguns falaram com conhecimento de causa, discorrendo sobre partidos onde militam ou militaram ou com os quais simpatizam. Outros falaram de forma genérica, da classe política e das instituições, enquanto agentes relevantes, para o bem e para o mal, do universo político.
Verificámos que apesar da reduzida participação dos jovens na política institucional, em particular nos partidos políticos, tal não significa que aqueles estejam totalmente afastados desta esfera. Em grande parte das vezes, as causas que defendem e agenciam de forma alternativa, têm pontos de contacto com determinados partidos políticos, em particular com os partidos de esquerda, que pela tradição que têm de comunhão com causas progressistas e princípios dos movimentos sociais, são aqueles que mais são mencionados. Os jovens detalharam-nos aproximações ao nível da problematização ideológica, de leitura do sistema social, cultural e económico, de uma visão dos partidos como espaços de aprendizagem para a organização e mobilização para a ação. As entrevistas realizadas demonstraram-nos precisamente isso, com diversos jovens a relatarem relações mais ou menos próximas com partidos, enquadrados nas categorias de “simpatizante” ou “militante”.
A análise efetuada permitiu identificar dois tipos de trajetórias. Por um lado, aqueles que mantêm uma relação de proximidade ou que militam em partidos e simultaneamente em movimentos ativistas, ressaltando a necessidade de convergência ou complementaridade entre ambos. Por outro lado, outros que, apesar de um passado ligado a partidos, se afastaram dos mesmos por razões diversas ao longo da sua trajetória ativista, revelando uma trajetória divergente. Na análise iremos adotar uma perspetiva mais biográfica, assente nas narrativas pessoais desveladas pelos entrevistados, que tendem a assumir uma determinada ordem temporal baseada na sua história. Iremos centrar a nossa análise em quatro temas: a família e os pares, as associações de estudantes, as aprendizagens e, finalmente, as formas de complementaridade e os processos de rutura.
O papel determinante da família e dos pares
Entendemos que, nalguns casos, os partidos políticos podem desempenhar um papel importante na socialização política dos jovens, em diferentes etapas da sua vida, em articulação com outros agentes de socialização, como a família ou os pares. Estas articulações não se anulam, antes representam a importância distinta que detêm nas diferentes fases de vida.
Encontramos com alguma regularidade no discurso um elemento comum no processo de socialização política: a influência que as famílias tiveram no despertar político e nos contactos iniciais com estes organismos políticos formais. A socialização política não é um processo compartimentado, mas envolve diferentes atores que agem em múltiplos sentidos. A família assume um papel fundamental, precisamente na infância e na passagem à adolescência. Neste âmbito há um conjunto de rituais e valores que são transmitidos, com hábitos de participação em manifestações, debates e outros eventos partidários.
Estes são os casos de Rute,3 militante da Juventude Socialista, estudante universitária e ativista na causa climática, de Marta, que militou na JCP, e atualmente é ativista afro-feminista, e de Beatriz, que milita atualmente no Bloco de Esquerda em complementaridade com o movimento estudantil.
[…] a minha mãe faz parte do Bloco de Esquerda, esteve na UDP […] Portanto, eu cresci sempre neste meio […] cresci a ir aos churrascos e aos grandes eventos. Quando era pequena obviamente que era uma questão mais passiva. […] Era tanta a discussão lá em casa, que a minha fase de rebelião contra os meus pais foi dizer ‘Não! vocês não entendem nada de economia. Agora sou eu que vou seguir o meu caminho’ […]. [Entrevista a Rute, de 20 anos, em 8 de abril de 2020]
[…] Eu e a minha irmã íamos muitas vezes à associação quando éramos pequenas. Ouvíamos então falar muito da revolução, do 25 de Abril, das Guerras de Libertação, do PAIGC […] já tínhamos alguma cultura política, não muita, mas alguma […] E o meu pai era o grande conselheiro. E houve um dia que ele disse que podia juntar-me a um partido […]. [Entrevista a Marta, de 34 anos, em 19 de novembro de 2019]
[…] Acho que a pessoa que me puxou mesmo para a política foi mesmo o meu pai. O meu pai foi do MPLA e há todo um background político. Ele sempre me empurrou imenso para x sítios […]. [Entrevista a Beatriz, de 23 anos, em 16 de outubro de 2020]
Com a gradual perda de importância da família, acompanhada pelo papel crucial que os amigos e pares vão assumindo na vida dos mais jovens, encontramos uma aproximação aos partidos, como no caso de Bárbara que é ativista estudantil.
[…] comecei a ir a manifestações quando era muito jovem, quando tinha 13 ou 14 anos, e depois também me aproximei dum partido político, o que me abriu mais portas. Ao conhecer-se as pessoas que estão envolvidas em projetos formamos círculos de conhecimentos que, depois, geram outros projetos […]. [Entrevista a Bárbara, de 23 anos, em 16 de outubro de 2020]
Apesar das diferentes relações atuais com os partidos políticos, os entrevistados referem a importância que a família teve no contacto com estas organizações. De todos os entrevistados apresentados, apesar das ligações partidárias dos seus familiares, percebemos um contexto familiar em que a discussão política estava presente, em que era comum assistirem, na altura através da televisão, a noticiários e programas dedicados à atualidade política, em que o questionamento acerca da sociedade era um elemento profundamente presente. Num momento posterior, de progressivo afastamento durante a adolescência, os jovens passam a valorizar crescentemente o papel dos amigos e dos seus colegas de escola, de agentes políticos já integrados na dinâmica política, que acabam por influenciá-los.
A importância das associações de estudantes
Da análise global dos discursos destes entrevistados que apresentam relações, atuais ou passadas, com partidos políticos, percebemos que essa participação, mesmo que iniciática, foi importante para o seu despertar para a política, para a criação de representações em redor de temas como a justiça, a participação, a necessidade de envolvimento individual e coletivo para a prossecução de objetivos, elementos fundadores das suas práticas atuais de ativismo.
Neste caso, as associações de estudantes apresentam-se como espaços iniciáticos de contacto com a vida política, dando resposta à necessidade dos jovens de intervir na sua escola, no seu entorno. Face à forte influência que os partidos políticos têm nestas, configuram-se como espaços privilegiados de recrutamento para as juventudes partidárias.
[…] Como desde miúda sempre tive um grande espírito crítico, estive envolvida em associações de estudantes, estive no parlamento dos jovens e envolvida em várias causas, como os direitos de estudantes. […] Entretanto, por querer também ter um papel mais ativo, acabei por me filiar a uma juventude partidária - mas não a JSD! Mas acabei por o fazer e, às vezes, ainda tenho alguns problemas, porque decidi juntar-me à Juventude Socialista […]. [Entrevista a Rute, de 20 anos, em 8 de abril de 2020]
[…] Eu aos 15 e 16 senti uma grande necessidade de me envolver politicamente. Então nessa fase comecei a me aproximar de alguns grupos, de algumas coisas e da Associação de Estudantes […] Fiz então parte da Juventude Comunista e isso foi muito importante na escola secundária, porque representava a JCP […]. [Entrevista a Marta, 34 anos, em 19 de novembro de 2019]
Neste sentido, as sociabilidades juvenis cruzam-se com a adesão a certos princípios e valores, práticas e modelos de ação política. Para muitos jovens, a participação política é um elemento fundamental na sua vida, em resposta a formas de questionamento pessoal, da necessidade de passagem à ação concreta integrada em coletivos políticos, em particular no seu ambiente escolar.
As aprendizagens
Apesar das críticas que apesar de tudo muitos avançam, existe uma ideia generalizada de que os partidos podem representar uma mais-valia para os ativistas, em particular como fontes de informação, de aprendizagem ideológica e de construção de redes que permitem a constituição de estruturas de interligação úteis para a sua ação cívica atual.
Os ativistas como Ana, ativista climática, Marta, ativista afro-feminista, e Gregório, ativista LGBTQIA+ e climático, ressaltam a importância da participação em debates e iniciativas destas organizações como um momento de aprendizagem. Para muitos, há momentos de aproximação e contacto com os partidos que poderão no futuro, levar à militância formal ou, pelo contrário, ao afastamento.
[…] sentia que não tinha coragem e que me incomodava. Depois comecei a ir a algumas manifestações, com o Bloco, e conheci pessoas que não tinham medo de ser. E isso foi um abrir de olhos e teve um impacto na forma como vivia. Acho que, em geral, é viver com orgulho. Não estou afiliada, mas sim, simpatizo. Mas não me consigo afiliar, por enquanto. Mas partilho visões […]. [Entrevista a Ana, de 19 anos, em 9 de agosto de 2019]
[…] Não quero cair no lugar-comum e falar mal do PCP e da JCP, porque respeito muito, assim como respeito a escola das freiras. Respeito ainda mais o que aprendi na JCP, porque foi uma escola importantíssima para mim, com as pessoas que estiveram sempre para mim e me respeitaram bastante […]. [Entrevista a Marta, 34 anos, em 19 de novembro de 2019]
[…] fomos a um acampamento, hã, do Bloco de Esquerda, o Liberdade, […] E… aí… pronto, foi um espaço tão confortável e com tanto debate e tanta festa, e tanta coisa, que eu… foi supermotivador para eu mergulhar noutras questões […]. [Entrevista a Gregório, de 20 anos, em 22 de abril de 2020]
Para estes jovens, é recorrente desenvolverem ligações mais flutuantes e fugazes com as instituições, por vezes de vai-e-vem, entre distintas estruturas (juventudes partidárias, associações ativistas, coletivos informais, associações de estudantes) que, em muitos casos, têm relações com partidos políticos. Estes contactos diretos com estas organizações configuram-se como momentos fundamentais de partilha e de criação de conhecimento com outros jovens, de acesso à teoria política, sendo determinantes no seu processo de socialização política, agora fora do espetro familiar e próximo dos seus pares.
A complementaridade e a rutura
Numa toada mais positiva em relação ao papel dos partidos políticos, alguns jovens reconhecem a necessidade de complementaridade com os movimentos sociais, que se expressa na partilha de ideias e propósitos comuns, como veículos institucionais das suas causas, representando-as nos órgãos democráticos, em particular na Assembleia da República. Essa ligação permite que as causas que defendem tenham um alcance maior, particularmente na comunicação social.4
[…] Eu estou no Bloco de Esquerda e acho que é um bocadinho diferente. Eu não olho para o Bloco de Esquerda como um partido megaformal, que existe só dentro da Assembleia. Eu fui ativista antes de ser militante do Bloco e é isso que levo para o partido. Não é uma aspiração a fazer política formal, mas antes uma aspiração a criar pontes entre o movimento social e a política formal […]. [Entrevista a Beatriz, 23 anos, em 16 de outubro de 2020]
De entre os jovens que tiveram uma experiência direta com os partidos, como já identificámos, alguns ainda militam em partidos, nomeadamente nas suas organizações juvenis, mas outros afastaram-se progressivamente.
[…] não me lembro muito bem do que aconteceu, mas sei que foi uma questão qualquer a nível nacional, bastante relevante, e eu comecei a dar a minha opinião e a falar e alguém dos meus camaradas disse: “Camarada, tem calma que o Comité Central não tem ainda opinião formada sobre isso”. E eu fiquei “ai, estás a gozar comigo? Esta é a minha opinião”. “Sim, mas isso não é bem assim”, não sei quê e toda a ideia do coletivo e tal. Então fiquei calada, mas pensei: “Eu não quero estar aqui”. [Entrevista a Marta, 34 anos, em 19 de novembro de 2019]
Estas vozes críticas apontam o excessivo centralismo destas organizações, que impossibilitam a expressão individual, passando pela perceção de não serem escutados e das suas demandas não serem atendidas. Fazem reparos sobre a sua organização interna, indicando que estas estruturas teriam uma dinâmica demasiado castradora das opiniões individuais, impossibilitando críticas internas e a expressão de opiniões discordantes.
Conclusões
O estado da arte sobre a participação política dos jovens tem vindo a reproduzir a ideia de que eles são, não apenas uma faixa etária com pouca participação e baixa vinculação ao sistema político, mas também que este é um problema que se tem vindo a agravar. No entanto, este diagnóstico incide sobre a participação política institucional, maioritariamente adultocêntrica, correspondendo, por isso, a uma abordagem parcial da realidade. Os jovens não são apolíticos, desenvolvendo processos políticos marcados pelo dinamismo, abertura a outras causas públicas, numa dinâmica interseccional. Alteraram as suas práticas de cidadania, não só porque valorizam crescentemente o seu envolvimento individual em todas as estruturas da vida social, mas também porque o mundo social que os envolve se tornou mais fragmentado. Consequentemente optam por formatos de comprometimento mais fluidos, baseados na valorização dos estilos de vida e de consumo, criando redes de ação mais informais.
Deste modo problematizámos a forma como a confiança nas estruturas políticas formais esmoreceu, não só entre os jovens, mas perante a população em geral. A natureza institucional, burocratizada, formalizada em estruturas hierárquicas, permeáveis à corrupção e ao nepotismo dos partidos políticos, são elementos apontados como disfunções dos sistemas democráticos.
As representações que os jovens têm em relação aos partidos políticos em Portugal demonstram que os jovens se afastam ou são afastados destas estruturas. Mas também, mesmo que em menor número, que valorizam estas estruturas como espaços de formação política, de encontro com outros ativistas, de complementaridade com movimentos sociais mais informais.
Os jovens entrevistados pelo projeto Artcitizenship, apresentam relações com os partidos de ordem diversa: são influenciados pelo papel da família e dos pares, mas também pelo contacto com as associações de estudantes, pela participação em eventos e mobilizações. Estes agentes, mas também estes momentos de mobilização política, constituem-se como elementos fundamentais dos seus processos de socialização política, influenciando determinantemente as suas trajetórias ativistas.
Apesar desta descrença e afastamento, os partidos ainda desempenham um papel relevante para muitos jovens. No caso em concreto da pesquisa realizada, em torno de jovens ativistas, se por um lado sobressai um discurso cético e crítico relativo aos partidos, levando a formas de ativismo divergente, por outro lado, existe a confirmação de que estas estruturas desempenharam ou desempenham um papel importante para a socialização política de alguns jovens, em complementaridade com o seu ativismo de natureza convergente. Os partidos surgem, muitas vezes, articulados com outros agentes de socialização, como a família e os pares. Por influência mais ou menos direta destes, facto é que muitos relatam aprendizagens fundamentais não apenas ao nível do despertar da consciência política e do discurso ideológico, mas também ao nível do desenvolvimento de competências organizacionais ou comunicacionais, entre outras.