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Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.18 Coimbra set. 2018

https://doi.org/10.12707/RIV18013 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO

RESEARCH PAPER

 

Construção e validação de casos clínicos para utilização no ensino de enfermagem no contexto materno-infantil

Development and validation of clinical cases to be used in maternal-child nursing education

Construcción y validación de casos clínicos para usarlos en la enseñanza de enfermería en el contexto materno-infantil

 

Casandra G. R. M. Ponce de Leon*
https://orcid.org/0000-0003-4378-9200

Ana Karolina Silva**

Laiane Medeiros Ribeiro***
http://orcid.org/0000-0002-5041-8283

Guilherme da Costa Brasil****
https://orcid.org/0000-0001-6878-7098

Laise Escalianti del Alamo Guarda*****
https://orcid.org/0000-0002-2084-0117

Luciana Mara Monti Fonseca******
https://orcid.org/0000-0002-5831-8789

 

* MSc., Docente, Universidade de Brasília, Faculdade de Ceilândia, 72220-900, Ceilândia, Brasil [casandrapleon@gmail.com]. Contribuição no artigo: análise e discussão de dados, tratamento e avaliação estatística, revisão do artigo. Morada para correspondência: Av. Araucárias, lote 4530, bloco E, apto. 2501, Sul - Águas Claras, CEP: 71.936-250, Brasília, Brasil.

** Bacharelaro, Estudante, Universidade de Brasília, Faculdade de Ceilândia, 72220-900, Ceilândia, Brasil [anakarolina_silva24@outlook.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica, participou em experimentação e recolha de dados.

*** Ph.D., Enfermeira, Universidade de Brasília, Faculdade de Ceilândia, 72220-900, Ceilândia, Brasil [lainha@gmail.com]. Contribuição no artigo: tratamento e avaliação estatística e análise de dados.

**** MSc., Enfermeiro, Universidade de Brasília, Faculdade de Ceilândia, 72220-900, Ceilândia, Brasil [guilhermecostabrasil@hotmail.com]. Contribuição no artigo: análise de dados e discussão.

***** MSc., Enfermeira, Universidade de Brasília, Faculdade de Ceilândia, 72220-900, Ceilândia, Brasil [laiseescalianti@hotmail.com]. Contribuição no artigo: análise de dados e discussão.

****** Ph.D., Enfermeira, Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, 14040-902, Ribeirão Preto, Brasil [lumonti@eerp.usp.br]. Contribuição no artigo: análise de dados e discussão.

 

RESUMO

Enquadramento: A simulação, como um método ativo de ensino, permite o estímulo da capacidade cognitiva, racional, visão crítica e exercício do trabalho em equipa, divisão de tarefas e liderança.

Objetivo: Descrever a construção de 2 casos clínicos e validá-los para utilização na simulação realística materno-infantil.

Metodologia: Estudo de validação do tipo metodológico, realizado em duas fases. Na primeira fase, realizou-se o levantamento das necessidades de cuidados em saúde escolar e elaboração de 2 casos clínicos para utilizar em simulação realística materno-infantil. Na segunda fase, procedeu-se à validação dos casos e dos instrumentos elaborados para avaliação da simulação no processo de formação.

Resultados: Os juízes avaliaram os itens que foram analisados através do Índice de Validade de Conteúdo (IVC). As sugestões foram apontadas para melhorar os instrumentos de avaliação dos cenários e houve a contribuição para a fidedignidade dos casos clínicos construídos.

Conclusão: A validação dos cenários pelos juízes viabilizou a adequação de itens nos instrumentos favorecendo uma nova implementação dos casos elaborados para a simulação realística materno-infantil.

Palavras-chave: ensino; simulação; estudos de validação; enfermagem; pediatria

 

ABSTRACT

Background: As an active teaching method, simulation allows improving cognitive and rational skills, critical judgment, teamwork, task division, and leadership.

Objective: To describe the development of 2 clinical cases and validate them to be used in high-fidelity maternal-child simulation.

Methodology: A two-phase methodological validation study was conducted. The first phase consisted of the identification of the school’s health care needs and the development of 2 clinical cases to be used in high-fidelity maternal-child simulation. The second phase consisted of the validation of the cases and instruments for assessment of simulation in the training process.

Results: The experts assessed the items using the Content Validity Index (CVI). The suggestions aimed at improving the scenario assessment tools and contributed to the reliability of the developed clinical cases.

Conclusion: The validation of the scenarios by the experts reflected the adequacy of the items in the instruments and promoted another implementation of the cases designed for high-fidelity maternal-child simulation.

Keywords: teaching; simulation; validation studies; nursing; pediatrics

 

RESUMEN

Marco contextual: La simulación, como método activo de enseñanza, permite estimular la capacidad cognitiva, la racional, la visión crítica y el ejercicio del trabajo en equipo, la división de tareas y el liderazgo.

Objetivo: Describir la construcción de 2 casos clínicos y validarlos para su uso en la simulación realista materno-infantil.

Metodología: Estudio de validación de tipo metodológico, realizado en dos fases. En la primera fase, se realizó la recopilación de las necesidades de atención en salud escolar y la elaboración de 2 casos clínicos para utilizarlos en la simulación realista materno-infantil. En la segunda fase se procedió a la validación de los casos y de los instrumentos elaborados para evaluar la simulación en el proceso de formación.

Resultados: Los jueces evaluaron los ítems que se analizaron a través del Índice de Validez de Contenido (IVC). Se apuntaron las sugerencias para mejorar los instrumentos de evaluación de los escenarios y hubo una contribución a la fidedignidad de los casos clínicos construidos.

Conclusión: La validación de los escenarios por los jueces viabilizó la adecuación de los ítems en los instrumentos, lo que favoreció una nueva implementación de los casos elaborados para la simulación realista materno-infantil.

Palabras clave: enseñanza; simulación; estudios de validación; enfermería; pediatría

 

Introdução

No decorrer do tempo, as necessidades da sociedade perante a saúde crescem e, paralelamente a isso, evoluções no ensino de enfermagem são realizadas para melhor qualificar os futuros profissionais que irão atuar na área e que possam responder às demandas da comunidade. Dentre estes avanços está a simulação realística, que é uma forma de alcançar, com eficiência, a capacidade de ensino-aprendizagem.

A simulação, como um método ativo de ensino, permite o estímulo da capacidade cognitiva, racional, visão crítica e exercício do trabalho em equipa, divisão de tarefas e liderança. Pesquisas apontam a satisfação dos estudantes diante do treino de habilidades com simuladores, pois sentem-se motivados por estarem no centro do processo, favorecendo o aumento da competência mediante os cenários simulados (Fernandes et al., 2016; Negri et al., 2017; Souza et al., 2017).

Vários são os cenários que podem ser construídos para que possam tornar-se o mais próximo do real, melhorando a aprendizagem dos alunos. O estudante inserido nessa prática poderá trabalhar a sua autoconfiança, pois aprenderá com os erros no cenário simulado e as dúvidas que surgirem durante a simulação não prejudicam as condições de saúde do utente. Com isso, o aluno pode aperfeiçoar as técnicas de enfermagem para melhor reproduzi-las num contexto real.

Porém, apesar de se encontrar na literatura uma variedade de casos simulados em diversas áreas do conhecimento, ainda há pouca evidência quando se trata da validação dos mesmos. Na medicina, há relatos de validação de simulador em erros de anestesia (Merry et al., 2017) e em casos de implantação de stent (Perrin et al., 2015). Na enfermagem, encontraram-se relatos sobre a validação de um questionário para o espanhol e português sobre satisfação dos alunos na simulação (Alconero-Camarero, Gualdrón-Romero, Sarabia-Cobo, & Martinez-Arce, 2016; Almeida et al., 2015) e sobre emergências perinatais na simulação de alta-fidelidade (Balki et al., 2017). Encontrou-se também um estudo sobre a satisfação e ganhos pessoais dos estudantes de enfermagem que vivenciaram as experiências educativas com a simulação de alta- fidelidade (Baptista, Martins, Pereira, & Mazzo, 2014).

O quantitativo de publicações relativas à eficácia da simulação realística no âmbito do ensino cresce no decorrer do tempo. Apesar disso, pouco é referenciado sobre a construção e validação dos casos clínicos para simulação materno-infantil (Góes, Dalri, Fonseca, Canini, & Scochi, 2014). Não se encontraram na literatura estudos sobre a validação de casos clínicos que abordem a interdisciplinaridade das áreas materno-infantil.

Diante do exposto, este estudo teve como objetivo descrever a construção de dois casos clínicos e a validação destes para utilizá-los, posteriormente, na simulação realística materno-infantil.

 

Enquadramento

Muitas vezes os estudantes não têm a oportunidade de vivenciar as temáticas ministradas na teoria e discutidas na sala de aula, assim como nos diferentes campos de estágio prático durante a sua graduação. O cenário simulado auxilia neste aspeto, pois eles poderão capacitar-se através deste método ativo, que viabiliza a vivencia de múltiplas situações, favorecendo o raciocínio clínico entre o conteúdo teórico e a prática (Carvalho, Oliveira-Kumakura, & Morais, 2017).

O ensino, com excelência na graduação, reflete-se no mercado de trabalho, no campo da saúde, pois o profissional apresentar-se-á mais bem preparado, caracterizando-se como um agente inovador e transformador, o que gera satisfação nos atendimentos realizados junto aos utentes, fortalecendo o sistema de saúde e a qualidade da assistência prestada à comunidade.

Um estudo com o objetivo de descrever a implementação de um programa de educação em enfermagem, para 27 alunos, baseado na simulação, trouxe uma avaliação da atividade altamente positiva por parte dos estudantes. Eles destacaram a importância do trabalho em equipa e da comunicação; os princípios de via aérea, respiração e circulação e fazer um histórico completo dos utentes. Alguns deles também mencionaram o papel importante que os enfermeiros desempenham na avaliação de um utente, da higiene das mãos, disponibilidade de equipamento adequado, documentando os cuidados de enfermagem e cuidar de parentes numa situação aguda (Tjoflat, Vaga, & Soreide, 2017).

Os estudantes explicaram que os cenários de simulação pareciam uma “situação real” e que isso facilitou a ação de realizar os cuidados adequados. Um estudante disse que a “Simulação aumenta a capacidade de aprender, porque é realizada agindo em situações reais de cuidados para os utentes” (Tjoflat et al., 2017, p. 2).

Um estudo transversal, realizado com estudantes do curso de enfermagem, no Brasil, que tinha como objetivo avaliar o uso da simulação clínica em pediatria, revelou que os tópicos abordados durante a simulação foram considerados importantes e que o tempo de duração da simulação estava adequado, na opinião desses participantes. Estes concordaram que a atividade da simulação permitiu colocar em prática o conteúdo teórico ministrado pela docente na sala de aula, e que a simulação pode ser introduzida no cronograma da disciplina, como uma estratégia metodológica para favorecer a autoconfiança dos estudantes (Fernandes et al., 2016).

Um estudo de revisão sistemática, recente, procurou avaliar se os programas de simulação existentes ajudam a prevenir os erros de medicação. Vinte e um estudos avaliaram os programas de aprendizagem baseados em simulação, concentrando-se em estudantes de farmácia, medicina e enfermagem, ou em programas destinados a reduzir erros de administração, preparação, gestão de crises ou habilidades de comunicação de aprendizagem para profissionais de saúde (Sarfati et al., 2018).

Os estudos variaram em termos de design, metodologia e avaliação. Poucos demonstraram que a simulação foi mais eficaz do que a aprendizagem didática na redução do erro de medicação. Esta revisão destaca a falta de avaliação a longo prazo, com cenários limitados e amostras de participantes. Essas várias experiências, no entanto, ajudam na identificação dos elementos-chave necessários para um efetivo programa de aprendizagem, baseado em simulação humana para prevenção de erros de medicação (Sarfati et al., 2018).

É necessário, independentemente da área à qual se propõe utilizar a simulação, que todas as etapas do processo de simulação, como a construção dos casos pelos docentes ou profissionais, a identificação do material a ser utilizado, a organização dos cenários simulados e a apresentação destes para o público-alvo, assim como o debriefing, sejam realizados com planeamento, pensando sempre no tempo de atuação dos cenários, nas competências e habilidades almejadas para cada atividade simulada.

 

Questão de investigação

Qual o processo de construção e validação de casos clínicos com objetivo de construir procedimentos de simulação realística materno-infantil?

 

Metodologia

Trata-se de uma pesquisa de validação, do tipo estudo de desenvolvimento metodológico, realizado em duas etapas: primeiro a construção dos cenários e depois a validação dos instrumentos que compõem a simulação por juízes da área da saúde.

Refere-se à investigação de métodos de obtenção e organização de dados e condução de pesquisas rigorosas. Trata do desenvolvimento, da validação e da avaliação de ferramentas e métodos de pesquisa (Polit & Beck, 2011). Inicialmente foi realizada uma análise do Relatório da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar no Brasil (PeNSE) de 2015 (último relatório disponibilizado pelo Ministério da Saúde e Ministério da Educação do país), onde foi possível identificar os problemas de maior incidência que acometem a vida de estudantes (idade entre 13 e 17 anos; Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2016). A partir disso, foram construídos dois casos clínicos, denominados da seguinte forma: Caso clínico 1 - Uso de drogas lícitas e ilícitas por adolescentes e abuso sexual de menor de idade; e Caso clínico 2 - Iniciação sexual precoce, gravidez e aborto entre adolescentes.

 

Figura 1. Caminho percorrido na pesquisa.

 

O cenário do caso clínico 1 procurou identificar no estudante a competência clínica, habilidades cognitivas e afetivas, a fim de prestar um cuidado seguro ao utente.

Já o cenário do caso clínico 2 procurou avaliar a competência clínica, habilidades cognitivas e afetivas a fim de contribuir como facilitador na tomada de decisão e preparação da utente para o autocuidado.

Para o acompanhamento das condutas exercidas pelos estudantes voluntários, foram desenvolvidas checklists (formulários de avaliação da prática simulada). A validação do caso clínico 1 contou com a participação de cinco juízes e no caso clínico 2 contou com seis juízes, que tinham o objetivo de avaliar os seguintes itens: a organização, a abrangência, a objetividade, a conveniência de cada elemento do cenário e os instrumentos utilizados. Todos consentiram na participação conforme consta assinatura em Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Para a seleção dos juízes, utilizou-se o sistema de pontuação para seleção de juízes adaptado por Góes et al. (2014), e foi estabelecida para este estudo a pontuação mínima de 4 pontos. Quanto à titulação, somente 1 ponto foi computado, mesmo que o juiz possuísse mais que um título na sua formação.

De acordo com o instrumento de pontuação, para seleção dos juízes, no caso clínico 1, esta variou entre 7 e 9 pontos, sendo que 80% dos juízes possuía experiência com simulação realística e, 30,2 foi a idade média destes juízes. No caso clínico 2, a pontuação também variou entre 7 e 9 pontos e 66,7% possuíam experiência com simulação, sendo 30,8 a idade média dos juízes. O instrumento adotado para caracterização dos juízes averiguou a titulação (doutoramento, mestrado ou especialização), área de atuação principal (hospitalar, assistencial, ensino), experiência com ensino e simulação, pesquisa desenvolvida ou orientada e publicações sobre temas vinculados aos cenários simulados em processo de validação.

Assim sendo, para os dois cenários de simulação materno-infantil, destaca-se que todos os juízes eram enfermeiros. No caso clínico 1, um juiz tinha o doutoramento em enfermagem, um possuía o mestrado em enfermagem e três possuíam o título de especialistas em enfermagem (nas áreas de neonatologia/pediatria, materno-infantil). No caso clínico 2, um juiz tinha o doutoramento em enfermagem, um possuía o mestrado em enfermagem e quatro possuíam o título de especialistas (nas áreas de neonatologia/pediatria, materno-infantil e urgência e emergência pediátrica). No caso clínico 1 contou-se com quatro juízes do sexo feminino e um do sexo masculino, e no caso clínico 2, eram todos do sexo feminino. O instrumento de caracterização não averiguava o estado civil, nem se tinham filhos. Todos declararam ter experiência docente.

Foram utilizados dois instrumentos no planeamento da validação da simulação: um questionário para a categorização dos juízes e a ferramenta de validação de cenários para simulação realística.

Os juízes procederam à análise de 20 itens, que abrangem, de uma forma geral, aspetos de todo o cenário, como por exemplo as ações que os estudantes devem realizar no referido cenário clínico, classificando cada item como: inadequado, parcialmente adequado e adequado. Outros nove itens referentes aos objetivos a serem alcançados pelos participantes nos cenários foram avaliados, sendo classificados como: realizado de forma correta no tempo correto, realizado de forma correta no tempo incorreto, realizado de forma incorreta e não realizado. O instrumento contava também com um campo aberto para observações subjetivas relativas à simulação.

Posteriormente, foi utilizado o índice de validade de conteúdo (IVC) para verificar a concordância entre os juízes em relação à permanência ou não, dos itens, na checklist para cada caso (primeiro instrumento) e para a avaliação dos objetivos da simulação (segundo instrumento).

Para calcular o IVC geral dos instrumentos, foi realizada a soma de todos os IVC calculados separadamente, dividido pelo número de itens em cada instrumento (20 itens no primeiro instrumento e nove itens no segundo instrumento; Góes et al., 2014). Como aceitável, considerou-se índice mínimo de 0,75 tanto para a avaliação de cada item, como para a avaliação geral dos dois instrumentos (Alexandre & Coluci, 2011; Medeiros et al., 2015).

O estudo respeitou as exigências formais contidas nas normas nacionais e internacionais regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa sob número CAAE nº 55504716.7.0000.0030, no Brasil.

 

Resultados

O modelo nas Tabelas 1 e 2 foi baseado no estudo de Eduardo, Mendes, Binotto, Tognolli, e Tucci (2016) e apresenta o planeamento, de cada caso clínico, que pode ser, futuramente, implementado na simulação realística materno-infantil.

Para atender ao objetivo deste estudo, tornou-se necessária a realização da atividade de simulação com estudantes do curso de enfermagem, e a avaliação dos instrumentos planeados para cada caso, pelos juízes convidados. Assim, ao especificar a execução de cada caso clínico, obteve-se o registo de 5 minutos para o briefing (apresentação do problema, dos objetivos da prática, do cenário e dos materiais que teriam para a execução da prática), e de 10 a 12 minutos para a execução da prática simulada em cada caso clínico.

O debriefing durou cerca de 25 minutos para o caso clínico 1 e cerca de 35 minutos para o caso clínico 2. Esta etapa seguiu um roteiro pré-estabelecido envolvendo cinco fases, onde os estudantes se expressavam sobre aspectos como: emocional (como se sentiram); descritiva (sobre o cenário vivenciado); avaliativa (os alunos destacaram os pontos positivos realizados); analítica (os estudantes foram estimulados a falar e pensar sobre o que poderiam ter feito diferente) e conclusiva (tomada de decisão e trabalho em equipa), numa conversa bilateral com a docente e juízes experientes na área da saúde materno-infantil.

Para a validação dos elementos dos cenários foram utilizados critérios conforme a Tabela 3, que expõe os resultados numéricos obtidos de acordo com o cálculo do IVC em relação aos itens avaliados para cada caso. O modelo apresentado na Tabela 3 foi baseado no trabalho de Medeiros et al. (2015) e adaptado para este estudo com a devida autorização dos autores.

No caso clínico 1, de acordo com os dados do IVC, seis itens ficaram abaixo de 0,75, abaixo do critério de decisão sobre a aceitação. Os critérios 1, 13, 15, 17 e 18 tiveram votos em branco que não foram contabilizados. Algumas sugestões para o instrumento foram dadas pelos juízes, uma delas como: “Seria interessante que houvesse itens para avaliação da comunicação verbal e não verbal das profissionais com as utentes” (Juíz 3, setembro de 2017).

No caso clínico 2, seis itens ficaram abaixo do critério de aceitação. Apenas o item 18 obteve voto em branco. Os juízes deram sugestões para o caso clínico, como excluir alguns itens (não “realizar exame físico ginecológico” por ser o primeiro contacto com a utente e materiais que seriam utilizados nesta atividade), por não acharem necessários para o contexto do caso, e inclusão de alguns materiais.

Como avaliação geral, nos dois casos clínicos, o número de itens que tiveram o IVC acima do critério de aceitação foi maior do que o número de itens com o IVC abaixo da média estabelecida. Com isso, conclui-se que os instrumentos elaborados para a simulação têm alta fidedignidade para serem aplicados em simulações voltadas para o ensino em enfermagem materno-infantil, possibilitando a aprendizagem de uma assistência qualificada em enfermagem (Negri et al., 2017).

Os objetivos propostos para cada caso clínico também foram avaliados pelos juízes. Estes, foram desenvolvidos com o intuito de nortear a avaliação do juíz durante o cenário simulado e de destacar as ações esperadas por parte do desempenho dos estudantes voluntários, ao vivenciar cada cenário de simulação realística materno-infantil. Posteriormente, foi calculado o IVC individual e IVC total que foi de 0,81 para os dois casos clínicos.

Diante do caso clínico 1 (Tabela 1), os juízes apontaram algumas sugestões quanto à lista de materiais: incluir o laringoscópio. Foi recomendada a especificação do tamanho do tubo para intubação ou colocar um de cada na lista de materiais.

Ainda no caso clínico 1, em relação às ações esperadas por parte dos estudantes, os juízes sugeriram incluir os itens: “pedido de gasometria” para detalhar os parâmetros sanguíneos que poderão contribuir para o diagnóstico da utente; “colocar biombo” antes do exame físico, devido ao fato de ter que investigar sinais de abuso sexual; “acionar psicólogo e serviço social”; “avaliar comunicação verbal e não verbal da utente”; e “cuidados pós-paragem cardiorrespiratória”.

Foi sugerido rever a carga do choque no uso do desfibrilhador, pois trata-se de atendimento a uma adolescente de 13 anos, portanto a carga seria referente à de um adulto a depender do porte da criança. A dose de adrenalina foi apontada como um item a ser reavaliado, segundo o mesmo critério, possibilitando a dose referente ao adulto.

Diante do caso clínico 2 (Tabela 2), quanto à lista de materiais, foi sugerido a inclusão de itens: “maca para exame clínico”, “foco de luz”, e “espéculo ginecológico”. Em relação às ações esperadas foi recomendado: a inclusão do item “informar à utente quanto ao sigilo ético-profissional”; readaptar o item “contatar os responsáveis pela adolescente” para “encorajar a presença de responsável na consulta”; reavaliar a necessidade do item “realizar exame físico ginecológico” pelo fato de ser o primeiro contacto com a utente.

Se o objetivo acima citado for excluído, os itens dos materiais referentes ao exame ginecológico não necessitarão de ser incluídos. Também sugeriram a reformulação do item “encaminhar à consulta com médico ginecologista para proceder a exames” para “solicitar exames necessários”, pois no âmbito da atenção básica em saúde o enfermeiro tem competência para solicitar exames de elementos e sedimentos anormais da urina, hematológicos, ultrassonografia, entre outros e, ainda, incluir o item “marcação de consulta pré-natal”.

A quantidade de informação contida na descrição dos casos clínicos foi questionada pelos juízes com a justificativa de que deveriam ser reduzidos os detalhes para que o estudante pudesse ser induzido a explorar mais o cenário e descobrir, por si só, as informações.

Porém, foi explicado aos juízes experientes que, a inclusão dos detalhes nas descrições dos casos foi proposital, pois cada cenário contava com apenas 10 minutos de duração e com isso foram priorizadas as ações mais pertinentes e diretas para alcançar o resultado almejado, que é a aprendizagem dos alunos. Diante dessa explicação, houve entendimento, por parte dos juízes, de que os pontos ali colocados eram pertinentes de serem avaliados, pela questão da curta duração dos cenários.

 

Discussão

Os critérios de elaboração dos cenários devem estar de acordo com os objetivos almejados para cada prática simulada (Góes et al., 2014). Para conferir a fidedignidade e confiabilidade para aplicação dos casos construídos, é fundamental a validação por juízes experientes (Eduardo et al., 2016; Góes et al., 2014).

Atendendo às sugestões dadas pelos juízes em cada cenário, como mostra a Tabela 3, os itens que não atingiram o valor de IVC de 0,75 ou mais nos itens individuais, significa que foram considerados de baixa relevância nos cenários. Tal quer dizer que esses itens precisam de ser reformulados e reavaliados, para uma posterior aplicação dos casos apresentados neste estudo.

No caso clínico 1, o debriefing incluiu a discussão entre os participantes e as responsáveis pelo cenário. No caso 2, os juízes experientes também participaram nesta etapa. Foi possível perceber a maior qualidade da troca de ideias quando os juízes participaram na discussão, pois a experiência de cada um no contexto do caso foi enriquecedora para a análise dos pontos levantados.

Na etapa final da experiência clínica simulada, é realizado o debriefing, que consiste no momento de reflexão e análise do que foi encenado, possibilitando ao estudante participante a oportunidade de expressar os seus sentimentos e avaliar a sua própria prática.

Estudos apontam que mesmo com o professor no papel de facilitador, os alunos têm o estado emocional afetado pela ansiedade e nervosismo. Diante disso, o debriefing tem relevância para trabalhar esses estados, pois é um impulsionador no desenvolvimento das competências, possibilita a postura colaborativa dos envolvidos na validação para discutir pontos importantes para a melhora das habilidades, o que é favorável ao estudante para construir a autoconfiança (Fernandes et al. 2016; Souza et al., 2017).

A simulação realística permite a fixação dos conteúdos ministrados na sala de aula anteriormente à reprodução dos casos clínicos. Essa associação teórico-prática permite que o aluno perceba a real importância da aplicabilidade das técnicas corretas pertinentes à profissão e aperfeiçoamento das habilidades (Costa, Medeiros, Martins, Cossi, & Araújo, 2017).

Neste estudo, de acordo com a validação do debriefing, foi sugerido pelos juízes trocar a expressão usada “pontos negativos” para “pontos que podem ser melhorados”, pois dessa forma os alunos não se sentiriam constrangidos e julgados por terem falhado nalguma ação esperada no cenário.

A validação foi aplicada aos instrumentos utilizados para avaliar as habilidades dos alunos participantes. Os instrumentos servem como norteadores para os especialistas que avaliam o cenário, que seguindo os resultados esperados na atuação dos casos podem contribuir para a melhoria das ferramentas de avaliação e também para a melhoria das práticas pedagógicas e desempenho da prática clínica (Barragán, Hernández, & Medina, 2017).

A validade do conteúdo possibilita a melhoria na formulação de propostas teóricas garantindo a excelência e precisão da avaliação dos cenários, tornando-se adequado para guiar as habilidades e comportamentos a serem seguidos pelo aluno participante. As sugestões levantadas pelos juízes, descritas acima, permitem que os instrumentos de avaliação se tornem próximos dos objetivos almejados no ensino-aprendizagem e concedem benefícios para o aluno perante a metodologia ativa na qual este é o centro do processo de treino (Barragán et al., 2017).

A discussão dos resultados alcançados, em cada cenário, possibilita a perceção dos alunos quanto à sua aprendizagem, estímulo à autonomia e responsabilidade do futuro enfermeiro. Este momento inclui o aluno num processo de comunicação e troca de ideias com pessoas que compartilham das mesmas vivências, sendo benéfico para habituá-lo a lidar com situações em equipa, algo essencial para a assistência em saúde (Góes et al., 2014).

Este estudo abrangeu a construção dos cenários por docentes e estudantes do curso de graduação em enfermagem, seguido da implementação no âmbito da simulação realística e validação do conteúdo por juízes experientes na saúde materno-infantil, que fizeram sugestões essenciais para a eficiência da aplicação futura, dos dois cenários descritos, no ensino de enfermagem materno-infantil (Eduardo et al., 2016).

Considerando que a validação dos casos clínicos para a simulação permite maior segurança aos aplicadores, os instrumentos utilizados nos dois casos clínicos estão qualificados para atender aos objetivos da simulação realística no âmbito educacional. Acredita-se que essa metodologia é um recurso importante para melhorar a aprendizagem dos estudantes de enfermagem, bem como para a melhoria de capacidade técnica de profissionais de serviços de saúde (Góes et al., 2014; Medeiros et al., 2015).

Tornam-se necessários mais estudos sobre a avaliação de desempenho de estudantes na simulação materna-infantil para endossar a metodologia de ensino ativa, revelando o impacto deste método no ensino de habilidades e competências para a prática segura junto a utentes adolescentes, nas situações clínicas descritas nos dois casos clínicos.

Uma limitação neste estudo é o uso dos atores voluntários (estudantes do curso de enfermagem que não possuem formação em artes cénicas). Porém, este item não foi relatado pelos juízes na avaliação do realismo do cenário.

 

Conclusão

O estudo alcançou o objetivo proposto, que foi o de descrever a construção de dois casos clínicos e a validação destes para utilizá-los na simulação realística materno-infantil.

A contribuição dos juízes como avaliadores, agregada à prática dos cenários junto dos estudantes, foi determinante para a validação dos cenários clínicos.

Desta forma, a disponibilidade destes cenários e dos instrumentos validados no presente estudo, aliados à capacitação de mais profissionais, para atuar com esta metodologia ativa de ensino, contribuirão para garantir resultados favoráveis a uma simulação realística de excelência no campo da saúde materno-infantil.

Futuras pesquisas com a simulação materno-infantil, com estudantes de outras localidades e países, poderão ser realizadas a fim de verificar a efetividade da aplicabilidade destes casos clínicos na formação de enfermeiros, tendo em vista a escassez de estudos nesta área temática.

 

Referências bibliográficas

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Agradecimento: À Fundação de Apoio e Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF) pelo financiamento a esta pesquisa, pelo edital 03/2016. Protocolo: 9721.56.32761.05042016

 

Recebido para publicação em: 03.04.18

Aceite para publicação em: 23.07.18

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