Serviços Personalizados
Journal
Artigo
Indicadores
- Citado por SciELO
- Acessos
Links relacionados
- Similares em SciELO
Compartilhar
Revista de Enfermagem Referência
versão impressa ISSN 0874-0283
Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.8 Coimbra mar. 2016
https://doi.org/10.12707/RIV15070
ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO
Adesão ao Regime Terapêutico de Pessoas com Hipertensão Arterial em Cuidados de Saúde Primários
Therapeutic Adherence of Hypertensive Patients in Primary Health Care
Adhesión al Régimen Terapéutico de Pacientes con Hipertensión Arterial en Atención Primaria de Salud
Raquel Sofia da Silva Ferreira*; Luís Carlos Carvalho da Graça**; Maria de La Salete Esteves Calvinho***
* Msc., Enfermeiro nível I, Escola Superior de Saúde - Instituto Politécnico de Viana do Castelo, 4900-347, Viana do Castelo, Portugal [rssferreira@sapo.pt]. Contribuição no artigo: escrita do artigo. Morada para correspondência: Rua S. Paio Nº 82, 4900-314, Viana do Castelo, Portugal.
** Ph.D., Professor adjunto, Instituto Politécnico de Viana do Castelo, 4900-347, Viana do Castelo, Portugal [luisgraça@ess.ipvc.pt]. Contribuição no artigo: orientação no estudo e colaboração no tratamento de dados e na redação do artigo.
*** Ph.D., Professor adjunto, Instituto Politécnico de Viana do Castelo, 4900-347, Viana do Castelo, Portugal [saletecalvinho@ess.ipvc.pt]. Contribuição no artigo: co-orientação do estudo e na redação do artigo.
RESUMO
Enquadramento: A hipertensão arterial é uma doença crónica e o fator de risco de doença cardiovascular com maior prevalência, impondo-se como um relevante problema de saúde pública.
Objetivos: Descrever a adesão ao regime terapêutico das pessoas com hipertensão arterial, com vigilância de saúde em cuidados de saúde primários.
Metodologia: Trata-se de um estudo descritivo, observacional e transversal, com uma amostra de 332 pessoas. Para a recolha de dados recorreu-se a um questionário de caracterização pessoal, escala de Graffar adaptada, teste de medida de adesão aos tratamentos, o international physical activity questionnaire – versão curta e questionário de cuidados dietéticos.
Resultados: Observou-se uma elevada adesão ao regime terapêutico na adesão medicamentosa (média de 5,63>±0,46), fraca na adesão à atividade física (média de 2939,05±5538,85) e boa na adesão aos cuidados dietéticos.
Conclusão: A consulta de enfermagem é uma ferramenta útil para a capacitação da pessoa com hipertensão arterial, possibilitando uma promoção de saúde personalizada, visando melhorar a adesão ao regime terapêutico.
Palavras-chave: adesão à medicação; cuidados de enfermagem; hipertensão; promoção da saúde
ABSTRACT
Background: Hypertension is a chronic disease and the leading risk factor for cardiovascular diseases, representing a major public health problem.
Objectives: To describe the therapeutic adherence of hypertensive patients being followed up in Primary Health Care.
Methodology: A descriptive, observational and cross-sectional study was conducted with a sample of 332 subjects. Data were collected using a questionnaire for sociodemographic and clinical characterization, the Measure Treatment Adherence Scale, the International Physical Activity Questionnaire – Short Version, and a questionnaire on dietary care.
Results: The results show a high medication adherence (mean 5.63±0.46), poor adherence to physical activity (mean 2939.05±5538.85) and good adherence to dietary care.
Conclusion: The nursing consultation is a useful tool to empower hypertensive patients, enabling a personalized health promotion to improve therapeutic adherence.
Keywords: medication adherence; nursing care; hypertension; health promotion
RESUMEN
Marco contextual: La HTA es una enfermedad crónica y el factor de riesgo cardiovascular de mayor prevalencia, por lo que destaca como un problema relevante de salud pública.
Objetivos:Describir la adhesión al régimen terapéutico de pacientes con hipertensión arterial en atención primaria.
Metodología: Se trata de un estudio descriptivo, observacional y transversal, con una muestra de 332 pacientes. Para la recogida de datos se utilizó un cuestionario de caracterización personal, la escala de Graffar adaptada, una prueba para medir la adhesión a los tratamientos , el cuestionario IPAQ – versión corta y un cuestionario de cuidados dietéticos.
Resultados: Se observó una adhesión elevada al régimen terapéutico en la adhesión a los medicamentos (media de 5,63±0,46), débil adhesión a la actividad física (media de 2939,05±5538,85) y buena en la adhesión a los cuidados dietéticos.
Conclusión: La consulta de enfermería es una herramienta útil para capacitar al paciente con hipertensión arterial y posibilita una promoción de la salud personalizada, con el objetivo de mejorar la adhesión al régimen terapéutico.
Palabras clave: cumplimiento de la medicación, cuidados de enfermería, hipertensión, promoción de la salud
Introdução
A hipertensão arterial (HTA) constitui-se como uma doença crónica (Direcção-Geral da Saúde, 2013a) e, ao mesmo tempo, como um fator de risco para o aparecimento de doenças cardiovasculares (World Health Organization, 2013). O seu diagnóstico origina uma transição difícil na vida da pessoa, visto que requer uma gestão de sintomas e formas de tratamento diárias, concomitantemente, com as exigências da vida diária (Meleis, 2010).
A prevalência mundial de HTA estimava-se em cerca de 40% dos adultos com 25 ou mais anos, em 2008 (World Health Organization, 2013). Em Portugal, estima-se em 42,6%, mas destes, apenas, 11,2% estarão controlados (PA <140/90 mm Hg) e 39,0% tomam medicação anti-hipertensiva (Macedo et al., 2007).
A HTA constitui o fator de risco de doença cardiovascular com maior prevalência, impondo-se como um relevante problema de saúde pública, pela mortalidade e morbilidade que lhe está associada (World Health Organization, 2013). Para minimizar os seus efeitos, considerámos necessário intervir aos três níveis de prevenção.
A plena eficácia do tratamento pode-se conseguir através da melhoria da adesão ao regime terapêutico, na qual os profissionais de saúde, particularmente os de cuidados de saúde primários (CSP), desempenham um papel fundamental. A promoção de estilos de vida mais saudáveis proporciona ganhos em saúde e mais qualidade de vida, bem como, leva à melhoria da eficácia das terapêuticas.
Intervir na promoção da saúde e na educação para a saúde, no sentido de incentivar a adesão ao regime terapêutico na HTA constitui uma necessidade, na atualidade. A profissão de enfermagem constitui-se como o recurso primário de saúde para as famílias e comunidades, desempenhando um papel de relevo.
Assim, é propósito deste estudo descrever a adesão ao regime terapêutico, nas pessoas com hipertensão arterial, com vigilância de saúde em CSP.
Enquadramento
A hipertensão arterial pode ser definida “como a elevação persistente, em várias medições e em diferentes ocasiões, da pressão arterial sistólica igual ou superior a 140 mmHg e/ou da pressão arterial diastólica igual ou superior a 90 mmHg” (Ministério da Saúde. Direcção-Geral da Saúde, 2013a, p. 1), sendo considerada pelos mesmos autores uma doença crónica, preconizando a necessidade de uma intervenção contínua na gestão e controlo da situação clínica, e prevenção das complicações.
A HTA é um grave problema de saúde pública, com prevalência elevada, atingindo cerca de 42,6% da população portuguesa, dos quais apenas 11,2 % estão controlados, apresentando a mais baixa prevalência no Norte e a mais elevada no Alentejo, maior prevalência no sexo masculino e uma tendência para o aumento da prevalência com a idade (Macedo et al., 2007).
Neste contexto os CSP desempenham um papel central na gestão e controlo da HTA, visto que esta implica uma vigilância contínua, a instituição de um plano terapêutico e a adesão da pessoa ao mesmo.
O tratamento da hipertensão arterial assenta no tratamento medicamentoso, na adoção de cuidados dietéticos e na prática de atividade física.
A adesão ao regime terapêutico é a chave para o sucesso na prevenção e gestão de doenças cardiovasculares, existindo adesão quando o comportamento de uma pessoa, na toma de medicação, no cumprimento de uma dieta, e/ou nas mudanças no estilo de vida, coincide com as recomendações de um prestador de cuidados de saúde (World Health Organization / Internacional Society of Hypertension Writing Group, 2003).
Consideramos que para favorecer a adesão ao regime terapêutico, é necessário que os profissionais de saúde estabeleçam com as pessoas um diálogo. Para que sejam bem-sucedidos devem usar uma linguagem clara, atender às necessidades de informação e esclarecimento, às capacidades cognitivas, crenças culturais e situação socioeconómica das pessoas.
O objetivo do tratamento farmacológico e não farmacológico da HTA é evitar sequelas a longo prazo e, em última instância, reduzir a mortalidade e morbilidade a ela associadas. Para tal é necessário reduzir a pressão arterial (PA) para valores inferiores a 140/90 mmHg e concomitantemente controlar outros fatores de risco cardiovascular modificáveis (Direcção- -Geral da Saúde, 2013b).
O maior obstáculo ao controlo da hipertensão arterial é a não adesão ao regime terapêutico (World Health Organization / Internacional Society of Hypertension Writing Group, 2003).
A escolha inicial do tratamento da hipertensão arterial deve incidir na modificação dos fatores de risco. Cabe aos enfermeiros investir na educação para a saúde, promovendo a adoção de uma dieta variada, nutricionalmente equilibrada, rica em legumes, leguminosas, verduras e frutas e pobre em gorduras (totais e saturadas); e divulgar os benefícios da adoção de prática regular e continuada de exercício físico, 30 a 60 minutos, quatro a sete dias por semana. Tais medidas influenciam o controlo e manutenção de peso normal, isto é, um índice de massa corporal (IMC) igual ou superior a 18,5 Kg/m2 mas inferior a 25 Kg/m2 e um perímetro da cintura inferior a 94 cm no homem, e inferior a 80 cm na mulher. Outros aspetos a modificar são a restrição do consumo excessivo de álcool (máximo 2 bebidas/dia); a diminuição do consumo de sal (valor ingerido inferior a 5,8 g/dia); e a cessação do consumo de tabaco (Direcção-Geral da Saúde, 2013b).
Relativamente ao consumo de álcool, Babor, Higgins- -Biddle, Saunders, e Monteiro (2001) consideram que o nível de consumo diário deve ser inferior a 20 gramas (2 unidades/dia) e de preferência estar pelo menos dois dias por semana sem beber qualquer bebida alcoólica.
No que ser refere a determinantes da HTA, Dickinson et al. (2014) comprovaram que as alterações do estilo de vida capazes de reduzir a pressão arterial são a restrição de sal, a redução do consumo de álcool, o alto consumo de vegetais e frutas, o baixo teor de gordura, a redução do peso e a prática de exercício físico regular.
Machado et al. (2010) verificaram que a prevalência de HTA, na população residente na cidade do Porto, era superior nos indivíduos não praticantes de exercício físico regular, em ambos os sexos e Martins, Guedes, Teixeira, Lopes, e Araújo (2009) verificaram que 40% dos inquiridos tinham um baixo nível de atividade física e 44,2% praticavam-na a um nível moderado.
Quanto aos medicamentos, no controlo da hipertensão arterial, o grupo farmacológico mais prescrito é o dos diuréticos (47,4%), seguido dos antagonistas do recetor da angiotensina (ARA; 43,0%) e dos inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA; 39,2%; Cortez-Dias, Martins, Belo, & Fiuza, 2009).
Os enfermeiros, como os profissionais de saúde mais próximos da população, têm um papel fundamental na educação para a saúde, com vista à promoção de estilos de vida saudáveis, no sentido da promoção da saúde e da prevenção da doença.
O diagnóstico de hipertensão arterial origina uma transição difícil na vida da pessoa. Os enfermeiros desempenham um importante papel na manutenção da adaptação da pessoa e na criação de estratégias de readaptação, facilitando o processo de aquisição de novas competências.
Questão de investigação
Qual a adesão ao regime terapêutico das pessoas com hipertensão arterial, com vigilância de saúde nos CSP?
Metodologia
O presente estudo desenvolveu-se numa unidade de saúde familiar (USF), do concelho de Barcelos, com uma população residente que ronda os 120 084 habitantes e um índice de envelhecimento de 90,7% (Instituto Nacional de Estatística, 2013). Em consonância com os objetivos da investigação, desenvolveu-se um estudo descritivo, observacional e transversal.
População e Amostra
A unidade de saúde familiar onde se desenvolveu o estudo possuía um total de 11 561 inscritos, dos quais 49,35% eram do sexo masculino e 50,65% do feminino, apresentando um índice de envelhecimento de 103,17%.
A população alvo do estudo era constituída pela totalidade das 2.227 pessoas com o diagnóstico clínico de HTA inscritas na unidade, sendo 1.314 mulheres e 913 homens, mas devido à impossibilidade deste estudo abranger a totalidade da população optou-se por uma amostragem probabilística aleatória sistemática, sendo que os elementos da amostra foram retirados da lista de pessoas com HTA de seis em seis pessoas, sendo que o primeiro, retirado aleatoriamente entre um e seis, foi o três.
A amostra apresentava como critérios de inclusão a pessoa ter mais de 18 anos e não apresentar, à data da realização do questionário, nenhuma alteração cognitiva diagnosticada. A amostra foi constituída por 332 pessoas.
Instrumentos
A escolha dos instrumentos utilizados pretendeu dar resposta aos objetivos da investigação e às características da população, e do ambiente em estudo. Foram selecionadas escalas e questionários validados para Portugal, assim como construídos questionários para o efeito e validados por pré-teste.
Utilizaram-se os seguintes instrumentos: 1) o questionário de caracterização sociodemográfica e de caracterização do perfil clínico; 2) a escala de Graffar adaptada (Costa, Leitão, Santos, Pinto, & Fino, 1996), apresentando uma razoável fiabilidade (Pestana & Gageiro, 1998), com um valor de Alfa de Cronbach de 0,67; 3) o questionário de cuidados dietéticos (onde incluímos questões sobre o número de refeições, a frequência de ingestão conforme o tipo de alimentos, confeção, e gordura mais utilizada; frequência e quantidade de ingestão de álcool); 4) o teste de medida de adesão aos tratamentos (Delgado & Lima, 2001) que engloba sete questões, considerando-se que a soma dos valores de cada item e a sua divisão pelo número de itens permite obter um nível de adesão aos tratamentos e que um valor mais elevado significa um maior nível de adesão, com uma consistência interna média (Pestana & Gageiro, 1998), sendo o valor de Alfa de Chronbach de 0,78; 5) o international physical activity questionnaire IPAQ – versão curta (Craig et al., 2003), que engloba sete questões referentes à atividade física praticada nos últimos sete dias, apresentando razoável consistência interna (Pestana & Gageiro, 1998), sendo o valor de Alfa de Chronbach de 0,61.
Procedimento
A recolha de dados decorreu de 6 de fevereiro a 31 de março de 2014.
As pessoas com consulta marcada foram informadas acerca do estudo, a sua finalidade, os objetivos e a garantia de confidencialidade das respostas.
Após a obtenção da disposição de participar no estudo, as pessoas foram contatados pela investigadora para agendamento da entrega do questionário. O questionário foi preenchido pelos utentes na USF e a clarificação de questões efetuada pela investigadora aconteceu quando solicitada.
Posteriormente, o questionário preenchido foi entregue na USF, conjuntamente com o consentimento informado.
Análise Estatística
Os dados obtidos foram codificados de forma a permitir o tratamento estatístico no SPSS – Statistical Package for the Social Sciences. Efetuou-se análise estatística descritiva, tendo em consideração as variáveis quanto à escala de medida. Para tal recorreu-se a distribuições de frequências, medidas de tendência central e medidas de dispersão.
Considerações Éticas
Para o estudo obteve-se a autorização da Comissão de Ética para a Saúde da Administração Regional de Saúde do Norte I.P. (Parecer nº13/2014). No primeiro contacto, a pessoa foi informada acerca da finalidade do estudo e da garantia da confidencialidade dos dados, assinando o consentimento informado.
Resultados
A amostra de 332 pessoas era, maioritariamente, do sexo feminino (59,3%). As idades variaram entre 27 e 94 anos, com média de 64,33±12,38 anos e mediana de 65,5 anos. O grupo etário mais representado era o de 64 anos ou menos (47,3%) e o menos representado o de 80 anos ou mais (12,3%). A maioria (75,9%) era casada ou vivia em união de facto, e pertencia à classe média baixa (69,9%), e 26,2% à classe média. Verificou-se o predomínio de pessoas que vivem em casal (35,2%) ou em famílias nucleares (30,1%), havendo 16,2% de famílias alargadas.
O tempo de diagnóstico da HTA variou entre 1 e 34 anos, com média de 9,11±7,30 anos e mediana de 6,00 anos. A pressão arterial sistólica variou entre 74 e 193 mmHg, com média de 141,33±15,14 mmHg e mediana 140,50 mmHg, e a pressão arterial diastólica entre 49 e 130 mmHg, com média de 77,73±11,05 mmHg e mediana 79,00 mmHg. Verificou-se o predomínio de pessoas com valores tensionais sistólicos acima de 140mmHg e diastólicos acima de 90 mmHg (60,8%). Relativamente ao perímetro abdominal, 22,3% dos homens e 44,3% das mulheres apresentavam perímetro abdominal elevado. O perímetro abdominal dos homens variou entre 74 e 136 cm, com média de 92,85±12,73 cm e mediana de 96,00 cm, e o das mulheres entre 63 e 136 cm, com média de 96,35±14,91 cm e mediana de 88,50 cm. Em relação ao índice de massa corporal, a maioria das pessoas apresentava excesso de peso (46,3% dos homens e 38,6% das mulheres) ou obesidade classe I (29,6% dos homens e 29,9% das mulheres), sendo que 15,4% dos homens e 20,3% das mulheres apresentavam peso normal.
A adesão ao regime terapêutico consiste na análise e na avaliação do comportamento relativamente à adesão medicamentosa, à adesão aos cuidados dietéticos e à adesão à atividade física.
A maioria das pessoas (97,3 %) fazia medicação anti-hipertensiva, sendo que para 2,7% o tratamento era efetuado, exclusivamente, com medidas não farmacológicas. Os grupos farmacológicos mais utilizados eram os diuréticos (59,5%), os ARA (53,2%) e os IECA (35,3%), sendo que o número de fármacos prescritos para o tratamento da hipertensão arterial variou entre um e cinco, com média de 1,97±0,82 e mediana de 2. A maioria das pessoas (79,9%) tomava um ou dois fármacos, 19,2% três ou quatro fármacos e 0,9% cinco fármacos. A adesão medicamentosa, avaliada através do teste de medida de adesão aos tratamentos (Delgado & Lima, 2001), variou entre dois e seis, apresentando média de 5,63±0,46 e mediana de 5,71 Tabela 1.
A adesão à atividade física, avaliada através do IPAQ, variou entre 0 e 37968 MET, apresentando média de 2939,05±5538,85 e mediana de 720,00. A maioria das pessoas (47,0%) apresentava atividade física baixa, sendo que os que referiram atividade física moderada e elevada apresentavam distribuições idênticas (26,2% e 25,9%, respetivamente) Tabela 2. Quando consideramos as pessoas com idades entre os 18 e os 69 anos a adesão à atividade física variou entre 0 e 37968 MET, apresentando média de 3627,15±5977.10 e mediana de 1371,00, sendo que 37,1% baixa atividade física e 32,6% elevada.
Relativamente ao regime dietético, a maioria dos inquiridos fazia três refeições principais (97,9%) e comia fora das mesmas (66,0%), e 41,3% fazia duas refeições intercalares. A maioria consumia sal (96,1%) na sua dieta e 92,8% não acrescentava sal no prato.
O método de confeção dos alimentos diário mais utilizado era o cozido (30,7%; Tabela 3.
A gordura mais utilizada era o azeite (56,3%), seguida do óleo vegetal (7,5%) Considerando-se o consumo de bebidas alcoólicas nos últimos 7 dias, 53,6% das pessoas referiram não ter consumido bebidas alcoólicas, enquanto 46,4% refere ter consumido bebidas alcoólicas. A bebida alcoólica mais consumida era o vinho, variando entre 2 e 360 cl, com um consumo médio de 54,31±57,665 cl, seguido da cerveja, que variou entre 3 e 70 cl, verificando-se um consumo médio de 16,35±20,418 cl. Relativamente ao número de dias em que ocorria consumo de bebidas alcoólicas, entre os que bebiam, verificou-se que a maioria referia beber mais de 5 dias por semana (77,3%) e 19,5% entre um a 5 dias por semana.
Discussão
A amostra era constituída maioritariamente por mulheres, o que difere de outros estudos (Macedo et al., 2007; Cortez-Dias et al., 2009), nos quais se verificaram uma maior prevalência de homens. Isto pode decorrer do maior predomínio de mulheres inscritas na USF com o diagnóstico de HTA, representando 59%. A idade das pessoas variou entre 27 e 95 anos, com média de 64,33±12,38 anos e mediana de 65,5 anos, valores superiores aos de Cortez-Dias et al. (2009) e Macedo et al. (2007). Esta diferença pode advir da variação significativa regional na prevalência de HTA (Macedo et al., 2007), dos estilos de vida e hábitos alimentares adotados, e do índice de envelhecimento desta população (103,17%).
A proporção de indivíduos casados ou que vivia em união de facto era elevada (75,9%), valor acima do observado por Macedo et al. (2007), o que pode estar relacionado com a ruralidade de algumas freguesias deste concelho, pela conceção tradicional do casamento e respetiva prática religiosa. O número de famílias unipessoais observado era baixo (5,1%). O número elevado de famílias em casal (35,2%), o número de famílias nucleares (30,1%) e alargadas (16,2%), vão ao encontro do observado por Macedo et al. (2007), dados que podem estar relacionados com a ruralidade de algumas freguesias e características demográficas das mesmas.
A maioria dos inquiridos pertencia à classe socioeconómica média baixa (69,9%), que se caracteriza por ser uma população com poucos recursos económicos, baixa escolaridade e baixo estatuto social.
Os profissionais de saúde poderão intervir a este nível, elegendo-se a USF como o espaço de eleição para a atuação ao nível dos determinantes da saúde, devido à proximidade com as populações, à resposta personalizada e à facilidade de acesso.
A maioria das pessoas inquiridas apresenta valores tensionais elevados (60,8%), o que questiona a eficácia das terapêuticas instituídas e da adesão ao regime terapêutico. Estes resultados são idênticos aos encontrados por Cortez-Dias et al. (2009).
Verificaram-se valores tensionais normais em 39,2% dos inquiridos, o que é superior ao observado por Macedo et al. (2007) e pode decorrer da elevada adesão medicamentosa observada.
A média do perímetro abdominal observada (94,27±14,15 cm) é superior à observada por Macedo et al. (2007), sendo que os valores de perímetro abdominal encontravam-se elevados em 22,3% dos homens e 44,3% das mulheres, o que constitui um fator de risco para o aparecimento de complicações cardiovasculares e demonstram uma adesão ao regime terapêutico ineficaz, visto que esta engloba os cuidados dietéticos e a prática de atividade física regular.
A maioria dos participantes apresentava excesso de peso (46,3% dos homens e 38,6% das mulheres) ou obesidade classe I (29,6% dos homens e 29,9% das mulheres), o que constitui um grave fator de risco para o aparecimento de complicações cardiovasculares, sendo que no caso das pessoas com HTA esse risco já se encontra aumentado.
As mulheres com perímetro abdominal elevado representam quase o dobro dos homens, o que pode estar relacionado com os estilos de vida, mas também com os fatores genéticos. Assim, torna-se imprescindível personalizar a educação para a saúde, no sentido de capacitar as mulheres com hipertensão arterial para gerir eficazmente a sua doença crónica, o que se irá traduzir na redução das complicações e na melhoria da eficácia do tratamento instituído.
A fraca adesão à atividade física regular e aos cuidados dietéticos pode justificar o perímetro abdominal e o IMC elevados observados, o que justifica a necessidade de reorientar as práticas dos profissionais de saúde, nas intervenções de educação para a saúde que realizam junto das pessoas com hipertensão arterial. À data da colheita de dados, a maioria das pessoas fazia medicação anti-hipertensiva (97,3%), valor extremamente elevado quando comparado com o de Macedo et al. (2007), e que pode ser explicado por possuírem assistência de saúde numa USF, com uma metodologia de trabalho e objetivos a atingir. O grupo de fármacos mais utilizado foi o dos diuréticos (59,5%), seguido do grupo dos ARA (53,2%) e por último o dos IECA (35,3%), o que vai ao encontro do observado por Cortez-Dias et al. (2009). O número médio de fármacos prescritos para a HTA parece revelar-se baixo (1,97 ± 0,82), visto que a ARS Norte tem um indicador contratualizado com as USF's (proporção de utentes com 75 ou mais anos de idade, com prescrição crónica inferior a cinco fármacos).
No entanto, uma percentagem reduzida dos inquiridos consome cinco fármacos (0,9%), o que poderá indiciar o incumprimento deste indicador. O número de fármacos prescritos pode ser explicado pela baixa adesão à atividade física e aos cuidados dietéticos, que levam à necessidade de prescrever um número maior de fármacos.
A melhoria da adesão ao nível da atividade física e dos cuidados dietéticos pode conduzir quer a uma redução da prescrição do número de fármacos, quer a uma redução nos custos com a saúde. Neste sentido, os enfermeiros como elementos próximos das populações, podem e devem intervir no sentido de aumentar a adesão ao tratamento não medicamentoso, visando um controlo mais eficaz dos valores de tensão arterial e, ao mesmo tempo, potenciando os efeitos da medicação prescrita e diminuindo a necessidade de prescrição adicional de fármacos.
A adesão medicamentosa observada era elevada (5,63 ± 0,46), o que corrobora o estudo de Pinto e José (2012). De facto, a adoção da terapêutica instituída parece ser eficaz nesta população. No entanto, este método de avaliação cinge-se apenas às respostas dos inquiridos e não podemos confirmar através de métodos diretos a toma efetiva da medicação. Podemos explicar esta elevada adesão com o facto de o número de famílias unipessoais ser muito baixo nesta população, existindo portanto uma rede de apoio à pessoa com HTA.
Constatou-se que 47,0% dos inquiridos apresenta uma atividade física baixa, valor ligeiramente superior ao encontrado por Martins et al. (2009), com 40% dos inquiridos a apresentar um baixo nível de atividade física, utilizando o mesmo instrumento. O avançar da idade parece surgir como um preditor de baixa atividade física, o que pode ser explicado pelo declínio progressivo das capacidades físicas e o aumento da morbilidade.
Observámos que a quase totalidade das pessoas faz as três refeições principais por dia e 66,0% faz refeições intercalares. A partir destes dados constatámos que uma percentagem significativa apenas faz três refeições por dia, o que nutricionalmente não é adequado. Numa alimentação adequada a pessoa deve efetuar pequenos lanches intercalados com as refeições principais para, deste modo, comer pequenas porções, divididas por diferentes horas do dia. Tal comportamento pode ser explicado devido ao predomínio do setor secundário, em que os trabalhadores não efetuam pausas para lanchar, de modo a manter a produtividade, mas também por hábitos adquiridos no seio da sua família.
Constatámos que o consumo de sal está presente nas refeições em 96,1% dos inquiridos. Não podemos concluir que o consumo de sal nesta população é o preconizado pela Direcção-Geral da Saúde (2013b), porque o questionário não nos permite quantificar o número de gramas ingerido por dia. Contudo, considerámos benéfico para a saúde o facto de não acrescentarem sal à comida do prato, desconhecendo se na sua confeção foi usado em demasia. Diariamente, os métodos de confeção dos alimentos mais utilizados eram os cozidos (30,7%), revelando estes também algum cuidado na escolha dos métodos de confeção, visto que estes são considerados mais saudáveis. A gordura mais utilizada na confeção dos alimentos era o azeite (56,3%), que é a gordura monoinsaturada aconselhada pela Direcção-Geral da Saúde (2013b).
O consumo de álcool revelou-se elevado, com 46,4% dos inquiridos a referir beber, talvez por ser mais aceite pela sociedade. Observámos que este consumo é maior nos homens (63,7%) do que nas mulheres (34,5%), o que pode ser explicado pela ruralidade e pelas conceções tradicionais sobre o papel da mulher que ainda perduram.
A maioria das pessoas inquiridas referia beber mais de cinco dias por semana (77,3%), o que pode ser explicado pela tradição do seu consumo como momento social nesta região. Este consumo não se encontra de acordo com as orientações emanadas pela Direcção-Geral da Saúde e pela Organização Mundial de Saúde (duas unidades/dia de consumo e 2 dias por semana sem ingestão), e revela a necessidade de se intervir o mais precocemente possível, para que com adequada intervenção as pessoas possam parar ou reduzir os seus consumos.
As bebidas alcoólicas mais consumidas são o vinho (54,31 ± 57,67 cl) e a cerveja (16,35 ± 20,418 cl), o que pode ser explicado pela facilidade de acesso a estas bebidas e pela tradição do seu consumo na região. Outro fator, ainda, explica-se pelo cultivo de vinhas para a produção de vinho para consumo, o que constitui uma prática comum nesta área geográfica. O consumo de outras bebidas alcoólicas revela-se baixo.
Considera-se uma limitação deste estudo o recurso ao IPAQ para avaliar a atividade física visto que a sua utilização pode ter originado algum enviesamento, dado que apenas foi validado para pessoas dos 18-69 anos. Outra limitação identificada consistiu no questionário de caracterização dos cuidados dietéticos que não nos permitiu avaliar a quantidade de sal ou de alimentos ingeridos, mas a sua frequência de ingestão.
Conclusão
É crucial investir na educação para a saúde das pessoas com HTA, no sentido de minimizar o aparecimento de doenças cardiovasculares e as complicações da HTA, visto que esta surge na literatura como um fator de risco para o aparecimento de doenças cardiovasculares e, concomitantemente, como uma doença crónica. Para tal, é necessário melhorar a adesão ao regime terapêutico, em todas as suas dimensões.
Neste âmbito o presente estudo visou descrever a adesão ao regime terapêutico da pessoa com HTA. Observou-se uma adesão medicamentosa elevada e verificou-se uma fraca adesão à atividade física, o que pode indicar a dificuldade em aderir a estilos de vida mais saudáveis. A adesão aos cuidados dietéticos estudados revelou-se boa.
Apesar da maioria das pessoas inquiridas estar medicada e da elevada adesão medicamentosa observada, os valores tensionais são elevados, o que põe em causa a eficácia das medidas farmacológicas, realçando a importância e impacto que as medidas não farmacológicas podem ter no tratamento da hipertensão arterial.
Há que salientar ainda o elevado número de pessoas com perímetro abdominal e IMC elevados, representando um terço das pessoas inquiridas e uma maior prevalência no sexo feminino.
Sendo assim, melhorar a adesão ao regime terapêutico, principalmente no que diz respeito à adesão à atividade física e aos cuidados dietéticos, permitirá aumentar a eficácia do tratamento da HTA. Para tal, os enfermeiros, dada a sua proximidade com as populações, devem intervir no sentido de melhorar a adesão ao tratamento não medicamentoso, efetuando-se, assim, um controlo mais eficaz dos valores tensionais, e maximizando-se os efeitos da medicação prescrita.
A adoção de estilos de vida saudáveis, visando uma promoção da saúde efetiva, é um objetivo que está alicerçado nas orientações internacionais e no plano nacional de saúde, bem como em programas de saúde e em projetos institucionais.
Neste sentido, os Cuidados de Saúde Primários estão numa posição privilegiada para desenvolver projetos e programas que visem melhorar a adesão ao regime terapêutico das pessoas com hipertensão arterial.
Concluímos, assim, que é necessário uma educação para a saúde personalizada e o envolvimento e a capacitação do cidadão para a gestão da hipertensão arterial. Favorecer no indivíduo a aquisição dessas competências, permite-lhe adquirir um maior domínio sobre os determinantes da sua própria saúde, sendo este aspeto um ponto de partida para a mudança de comportamentos e o estabelecimento de novos hábitos de vida.
A elaboração de mais estudos acerca dos fatores que influenciam a adesão ao regime terapêutico na HTA e de medidas capazes de incrementar a mesma é pertinente para o desenvolvimento do conhecimento nesta área. Estudar a influência da consulta de enfermagem no processo de adesão ao regime terapêutico é um caminho que não deve ser descurado.
Referências bibliográficas
Babor, T., Higgins-Biddle, J., Saunders, J., & Monteiro, M. (2001). AUDIT - The Alcohol Use Disorders Identification Test: Guidelines for use in primary care. Geneva, Switzerland: World Health Organization/ Department of Mental Health and Substance Dependence. [ Links ]
Cortez-Dias, N., Martins, S., Belo, A., & Fiuza, M. (2009). Prevalência e padrões de tratamento da hipertensão arterial nos cuidados de saúde primários em Portugal: Resultados do estudo VALSIM. Revista Portuguesa de Cardiologia, 28(5), 499-523. [ Links ]
Costa, M., Leitão, F., Santos, J., Pinto, J., & Fino, M. (1996). Currículos funcionais: Instrumentos para o desenvolvimento e aplicação (Vol. 2). Lisboa, Portugal: Instituto de Inovação Educacional. [ Links ]
Craig, C., Marshall, A., Sjöström, M., Bauman, A., Booth, M., Ainsworth, B., … Oja, P. (2003). International Physical Activity Questionnaire: 12-country reliability and validity. Medicine and Science in Sports and Exercise, 35(8), 1381-1395. [ Links ]
Delgado, A., & Lima, M. (2001). Contributo para a validação concorrente de uma medida de adesão aos tratamentos. Psicologia, Saúde & Doenças, 2(2), 81-100. [ Links ]
Dickinson, H., Mason, J., Nicolson, D., Campbell, F., Beyer, F., Cook, J., … Ford, G. (2014). Lifestyle interventions to reduce raised blood pressure: A systematic review of randomized controlled trials. Recuperado de http://www.crd.york.ac.uk/CRDWeb/PrintPDF.php?AccessionNumber=12006001560&Copyright=Database+of+Abstracts+of+Reviews+of+Effects+%28DARE%29%3Cbr+%2F%3EProduced+by+the+Centre+for+Reviews+and+Dissemination+%3Cbr+%2F%3ECopyright+%26copy%3B+2016+University+of+York%3Cbr+%2F%3E [ Links ]
Direcção-Geral da Saúde. (2013a). Hipertensão arterial: Definição e classificação. Lisboa, Portugal: Autor. [ Links ]
Direcção-Geral da Saúde. (2013b). Abordagem terapêutica da hipertensão arterial. Lisboa, Portugal: Autor. [ Links ]
Instituto Nacional de Estatística. (2013). Anuário estatístico da Região Norte 2012. Lisboa, Portugal: Autor. [ Links ]
Macedo, M., Lima, M., Silva, A., Alcântara, P., Ramalhinho, V., & Carmona, J. (2007). Prevalência, conhecimento, tratamento e controlo da hipertensão em Portugal: Estudo PAP. Revista Portuguesa de Cardiologia, 26(1), 21-39. [ Links ]
Machado, H., Alves, A., Tinoco, C., Gonçalves, C., Matos, C., Rego, D., … Martins, S. (2010). Prevalência do diagnóstico de hipertensão arterial em pessoas sedentárias e em praticantes de exercício físico, na Cidade do Porto. Acta Médica Portuguesa, 23(2), 153-158. [ Links ]
Martins, L., Guedes, N., Teixeira, I., Lopes, M., & Araújo, T. (2009). Nível de atividade física em portadores de hipertensão arterial. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 17(4), 462-467. doi: 10.1590/S0104-11692009000400005 [ Links ]
Meleis, A. I. (2010). Transitions Theory: Middle Range and Situation Specific Theories in Nursing Research and Practice. New York, NY: Springer Publishing Company. [ Links ]
Pestana, M., & Gageiro, J. (1998). Análise de dados para ciências sociais: A complementaridade do SPSS. Lisboa, Portugal: Edições Sílabo. [ Links ]
Pinto, A., & José, H. (2012). Hipertensão arterial e adesão ao regime terapêutico nos cuidados de saúde primários. Journal of Nursing, 6(7), 1638-1647. doi: 10.5205/reuol.2255-18586-1-LE.0607201217 [ Links ]
World Health Organization. (2003). Adherence to long term therapies: evidence for action. Geneva, Switzerland: Author. [ Links ]
World Health Organization, Internacional Society of Hypertension Writing Group. (2003). 2003 World Health Organization (WHO)/Internacional Society of Hypertension (ISH). Journal of Hypertension, 21(11), 1983-1992. [ Links ]
World Health Organization. (2013). A global brief on hypertension: Silent killer, global public health crisis. Geneva, Switzerland: Author. [ Links ]
Recebido para publicação em: 09.11.15
Aceite para publicação em: 17.02.16