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Etnográfica
versão impressa ISSN 0873-6561
Etnográfica vol.24 no.3 Lisboa out. 2020
https://doi.org/10.4000/etnografica.7773
ARTIGO ORIGINAL
Os estudantes timorenses em rede: laços sociais e conforto emocional frente à solidão da experiência migratória no Brasil e em Portugal
Timorese students in network: social ties and emotional comfort facing the loneliness of the migratory experience in Brazil and Portugal
Silvia Garcia Nogueira*
*Universidade Estadual da Paraíba, Brasil; Universidade de Lisboa, Portugal E-mail: snogueirari@gmail.com
RESUMO
Este artigo busca abordar a dimensão afetiva da cooperação acadêmica do Timor-Leste com Portugal e Brasil, em perspectiva etnográfica dos estudantes em mobilidade internacional. Focaliza um conjunto de alunos timorenses em universidades portuguesas e brasileiras, destacando um sentimento de solidão (mesak) por eles expresso nessa experiência migratória, e os meios de lidar com isso. As mídias sociais são os recursos mais utilizados para falar com a família e fazer novas amizades.
Palavras-chave: solidão, estudantes timorenses, mídias sociais
ABSTRACT
This article seeks to address the affective dimension of East Timorese academic cooperation with Portugal and Brazil, from an ethnographic perspective of students on international mobility. It focuses on a group of Timorese students in Portuguese and Brazilian universities, highlighting a feeling of loneliness (mesak) expressed by them in their migratory experience, and the means they use to deal with it. Social media is the most used resource for talking to family and making new friends.
Keywords: loneliness, Timorese students, social media
A distância da família, dos amigos e de um estilo de vida anterior marca a experiência migratória de estudantes em formação acadêmica no exterior.[1] Para os Estados e as instituições de ensino, a cooperação educacional entre diferentes países é vista como um protocolo, um meio de internacionalização e/ou uma estratégia política. Para os alunos, representa uma mudança de vida, uma esperança de um futuro melhor, uma aventura e/ou um compromisso para com seu país de origem. Em geral, o cotidiano e os afetos envolvidos na mobilidade internacional estudantil são deixados de lado pelos governos envolvidos em um universo em que o foco recai sobre desempenhos, relatórios e cumprimentos de prazos por parte de alunos e instituições.
Diante desse quadro, este artigo busca discutir a dimensão afetiva da cooperação acadêmica, partindo de uma pesquisa etnográfica focalizada no ponto de vista de um conjunto de alunos timorenses que estudam no Brasil e em Portugal, dando relevo a um sentimento de solidão por eles expresso com recorrência e aos meios de lidar com ele, envolvidos na experiência de estudar fora do país.
O recorte adotado recai sobre a análise da articulação do sentimento de solidão experimentado pelos alunos com os processos de criação e manutenção de laços afetivos (amizade) por meio das mídias sociais na conexão entre um e outros. O suporte para a pesquisa vem sendo proporcionado por trabalho de campo desenvolvido junto a estudantes do Timor-Leste no Estado da Paraíba, na região Nordeste do Brasil, desde 2012, e em Lisboa (Portugal) a partir de 2017.[2]
Ainda que o tema da solidão tenha aparecido de diversos modos, ao longo do trabalho de campo, nas falas espontâneas dos estudantes, em conversas informais presenciais, são utilizadas também como fontes observações diretas e entrevistas.[3]
A abordagem dos sentimentos envolvidos na experiência de estudar fora surgiu tanto em meio a outros assuntos comentados pelos meus interlocutores quanto diante de uma provocação minha para que falassem do tema, tendo em vista que inicialmente surgiu em alguns relatos. Mais sistematicamente foram ouvidos 20 alunos, com quem tive múltiplas conversas que os conformam com a configuração de estudos de caso. Entre esses 20, tive quatro interlocutores principais no Brasil e três em Portugal (sendo duas mulheres e dois homens, no primeiro, e dois homens e uma mulher, no segundo). Eles, inclusive, me ajudaram a traduzir alguns depoimentos em tétum.
Embora o acompanhamento sistemático das mídias sociais, em especial do Facebook, tivesse enriquecido o presente artigo, o texto que aqui apresento não é e nem se propõe a ser uma análise sistemática e focalizada na utilização desses meios. Aspectos muito genéricos do uso do Facebook, no entanto, foram observados, como, por exemplo, o fato de a maior parte da comunicação entre eles nessa plataforma ser realizada em tétum e em outras línguas maternas.
O movimento de saída do país de origem faz parte de uma política do Timor-Leste voltada para a formação de quadros para atuação em seu recém-criado Estado. Os estudantes que partem, no entanto, a despeito dos lugares para onde se dirigem, costumam manter comunicação com familiares e amigos que ficaram ou se dirigiram para outras partes do globo por meio das mídias sociais, em especial por Facebook, WhatsApp e Skype. A manutenção dos laços sociais existentes antes de suas partidas torna-se um recurso importante para conforto emocional, mobilizações políticas e informações cotidianas. Além disso, usam a Internet como fonte de entretenimento e distração.
A atenção da pesquisadora para a solidão e o modo como os estudantes lidavam com ela foi despertada pela primeira vez quando uma aluna no Brasil, ao passar no corredor da universidade, cabisbaixa, contou que estava triste, se sentindo sozinha, com saudades de casa e de dormir com a mãe, hábito que possuía no Timor. Ao ser perguntada sobre como lidava com isso, respondeu que procurava os amigos e falava sempre com a família pelo Facebook.
O roteiro deste artigo foi construído a partir dos relatos dos estudantes: dentro de uma cadeia de significação, eles falavam sobre solidão e sobre a importância de se comunicar com a família e da amizade para combater esse sentimento. As mídias sociais, em especial o Facebook e o WhatsApp, eram citadas como meios da possibilidade de amenizar o sofrimento de se estar só. Os laços sociais eram mantidos ou criados via Internet.
Começo por introduzir o tema da estratégia de formação de quadros como parte do processo de nation-building (construção da nação) em Timor-Leste. Em seguida, faço rapidamente uma discussão sobre o campo das emoções na antropologia, que servirá de introdução para a apresentação e análise do modo como os alunos entendem solidão e amizade (mesak e habelum em tétum, respectivamente). Finalmente, exploro a forma como eles se utilizam das mídias sociais no combate à solidão e como ferramenta para criarem ou manterem laços afetivos.
Nation-building e mobilidade estudantil
Timor-Leste é um país do sudeste asiático que teve sua história marcada por ocupações estrangeiras, tais como o período colonial português (do século xvi até 1975), ocupação japonesa (1942), ocupação indonésia (1975-1999), intervenção direta ou acompanhamento da Organização das Nações Unidas (1999-2012). Em 1999 o país torna-se independente, mas ocorrem violentos conflitos pró-Indonésia, exigindo a intervenção da ONU. Somente em 2002 a independência é restaurada e dá-se início a um processo de construção de Estado e nation-building.
De acordo com Leach (2012), a comunidade internacional estava mais preocupada com o state-building no período pós-conflito do que com o nation-building. O primeiro teria um foco no regime de governança, instituições, accountability e Estado de direito; o segundo seria referente a um processo cultural para formar uma comunidade política coesa que sustentasse o desenvolvimento de um Estado funcional, destacando desenvolvimento de comunidade, formação de identidade e integração nacional.
Em Timor-Leste ocorre uma combinação de processos, que reside principalmente na coexistência de instituições sociais, tanto baseadas no Estado quanto no costume (Cummins 2015). Esta combinação de referentes tem sido entendida por diversos autores como coabitação (Viegas e Feijó 2017), caracterizando – se é possível falar em uma – a própria identidade nacional timorense. Sobre ela, Leach (2017: 232) destaca que está sendo moldada por suas próprias mãos (“now under its own hand”), com o desafio de ser simultaneamente um Estado e uma nação. Para o autor, os jovens possuem papel significativo nesse processo, tendo em vista que a média de idade no país está em torno dos 18 anos e que eles possuem suas próprias ideias sobre a identidade nacional, uma vez que são fluentes em tétum, familiarizados com a língua indonésia e cada vez mais educados em português.
Marcado pela diversidade cultural e linguística, Timor-Leste tem como idiomas oficiais o tétum e o português, ainda que seja considerado um país multilinguístico (Goglia e Afonso 2012). Devido às múltiplas interferências externas ao longo da sua história, o problema reside no fato de que poucos são os que falam português. A complexidade da questão engloba uma dimensão geracional, como observado por Goglia e Afonso (2012) e Silva (2006). Para esta última, “diferentes gerações de timorenses abordam ora o tempo português, ora o tempo indonésio”, reproduzindo muitas vezes “os discursos coloniais dentro dos quais foram educadas” (Silva 2006: 190).
Uma vez que, como lembra Antunes (2014: 29), a “língua é um fator de identidade e parte importante da herança cultural de um povo”, seguindo um planejamento estratégico, que envolve formação de quadros para o Estado, o governo timorense vem investindo em protocolos de cooperação acadêmica com países de língua portuguesa. Portugal e Brasil têm recebido especial atenção. As orientações de política externa portuguesa e brasileira reforçam tais relações diplomáticas: no caso português, a partir de uma política voltada para as ex-colônias; no caso brasileiro, na cooperação de tipo sul-sul, com ênfase em países lusófonos.
Cabe observar, como o faz Carey, que, em 1990,
“cerca de 50.000 timorenses tinham terminado os estudos nos liceus de língua indonésia e cerca de outros 1000 tinham estudado nas duas faculdades técnicas do território (Fatumaca e Díli) ou frequentado universidades no interior da Indonésia, um rácio bastante mais elevado do que os estimados 0,25% de população indígena timorense que beneficiaria de educação superior de língua portuguesa (e, desse modo, acedera ao estatuto de assimilado/civilizado) sob a administração portuguesa no início dos anos 70” (2002: 1065).
De acordo com Butcher et al. (2015), Timor-Leste sofre com falta de infraestruturas. O Plano Estratégico de Desenvolvimento, de Xanana Gusmão, criado em 2010 com vistas a 2030, objetivou transformar o país de um Estado pobre do sudeste asiático em uma “sociedade de classe média alta baseada em uma economia sustentável e non-oil” (Shoesmith 2012: 285 apud Butcher et al. 2015: 21, tradução minha). Investimentos no campo da educação estão dentro desse programa.
Uma das políticas adotadas tem sido a de estabelecer parcerias e protocolos de cooperação com instituições de ensino superior. Particularmente no que se refere a Portugal, os alunos chegam após uma seleção feita no Timor-Leste, em um regime especial destinado a naturais de lá, abrangendo os que lá nascem ou filhos de timorenses nascidos em Portugal. Os selecionados têm seus currículos do ensino secundário avaliados pelo gabinete do adido da Educação, de modo a encaminhá-los aos diversos cursos em distintas universidades, segundo correspondências curriculares exigidas. Esse processo diz respeito aos alunos bolseiros, apoiados pelo Ministério da Educação do Timor-Leste. Em 2016 eram 29 os estudantes bolseiros, e 41 em 2017.[4] A estimativa dos próprios alunos atualmente em Portugal, no entanto, é que sejam no total cerca de 80, porque alguns deles fazem a migração com fins de estudo por conta própria e às custas da família.
Ao Brasil, os alunos chegam também a partir de uma seleção realizada no Timor-Leste. Já lá, alguns passam por um “semestre zero”, para aprender português e matemática, e são encaminhados para os cursos conforme escolha estratégica do governo timorense. Podem receber uma bolsa do Programa Estudante Convênio de Graduação (PEC-G) e de Pós-Graduação (PEC-PG) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação brasileiro, ou ainda obtê-la do próprio governo timorense, do Fundo de Desenvolvimento do Capital Humano (FDCH), a partir de protocolos de cooperação acadêmica bilateral com universidades específicas.
Dentro do PEC-G, foi selecionado um aluno em 2015, seis em 2016, onze em 2017, oito em 2018 e dez em 2019; no PEC-PG, eram três em 2015, nenhum em 2016, um em 2017 e nenhum em 2018 e 2019.[5] Entretanto, duas universidades abrigaram mais estudantes timorenses em protocolos de cooperação próprios, ambas na região Nordeste: a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), com 51 alunos de graduação em 2017, mas que em 2012 recebeu 72 estudantes timorenses – sendo a instituição com maior contingente –,[6] e a Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), a segunda em números de alunos, com 33 alunos em 2012 (23 na graduação e 10 na pós-graduação) e que recebeu mais 19 alunos em 2015.[7]
É importante observar que, enquanto parte dos estudantes do Timor-Leste em Portugal consegue sair de férias para eventualmente visitar a família no seu país, no caso brasileiro, de acordo com os ouvidos na pesquisa, entre 2012 e 2017 somente dois deles o fizeram. Isso se deve aos altos custos, combinados à duração de uma viagem que está em torno de três dias de avião, dependendo da região de que se parte e do trajeto. Vários alunos em Portugal possuem parentes morando na Europa ou mesmo dividindo casa na cidade em que estudam – parte da família está por perto. No Brasil, isso raramente ocorre.
As emoções: solidão, saudade e amizade
A sociologia e a antropologia das emoções, de acordo com Koury (2014), se constituíram como subárea de conhecimento em ambas as disciplinas nos Estados Unidos, nos anos 1970. No Brasil, isso ocorreu quase duas décadas depois, como resultado de um “processo de busca de rejuvenescimento da teoria social, permitindo uma releitura da tradição sociológica e antropológica, desde os seus clássicos”, com influência, principalmente, por meio da “filosofia francesa de Derrida e Foucault e pela filosofia social de Simmel e através da redescoberta do processo civilizador, de Norbert Elias” (Koury 2014: 841).
Na sociologia, segundo Stets (2012), em geral, uma análise das emoções envolve teorizações e testes que abrangem as relações entre macroelementos (estrutura social e cultura) e microelementos (interação e self-processes), chaves para “experiências emocionais individuais” (2012: 326). A autora defende que sejam empreendidos mais estudos sobre emoções específicas em sua relação com determinados comportamentos e o próprio gerenciamento das emoções pelos agentes.
Na antropologia, as emoções passam a merecer atenção com as abordagens interpretativistas (na década de 1970), nos estudos que enfatizavam as relações entre as noções de pessoa, moralidade, estrutura social e relações de poder. Nos anos 1980, sob um olhar relativista, os sentimentos eram tratados como conceitos culturais “que mediam e produzem a experiência afetiva”, segundo Rezende e Coelho (2010: 14), que citam Lutz (1988) como responsável pelo entendimento de que os conceitos de emoção implicariam “negociações sobre a definição da situação e sobre vários aspectos da vida social” (Rezende e Coelho 2010: 14), como “um idioma que define e negocia as relações sociais entre uma e as outras pessoas” (2010: 14-15), constituindo-se como uma linguagem inserida em um código comum compartilhado (Mauss 1980). Nesse sentido, conforme Pussetti (2016: 43), emoções e sensações podem ser consideradas como linguagem primária para “definir, negociar, refletir e estruturar” relações sociais e construir conduta social.
A partir dos anos 1990, configura-se uma abordagem contextualista e pragmática, na qual o foco recai sobre as situações sociais específicas em que os sentimentos são expressos. A adoção de um enfoque relacional dos sentimentos pode ser atribuída ao que Rezende e Coelho (2010: 49) chamam de “gramática dos sentimentos”: “esforços emocionais de fusão com o outro (o amor e a admiração)”; “sentimentos suscitados pela ausência do outro (a solidão e a saudade) [e] pelo desejo de estar com o outro (a amizade)”. Os dois últimos compõem diretamente o repertório da experiência migratória estudantil.
Para Bispo, o amor, a amizade e a admiração teriam “um caráter aproximativo”; a solidão e a saudade caminhariam para um “lado oposto ao desses afetos, sendo não relacionais por princípio definidor” (2016: 253). Citando Wood (1986), Bispo (2016: 255), que estuda a solidão em um contexto de envelhecimento, diz que seria um sentimento paradoxal, visto no senso comum como não social, ainda que fosse “por excelência um dos sentimentos mais sociáveis” existentes.
No seguimento da minha interlocução com os alunos timorenses, foi ficando crescentemente claro que o sentimento de estar sozinho (mesak, em tétum) não necessariamente é negativo, sendo compartilhado por vários estudantes em sua vida longe da família e dos amigos. Para Emanuel,[8] um dos estudantes ouvidos, o sentimento negativo pode até existir, mas não está contido no conceito de mesak de modo definitivo. Pais (2013: 15) também faz a relativização: “há que se desembrulhar o sentimento de solidão da ideia de ‘estar só’. […] É o que ocorre quando alguém, carente de relacionamentos, se vê entre estranhos ou indiferentes”. Para o autor, a solidão refere-se a um estado de subjetividade e “estar só”, a uma situação objetiva.[9]
Já para Bispo, “estar só” é marcado por uma “separação do indivíduo do mundo exterior, de seus bens pessoais (a começar por sua morada) e por entrar em outro cenário com regras e ritmos próprios” (2016: 267). Nele está incluído “o distanciamento de antigas redes de sociabilidade que não são rapidamente substituíveis nos novos espaços de vivência” (Bispo 2016: 268), gerando o que Marandola Jr. e Dal Gallo (2010: 410) denominam “desencaixe espacial”, formado pela experiência de um processo existencial de “desenraizamento original”.
O mesak, para os timorenses, é um sentimento que tanto pode expressar uma necessidade de isolamento, de estar só, constituindo-se em um momento de reflexão eventualmente até para que uma importante decisão seja tomada, quanto pode ser relacionado a um isolamento forçado por conta de uma situação. Em quase todos os relatos, fica clara uma identificação dos meus interlocutores no estudo no exterior com o próprio isolamento do Timor-Leste, em especial no que se refere ao período da ocupação indonésia. Acredito que isso é muito particular ao Timor-Leste, ainda que o sentimento de solidão seja comum à condição migrante em geral. Em uma dimensão mais geral compartilhada pelos que migram, pode-se dizer que, no caso em tela, também ocorre uma relação entre o sentimento de pertença ao lugar, seja ele Portugal, o Brasil ou o Timor-Leste.
A mútua constituição entre o self e o lugar, no caso dos migrantes, implica naquilo que Marandola Jr. e Dal Gallo (2010: 410) chamam de “formação enquanto pessoa”, uma vez que o self é composto por dinâmicas, fenômenos e laços sociais que se desenrolam em uma “realidade geográfica”. Esta, repleta de memórias e vivências particulares, corresponde a um território de segurança. A partir de “percepção, sensação, cognição, representação e imaginação, o lugar-ser se constitui” (2010: 411).
Para os autores, a alteração da “relação originária self-lugar, saindo do lugar natal”, impacta diretamente em alicerces onde está edificada a identidade. Isso porque, como chama a atenção Koury (2010), o sentido de pertença advém da sua inserção no universo relacional do grupo, “sujeito de um discurso que evoca um lugar de origem e o torna visível através desse lugar, individualizando-o enquanto ser singular” (2010: 34). É a partir do lugar, desse local de origem, que o indivíduo descobre o “outro”, como uma “espécie de raiz que estabelece o seu local e o ser no local” (Koury 2001: 132).
A combinação de um distanciamento de si e da vida que se tinha antes com uma gradativa e relativa aproximação da nova realidade, vivenciada na situação migratória, é um jogo que os estudantes aprendem a manejar. Os que não são bem-sucedidos adoecem ou não conseguem terminar os estudos.
Esse fenômeno, que relaciona a experiência migratória ao rompimento de laços originais e doença, é apontado por Marandola Jr. e Dal Gallo (2010: 410), em uma referência a Lechner (2007: 81), para quem migrar corresponde a uma ruptura que altera trajetórias pessoais e implica no rompimento de laços. Para a autora, a experiência pode provocar “um deslocamento do sentimento de si”, causando “mal-estar existencial” e doença. Entre o grupo de timorenses no Brasil e em Portugal, há casos de depressão, tristeza e mesmo surto psicótico. Em Portugal, fala-se de um aluno que se suicidou.[10] Vários estudantes relatam que uma estratégia para lidar com a distância física, simbólica e emocional de “casa” é o uso cotidiano das mídias sociais – o que será discutido mais adiante.[11]
Para outra estudante timorense em Portugal, a solidão pode ser tanto uma “escolha” como um sentimento decorrente de uma conjuntura “negativa”, involuntária:
“É um sentimento no qual uma pessoa decide estar sozinha. Decidir se afastar e ficar só é uma razão pessoal. Algo que considera resolver a sua própria vida, refletir sobre a vida, ter uma experiência nova e positiva, trazer o alívio emocional. Vários motivos levam uma pessoa a ficar e viver sozinha. Razão pela qual existe algo negativo que acontece, estresse de alguma coisa, perda de alguém, etc.; e tudo isso leva a pessoa a ficar distante do indivíduo [de outro indivíduo]. Ao ver a nossa sociedade de hoje, pelo mundo tecnológico e avançado das coisas, pelo mundo de competição de trabalho, estudo, emprego… o ser humano esquece de si, de que o universo só nele vive.[12] Cada um escolhe sua vida, viver feliz e ter família ou viver feliz de ficar só. A questão é ampla, é preciso procurar saber quem fica isolado, deslocado, não tem interação social… Às vezes pode causar doença mental, morte. Por isso a vida é feita pela escolha, conviver com a pessoa ou ficar distante, isolado. Como estudante, ficar distante da família não é ficar isolado, mas a escolha de ter uma vida feliz no futuro” [Ana].
Os meus interlocutores entendem que a solidão, o mesak, está atrelada a uma “razão pessoal” e que foi provocada por algo (positivo ou negativo) que os leva a uma vivência de falta ou diminuição de interação social, seja ela voluntária, involuntária ou forçada por uma dada situação. Em geral, os estudantes ouvidos podem ou não atribuir sentido negativo à ideia de estar só, mas relacionam frequentemente o termo “solidão” a coisas tristes.
Cabe observar que o processo migratório no qual os estudantes timorenses estão inseridos engendra, do ponto de vista dos pesquisados, um entendimento de que estudar no exterior, deixando a sua terra natal, é um ato simultaneamente voluntário e involuntário. Involuntário, porque muitos deles prefeririam ter melhores condições de ensino superior e de trabalho no seu país, de modo que não precisassem buscar a capacitação fora para compensar essa lacuna.[13] O preço a pagar é o sofrimento causado pela distância da família e dos amigos. No entanto, eles entendem que a solidão experimentada é temporária – enquanto durar sua formação acadêmica – e atrelada a um objetivo maior – na fala da estudante, “ter uma vida feliz no futuro”. E, neste sentido, os estudantes se veem também como agentes de seus destinos (caráter voluntário), optando por experimentar um novo estilo de vida, conhecer pessoas e realidades distintas da sua vida timorense, ter acesso a uma capacitação profissional de qualidade como meio para melhorar suas condições de vida quando voltarem ao Timor-Leste ou onde quer que decidam viver.
Em sua face negativa (o custo emocional envolvido), a solidão significa para Sokolai, uma estudante timorense no Brasil,
“o sentimento quando uma pessoa se sente só. A solidão é não apenas a falta e o acompanhamento das pessoas, mas também a distância, o ficar longe das pessoas que a gente ama (família, bons amigos). A falta de contato também faz a gente ficar só, mesmo com quem está próximo. Às vezes as pessoas que estão próximas não estão abertas, ou seja, nós não as procuramos para desabafar os nossos sentimentos (tristezas, dores, sofrimentos), porque não confiaríamos. O problema sentimental também faz as pessoas se afastarem, e as leva a ficar com saudades das pessoas, dos passados, e acaba trazendo os pensamentos negativos, como as tristezas que destruíram nossa vida. Não existe a solidão para pessoas que têm um bom relacionamento com os seus próximos. Aqueles que têm dificuldades de vivenciar com as pessoas das suas convivências são muito mais fáceis de sentir a solidão” [Sokolai].
O depoimento dela chama a atenção por relacionar o sentimento não somente com os que estão distantes fisicamente (“família, bons amigos”), como também com os “próximos”, os que chegaram juntos mas que ainda não formaram um laço de amizade. Ela ressalta ainda a importância dos “passados” – ou seja, de experiências compartilhadas – e de “tristezas que destruíram nossa vida” – neste caso, suponho que as tristezas não se refiram somente a experiências pessoais, subjetivas, mas principalmente às vivências de um passado de sofrimento durante a ocupação indonésia, a resistência, a luta pela independência e pela construção do Estado timorense. Refere-se a um sentimento relacionado a um lugar, onde estão suas raízes, que possui temporalidade característica, como disse Arendt (1993) lembrada por Koury (2010). Desse modo, na fala de Sokolai, sentimentos atuais de solidão e isolamento se mesclam aos sentimentos dos e nos “passados” vividos no Timor-Leste.
A cadeia associativa de palavras usadas pelos estudantes timorenses para expressarem sentimentos costuma relacionar os termos “solidão”, “saudade” e “amizade”. Em consonância com o que diz a estudante acima, a saudade que se refere a um sentimento relativo ao passado, de acordo com diversos autores (Rezende e Coelho 2010; Lourenço 1999; DaMatta 1993), envolve um conceito de passado que não é pensado cronologicamente, como “algo que ‘passa’ inelutavelmente em um ritmo regrado e constante, mas sim como algo que do ponto de vista subjetivo, pode ser recuperado, revivido, por meio da ação da memória” (Rezende e Coelho 2010: 67).
Essa conexão fica muito clara na fala de outro aluno timorense, Afakay, que faz referência a uma espécie de solidão profunda, quase mítica, relacionada a uma memória coletiva compartilhada e forjada por uma separação dos militantes da resistência à ocupação indonésia em relação a seus familiares, que não fugiram para as “montanhas”, para o “mato”:[14]
“Existem várias definições sobre o conceito de solidão. Porém, ao definir essa palavra solidão, eu devo olhar para minha realidade, a realidade dos meus heróis (maubere e buibere) [guerreiro e guerreira em tétum, respectivamente] e a realidade do meu país. Falo isso porque durante tantos anos da luta, os nossos líderes da Frente Armada, que fizeram a guerra armada contra os indonésios no mato, deixaram as pessoas que eles/elas amam (as famílias e os filhos) na cidade, e ficaram no mato durante 24 anos, e sentiram o ato de solidão” [Afakay].
A solidão dos maubere e buibere é percebida como um ato. Possui agência, ainda que decorrente de uma situação política não desejada, forçada. Tal entendimento permite contextualizar melhor outra fala de Afakay, que se refere também a uma solidão do próprio Timor-Leste, que ficou isolado do resto do mundo durante os momentos de “tristeza”, para usar a expressão de Sokolai.
Nesse trecho do depoimento do estudante, a identificação entre o nível individual, subjetivo, e o do país (de um ponto de vista de percepção de quem ele é no mundo) revela uma concepção de si coletiva, social, mais que particular. O sentimento de isolamento dos militantes da resistência parece ser percebido como da mesma natureza que o isolamento do país em relação a outros Estados e organizações sociais:
“No Timor-Leste também já senti a solidão durante tantos anos. Porque muitos países e até a ONU também reconhecem que a invasão da Indonésia em Timor-Leste foi ilegal. Porém, desde 1975 até 1998, as forças indonésias praticaram o ato violento contra o direito dos cidadãos timorenses, como também contra os Direitos Humanos. Tudo isso sem intervenção nenhuma pela ONU e outros países. Portanto, nós podemos dizer que o mundo deixou o Timor-Leste ficar isolado, a gritar pela sua liberdade contra os indonésios. Então, até hoje em dia, muitas pessoas ainda não conhecem o Timor-Leste… devido a o Timor-Leste ter ficado escondido dos olhos do mundo durante tantos anos. E sinto solidão como um estrangeiro fora do meu país. Portanto, a palavra solidão segundo a minha definição, ou seja, no momento que eu sinto ou conheci teoricamente a palavra solidão, foi quando deixei o meu amado país Timor-Leste, deixei os meus amigos e a minha família. Sinto muito a falta deles fisicamente. Com tudo isso, posso dizer que a solidão surgiu quando nós fomos obrigados a deixar as pessoas que nós amamos por causa de um futuro do nosso amado país. A solidão pode ser considerada também como um desafio, pois apesar de muitas pessoas já terem sido vítimas dela, a solidão nos ajuda a crescer, nos ajuda a manter firme e lutar contra todas as dificuldades” [Afakay].
A fala de Afakay combina com a percepção de Emanuel, sob determinados aspectos:
“Solidão é quando você está num lugar fisicamente, mas sua alma ou seu pensamento não está nesse lugar. Para combater essa solidão, você precisa sair para a praia, para assistir a um filme e também sair com amigos. Essas atitudes vão ajudar a sair dessa situação. Para mim, a solidão não é necessariamente estar sozinho ou sozinha, mas a solidão reflete os acontecimentos que acabam mexendo com seu coração” [Emanuel].
O que mexe com o “coração” de Afakay, de Emanuel e de outros estudantes timorenses ouvidos é estar enredado em uma situação que os obriga involuntariamente a “estar num lugar fisicamente”, mas tendo “sua alma ou seu pensamento” em outro. A solidão, por outro lado, para Afakay, é percebida também como um desafio e algo que faz parte de um compromisso maior com seu próprio país. Na interpretação dele, a solidão da experiência migratória de estudar fora, portanto, promove o crescimento individual tanto quanto contribui para o próprio crescimento nacional.
A identificação entre indivíduo e país – ambos depositários da esperança de um futuro melhor – e o compromisso assumido na mobilidade acadêmica com a consequente solidão que gera aparecem de modo muito revelador no depoimento de Hermenegildo, estudante timorense em Portugal que está se formando em 2018, ao ser perguntado se sentia solidão: “Senti solidão principalmente no início, assim que cheguei. Depois fui fazendo amizade, pedia informação sobre um livro com um colega, tirava uma dúvida. Senti saudades da família e dos amigos. Não conhecia ninguém”. Pergunto se ele fala muito com a família, responde:
“Eu falo pelas mídias sociais com a família, que no Timor-Leste tem pacotes só para mídias sociais, mais baratos. Falo uma ou duas vezes na semana, como toda a gente. Eu sempre lembro do que meu irmão me disse: ‘tem que falar sempre com a família’, para lembrar o que eu estou fazendo aqui” [Hermenegildo].
Em geral, a solidão estudantil é sentida mais no primeiro ano, porque ainda não se conhece muita gente e há maior dificuldade com a comunicação em português, conforme me explicou uma aluna em Portugal. O mesmo problema foi detectado por Silva e Morais (2012: 168) entre estudantes africanos no Brasil, particularmente nos dois primeiros semestres, sendo a língua portuguesa considerada uma causa das dificuldades de “inserção de muitos estudantes, assim que se deparam com o contexto universitário, pois é um dos principais indicadores da sua posição como estrangeiros no Brasil”, gerando inclusive sentimentos de vergonha perante colegas e professores. O mesmo processo foi relatado pelos estudantes timorenses da presente pesquisa.
De certo modo, as dificuldades iniciais percebidas pelos estudantes pousam naquilo que Frangella (2014) aponta sobre a forma como os lugares e os sentimentos de pertença dos migrantes vão se construindo em uma combinação de “movimentações, interesses e práticas entre ponto de origem, trajeto local e local de destino” (2014: 75). Nesse sentido, o cotidiano das aulas, a circulação pelo local em que se encontram, o estabelecimento e/ou acionamento de redes de interação com estudantes de pertencimentos distintos ou timorenses, o domínio do sistema acadêmico, dia após dia, desde o momento de chegada ao local de destino até o final do curso, amenizam a solidão, permitem que haja um nível de identificação com o novo lugar e criam um relativo sentimento de pertença a essa vida de estudante.
Ao se chegar próximo ao final do curso, contudo, ocorre outro momento em que o sentimento de solidão se agudiza novamente: “quando a saudade de casa aperta” (e não se conseguiu visitar o Timor-Leste durante a formação acadêmica), conforme me disse uma estudante no Brasil. Como já dito, raramente os alunos timorenses nesse país viajam ao Timor-Leste ao longo do curso. Essa é a fase em que o sentimento de compromisso com seu país de origem fica mais forte, assim como a insegurança quanto a seu próprio futuro como profissional, seu papel na construção do Estado timorense, a adaptação à velha (nova) vida, depois de tudo por que se passou.
O contato regular com a família torna-se significativo para eles para trazer conforto emocional, para se ter notícias da vida familiar e do próprio Timor-Leste. Mas não somente. Conforme o conselho dado pelo irmão de Hermenegildo, envolve ainda uma dimensão de responsabilidade para com o Estado timorense, com a família e com uma relativa preservação de um estilo de vida anterior à experiência de estudar fora do país. Entre lá (onde estiveram) e cá (onde estão), suas noções de casa, o sentimento de pertença a dois ou mais lugares e sua percepção de si vão sendo tecidos. Como me explicou Hermenegildo, “temos contato com muitas coisas novas, mas não podemos nos esquecer de onde viemos”. As mídias sociais desempenham papel significativo, nesse sentido, para esses estudantes.
A amizade e as mídias sociais como antídoto da solidão e da saudade
A relação entre mídia e combate à solidão por meio da formação de uma rede de sociabilidade não é uma novidade. Como analisado por diversos autores (Nogueira 2005; Prata 2004; Sevcenko 1998; Mendelsohn 1979 [1964]; Avery e Ellis 1979 [1978]), em momentos históricos anteriores à difusão da Internet, essa sempre se configurou como uma das funções, por exemplo, da rádio. De acordo com Dolto (1998: 48), o sentimento faz parte da existência humana e a rádio seria encarada pelos ouvintes como uma forma de driblar ou suportar a solidão. Além disso, a rádio serviria como suporte para a pessoa organizar sua vida no mundo social quanto aos eventos do dia, fora de casa, nos quais a participação seria compartilhada com outras pessoas (Mendelsohn 1979 [1964]: 91-95). Assim, a rádio operaria como um meio de conexão com a sociedade, na medida em que ligaria, por intermédio de relações afetivas, instrumentais ou integrativas, pessoas de diversos tipos (Katz et al. 1979 [1974]: 219, 222). De acordo com Dominick (1979 [1974]), particularmente no que se refere aos jovens, a rádio seria também um importante canal de socialização, na medida em que constitui uma fonte de informação dotada de credibilidade.
Essa discussão, muito presente na década de 1970, torna-se atual e útil para pensarmos as relações entre as mídias sociais, a solidão e redes de sociabilidade. Os “alôs” e recados enviados “no ar” produziam efeitos de sociabilidade na vida social face a face (Nogueira 2005) com membros da família, amigos, conhecidos, vizinhos. Embora a figura do locutor de rádio ocupasse uma posição central de mediador, os usuários da Internet possuem muito mais autonomia e liberdade para relacionarem-se diretamente entre si por meio das mídias sociais do que tinham os ouvintes de rádio.
Entre os(as) alunos(as) do Timor-Leste, o WhatsApp, o Facebook e o Skype são os preferidos para contatos com familiares, amigos, colegas de turma e professores. Configuram-se também como importantes ferramentas para fazerem/manterem amizades e lidarem com os impactos emocionais gerados pela experiência migratória que a cooperação educacional internacional proporciona.
Desde o início do estudo, ficou evidente que as relações sociais que estabeleciam ou alimentavam a partir da Internet e das mídias sociais não os faziam diferir muito dos colegas universitários brasileiros e portugueses. Tal coincidência parece corresponder ao fenômeno discutido por Barreto (2014: 2), para quem “esta geração está sendo conhecida não apenas como geração Y, mas como os nativos digitais, geração net, geração Google ou millenials”, a partir de acessos a artefatos como smartphones, tablets, notebooks e outros dispositivos eletrônicos. Cabe observar que a maioria dos timorenses estudados se localiza na faixa etária dos 19 aos 24 anos, não destoando muito da maioria dos brasileiros e portugueses que frequentam as mesmas universidades.
A coincidência pode ser explicada pela compreensão de que uma das faces da modernidade é a conexão entre as pessoas por meios tecnológicos, formando o que Castells (1999 [1997]) nomeou de “sociedade em rede”. Seu pressuposto se coaduna com a ideia apresentada por Thompson (1998), para quem a relação com e a partir dos meios de comunicação é uma marca das interações sociais modernas, e com o entendimento de Martín-Barbero (2010), para quem essas tecnologias servem como espaços de relações sociais cotidianas.
Para Recuero (2014 [2012]) e Barreto (2014), nessa geração, há uma “primazia das atividades em plataformas que permitem uma maior sociabilidade, o que confirma a utilização dos dispositivos conectados […] como espaços conversacionais” (Barreto 2014: 6). Em pesquisa realizada junto a 89 alunos do ensino médio de uma escola em Mossoró (Rio Grande do Norte, região Nordeste do Brasil), Barreto (2014) constata uma predominância do WhatsApp, do Instagram e do Facebook como redes sociais e aplicativos preferidos para troca de mensagens, fotografias e bate-papo.
Nesse mesmo sentido segue a interpretação de Miller e Sinanan (2017), que ressaltam ainda que críticas vêm sendo direcionadas a essas plataformas relacionadas aos jovens, como responsáveis pela exacerbação de aspectos “superficiais e narcisísticos” deles, ainda que todas as evidências apontem que o uso dessas plataformas corresponda a práticas “em essência social, não individualista” (2017: 58).
Miller e Sinanan (2017) e Miller et al. (2016) destacam que as mídias sociais atualmente são não apenas um meio de comunicação, mas também um espaço em que se socializa. Os autores defendem que ocorre uma espécie de socialidade escalonável (scalable sociality) dos grupos, que percorre dimensões públicas e privadas desse espaço relacional. Conforme Miller et al. (2016: 2), com a Internet, a polarização entre público e privado começou a mudar.
Um outro ponto levantado por Miller e Sinanan (2017) e por Miller et al. (2016) diz respeito a uma separação ou distinção entre o que poderia ser chamado de mundo real e mundo virtual. Ambos são tratados como uma coisa só, ainda que as etnografias que serviram de base para os estudos apontem que seus interlocutores fizessem distinções sobre isso, e que as primeiras pesquisas sobre Internet também faziam tal distinção, mas para eles não há distinção: “o online é tão real quanto o off-line” (Miller et al. 2016: 7, tradução minha).
A complexidade implicada na percepção de que essas plataformas são mais do que um meio de comunicação leva os autores a entendê-las como uma “polimídia” que integra o cotidiano, a vida diária. Para eles, uma plataforma, como meio de comunicação, não pode ser compreendida em isolamento; antes, elas devem ser entendidas umas em relação às outras, já que as pessoas as usam para distintas formas de interação (Miller et al. 2016: x).
Além disso, ressaltam que, ao longo do tempo, a partir da Internet, as mídias e seus usos foram se diversificando (Miller et al., 2016: 2). Em qualquer lugar, as mídias sociais se tornaram um espaço para relações de intimidade – tais como laços de parentesco, entre amigos chegados, casais – experimentadas, mantidas e reforçadas (Miller et al. 2016: 105). Os autores citam também a importância das mídias sociais para combater a solidão e o isolamento (2016: 107).
Particularmente no que se refere à mobilidade estudantil e aos usos da Internet, em um estudo sobre alunos brasileiros em contato com pessoas de outros países e no ensino superior em Portugal, Iorio e Fonseca (2017) destacam que essas tecnologias funcionam como importantes fontes de informação e troca de conhecimentos, reforçando a sociabilidade dessa rede que vai se formando. O Facebook, de acordo com os autores, é a mídia social preferida para isso. Esse processo, que conecta futuros estudantes migrantes com os pioneiros, faz com que
“antes mesmo de se estabelecer redes transnacionais científicas, a ideia da mobilidade estudantil internacional pode começar a se materializar por meio do conhecimento de redes sociais (com familiares, amigos e/ou conhecidos), fomentada ainda mais pelo uso de mídias digitais, como a Internet” (Iorio e Fonseca 2017: 6).
Caminhos semelhantes percorrem os timorenses quando optam por estudar no exterior. Assim, o acionamento de redes online de relacionamentos ocorre antes, durante e mesmo depois da experiência migratória estudantil propriamente dita: antes, no contato com os antecessores da mobilidade, para coletarem informações sobre como é estudar fora e terem dicas sobre o lugar de destino; depois, para compartilhar as vivências, dificuldades e vantagens adquiridas no retorno; e, durante, como modo de estabelecimento de laços sociais, fonte de informações práticas cotidianas e de entretenimento, estratégia contra a solidão. Veja-se a fala de um dos alunos, ao responder sobre a situação em que recorre às mídias sociais:
“Depende, às vezes em situação em que me sinto solitário, saudades da família, dos amigos, e também uso para compartilhar coisas com os amigos, como estudar fora do país […] foi a primeira vez que enfrentei a vida fora do país. Sinto saudades… Sempre converso com a minha mãe, irmã e amigos, todos através da Internet. Prefiro por Facebook, Skype e WhatsApp, porque é mais fácil e mais utilizado em Timor-Leste” [Pedro, estudante em Portugal].
Sob a ótica do campo das emoções, as mídias sociais são o meio por excelência para os estudantes do Timor-Leste acessarem àquilo que os ajuda a combater a solidão: a amizade (habelum, em tétum):
“Solidão é normalmente quando uma pessoa se sente sozinha e sem ninguém. Por exemplo, quando cheguei no Brasil em 2012, para começar meu estudo aqui, eu sentia solidão, porque vim para cá com meus amigos e deixei toda a minha família lá no meu país. Me sentia muito sozinho aqui. Aqui somos [os estudantes do Timor-Leste que chegam juntos para estudar] apenas conhecidos. Comecei a criar amizade com os que chegaram junto comigo e também com alguns brasileiros, para conversar, ajudar e cuidar uns aos outros, ou seja, a gente se completar para esquecer as famílias e continuar o estudo. Então, para mim, a amizade significa segunda família, porque com amizades que criei não me sinto mais sozinho, me sinto como se estivesse com a minha família, durante esses anos aqui estudando. Por isso a amizade aparece para tirar a gente da solidão” [Antonio, estudante no Brasil].
Outra definição de amizade é dada por Maria do Carmo, para quem “é uma forma de afeto que relaciona as pessoas”. Estas, para ela, em situação de amizade, buscam proteger umas às outras. Além disso, “não tem cor, é tudo o que existe na vida”, constituindo-se com “um apego entre mulheres, homens, irmãos, namorados, maridos, esposas, parentes e pessoas que passam na vida da gente… até os animais”. É um relacionamento espontâneo, que pode surgir “no trabalho, na faculdade, no colégio, a partir de amigos em comum, e às vezes surge por acaso”. A amizade, acrescenta, “significa ajudar aos outros através de informações, ideias, compartilhar os momentos da vida e os sentimentos de algo”.
Particularmente no que se refere à experiência migratória para estudar, assim como para todos os ouvidos na pesquisa, a fase inicial foi a mais difícil para Maria do Carmo. Esse foi o período em que todos, de algum modo, no Brasil (Paraíba) e em Portugal (Lisboa), relataram que o sentimento de solidão era maior, na proporção direta de ainda não terem amigos e estarem longe da família, ou seja, ainda não terem o “apego” do universo cultural novo e já não terem mais o da família, que ficou para trás.
“Eu me sinto tão feliz por esta vida, sou uma pessoa fácil de cativar, de conhecer, de compartilhar, em qualquer momento. Mas no início lamentei, com as atitudes que eu percebi, fiquei um pouco excluída dentro das situações, digamos, numa sociedade de diversas culturas, as convivências, os diferentes olhares e etc. Enfim, tudo passou e virou, e se tornou amizade. Na verdade, a amizade aparece sem perceber, nasce sem dar explicação. Através da amizade, se torna família, namorado(a), se considera como irmãos, verdadeiros amigos, etc. Portanto, quanto às pessoas que eu conhecia, alguns foram amigos, poucos eram amigos de verdade… o essencial eram o amor e a verdadeira amizade da minha família” [Maria do Carmo].
A ideia de família envolvida nessas percepções é a de que cada indivíduo é parte de um todo, portanto, se no Timor-Leste a completude é alcançada dentro da família (e suas relações com os membros vivos e os antepassados), longe, ela é formada pelas interações com os amigos, “segunda família”. E as famílias/amizades tiram da solidão. No entanto, amigos não são exatamente família, conforme diz Maria do Carmo, que possui uma visão mais situacional da amizade feita na mobilidade estudantil e que hierarquiza os amigos em relação à família – esta ocupa o primeiro lugar para os sentimentos de amor, proteção e referência.
Depreende-se, pois, que, se de um lado o que se considera amizade e com quem/que se tem amizade varia, por outro, o meio em que os laços são criados também:
“Existem muitas e várias definições de amizade, conforme cada um. Segundo minha definição, a amizade não surge apenas por meio de pessoas, mas por tecnologias também. Como um estrangeiro fazendo o meu estudo aqui no Brasil, senti a solidão, ficando longe da família. Uma coisa que eu devo fazer para solucionar essa situação é a amizade. Portanto, a amizade feita diretamente entre as pessoas numa sociedade, a convivência uns com os outros, também pode ser feita indiretamente por meio dos meios eletrônicos. Exemplo: O Facebook, o WhatsApp e o Skype me ajudam muito a manter a amizade com os meus amigos e a família à longa distância” [Afakay].
Quando Emanuel se sente só, no “sentido triste”, ele procura se “divertir”. Para ele, “uma das formas comuns hoje em dia” é o recurso às redes sociais:
“Você poder entrar nas mídias sociais, como Facebook, WhatsApp, conversando com os amigos, a família… e também o Youtube, para assistir vídeos ou vídeos engraçados. A presença tecnológica hoje em dia ajuda bastante às pessoas para saírem da solidão, embora tenha outro lado negativo, que é… vicia… Mas assume papel muito importante para as pessoas que moram sozinhas, para não ficarem tristes ou se sentirem sozinhas” [Emanuel].
O aspecto negativo do uso das mídias sociais é o vício nelas, segundo o estudante. Em vários depoimentos, os alunos comentaram que alguns deles viravam noite nas mídias sociais – ato que nenhum deles disse realizar, embora admitissem achar prejudicial aos estudos. Ressalta-se que a diferença de fuso horário entre Timor-Leste e Brasil é de cerca de 12 horas e entre Timor-Leste e Portugal, de aproximadamente 8 horas.
Um deles diz que não se sente solitário, que sempre fala com os amigos da faculdade e timorenses: “com os que estão no Timor-Leste falo via Internet. E sempre falo com os amigos timorenses que estão na Paraíba e no Ceará [região Nordeste do Brasil] – neste caso prefiro Facebook e WhatsApp”. Outro diz que “a presença das mídias sociais faz com que o mundo fique cada vez mais estreito”, possibilitando conversar com “os amigos da turma, brasileiros, com a família e os amigos que estão estudando em outros países, como Portugal, Indonésia…”
Citando Sherry Turkle (2011: 11), para quem “a tecnologia reconfigura as fronteiras entre intimidade e solidão”, Barreto (2014) lembra que as “razões apresentadas para interagir online apenas com amigos e conhecidos foram que, com eles, possuem mais liberdade, intimidade e confiança e estabelecem um contato mais frequente e intenso” (2014: 9-10), já que “exigem maior esforço para que a amizade seja mantida” (2014: 9).
Ter notícias da família, receber e dar informações sobre a “situação” [15] de vida em que se encontram também costumam se configurar como as razões de ser do contato pelas mídias sociais, em particular pelo Skype, pelo videocall do Facebook e pelo telefone do WhatsApp. Como me contou uma aluna em Portugal, expressando um sentimento compartilhado por grande parte dos demais:
“Prefiro falar pelo WhatsApp e pelo videocall do Facebook, porque é mais rápido de acessar e podemos ver uns aos outros e matar as saudades. Falo com meus pais quando eles e eu sentimos saudades. As mídias sociais ajudam muito, porque mesmo longe uns dos outros, posso acessar informações” [Susana].
Perguntado sobre em que situações utiliza as mídias sociais, Hermenegildo respondeu: “no momento em que preciso me comunicar com alguém, no momento em que preciso expressar meu sentimento ou opinião. Me sinto solitário quando penso na minha família, que estava sempre perto de mim quando precisava”.
Outra estratégia utilizada pelos estudantes no uso das mídias sociais e da Internet para combater o sentimento de solidão é o recurso a entretenimentos. Em geral, os rapazes buscam alternativas ao contato familiar e com os amigos, conforme depoimentos de dois alunos:
“Não prefiro falar com alguém principalmente, mas prefiro ler algumas postagens que contêm informações importantes, imagens interessantes e vídeos que podem animar e ajudar na inspiração” [Francisco].
“Quando me sinto sozinho, uso mais Internet, para assistir filme e jogar game” [Pedro].
A experiência de deixar a vida em família, ao viver “longe de casa”, para ter acesso à capacitação profissional – ação que no Timor-Leste está atrelada a uma necessidade de construção de um Estado por um entendimento político-governamental estratégico – torna-se um desafio ainda maior porque é acrescida de uma pressão estatal, que adiciona peso na bagagem que os estudantes timorenses carregam na viagem para estudo:
“Estudar em outro país é uma nova jornada da vida, que necessita de muita paciência e coragem. Às vezes me sinto sozinha porque tenho que fazer as atividades dadas pelos professores, e num certo momento tenho que fazer sozinha sem a ajuda dos outros amigos. Nós temos uma grande responsabilidade para com o Timor-Leste” [Ana].
Pode-se perceber, nos relatos e na observação direta dos estudantes timorenses, que o recurso à ação de compartilhar algo com alguém é que possibilita o combate ao sentimento de solidão que a própria experiência migratória contém. E, nesse sentido, as mídias sociais tornam-se os canais por excelência para se compartilhar algo com alguém.
Para Pais, uma vez que “o sentimento da solidão é tecido por desfiliações sociais, a fuga da solidão passa necessariamente pela superação dos desencontros que produzem, pelo avivamento de laços de solidariedade, pela intensificação de sentimentos de pertença social” (2013: 15). Para os estudantes do Timor-Leste, as mídias sociais promovem os encontros, nos termos de Pais, reforçando o sentimento de pertencimento a um grupo e gerando laços de solidariedade (por meio das dúvidas de conteúdo que são esclarecidas com professores e colegas de turma, de dicas sobre como resolver problemas do cotidiano, de desabafos emocionais com familiares e amigos, etc.).
Por outro lado, para além de permitirem a transmissão e recepção de informações, expressões de saudades, outros sentimentos e opiniões, a própria prática do uso das mídias sociais é compartilhada, gerando a sensação de pertença social. Isto é, a experiência em si de se recorrer ao WhatsApp, Facebook e Skype para solucionar questões do cotidiano, um recurso contemporâneo utilizado por várias pessoas em diversas partes do mundo, cumpre ainda a função de construir nos planos cognitivo e simbólico uma rede social em que os que nela estão conectados percebem-se como incluídos.
Considerações finais
Este artigo buscou analisar a importância do uso das mídias sociais pelos estudantes do Timor-Leste no Brasil e em Portugal como meios de criação ou manutenção de laços sociais, com familiares e amigos. A formação de redes de amizade e o contato regular com a família são estratégias de combate ao sentimento de solidão vivenciado na mobilidade estudantil internacional.
Partindo da percepção dos estudantes e de uma pesquisa etnográfica do cotidiano dos alunos em situação de cooperação acadêmica, nota-se que sentir-se sozinho e estar só podem se configurar tanto como algo positivo (uma escolha), quanto negativo (por força das circunstâncias). Nesse sentido, migrar é entendido pelo grupo pesquisado como um ato simultaneamente voluntário – porque foi uma escolha estudar no exterior em busca de uma vida melhor e o estudante possui uma responsabilidade para com seu país – e involuntário – devido a tal opção, precisa ficar distante da sua casa, dos seus parentes e amigos, da sua vida anterior, gerando muitas vezes um “desencaixe” que é espacial e existencial.
Frequentemente, o sentimento de solidão está atrelado ao de saudades – da família, dos amigos, do dia a dia que se tinha no Timor-Leste. Entretanto, o objeto dessa saudade pode ultrapassar as fronteiras temporais do presente, remetendo a um tempo da memória coletiva da distância da família e dos amigos no período da ocupação indonésia, em que se precisou “fugir para as montanhas”, ao lado ou no seio da resistência política. Neste caso, trata-se quase de uma solidão profunda, arraigada física, emocional e simbolicamente nessa geração.
A solidão, que possui múltiplos significados para os estudantes, pode então ser associada a um sentimento simultaneamente individual e de origem nacional, constituindo-se a partir de uma identificação de sua própria trajetória particular – se afastando de seu país – combinada à história do Timor-Leste – que teria se afastado forçosamente de sua identidade cultural durante o período de governação indonésia.
Como dito por um aluno, mesmo estudando no exterior, não se pode esquecer o Timor-Leste. Ou, como disse outro estudante, não se pode esquecer quem se é frente às novidades da experiência migratória. O contato regular com a família e os amigos timorenses, dentro ou fora do Timor-Leste, torna-se um meio de reforço, em nível cotidiano, de um sentimento de pertença comum, de fazer parte e estar inserido nos processos de nation-building e de state-building timorenses. Mas não somente: a experiência migratória particular (desde o local de partida ao de chegada), adicionada ao compromisso para com o seu país de origem, marca profundamente o modo como os estudantes se constroem como seres no mundo, seus sentimentos de pertença e de lugar.
As mídias sociais, que ultrapassam as fronteiras de tempo e espaço, proporcionam a possibilidade de levar uma parte do Timor-Leste para Brasil e Portugal, assim como um pedaço do Brasil e de Portugal para o Timor-Leste. O movimento de aproximação entre vivências culturais distintas, mediado pela Internet e pelos olhares dos estudantes na conexão com seus familiares e amigos, permite amenizar o sentimento de solidão e isolamento estudantil. Permite também, em um nível macro, a partir de protocolos de cooperação acadêmica, prevenir do isolamento o Timor-Leste, colocando-o em relação com o mundo e ao mundo com ele.
Entendido desse modo, se no nível individual a amizade marca as conexões entre os estudantes, no internacional ressalta as alianças necessárias para a construção do país. Entre uma e outra coisa, profissionais vão sendo capacitados, amigos vão sendo formados. Para além dos estudantes se constituírem como nativos digitais, geração net, geração Google ou millenials – marcando suas visões de mundo e os modos como lidam com os fatos da vida –, WhatsApp, Facebook, Skype e Instagram são os espaços por excelência de socialização em que tudo isso acontece.
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Receção da versão original / Original version 2017 / 12 / 04 Receção da versão revista / Revised version 2018 / 07 /02 Aceitação / Accepted 2018/ 11 /16 Pré-publicação online / Pre-published online 2019/ 12 /31
Notas
[1] Uma comunicação inicial dos resultados da pesquisa foi apresentada no VI Congresso da Associação Portuguesa de Antropologia, em junho de 2016, na Universidade de Coimbra.
[2] A pesquisa em Portugal vem sendo desenvolvida dentro de um projeto de pós-doutoramento realizado no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, entre 2017 e 2018, como investigadora visitante.
[3] Agradeço a Suzeti Rosaria Guterres Fonseca, Adolfino Varela e Zaqueu Maria Marques, estudantes timorenses no Brasil e assistentes neste estudo, pela coleta de alguns depoimentos e pela leitura deste manuscrito. Agradeço ainda a todos os alunos timorenses ouvidos no Brasil e em Portugal pela disponibilidade e a Susana Viegas pelos comentários a este texto e frutífero diálogo sobre o assunto. Finalmente, agradeço aos pareceristas que teceram comentários preciosos para o aprimoramento deste artigo.
[4] Números fornecidos em agosto de 2017 pelo Gabinete da Educação da Embaixada do Timor-Leste em Portugal, a quem agradeço a colaboração.
[5] Números apresentados em “PEC-G – Candidatos selecionados – Ásia – 2000-2019”, no site da Divisão de Assuntos Educacionais do Ministério das Relações Exteriores (DCE/MRE), (http://www.dce.mre.gov.br/PEC/G/historico/introducao.php, última consulta em dezembro de 2019).
[6] Dados sobre convênios apresentados no site da Unilab, (http://www.unilab.edu.br/, última consulta em março de 2018).
[7] Dados apresentados no site da UEPB, em “Representante da Embaixada do Timor-Leste destaca importância de convênio celebrado com a UEPB” http://www.uepb.edu.br/representante-da-embaixada-do-timor-leste-destaca-importancia-de-convenio-celebrado-com-a-uepb/, última consulta em dezembro de 2019) e em “Universidade Estadual da Paraíba recebe novos estudantes do Timor-Leste para estudar na instituição em 2015” http://www.uepb.edu.br/universidade-estadual-da-paraiba-recebe-novos-estudantes-do-timor-leste-para-estudar-na-instituicao-em-2015/, última consulta em dezembro de 2019).
[8] Como de praxe, os nomes verdadeiros dos estudantes ouvidos são omitidos para garantir o anonimato.
[9] Em seu estudo sobre mulheres solteiras manggarai, Allerton (2007: 22) chama a atenção que nem sempre quem é definido como sozinho (alone) é solitário (lonely), e que “solidão” é um conceito difícil de ser trabalhado em uma perspectiva cross-cultural por se tratar de um conceito que é produto de certas circunstâncias culturais, históricas e tecnológicas – neste caso, lembrando os estudos sobre Internet e novas tecnologias.
[10] Esse fato me foi relatado por dois alunos distintos. Não importa, contudo, conferir a veracidade do dito. Antes, ressaltar algo que foi tornado relevante na fala dos estudantes que trouxeram o caso à tona ao se conversar sobre solidão.
[11] “Casa” aqui é entendida como um lugar do conhecido e do acolhimento, relacionado a tradições culturais, vínculos familiares e de amizade, referenciais morais e visões de mundo compartilhadas. De acordo com Marandola Jr. e Dal Gallo (2010), a perda da casa é a mais sentida pelo migrante, pois nela estão fundadas as memórias e sua própria identidade.
[12] Esta frase me pareceu ambígua: pode ser entendida como relacionada à ideia de que o indivíduo vive sozinho no universo, ou de que é como se o universo social vivesse dentro do indivíduo. Pareceu-me que ambas as interpretações fazem sentido, em um contexto em que o sentimento é ao mesmo tempo subjetivo e social.
[13] Três estudantes ouvidos disseram preferir que em vez de investir em bolsas para os timorenses estudarem fora, o governo deveria investir mais em desenvolver o campo da Educação, inclusive o ensino superior, no Timor-Leste.
[14] Cabe dizer que vários estudantes no Brasil e em Portugal, ainda que muito jovens, relatam terem fugido com a família para as montanhas, para o mato, para lutarem ao lado da resistência contra a ocupação indonésia, ou mesmo para se protegerem das violentas milícias indonésias.
[15] O termo situação foi utilizado por vários estudantes timorenses, e abrange desde saber como estão de saúde até como está o Timor-Leste politicamente e a inserção da família no quadro político. Quando utilizado sobre si mesmo(a), denota sua inserção acadêmica, no Brasil e saúde/integridade física e emocional.