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Revista de Enfermagem Referência
versão impressa ISSN 0874-0283
Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.13 Coimbra jun. 2017
https://doi.org/10.12707/RIV16085
ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO
RESEARCH PAPER
Presença de familiares durante situações de emergência: a opinião dos enfermeiros do serviço de urgência de adultos
Family presence during emergency situations: the opinion of nurses in the adult emergency department
Presencia de familiares durante situaciones de urgencia: la opinión de los enfermeros del servicio de urgencias de adultos
Marco Job Batista*; Pedro Vasconcelos**; Rui Miranda***; Tiago Amaral****; João Geraldes*****; Ana Patrícia Fernandes******
*MSc., Enfermeiro, Departamento de Enfermagem à Pessoa em Situação Crítica da Associação Portuguesa de Enfermeiros, Hospital Garcia de Orta, EPE, 2805-267, Almada, Portugal [marco.batista@hgo.min-saude.pt]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica, recolha e análise de dados, tratamento estatístico, discussão e redação do artigo.
Morada para correspondência: Av. Torrado da Silva, 2805-267, Almada, Portugal.
** MSc., Enfermeiro, Departamento de Enfermagem à Pessoa em Situação Crítica da Associação Portuguesa de Enfermeiros, Hospital São Francisco Xavier - Centro Hospitalar Lisboa Ocidental, EPE, 1449-005, Lisboa, Portugal [enf.pedro.vasconcelos@gmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica, recolha de dados, revisão e redação do artigo.
*** MSc., Enfermeiro, Departamento de Enfermagem à Pessoa em Situação Crítica da Associação Portuguesa de Enfermeiros, Hospital Santa Maria - Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE, 1649-035, Lisboa, Portugal [ruidmiranda@gmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica, recolha de dados, revisão e redação do artigo.
****MSc., Enfermeiro, Departamento de Enfermagem à Pessoa em Situação Crítica da Associação Portuguesa de Enfermeiros, Hospital São José - Centro Hospitalar Lisboa Central, EPE, 1150-199, Lisboa, Portugal [enf.tiagoamaral@gmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica, recolha de dados, revisão e redação do artigo.
***** MSc., Enfermeiro, Departamento de Enfermagem à Pessoa em Situação Crítica da Associação Portuguesa de Enfermeiros, Hospital Garcia de Orta, EPE, 2805-267, Almada, Portugal [jpgeraldes@hotmail.com]. Contribuição no artigo: recolha de dados e revisão.
****** MSc., Enfermeira, Hospital Garcia de Orta, EPE, 2805-267, Almada, Portugal [patricia_agf@hotmail.com]. Contribuição no artigo: recolha de dados e revisão.
RESUMO
Enquadramento: A presença de familiares no serviço de urgência é uma realidade. Em algumas situações como as de emergência a presença de familiares é algo controverso para os enfermeiros.
Objetivos: Conhecer a opinião dos enfermeiros sobre a presença de familiares em situações de emergência no serviço de urgência de adultos.
Metodologia: Estudo exploratório descritivo, recorrendo-se à aplicação de um questionário numa amostragem por conveniência. A amostra foi constituída por 233 enfermeiros dos 4 serviços de urgência polivalentes da região de Lisboa e Vale do Tejo.
Resultados: Verifica-se que a maioria dos enfermeiros não concorda com a presença de familiares em contextos de emergência. Destacam-se como vantagens, o fornecimento de informação clínica à equipa e o apoio ao doente, e como desvantagens, a ansiedade dos familiares e o aumento do stresse nos profissionais.
Conclusão: Os enfermeiros têm uma opinião desfavorável à presença da família em situações de emergência. Seria importante refletir sobre a prática clínica na sala de reanimação considerando-se o F de família após a prestação dos cuidados de emergência segundo o ABCDE.
Palavras-chave: família; ressuscitação; enfermeiros; serviço hospitalar de emergência
ABSTRACT
Background: Family presence in the emergency department is a reality. However, in some situations, namely emergency situations, family presence is a controversial issue for nurses.
Objectives: To identify nurses' opinions about family presence in emergency situations in adult emergency departments.
Methodology: A descriptive exploratory study was conducted using a questionnaire in a convenience sample. The sample consisted of 233 nurses from four multipurpose emergency departments in the Lisbon and Tagus Valley region.
Results: Most nurses in the study do not agree with family presence in emergency settings. Some of the identified advantages included the provision of clinical information to the team and patient support, whereas the disadvantages related to family anxiety and increased stress for professionals.
Conclusion: Nurses have an unfavorable opinion about family presence in emergency situations. It would be important to reflect on the clinical practices in the resuscitation room so that the F for family can be included after the ABCDE approach to emergency care delivery.
Keywords: family; resuscitation; nurses; emergency service, hospital
RESUMEN
Marco contextual: La presencia de familiares en el servicio de urgencias es una realidad. En algunas situaciones, como las de urgencia, la presencia de familiares es algo controvertido para los enfermeros.
Objetivos: Conocer la opinión de los enfermeros sobre la presencia de familiares en situaciones de urgencia en el servicio de urgencias de adultos.
Metodología: Estudio exploratorio descriptivo, en el que se recurrió a la aplicación de un cuestionario en una muestra por conveniencia. La muestra estuvo constituida por 233 enfermeros de los 4 servicios de urgencias polivalentes de la región de Lisboa y Valle del Tajo.
Resultados: Se comprueba que la mayoría de los enfermeros no está de acuerdo con la presencia de familiares en los contextos de urgencias. Se destacan como ventajas proporcionar información clínica al equipo y apoyar al paciente, y como desventajas, la ansiedad de los familiares y el aumento del estrés en los profesionales.
Conclusión: Los enfermeros tienen una opinión desfavorable en cuanto a la presencia de la familia en situaciones de urgencia. Sería importante reflexionar sobre la práctica clínica en la sala de reanimación, considerándose la F de familia tras la prestación de los cuidados de urgencias según el ABCDE.
Palabras clave: familia; resucitación; enfermeros; servicio de urgencia en hospital
Introdução
A prestação de cuidados de enfermagem no serviço de urgência deve ser centrada no utente e família (Kingsnorth-Hinrichs, 2011). No entanto, a complexidade dos cuidados prestados à pessoa em situação crítica num serviço desta natureza, pode fazer com que se negligencie, em alguns momentos, a família. As necessidades familiares são muitas vezes colocadas em segundo plano já que num contexto de urgência e emergência, os enfermeiros tendem a valorizar as necessidades da pessoa que cuidam (Fulbrook et al., 2007).
O direito ao acompanhamento nos serviços de urgência do Sistema Nacional de Saúde está legalmente reconhecida em Portugal (Lei nº 15/2014 de 21 de março). No entanto, está consagrado na lei que existem situações que, pela sua natureza, podem comprometer a ação dos profissionais de saúde.
Embora em Portugal a presença da família em situações de emergência e reanimação seja um tema pouco discutido, ao nível internacional é tema de discussão e objeto de investigação há já alguns anos (Flanders & Strasen, 2014). No entanto, apesar de existirem estudos sobre a presença da família em situações de emergência, pouco é conhecido sobre a opinião e experiência dos enfermeiros no cuidar dessas famílias (Sá, Botelho, & Henriques, 2015). Algumas associações internacionais, nomeadamente a American Association of Critical-Care Nurses (2016), a American Heart Association (Field et al., 2010) e a Emergency Nurse Association (2012), apresentaram posições institucionais favoráveis à presença de familiares em situações de reanimação e procedimentos invasivos.
Tendo em conta o descrito, o presente estudo tem como objetivo conhecer a opinião dos enfermeiros sobre a presença de familiares em situações de emergência no serviço de urgência de adultos.
Enquadramento
No serviço de urgência são atendidas pessoas com vários níveis de gravidade. A pessoa em situação crítica é aquela que tem a vida ameaçada por falência ou eminência de falência de uma ou mais funções vitais e a sua sobrevivência depende de meios de suporte avançados de vigilância, monitorização e terapêutica (Regulamento n.º 124/2011 de 18 de fevereiro).
Quando se cuida de uma pessoa em situação crítica, têm-se como objetivo salvar a pessoa, recuperando e mantendo as suas funções vitais, ficando em segundo plano o apoio à família dessa mesma pessoa. No entanto, o enfermeiro, além da prestação de cuidados à pessoa em situação crítica, é também responsável pelo apoio e acompanhamento da família. A experiência vivenciada pela família da pessoa em situação crítica é única, intensa e muito emocional uma vez que está associada ao risco de vida do seu familiar (Sá et al., 2015).
Tendo em conta a Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE), a família é “composta por pessoas ligadas através da consanguinidade, afinidade, relações emocionais ou legais, sendo a unidade ou o todo considerado como um sistema que é maior do que a soma das partes” (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2011, p. 115). Desta forma, um problema de saúde, nomeadamente uma doença aguda num dos membros da família pode afetar a família num todo sendo por isso importante a prestação de cuidados à família num momento de crise. Também de acordo com a CIPE, a crise familiar é “um desequilíbrio da estabilidade mental, social e económica do grupo familiar, causando uma inadaptação e alteração temporária do desempenho normal da família” (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2011, p. 47).
A presença da família em situações de emergência é a essência do apoio familiar, ao permitir que os familiares usufruam de estarem juntos durante a crise (Kingsnorth-Hinrichs, 2011). Num contexto de urgência e emergência, o cuidado de enfermagem à família da pessoa em situação crítica tem características únicas e exige do enfermeiro competências especializadas para ultrapassar os desafios desta prática (Sá et al., 2015).
Na revisão da literatura realizada por Flanders e Strasen (2014), é demonstrado que a presença de familiares em situações de reanimação permanece controversa e depende dos vários contextos e culturas profissionais. Assim, as autoras referidas analisaram a origem desta problemática, verificando que os enfermeiros e médicos são menos favoráveis à presença de familiares durante situações de emergência do que os próprios doentes e sua família. As mesmas autoras referem, também, que existem variações na prática clínica na presença (ou não) de familiares durante situações de emergência e sugerem formação nesta área e o desenvolvimento de políticas e guidelines sobre a presença de familiares em situações de emergência e reanimação.
Lowry (2012) desenvolveu um estudo onde descreve os benefícios dos familiares estarem presentes durante a reanimação, usando as perceções dos enfermeiros que trabalham num serviço de urgência onde se encontra estabelecido um protocolo de presença de familiares durante situações de reanimação. Neste estudo todos os enfermeiros descrevem a permanência dos familiares durante a reanimação como algo já esperado e positivo. Por outro lado, Al-Mutair, Plummer, e Copnell (2012) revelam no seu estudo que os enfermeiros têm atitudes negativas relativamente à presença dos familiares durante a reanimação e recomendam o desenvolvimento de programas educacionais aos profissionais de saúde e ao público, para a correta implementação desta prática.
Tendo em conta o exposto e sabendo que o tema ainda requer discussão há necessidade de reunir esforços para sensibilizar os profissionais de saúde, nomeadamente os enfermeiros sobre a proximidade à família da pessoa em situação crítica no serviço de urgência.
Questão de Investigação
Qual a opinião dos enfermeiros do serviço de urgência de adultos sobre a presença de familiares durante situações de emergência?
Metodologia
Para responder à questão de investigação realizou-se um estudo exploratório e descritivo, recorrendo-se à amostragem por conveniência. A amostra do estudo foi constituída por 233 enfermeiros dos quatro serviços de urgência polivalentes da região de Lisboa e Vale do Tejo que aceitaram participar no estudo. Os dados foram recolhidos entre setembro e dezembro de 2015 após a obtenção de autorização dos conselhos de administração e das comissões de ética dos respetivos hospitais (Parecer n.º 237/2015 e Parecer n.º 41/2015).
Durante a realização deste estudo respeitaram-se os princípios éticos tendo em conta a Declaração de Helsínquia. Desta forma, no âmbito da recolha de dados entendeu-se dispensar o formulário do consentimento informado, mas colocou-se no texto introdutório do questionário a informação sobre o carácter voluntário da participação no estudo.
A recolha de dados foi realizada através de um questionário. A construção do questionário teve por base a evidência científica sobre o tema da presença de familiares em situação de emergência e foi validado por um grupo de peritos. O questionário foi dividido em três partes. A primeira refere-se aos dados sociodemográficos de forma a caracterizar a amostra. A segunda reporta-se à opinião profissional dos enfermeiros sobre a presença de familiares na sala de emergência. Esta parte é constituída por três questões fechadas com resposta numa escala de likert de concordância com cinco opções de resposta: discordo completamente, discordo, não me faz diferença, concordo e concordo completamente e duas questões abertas para enumerar as vantagens e desvantagens sobre a presença dos familiares numa situação de emergência e reanimação. Por último, a opinião pessoal sobre o tema em estudo com duas questões fechadas com resposta numa escala de likert de concordância com cinco opções de resposta: discordo completamente, discordo, não me faz diferença, concordo e concordo completamente. Esta parte do questionário interroga o nível de concordância da presença numa situação de emergência perante um seu familiar ou sendo o próprio doente.
O processamento e análise dos dados foi efetuado com o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 22.0 para a estatística descritiva e realizou-se análise de conteúdo das questões abertas de acordo com Bardin (1977).
Resultados
A amostra ficou constituída por 233 enfermeiros com uma média de idades de 32,8 anos com um desvio padrão de 5,9, sendo 70% sexo feminino (163) e 30% do masculino (70). No que respeita à experiência profissional, 67 trabalham há menos de 6 anos (28,7%), 130 têm uma experiência que varia entre os 7 e os 15 anos (55,8%) e 36 trabalham à mais de 16 anos (15,5%). Tendo em conta o grau académico, 194 são licenciados (83,3%) e 39 têm o grau de mestre (16,7%). Em termos de título profissional, 196 são enfermeiros de cuidados gerais (84,1%) e 37 enfermeiros especialistas (15,9%).
A Tabela 1 mostra a distribuição dos enfermeiros pela urgência polivalente do respetivo hospital.
A Tabela 2 apresenta a opinião dos enfermeiros sobre a presença de familiares durante as manobras de reanimação, destacando-se que 76% dos enfermeiros inquiridos discorda/discorda completamente.
A Tabela 3 descreve a opinião dos enfermeiros sobre a presença de familiares em situações de peri-paragem, nomeadamente edema agudo do pulmão, síndrome coronário agudo, disritmias, entre outras, sendo visível que 66,1% dos enfermeiros constituintes da amostra discorda/discorda completamente.
A Tabela 4 revela a opinião dos enfermeiros sobre a presença da família em situações de politraumatizados graves. Esta questão surge pela especificidade na abordagem de um politraumatizado grave na sala de emergência e evidenciou que 75,5% dos enfermeiros discordam/discordam completamente com a presença de familiares nesta situação específica.
No que respeita às vantagens e desvantagens da presença dos familiares na sala de reanimação de um serviço de urgência realizou-se a análise de conteúdo das respostas. Desta forma, foram descritas 396 unidades de enumeração relativas às vantagens e 554 relativamente às desvantagens, as quais são apresentadas nas Tabelas 5 e 6.
Por último, as Tabelas 7 e 8 referem as opiniões pessoais dos enfermeiros no caso de o doente ser um familiar ou de ser o próprio. Nas situações em que o doente fosse um familiar 64,8% revelam que discordam/discordam completamente de estar presentes na sala de reanimação. É de realçar que 30,1% concordam/concordam completamente em acompanhar o seu familiar na sala de reanimação. Por outro lado, em caso de doença súbita do próprio, 69,5% dos enfermeiros inquiridos discordam/discordam completamente de ter um familiar a acompanhá-lo na sala de reanimação.
Discussão
Depois de analisar os dados recolhidos verifica-se que a maioria dos enfermeiros incluídos no estudo não concorda com a presença de familiares em situações de reanimação (76%), em situações de peri-paragem como por exemplo doentes em edema agudo do pulmão, com síndrome coronário agudo, com disritmias (66,1%) nem em situações de politraumatizados graves (75,5%). Num estudo português que avaliou a importância dos familiares nos cuidados de enfermagem (Fernandes, Gomes, Martins, & Gonçalves, 2015), o serviço de urgência obteve uma pontuação menor relativamente a outros serviços no que respeita à atitude dos enfermeiros pela importância da presença da família. Os mesmos autores referiram que os dados obtidos sobre o serviço de urgência poderiam estar relacionados com a complexidade do contexto de trabalho.
Num serviço de urgência, os cuidados de enfermagem ao doente em situação crítica estão associados à tecnicidade e à agilidade dos procedimentos num ambiente cuja dinâmica impõe ações complexas por parte dos profissionais cujo objetivo é a recuperação e manutenção das funções vitais da pessoa em situação crítica (Sá et al., 2015). Desta forma, uma das desvantagens descritas no presente estudo é que os familiares poderão interferir negativamente no desempenho da equipa, pois dificulta a sua atuação (92 enumerações) e aumenta o stresse dos profissionais (98 enumerações).
Em contextos de cuidados críticos e de emergência, não é fácil a inserção da família (Soares, Martin, Rabelo, Barreto, & Marcon, 2016) e isto é comprovado neste estudo, uma vez que nesta amostra, os enfermeiros enumeraram 96 vezes (num total de 396) de que não existem vantagens na presença de familiares na sala de reanimação.
As guidelines de suporte avançado de vida da American Heart Association (Soares et al., 2016) preveem a presença de membros da família nas situações de reanimação de forma a apoiá-los e confortá-los desde que estes estejam preparados para assistir a situações de reanimação. No entanto, numa situação de reanimação, os esforços dos profissionais estão vocacionados para o doente em situação crítica, descurando a informação à família. É referido como desvantagem a não existência de um profissional dedicado à informação e acompanhamento da família na sala de reanimação (34 enumerações), pois pode levar a não compreensão por parte dos familiares dos cuidados prestados (49 enumerações) e poderá causar ansiedade nos mesmos (112 enumerações).
Por outro lado, estão descritas algumas vantagens relativamente à presenta de familiares em situações de emergência, sendo as mais relevantes o fornecimento de informação clínica (77 enumerações) e o apoio ao doente (50 enumerações). Num estudo recente a doentes vítimas de trauma (Soares et al., 2016) revelam que a presença da família seria benéfico pois permitiria apoiar e tranquilizar o doente num momento de stresse. No mesmo estudo, os doentes reconhecem que “o cuidado prestado pela família é distinto daquele ofertado pelos profissionais de saúde” uma vez que “as diferenças existentes entre o cuidado técnico executado pelos profissionais e o cuidado emocional ofertado pelos familiares impulsionariam o membro da família a querer estar presente durante o atendimento emergencial” (p. 200). Um outro estudo revelou que a maioria dos inquiridos teve atitudes e crenças positivas sobre a presença da família durante situações de reanimação cardiopulmonar (Zavotsky et al., 2014).
Num estudo, Lowry (2012) entrevistou 14 enfermeiros de forma a descrever as perceções sobre a presença da família em situações de reanimação. Todos os enfermeiros entrevistados se mostraram favoráveis à presença da família em situações de reanimação. Pelo contrário, 76% dos enfermeiros incluídos nesta amostra não concorda com a presença de familiares em situações de reanimação.
Uma limitação deste estudo prende-se pelo facto de apenas ter abordado quatro serviços de urgência polivalentes. No entanto, pode ser o início da reflexão sobre a presença da família em situações de emergência e reanimação. Embora o nível de concordância sobre a presença da família seja baixo nas várias questões efetuadas, a formação poderá ser importante e facilitadora na alteração de práticas, nomeadamente a presença da família em situações de emergência e reanimação (Zavotsky et al., 2014).
Como descreve Lederman (2016) numa carta ao editor da Resuscitation, tanto a American Heart Association como a European Resuscitation Council descrevem nas suas últimas guidelines que a família poderá estar presente em situações de suporte avançado de vida se houver possibilidade para tal. Seria importante que em Portugal as associações similares às referidas realizassem referências à presença de familiares em situações de emergência e reanimação.
Conclusão
Tendo em conta o caminho percorrido e o objetivo definido, identifica-se que os enfermeiros desta amostra têm uma opinião de discordância sobre a presença de familiares em situações de emergência e reanimação no serviço de urgência de adultos. Existem algumas evidências internacionais e nacionais que revelam dados semelhantes e outros completamente contrários. No entanto, é importante ressalvar que a diversidade de resultados dos vários estudos está relacionada com a cultura profissional de cada país onde foram realizados. Em locais onde a presença de familiares é um hábito profissional existem benefícios para todos, nomeadamente profissionais de saúde, doente e família. Sabe-se que o papel do enfermeiro junto da família é importante, no entanto em situações de reanimação o enfermeiro dá uma relevância maior ao doente, podendo deixar a família em segundo plano.
A realização desta investigação possibilitou a reflexão sobre a prática de cuidados na sala de emergência no que se refere à presença de família em situações de doença crítica. Tendo em conta o tipo de estudo, estes dados não podem ser generalizados e apenas se referem à amostra identificada.
No que respeita à presença da família em situações de emergência e reanimação seria importante realizar um ou vários estudos transversais que englobassem enfermeiros, médicos e utentes (no papel de doente e de familiar) de forma a refletir-se sobre a prestação de cuidados de emergência na presença da família.
Pode ser o ponto de partida para se discutir no seio das equipas de saúde sobre a presença de familiares em situações de emergência e reanimação. As implicações para a prática deste estudo podem levar a uma mudança de atitude, nomeadamente a permitir a presença da família em situações bem definidas em que depois do ABCDE estar estabilizado se inclua o F de família na prestação de cuidados na sala de emergência.
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Recebido para publicação em: 15.12.16
Aceite para publicação em: 09.03.17