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Revista de Enfermagem Referência
versão impressa ISSN 0874-0283
Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.3 Coimbra dez. 2014
https://doi.org/10.12707/RIII13177
ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO
Panorama clínico, terapêutico e sexual de mulheres portadoras de Papiloma Vírus Humano e/ou Neoplasia Intraepitelial Cervical
Clinical, therapeutic, and sexual overview of women with Human Papilloma Virus and/or Cervical Intraepithelial Neoplasia
Panorama clínico, terapéutico y sexual de mujeres con Virus del Papiloma Humano y/o Neoplasia Intraepitelial del Cuello Uterino
Escolástica Rejane Ferreira Moura*; Stephanie da Silva Veras**; Andrezza Alves Dias***; Lidiane Nogueira Rebouças Aguiar****; Paula Sacha Frota Nogueira*****; Carolina Barbosa Jovino de Souza Costa******
* EN. Professora Doutora do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal do Ceará, Brasil, 60430-160, Fortaleza-Ceará, Brasil [escolpaz@yahoo.com.br]. Morada para correspondência: Av. Filomeno Gomes, no. 80. Apto. 503. Jacarecanga. Fortaleza-Ceará, Brasil.
** EN. Universidade Federal do Ceará, Brasil, 60430-160, Fortaleza - Ceará - Brasil [stephanieveras@hotmail.it].
*** EN. Mestranda do Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Ceará, Brasil, 60430-160, Fortaleza-Ceará, Brasil [Andrezza_ufc@yahoo.com.br],
**** EN. Mestranda do Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Ceará, Brasil, 60430-160, Fortaleza-Ceará-Brasil. [lidianereboucas@hotmail.com].
***** EN. Professora Mestre do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal do Ceará, Brasil, 60430-160, Fortaleza - Ceará - Brasil. [sachanogueira@hotmail.com].
****** EN. MSc, Instituto Dr. José Frota, 60025-061, Fortaleza Ceará, Brasil. [carolinanafe@yahoo.com.br].
RESUMO
Enquadramento: A infeção pelo Papiloma Vírus Humano (HPV) e/ou Neoplasia Intraepitelial Cervical (NIC) caracteriza-se como uma doença crónico-degenerativa de elevada morbidade e letalidade.
Objetivos: Identificar o estádio clínico da infeção pelo HPV e/ou NIC ao diagnóstico; verificar medidas terapêuticas e preventivas realizadas, extensivas ao(s) parceiro(s); e relacionar mudanças no comportamento sexual das mulheres após o diagnóstico.
Metodologia: Pesquisa descritiva transversal, em que se realizou entrevistas com 100 mulheres com HPV e/ou NIC, atendidas no Instituto de Prevenção do Cancro de Fortaleza, Ceará, Brasil, de fevereiro a maio de 2013.
Resultados: Ao diagnóstico, 59,0% das mulheres estavam no estádio clínico do HPV, sendo que 58,0% foram tratadas com ácido tricloroacético, 25,0% com conização e 12,0% com eletrocauterização. Após o diagnóstico, 20 (55,5%) mulheres referiram diminuição da libido e 15 (41,7%) afirmaram ausência; 27 (60,0%) diminuíram a frequência sexual e 17 (37,8%) optaram pela abstinência sexual; 15 (46,9%) afirmaram anorgasmia e 14 (43,7%) disfunção orgásmica.
Conclusão: A assistência dessas mulheres precisa abranger a escuta e o aconselhamento voltado à sexualidade.
Palavras-chave: infeções por papillomavirus; neoplasia intraepitelial cervical; saúde da mulher; comportamento sexual.
ABSTRACT
Theoretical Framework: The infection by Human Papilloma Virus (HPV ) and/or Cervical Intraepithelial Neoplasia (CIN) consists of a chronic degenerative disease of high morbidity and mortality.
Objectives: To identify the clinical stage of the HPV and/or NIC infections at diagnosis; verify the therapeutic and preventive measures conducted, including on the partner(s); and correlate changes in womens sexual behaviour after diagnosis.
Methodology: A cross-sectional descriptive research using interviews with 100 women with HPV and/or NIC, treated at the Cancer Prevention Institute of Fortaleza, Ceará, Brazil, between February and May, 2013.
Results: At diagnosis, 59.0% of women were in the clinical stage of HPV, of which 58.0% were treated with trichloroacetic acid, 25.0% underwent conisation and 12.0% electrocautery. After diagnosis, 20 (55.5%) women reported decreased libido; 15 (41.7%) mentioned lack of libido; 27 (60.0%) decreased frequency of sexual intercourse; 17 (37.8%) opted for sexual abstinence; 15 (46.9%) reported anorgasmia, and 14 (43.7%) experienced orgasmic dysfunction.
Conclusion: The care provided to these women should encompass listening and counselling specifically addressed to sexuality.
Keywords: papillomavirus infections; cervical intraepithelial neoplasia; womens health; sexual behavior.
RESUMEN
Marco contextual: La infección por el Virus del Papiloma Humano (HPV, por sus siglas en inglés) y/o Neoplasia Intraepitelial Cervical (NIC) se considera una enfermedad crónico-degenerativa de elevada morbilidad y letalidad.
Objetivos: Identificar el estadio clínico de la infección por el HPV y/o NIC en el momento del diagnóstico; comprobar las medidas terapéuticas y preventivas realizadas, y que abarcan a la(s) pareja(s), y relacionar los cambios en el comportamiento sexual de las mujeres después del diagnóstico.
Metodología: Investigación descriptiva transversal, en la que se realizaron entrevistas con 100 mujeres con HPV y/o NIC atendidas en el Instituto de Prevención del Cáncer de Fortaleza (Ceará, Brasil) de febrero a mayo de 2013.
Resultados: En el momento del diagnóstico, el 59,0% de las mujeres se encontraba en el estadio clínico del HPV. De estas, el 58,0% fue tratado con ácido tricloroacético, el 25,0% con conización y el 12,0% con electrocauterización. Después del diagnóstico, 20 (55,5%) mujeres señalaron una disminución de la libido y 15 (41,7%) afirmaron una ausencia; 27 (60,0%) disminuyeron su frecuencia sexual y 17 (37,8%) optaron por la abstinencia sexual; 15 (46,9%) indicaron anorgasmia y 14 (43,7%) disfunción orgásmica.
Conclusión: La asistencia de esas mujeres debe incluir la escucha y el consejo enfocados hacia la sexualidad.
Palabras clave: infecciones por papillomavirus; neoplasia intraepitelial del cuello uterino; salud de la mujer; conducta sexual.
Introdução
O Papiloma Vírus Humano (HPV) infeta pele e mucosas, apresentando mais de 100 subtipos, 20 dos quais podem infetar o trato genital. Estes estão divididos em dois grupos, conforme o seu potencial de oncogenicidade. Os tipos de alto risco oncogénico quando associados a outros cofatores têm relação com o desenvolvimento das neoplasias intraepiteliais e do cancro invasor do colo do útero, da vulva, da vagina, da região anal e do pénis. Os de baixo risco oncogénico estão associados às infeções benignas do trato genital como o condiloma acuminado ou plano e lesões intraepiteliais de baixo grau (Teles, Alves, & Ferrari, 2013).
A prevalência dos diversos tipos de HPV na população é bem heterogénea, oscilando de 1,4% a 25,6% (Rama et al., 2008). É provável que essa variedade de prevalências esteja relacionada com as subnotificações e a estudos realizados em áreas específicas de maior vulnerabilidade.
Sendo a infeção pelo HPV e/ou Neoplasia Intraepitelial Cervical (NIC) de transmissão basicamente sexual, com sinais e sintomas que afetam principalmente a área genital, é esperado que o seu diagnóstico altere o comportamento sexual das mulheres. Além disso, quando uma pessoa recebe o diagnóstico de HPV e/ou NIC, pode apresentar alterações emocionais associadas à relação com o parceiro, levando à perda do interesse sexual, constrangimentos, mudanças nos hábitos sexuais e sentimentos de culpa ou desconfiança (Araújo, 2011).
Diante do exposto, estudos que apresentem um panorama da conduta clínica e suas implicações para o quotidiano da mulher diagnosticada com HPV e/ou NIC, tendem a orientar os profissionais de saúde na supervisão e prevenção de tais comportamentos, de modo a proporcionar uma atenção humanizada e integral.
Portanto, decidiu-se pela realização do presente estudo com os objetivos de identificar o estádio clínico da infeção pelo HPV e/ou NIC ao diagnóstico; verificar as medidas terapêuticas e preventivas realizadas, extensivas ao(s) parceiro(s); e relacionar possíveis mudanças no comportamento sexual de mulheres após o diagnóstico.
Fundamentação Teórica
A infeção pelo HPV caracteriza-se como uma doença crónica-degenerativa de elevada morbidade e letalidade. Possui evolução lenta, iniciando-se com pequenas alterações celulares, que levam, em média, 14 anos para atingir a sua forma mais grave, com metástases. As lesões precursoras podem ser detetadas precocemente através do exame de Papanicolau, sendo possível, dessa forma, reduzir a sua incidência e mortalidade (Teles et al., 2013).
A infeção apresenta-se na maioria das vezes na forma assintomática (infeção latente) ou como lesões subclínicas (inaparentes). As lesões clínicas, quando presentes, podem ser planas ou exofíticas (condilomas). Na forma subclínica, que corresponde a 80% dos casos, são visíveis apenas por meio de magnificação e após aplicação de reagentes como o ácido acético. Quando assintomático, pode ser detetável por meio de técnicas moleculares, que consistem na identificação do DNA viral por meio de testes de hibridização molecular (Gagizi, 2010).
A pesquisa de caso-controle realizada com 248 mulheres com HPV no colo uterino atendidas na rede pública de saúde de Recife-PE, identificou a infeção em estádio subclínico em 100% dos casos, em 76,6% das participantes do estudo, o genótipo viral da infeção cervical foi identificado, predominando genótipos de alto risco oncogénico (83,4% nos casos e 67,1% nos controles), principalmente HPV 16 e 31 (Mendonça et al., 2010). Ou seja, são percentagens elevadas de deteção em estádio subclínico, o que corrobora a estratégia de diagnóstico mais difundida, a da magnificação após aplicação de ácido acético.
Portanto, entre as medidas de prevenção primária da infeção pelo HPV e consequentemente do Cancro de Colo Uterino (CCU), estão as medidas de promoção do comportamento sexual saudável, incluindo o sexo seguro, que consiste no uso correto de preservativo masculino ou feminino em todas as relações sexuais, redução do número de parceiros e prática de monogamia pelo casal (Melo, Prates, Carvalho, Marcon, & Pelloso, 2009). Ressalta-se que a prática do sexo seguro também compreende o relacionamento sexual sem uso de preservativo, desde que o casal conviva em monogamia mútua e sem que um dos cônjuges tenha contraído a infeção antes do início do relacionamento atual.
Nesse sentido, um estudo realizado com 39 mulheres com HPV, no Município de Fortaleza-CE, encontrou que 13 (33,0%) não usavam preservativo nas relações sexuais e 10 (26,0%) utilizavam casualmente. Em relação ao número de parceiros sexuais, 20 (51,3%) tiveram de dois a quatro parceiros no último ano. No que concerne às práticas sexuais realizadas antes do diagnóstico da infeção pelo HPV, 21 (53,9%) referiram prática de sexo vaginal, 13 (33,3%) vaginal e anal, e 5 (12,8%) vaginal e oral (Machado, Araújo, Mendonça, & Silva, 2010).
A prevenção secundária do HPV e, portanto, do CCU é efetuada através do exame preventivo de Papanicolau para a deteção precoce do vírus e das possíveis alterações iniciadas no órgão genital feminino.
Um estudo descritivo exploratório realizado com 114 mulheres da Estratégia Saúde da Família (ESF) de Iporá, Goiás, Brasil, revelou que a maior adesão está na faixa etária de 46 a 50 anos de idade (24%) e a menor nas de 18 a 20 anos e de 41 a 45 anos (10%). Entre as entrevistadas, 70% realiza o exame a cada dois anos ou menos e 12% nunca o realizou (Oliveira et al., 2012).
Face ao exposto, percebe-se a relevância de se pesquisar a respeito da infeção pelo HPV envolvendo as próprias mulheres portadoras do vírus, uma vez que são corresponsáveis pela prevenção e controle desta infeção.
Questões de Investigação
Face ao exposto, foram elaboradas as questões: Em que estádio clínico o HPV é diagnosticado no principal serviço de referência para a prevenção do cancro de colo uterino do Ceará? O acometimento pelo HPV e/ou NIC provoca mudanças no comportamento sexual dessas mulheres, que sejam conducentes à saúde?
Metodologia
Estudo descritivo, transversal, realizado no Instituto de Prevenção do Cancro (IPC) de Fortaleza, Ceará, Brasil. A população correspondeu às mulheres com diagnóstico de HPV e/ou NIC atendidas neste local, que por um processo de amostragem aleatória consecutiva gerou um total de 100 participantes, a qual representa um nível de confiança de 95% e um erro amostral absoluto de 10% considerando uma proporção de 50% das ocorrências de características clínicas e demográficas a serem analisadas.
Como critérios de inclusão foram adotados: mulheres com idade maior ou igual a 18 anos, por representar maioridade civil, e com diagnóstico de HPV e/ou NIC registado no processo. A respeito deste último critério, ressalta-se que foram considerados com diagnóstico de HPV, tanto os casos que continham o respetivo termo HPV descrito no processo, quanto áqueles que continham descrição de NIC, pois a infeção por subtipos oncogénicos do HPV é fator determinante ao surgimento dessas lesões precursoras, visto que estudos demonstram que a infeção pelo vírus precede o início das lesões intraepiteliais (Fonseca, Tomasich, & Jung, 2012).
A colheita de dados deu-se através da identificação dos processos das mulheres que se ajustassem aos critérios de inclusão, onde posteriormente, quando se encontravam na sala de espera para a consulta, eram convidadas a participar da pesquisa. As entrevistas ocorreram em sala privativa, previamente preparada de acordo com a gerência do serviço. Estas seguiram um formulário que foi elaborado e testado previamente com cinco mulheres, que não fizeram parte da amostra. O formulário continha perguntas acerca de dados demográficos e socioeconómicos, como idade, escolaridade, renda familiar e número de pessoas que compunham o agregado familiar; estádio clínico do HPV ao diagnóstico; medidas terapêuticas e preventivas voltadas ao HPV e/ou NIC, extensivas ao parceiro; e mudanças no comportamento sexual dessas mulheres após o diagnóstico. Um diário de campo foi utilizado para o registo de situações pertinentes ao tema, que não eram contempladas no formulário de entrevista.
Os dados foram digitados no Programa Excel for Windows e exportados para o Software Statistical Package for Social Sciences for Personal Computer (SPSS-PC), versão 11.0, onde foram organizados e apresentados em tabelas. Foi realizada análise estatística descritiva pelo cálculo de frequências absolutas e relativas, média e desvio padrão.
As mulheres foram informadas sobre os objetivos da pesquisa e a estas foi garantido o anonimato e o direito de retirar-se da pesquisa quando assim desejassem. A pesquisa obteve parecer favorável conforme protocolo no. 196.840.
Resultados
A idade das participantes variou entre 18 e 75 anos, com uma média de 32,8 (±13,1), predominando a faixa etária dos 25 aos 35 anos (43,0%), seguida pela faixa dos 20 aos 24 anos (21%). Quanto à escolaridade, o ensino médio (incompleto ou completo) foi o prevalente (57,0%). A maior parte das mulheres não trabalhava fora do lar (57,0%), e a renda per capita familiar mensal média foi de 2,6 (±0,7) salários mínimos brasileiros, destacando uma concentração maior no ganho de até ½ salário mínimo (52,0%). Ressalta-se que no momento da realização desta pesquisa, o valor do salário mínimo brasileiro era de R$ 678,00.
No que diz respeito ao estádio clínico da infeção pelo HPV ao diagnóstico, 59,0% correspondeu ao estádio clínico (condiloma), seguindo-se pelo estádio subclínico (37,0%) e assintomático (4,0%).
O grupo de mulheres pesquisado apresentou tempo de diagnóstico de HPV e/ou NIC que variou de menos um mês a 11 anos, com uma média de 2,5 (±4,3), resultado que pode demonstrar a permanência de mulheres diagnosticadas no sistema de saúde, pela necessidade de seguimento a longo prazo cujo controlo da infeção o exige.
Houve a predominância (58,0%) da aplicação do ácido tricloroacético (ATA), seguido por 25,0% que realizaram conização. No que diz respeito às medidas terapêuticas e preventivas realizadas, 46,0% recaiu sobre a colposcopia, 42,0% realizaram citologia e 36,0% tiveram os seus parceiros convocados e receberam orientações de Enfermagem (Tabela 1).
Após o diagnóstico do HPV e/ou NIC, 20 (55,5%) mulheres referiram diminuição da libido e 15 (41,7%) ausência; 27 (60,0%) relataram diminuição da frequência sexual e 17 (37,8%) optaram pela abstinência sexual; 15 (46,9%) afirmaram anorgasmia e 14 (43,7%) disfunção orgásmica; 16 (40,0%) aboliram o sexo oral e 12 (30,0%) o anal (Tabela 2).
Discussão
A elevada concentração de casos de HPV e/ou NIC na idade reprodutiva (43,0%) conduz à discussão quanto à relação entre HPV, gestação e saúde do recém- -nascido. Sabe-se que o HPV tem relação com a papilomatose laríngea e pulmonar no recém-nascido, em que esta última é de grave evolução e, apesar de rara, caracteriza-se como uma infeção incontrolável e fatal (Reis, Paula, & Cruz, 2010).
No que se refere à idade das participantes, resultado semelhante foi encontrado numa pesquisa realizada também no Município de Fortaleza-CE, com 39 mulheres que apresentaram lesões cervicais por HPV, na qual a faixa etária predominante foi entre 20 a 29 anos (56,4%) (Machado et al., 2010). Outro estudo realizado nas cidades de São Paulo-SP e Campinas-SP, com 2300 mulheres que procuraram rastreamento para o CCU, encontrou uma média de idade superior à encontrada em Fortaleza-CE, de 35,7 anos (Rama et al., 2008).
A escolaridade também foi pesquisada por outros autores com um público-alvo similar, encontrando-se escolaridade inferior à do presente grupo, no qual prevaleceu o ensino médio. Pesquisa realizada no Município do Rio de Janeiro-RJ com 120 mulheres com diagnóstico de Lesões Precursoras de Cancro do Colo do Útero (LPCCU) e resultados sugestivos de HPV identificaram uma prevalência do ensino fundamental entre as participantes (Carvalho & Queiroz, 2011).
A percentagem de participantes que não realizavam trabalho fora do lar (57,0%), pode ter influenciado a baixa renda per capita detetada. Um estudo realizado com 299 mulheres de Vitória-ES, com o objetivo de descrever as taxas de prevalência e o perfil clínico e comportamental para infeções genitais em mulheres atendidas numa unidade básica de saúde, identificou percentagem menor de donas de casa, isto é, de 35,7% (Barcelos, Vargas, Baroni, & Miranda, 2008).
Assim, os resultados referentes à escolaridade e à renda familiar do grupo pesquisado corroboram a literatura, que aponta o baixo nível socioeconómico e de escolaridade como fatores de risco para o desenvolvimento do CCU e, consequentemente, para a infeção pelo HPV e/ou NIC.
No que se refere ao estádio clínico da infeção foi elevada a percentagem de diagnóstico tardio, ou seja, na fase clínica do HPV (condiloma) (59,0%). Este resultado pode estar relacionado a aspetos culturais que venham determinar a procura das mulheres pelo serviço de saúde apenas quando os sinais e sintomas das doenças aparecem, bem como pelo medo e a vergonha em lidar com o próprio corpo.
Tratando-se especificamente do HPV, um estudo realizado com mulheres portadoras desse vírus, em Fortaleza-CE, afirmou que conceções erróneas fundamentadas em elementos culturais, como mitos e tabus, têm grande significado para os indivíduos, o que pode representar uma barreira ao acesso dos mesmos ao serviço de saúde, assim como para a atuação dos profissionais na promoção da saúde e prevenção de doenças (Sousa, Pinheiro, & Barroso, 2008).
O estádio assintomático correspondeu a 4,0%, quando este deveria corresponder à maior parte dos diagnósticos, uma vez que a deteção precoce do HPV e/ou NIC deve constituir a meta dos serviços de prevenção do CCU.
O levantamento estatístico realizado em 106 exames citológicos emitido pelo Laboratório de Anatomia Patológica do Hospital Universitário Sul Fluminense (HUSF), 77,4% tiveram associação com a ocorrência de infeção pelo HPV em estádio subclínico e 2,8% corresponderam ao carcinoma invasivo (Monte & Peixoto, 2010).
As medidas terapêuticas disponíveis para a forma condilomatosa do HPV são: ATA, podofilina, crioterapia, eletrocoagulação e exérese cirúrgica. Tratando-se especificamente do ATA, este constitui um agente cáustico que promove a destruição dos condilomas através da coagulação química do seu conteúdo protéico (Gagizi, 2010).
Estudo coorte retrospetivo realizado no Centro de Saúde-Escola de Porto Alegre - RS com 372 mulheres com lesão intraepitelial, encontrou uma prevalência de 70,2% de lesões de baixo grau e 29,8% de lesões de alto grau e cancro invasor. No total, 68,2% passaram por colposcopia, 48,1% chegaram à biopsia e 8,8% das orientadas a repetir o CP, fizeram-no em menos de um ano. No seguimento, 20,7% chegaram à conização, 1,9% sofreram histerectomia e 78,2% das alterações de baixo grau tiveram citologia normal à recolheita (Peres, Menezes, & Oliveira, 2011).
Ainda sobre esse aspeto, sabe-se que garantir um tratamento oportuno e um seguimento adequado às pacientes com HPV gera um impacto positivo no perfil epidemiológico do CCU ao reduzir as suas taxas de morbidade e mortalidade (Albuquerque et al., 2009).
Constatou-se que 10% dos parceiros das mulheres pesquisadas realizaram peniscopia, apesar de 36,0% terem sido convocados a comparecer ao serviço de saúde.
Tratando-se da infeção pelo HPV na população masculina, estima-se que no Brasil haja de 3 a 6 milhões de homens infetados pelo vírus. Dentre as três formas pelas quais o HPV se pode manifestar, a forma subclínica é a mais frequente no homem. O diagnóstico, por sua vez, deve considerar dados do histórico do paciente e um exame físico minucioso, podendo fazer uso de exame complementar, como a peniscopia e a inspeção pelo ácido acético a 5%, que realizados em conjunto identificam as lesões com um aumento entre 14 e 16 vezes (Chaves, Vieira, Ramos, & Bezerra, 2011).
O comportamento sexual pode ser entendido como atividades sexuais praticadas pelo indivíduo que envolve aspetos relacionados com o desejo, frequência e prazer sexual. Quando se trata da sexualidade feminina, esta envolve muito mais do que o intercurso sexual, pois pode sofrer influência de componentes psicológicos, emocionais e socioculturais (Minotto, 2009).
Um estudo realizado com 78 mulheres, portadoras de NIC I, II, III e condiloma acuminado, do Hospital das Clínicas de São Paulo, encontrou que 60,2% das participantes não apresentaram mudanças na libido, porém 36,5%, percentagem inferior à encontrada no presente estudo (55,5%), relataram redução da libido após o diagnóstico do HPV (Minotto, 2009).
No que se refere à interferência do diagnóstico de HPV na frequência sexual, uma pesquisa realizada em ambulatório de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) com 12 mulheres, em Fortaleza-CE, com o objetivo de conhecer os sentimentos vivenciados pelas participantes ao serem submetidas ao tratamento de lesões por HPV, encontrou resultado semelhante ao do presente estudo, no qual 60,0% das mulheres apresentaram diminuição na frequência sexual como consequência do diagnóstico de infeção pelo HPV (Carvalho et al., 2007).
No que se refere à mudança no prazer sexual (orgasmo), 46,9% das participantes referiram anorgasmia e 43,7% disfunção orgásmica, ou seja, praticamente todas as mulheres tiveram mudanças negativas no orgasmo. O mesmo estudo citado anteriormente constatou 36,0% de suas participantes com redução do orgasmo (Minotto, 2009).
Em relação às mudanças no tipo de prática sexual, 16 (40,0%) mulheres deixaram de praticar sexo oral, 12 (30,0%) deixaram de praticar sexo anal e outras 12 (30,0%) optaram pela abstinência sexual. A pesquisa recém citada encontrou resultado inferior, visto que apenas 11,7% das mulheres referiram deixar de praticar sexo oral após o diagnóstico da infeção pelo HPV (Minotto, 2009). A ausência de mudanças nas práticas sexuais pode ter relação com a falta de conhecimento das participantes acerca das formas de transmissão do HPV, visto que o vírus também pode ser transmitido por sexo anal e oral, através do contato direto dos órgãos genitais durante as relações sexuais sem uso do preservativo (Rosa et al., 2009). Outro aspeto, diz respeito às relações sociais de género, nas quais o poder masculino sobressai, impedindo as mudanças nas práticas sexuais das mulheres.
Ressalta-se como limitações do estudo o subregisto no processo, bem como os registos ilegíveis por parte dos médicos.
Conclusão
O grupo de mulheres portadoras de HPV e/ou NIC pesquisado é predominantemente de baixa renda, sem atividade fora do lar, com ensino médio e que teve diagnóstico tardio da infeção, sendo a aplicação do ácido tricloroacético a terapêutica mais recomendada. Parte das mulheres refere apresentar alteração da libido, frequência sexual, orgasmo e das práticas sexuais após conhecer o diagnóstico. Poucos parceiros são convocados e praticamente não há registo do seguimento masculino nos processos das mulheres.
Portanto a contribuição do estudo consiste, em alertar para uma assistência em Enfermagem dessas mulheres, que englobe a escuta e o aconselhamento voltado à sexualidade, bem como inclua o parceiro dessas mulheres como sendo de risco potencial para manifestar a infeção pelo HPV e, portanto, convoque a todos para avaliação diagnóstica, terapêutica se pertinente e educativa.
Para que pessoas com HPV e/ou NIC sejam capazes de alcançar a saúde é fundamental que adquiram conhecimentos voltados para a promoção de comportamentos de vida saudáveis e práticas sexuais seguras.
Pesquisas futuras devem ser realizadas com o intuito de intervir no empoderamento destas mulheres quanto à atividade sexual após o tratamento, e também podem ser desenvolvidas em serviços privados e com outros grupos populacionais.
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Recebido para publicação em: 14.10.13
Aceite para publicação em: 01.07.14