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Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283

Rev. Enf. Ref. vol.serIV no.19 Coimbra dez. 2018

https://doi.org/10.12707/RIV18046 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO

RESEARCH PAPER

 

Validação transcultural para a população portuguesa da Care Dependency Scale for Rehabilitation

Cross-cultural validation for the Portuguese population of the Care Dependency Scale for Rehabilitation

Validación cultural para la población portuguesa de la Care Dependency Scale for Rehabilitation

 

Sara Bernardo*
https://orcid.org/0000-0002-0847-4484

Maria do Rosário Carreiró de Carvalho e Sá**
https://orcid.org/0000-0001-7956-4826

 

* MSc., Enfermeira, Especialista em enfermagem de reabilitação, Mestre em enfermagem de reabilitação, ACES Pinhal Litoral, 2401-903, Leiria, Portugal [sararfbernardo@gmail.com]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica, escrita do artigo, recolha de dados, tratamento estatístico, análise e discussão dos dados. Morada para correspondência: Canto do Brejo, Nº 54, Milagres, 2415-020, Leiria, Portugal.

** MSc., Professora Adjunta, Especialista em Enfermagem de Reabilitação, Mestre em Sociopsicologia da Saúde, Doutoranda em Ciências de Enfermagem, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, 3046-851, Coimbra, Portugal [carreiro@esenfc.pt]. Contribuição no artigo: pesquisa bibliográfica, escrita e revisão do artigo, orientação na análise e discussão dos dados.

 

RESUMO

Enquadramento: A dependência define-se pelo comprometimento da capacidade individual para o autocuidado da pessoa e a sua avaliação determina a implementação de um plano terapêutico adequado e exequível.

Objetivo: Neste estudo pretendeu-se validar a Care Dependency Scale for Rehabilitation (CDS-R), pelo facto de permitir avaliar, além de aspetos físicos e psicossociais, a adaptação da pessoa à situação de doença.

Metodologia: A tradução e adaptação cultural para a língua portuguesa da CDS-R foi realizada em 2015, segundo as guidelines de Beaton, Bombardier, Guillemin, e Ferraz (2000). A validação orientou-se pelas guidelines de Vilelas (2009) e conceção de Pestana e Gageiro (2005).

Resultados: A CDS-R é um instrumento válido e fiável, com valor de alfa de Cronbach de 0,971 e percentagem de variação explicada de 71,7%, que permite, aos enfermeiros especialistas em reabilitação, avaliar o grau de independência e autonomia da pessoa em processo de transição de saúde.

Conclusão: Pelos valores obtidos, considera-se que a CDS-R se encontra validada para a população portuguesa.

Palavras-chave: dependência; enfermagem; reabilitação; escala de dependência em cuidados de reabilitação; estudos de validação

 

ABSTRACT

Background: The dependence is defined by the commitment of the person’s individual capacity for self-care and its evaluation determines the implementation of a suitable and feasible therapeutic plan.

Objective: The aim of this study was the validation of the Care Dependency Scale for Rehabilitation (CDS-R), which makes it possible to evaluate, besides physical aspects, the psycho-social aspects, in particular the adjustment of the person to sickness situation.

Methodology: The translation and cultural adjustment of the CDS-R to the Portuguese language were carried out according to the guidelines of Beaton, Bombardier, Guillemin, and Ferraz (2000), in 2015. The CDS-R validation for the Portuguese language was carried out according to the guidelines of Vilelas (2009) and conception of Pestana and Gageiro (2005).

Results: The CDS-R is a valid and reliable instrument, with the total Cronbach alpha value obtained of 0.971, which allows nurses specialist in rehabilitation to evaluate the degree of independence and autonomy of the person in health transition processes.

Conclusion: From the values obtained, it is considered that the CDS-R is validated for the Portuguese population.

Keywords: dependency; nursing; rehabilitation; care dependency scale for rehabilitation; validation studies

 

RESUMEN

Marco contextual: La dependencia se define por el comprometimiento de la capacidad individual para el autocuidado de la persona, y su evaluación determina la implementación de un plan terapéutico adecuado y exequible.

Objetivo: En este estudio se pretendió validar la Care Dependency Scale for Rehabilitation (CDS-R), por el hecho de permitir evaluar, además de aspectos físicos y psicosociales, la adaptación de la persona a la situación de enfermedad.

Metodología: La traducción y adaptación cultural a la lengua portuguesa de la CDS-R se realizó en 2015, según las directrices de Beaton, Bombardier, Guillemin, y Ferraz (2000). La validación se orientó por las directrices de Vilelas (2009) y la concepción de Pestana y Gageiro (2005).

Resultados: La CDS-R es un instrumento válido y fiable, con valor de alfa de Cronbach de 0,971 y porcentaje de variación explicada del 71,7%, que permite a los enfermeros especialistas en rehabilitación evaluar el grado de independencia y autonomía de la persona en proceso de transición de la salud.

Conclusión: Por los valores obtenidos, se considera que la CDS-R se encuentra validada para la población portuguesa.

Palabras clave: dependencia; enfermería; rehabilitación; escala de dependencia en cuidados de rehabilitación; estudios de validación

 

Introdução

A existência de pessoas com diferentes graus de dependência no autocuidado é uma realidade nas sociedades desenvolvidas, bem como em Portugal (Ribeiro, Pinto, & Regadas, 2014). Estes autores reforçam que o conhecimento das capacidades de cada indivíduo para realizar o autocuidado é fundamental para estabelecer o plano terapêutico, adequá-lo à situação de dependência e selecionar as metodologias a adotar para ensinar e instruir estratégias adaptativas ou treinar capacidades remanescentes.

Este estudo tem como objetivo validar a Care Dependency Scale for Rehabilitation (CDS-R) para a população portuguesa. Esta escala, da autoria de Juliane Eichhorn-Kissel, é adequada à avaliação das necessidades de independência e autonomia da pessoa em processos de transição de saúde.

A CDS-R foi criada a partir da Care Dependency Scale (CDS), escala desenvolvida em 1994, na Holanda, por Dijkstra et al., citado por Eichhorn-Kissel (2011). À CDS-R foi acrescentado o item “capacidade para lidar”, por ser considerado importante em termos de reabilitação (Marsh & White, citado por Eichhorn-Kissel, 2011).

 

Enquadramento

A independência ou a dependência podem estar presentes em qualquer fase da vida, não sendo a idade que define a dependência, mas sim determinados processos patológicos que levam ao declínio e consequentemente à dependência (Gonçalves, 2012).

O processo de transição para a dependência é um processo complexo, multidimensional e multicausal, que se pode dever a um acontecimento não antecipado que surge de forma abrupta ou de forma progressiva, na maioria das situações devido a uma diminuição da capacidade das estruturas ou funções do organismo (Sequeira, 2010).

Ribeiro et al. (2014) consideram o autocuidado como um elemento central na vida de qualquer pessoa, e por outro lado, conceptualizam as transições como sendo sensíveis a qualquer mudança nesse autocuidado, decorrentes de alterações no processo de desenvolvimento individual ou eventos significativos de vida, pressupondo uma adaptação à dependência no autocuidado, súbita ou gradual.

Os profissionais de saúde definem a dependência como um estado em que o indivíduo, por motivos relacionados com a falta ou a perda de autonomia, nomeadamente física, psíquica ou social, precisa de ajuda para realizar as atividades básicas de vida e as atividades instrumentais de vida diária (Grelha, 2009).

O Conselho Internacional de Enfermeiros (2006), no documento Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem, define independente como sendo “o estado de dependência com as características especificas: estado de não estar dependente de alguém ou de alguma coisa para ajuda e apoio” (p. 107). Autonomia é o “direito do cliente com as características específicas: autónomo, independente, ter autocontrolo e estar orientado” (Conselho Internacional de Enfermeiros, 2006, p. 95). Daqui advém que a independência não é condição obrigatória para a autonomia, uma vez que é possível uma pessoa ser dependente e não perder a sua autonomia, ou seja, a sua capacidade de tomar decisões (Gonçalves, 2012).

Roper, Logan, e Tierney, citados por Ribeiro et al. (2014) definem, no modelo de enfermagem, que é competência do enfermeiro avaliar o grau de dependência da pessoa em cada atividade básica de vida (AVD), e reforçam que é fundamental para estabelecer o tipo de assistência e as intervenções adequadas à pessoa, visando alcançar objetivos exequíveis em cada situação.

Para avaliar o grau de dependência é fundamental a utilização de instrumentos de medida de modo a definir-se um diagnóstico rigoroso. Analisando o contexto atual, da prática clínica portuguesa, os instrumentos mais utilizados nesta área abrangem as atividades básicas, as atividades instrumentais e as atividades avançadas de vida (Sequeira, 2010). O Índice de Barthel e o Índice de Katz são os instrumentos mais utilizados para avaliação das AVDs (Sequeira, 2010). A Medida de Independência Funcional (MIF) permite avaliar o que a pessoa consegue fazer e possibilita monitorizar a funcionalidade do indivíduo num determinado momento ou ao longo do tempo. Atualmente, a Classificação Internacional da Funcionalidade (CIF), amplamente utilizada, possibilita avaliar a capacidade das pessoas, no seu constructo biológico e social e não somente na incapacidade física (Quintana et al., 2014). Apesar de ser apontada como um relevante instrumento de trabalho para a enfermagem, a sua complexidade é um entrave à generalização da sua utilização.

A tradução e a validação para o contexto português da CDS-R devem-se ao facto de esta escala avaliar, além dos aspetos físicos, os aspetos psicossociais considerados importantes num processo de reabilitação.

Assim, a CDS-R permite avaliar em que medida a pessoa é capaz de comunicar com outros; interagir com os outros, independentemente e de forma adequada; reconhecer regras e valores e de agir socialmente de forma adequada; lidar com desafios e realizar as atividades instrumentais de vida diária; usar racionalmente o tempo livre; participar nas atividades recreativas e ocupacionais; adquirir e/ou reter conhecimentos e competências aprendidas anteriormente; lidar com a sua situação atual de doença, emocional e psicologicamente.

Como anteriormente referido, a CDS-R é uma modificação da CDS, escala desenvolvida em 1994, na Holanda, por Dijkstra et al., citado por Eichhorn-Kissel (2006), com o objetivo de criar um instrumento rápido e válido que permitisse avaliar as necessidades dos utentes e a sua dependência nos lares holandeses, podendo ser utilizada em várias faixas etárias, em lares, na comunidade ou em hospitais.

A escala foi desenvolvida baseada nas 14 necessidades humanas básicas de Virgínia Henderson que acredita que a saúde é essencial para o desenvolvimento humano, sendo que a doença pode provocar dependência. Assim, o objetivo dos profissionais de saúde é permitir a transição de uma situação de dependência para uma situação de independência (Fitzpatrick & Whall, citado por Dijkstra et al., 2006).

A CDS permite avaliar o grau de dependência dos utentes em termos físicos e em termos psicossociais (Dijkstra, Buist, & Dassen, citado por Eichhorn-Kissel, 2011).

O preenchimento da escala está dependente da observação do comportamento do utente, por isso a precisão da avaliação depende do quanto o profissional de saúde conhece o utente, as suas necessidades e a forma de as satisfazer (Dijkstra et al., 2006).

Para Wingenfeld, Buescher, e Schaeffer, citado por Eichhorn-Kissel (2011), há falta de instrumentos válidos psicometricamente para avaliação da dependência de cuidados na área da reabilitação.

À CDS-R foi acrescentado o item “capacidade para lidar”, por ser considerado relevante em termos de reabilitação, uma vez que, especialmente em situações de utentes com doenças crónicas ou prolongadas, parece importante conhecer a forma como estes lidam com a sua saúde e as suas incapacidades. A implementação deste processo foi desenvolvida por um grupo de peritos ingleses constituído por enfermeiros, terapeutas e psicólogos, acompanhados por um grupo de reabilitação austríaco (Marsh & White, citado por Eichhorn-Kissel, 2011). A adição deste novo item permite fazer uma avaliação psicológica e emocional do estado do utente (Eichhorn-Kissel, 2011).

A relação entre as necessidades humanas básicas de Virgínia Henderson e a CDS-R é explanada na Tabela 1.

Cada um dos itens da escala é avaliado através de uma resposta tipo Likert, sendo que na CDS-R podem-se obter valores que variam entre 16 e 80, ou seja, quanto mais baixo o valor obtido maior o grau de dependência do utente em cuidados de enfermagem de reabilitação (Eichhorn-Kissel, 2011). Cada item da CDS-R é avaliado de 1 a 5, o valor 1 é considerado completamente dependente e o valor 5 praticamente independente (Dijkstra et al., 2006).

No estudo realizado em instituições de reabilitação austríacas sobre a utilidade clínica da CDS-R: Perceção dos enfermeiros, os resultados demonstraram que os enfermeiros necessitam em média de 12 minutos para preencher a escala e 70% dos enfermeiros consideram que a CDS-R é fácil de ser utilizada e, aproximadamente, 60% acham-na fácil de ser analisada e interpretada. Cerca de 71% dos enfermeiros consideram muito vantajoso a integração de aspetos psicossociais na escala (Eichhorn-Kissel, 2011).

Para Borrell-Carrió, Suchman, e Epstein, citados por Amorim (2009), a inclusão e avaliação das variáveis psicossociais nos instrumentos de medida é importante, uma vez que estas determinam a adoção do papel do utente no assumir da responsabilidade pelo seu próprio tratamento.

Bolander, citado por Amorim (2009) sintetiza a ideia referindo que a saúde e a doença são compreendidas como processos dinâmicos, em constante evolução, que sofrem a influência de fatores biológicos, psicológicos e sociais, em permanente interação.

 

Questão de investigação

A versão portuguesa da Care Dependency Scale for Rehabilitation evidencia propriedades psicométricas adequadas para avaliar a adaptação da pessoa em situação de doença?

 

Metodologia

O presente estudo classifica-se como do tipo metodológico de tradução/retroversão e análise psicométrica da escala CDS-R.

O processo de tradução, adaptação cultural e validação da CDS-R foi precedido por diversas fases: Pedido de autorização à autora da CDS-R e ao autor da CDS, por ser a escala precedente e grande parte dos itens se manterem na CDS-R. Os autores autorizaram todo o processo via correio eletrónico; Pedido de autorização para alteração de utilização para a 3ª pessoa do singular. A escala original fornecida pela autora Julianne Eichhorn-Kissel, encontrava-se na 1ª pessoa, de forma a ser o próprio utente a preencher a CDS-R. Como o objetivo da investigadora é a escala ser aplicada pelos enfermeiros aos utentes, foi pedida autorização à autora da escala para a alterar para a 3ª pessoa do singular. A autora da escala autorizou a alteração via correio eletrónico; Pedido de apreciação à Comissão de Ética da Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, tendo obtido parecer favorável; Pedido de autorização à Unidade de Cuidados Continuados Integrados (UCCI) de Leiria e de Figueiró dos Vinhos para todo o processo de tradução, adaptação cultural e validação da CDS-R. Contudo, o processo de validação decorreu apenas na UCCI de Leiria; Pedido de autorização aos utentes/familiares responsáveis internados na UCCI de Leiria na vertente de Média Duração e Reabilitação (UMDR), para aplicação da escala, aos quais foram explicados os objetivos do estudo e garantido o anonimato e confidencialidade dos dados.

O processo de tradução e adaptação cultural da CDS-R para a população portuguesa decorreu segundo as guidelines de Beaton, Bombardier, Guillemin, e Ferraz (2000). O processo de validação da mesma seguiu as guidelines de Vilelas (2009) e conceção de Pestana e Gageiro (2005).

Cumprindo as guidelines de Beaton et al. (2000), o processo de tradução e adaptação cultural da CDS-R integrou os seguintes estádios: Estádio I – tradução da escala CDS-R da língua de origem (inglês) para a língua final (português), por dois tradutores bilingues; Estádio II – síntese das traduções realizada pelos tradutores iniciais por um observador externo; Estádio III – realização de duas retroversões da escala por dois tradutores independentes para a língua de origem da escala (inglês); Estádio IV – reunião de um comité de peritos, constituído por metodologistas, profissionais de saúde, profissionais de línguas e os tradutores (tradutores iniciais e retrotradutores), tendo sido sintetizada uma única escala final; Estádio V – realização do pré-teste com uma amostra de 25 enfermeiros pertencentes à UCCI de Leiria e Figueiró dos Vinhos; Estádio VI – submissão ao comité de peritos de um documento com a sistematização de todos os relatórios escritos produzidos no decorrer do processo de tradução e adaptação cultural para a população portuguesa da escala CDS-R. A escala final obtida foi, ainda, retrotraduzida para o inglês e enviada aos autores da CDS e da CDS-R, via correio electrónico. Terminado todo este processo, a escala passou a designar-se Escala de Dependência de Cuidados em Reabilitação (EDC-R).

Para a validação da EDC-R, a população considerada foram os utentes internados na UCCI de Leiria na vertente de UMDR. De acordo com Pestana e Gageiro (2005), o número de indivíduos que compõem a amostra deve ser no mínimo cinco vezes maior que o número de itens presentes na escala, pelo que a amostra do estudo foi composta por 80 utentes. O processo de colheita de dados para validação da EDC-R, decorreu entre 19 de dezembro de 2015 e 4 de agosto de 2016. Constituíram-se como critérios de inclusão os utentes com mais de 18 anos, os utentes/responsável pelo internamento, autorizarem a aplicação da escala através do consentimento informado e os utentes terem domínio da língua portuguesa.

Antes da aplicação da EDC-R foi dada formação a dois enfermeiros generalistas da UCCI de Leiria. Posteriormente, a EDC-R foi aplicada a cada utente por estes enfermeiros, em que um deles a aplicou ao mesmo utente em dois momentos distintos, de forma a permitir a avaliação da estabilidade temporal da escala.

Para avaliação das propriedades psicométricas da EDC-R foi analisada a fiabilidade (consistência interna e a estabilidade temporal) e a validade de constructo através de uma análise fatorial exploratória dos itens que compõem a escala. Os dados foram tratados recorrendo ao programa IBM SPSS Statistics, versão 23.0.

 

Resultados

Os 80 utentes que constituem a amostra têm idades compreendidas entre 43 e 95 anos, a idade média é de 75,77 anos com um desvio-padrão de 10,705 anos. Quanto ao sexo, 41,3% (33) da amostra é do sexo masculino e 58,8% (47) do sexo feminino.

Em relação ao grau de escolaridade, 32,5% (26) é analfabeto, 50% (40) tem a 4ª classe, 10% (8) o ensino preparatório, 5% (4) o ensino secundário e 2,5% (2) ensino superior. O diagnóstico que motivou o internamento mais frequente foi a doença osteoarticular (31 utentes - 38,8%), seguido do AVC (22 utentes - 27,5%).

Com o objetivo de avaliar a praticabilidade e tempo necessário para aplicação da escala, foi pedido aos enfermeiros que registassem a hora de início e término de aplicação desta. Assim, o tempo necessário global para preencher a escala variou entre 2 minutos e 10 minutos, com uma média de 4,69 minutos.

Os itens em que os utentes foram mais dependentes foram o item “mobilidade” e “atividades instrumentais” e os itens em que são menos dependentes foram “padrão sono/vigília” e “comunicação”.

Para determinação da consistência interna da escala, foi avaliado o Alfa de Cronbach. O Alfa de Cronbach total obtido foi de 0,971. Os valores de Alfa de Cronbach para cada item da escala caso este fosse excluído, variam entre 0,967 e 0,973. Todas as correlações item-total são positivas. Os dois itens com correlações item-total mais baixas são a mobilidade e padrão sono/vigília (Tabela 2).

 

 

Para a avaliação da estabilidade temporal da EDC-R foi, inicialmente, calculado o Teste de normalidade da escala (Tabela 3) e posteriormente a Anova de medidas repetidas (Tabela 4). A normalidade da amostra foi testada através do teste Kolmogorov-Smirnov, determinando-se que a escala tem uma distribuição normal. Aplicou-se, de seguida, o teste Anova de medidas repetidas que mostrou que as diferenças não são estatisticamente significativas (sig > 0,05), não se encontrando diferenças nas três avaliações (F = 1,083; sig. = 0,301).

 

 

 

Para avaliar a validade de constructo da EDC-R foi realizada uma análise fatorial exploratória dos itens que compõem a escala. A escala de origem é unidimensional.

A solução não rodada revela um fator, cujos pesos (loadings) são elevados (todos > 0,5). Os valores das comunalidades são bons para esta solução. A percentagem de variação explicada é elevada, situando-se em 71,7%, pelo que se considera que a escala tem validade de constructo. A Matriz de saturação dos itens nos fatores para solução não rodada encontra-se explanada na Tabela 5.

 

 

Os valores da matriz de correlação de Pearson encontrados são muito elevados e com significado estatístico, o que revela uma tendência que pontuações mais elevadas numa avaliação sejam, também, mais elevadas nas outras avaliações, como revela a matriz de correlação de Pearson (Tabela 6).

 

Discussão

O estudo foi realizado com uma amostra não probabilística de 80 utentes da UCCI de Leiria na vertente de média duração e reabilitação, portanto, a amostra não cumpre a representatividade a nível nacional, o que pode ser considerado uma fraqueza metodológica e uma limitação à validação da escala.

A amostra obtida (80 utentes) para a validação da EDC-R para a população portuguesa é uma população envelhecida, com uma média de idade de 75,77 anos, maioritariamente feminina (58,8%), com baixo nível de escolaridade (50% dos utentes têm a 4ª classe), cujos principais motivos de internamento na UCCI, na vertente de UMDR, são as doenças osteoarticulares e o AVC.

A caracterização sociodemográfica da amostra está de acordo com os dados fornecidos pelo Ministério da Saúde (2014) no Relatório de Monitorização do desenvolvimento e da atividade da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), que caracteriza a população da RNCCI como envelhecida (83,7% da população tem idade superior a 65 anos), maioritariamente feminina (54,7% dos utentes), com baixo nível de escolaridade (com 26% sem instrução e 64% com escolaridade entre 1 e 6 anos) e com elevada incapacidade e dependência (96,2% da população). É, também, referido em termos clínicos, que o principal motivo de referenciação para a UMDR é a dependência nas AVD (95%), sendo que 80% dos utentes são referenciados por necessidade de reabilitação, 19% por doença cardiovascular e 10% por tratamento de feridas/úlceras de pressão.

O tempo médio necessário para o preenchimento da escala variou entre 2 e 10 minutos, com uma média de 4,69 minutos. Estes valores vão ao encontro dos valores obtidos pela autora da escala, no estudo que realizou sobre a utilidade clínica da CDS-R: Perceção dos enfermeiros em que os resultados demonstraram que os enfermeiros necessitaram em média de 12 minutos para preencher a escala, e ao encontro do referido por McColl, Christiansen, e König-Zahn, citados por Eichhorn-Kissel, 2011, que defendem que a aplicação de um instrumento não deve demorar mais de 15 minutos a ser realizada, pois caso contrário será impraticável a sua utilização na prática clínica.

As médias dos valores obtidos situam-se entre 2 e 3, sendo que os itens em que os utentes são mais dependentes foram o item “mobilidade” e “atividades instrumentais” e os itens em que são menos dependentes foram “padrão sono/vigília” e “comunicação”.

Os dados obtidos estão de acordo com os resultados obtidos por Sequeira (2010) no estudo que realizou com 184 idosos dependentes (com mais de 60 anos e dependentes à menos de 2 anos), em que, para avaliação das atividades instrumentais e após aplicação do índice de Lawton, verificou que 67,3% dos idosos se encontravam severamente dependentes e 32,7% moderadamente dependentes, neste tipo de atividade.

Para avaliação das propriedades psicométricas da EDC-R foi analisada a fiabilidade (consistência interna e estabilidade temporal) e a validade de constructo.

O valor obtido da consistência interna da escala avaliada através do alfa de Cronbach foi de 0,971. Os valores obtidos são considerados aceitáveis de acordo com o referido por Polit e Beck, citado por Eichhorn-Kissel (2011), que referem que os valores de consistência interna de um instrumento devem ser de 0,90 ou mais para permitir a aplicação a nível individual. Também para Nunnally, Bernstein, LoBiondo-Wood, e Haber, citado por Vilelas (2009), os valores considerados aceitáveis para este parâmetro estão entre 0,70 e 0,90. O valor obtido é idêntico ao valor da autora original da CDS-R que foi de 0,97.

Os valores de alfa de Cronbach obtidos, no caso de exclusão de cada um dos itens que compõem a escala, variaram entre 0,967 e 0,973. Todas as correlações item-total são positivas. Os dois itens com correlações item-total mais baixas são a “mobilidade” e “padrão sono/vigília”, ou seja, estes itens não estão a contribuir para a consistência interna da escala, o que poderá estar relacionado com as características da amostra, uma vez que são utentes internados na vertente de média duração e reabilitação e, como tal, com uma elevada dependência a nível da mobilidade. O item “padrão sono/vigília” foi mantido por ser considerada uma necessidade humana básica, já referida por Virgínia Henderson.

Os resultados da aplicação do Anova de medidas repetidas mostraram que as diferenças não são estatisticamente significativas (sig. > 0,05), não se encontrando diferenças nas três avaliações (F = 1,083; sig. = 0,301). Isto significa que os valores obtidos nas três avaliações não são estatisticamente significativos, garantindo a estabilidade temporal da escala.

A análise fatorial exploratória dos itens que compõem a EDC-R mostra que a percentagem de variação explicada é elevada, situando-se em 71,7%, pelo que se considera que a escala tem validade de constructo. A solução não rodada revela 1 fator, cujos pesos (loadings) são elevados (todos > 0,5). Os valores das comunalidades são bons para esta solução. Optou-se pela solução não rodada, pois como afirma Laros (2005) o objetivo do processo de rotação é a obtenção de uma estrutura fatorial simples. E, ainda, por se tratar de uma escala de origem unidimensional de apenas um fator e todos os pesos (loadings) serem elevados.

Ainda, os valores da matriz de correlação de Pearson encontrados confirmam a tendência de que pontuações mais elevadas numa avaliação sejam mais elevadas nas outras duas avaliações.

Atualmente em Portugal, os instrumentos mais utilizados para avaliar o nível de dependência abrangem as atividades básicas, as atividades instrumentais e as atividades avançadas de vida (Sequeira, 2010). A EDC-R distingue-se destas escalas por permitir avaliar aspetos psicossociais, nomeadamente a adaptação da pessoa à sua situação de doença, através do item “capacidade para lidar”.

A EDC-R torna-se um instrumento de medida que avalia a dependência, nos seus aspetos físicos e psicossociais, determinantes no processo de reabilitação.

 

Conclusão

Com base nos objetivos delineados inicialmente, podem ser realçadas algumas conclusões alicerçadas nos resultados da pesquisa efetuada.

Para a correta avaliação e quantificação do grau de dependência, os instrumentos de medida utilizados devem viabilizar a mensuração dos fatores funcionais e dos fatores psicossociais, nomeadamente a perceção da doença e a adaptação da pessoa a esta, o que influencia o seu processo de reabilitação.

De forma a dar resposta a esta necessidade, escolheu-se validar para a população portuguesa a CDS-R que, pela tradução e adaptação, passou a designar-se de EDC-R, uma vez que esta serve com supremacia este propósito, não se distanciando dos autocuidados, centrando-se na pessoa e não na sua dependência, o que permite manter a variabilidade necessária e fundamental a uma prática de enfermagem de reabilitação individualizada.

A consistência interna da escala avaliada através do Alfa de Cronbach (0,971) é idêntico ao valor da autora original da CDS-R (0,97). A análise fatorial exploratória dos itens que compõem a escala mostra que a EDC-R tem validade de constructo (71,7%).

Pelos valores obtidos, considera-se que a EDC-R se encontra validada para a população portuguesa.

Em estudos futuros, sugere-se a utilização de uma amostra de maior dimensão e representativa da população portuguesa, de modo a confirmar as propriedades psicométricas da EDC-R, permitindo a generalização dos resultados para a totalidade da população portuguesa.

O objetivo geral foi concretizado, com a validação para a população portuguesa da EDC-R. A EDC-R é um instrumento disponível à comunidade clínica e científica de enfermeiros portugueses, dirigida essencialmente à prática de enfermeiros especialistas em reabilitação, para utilização quer em contexto de investigação quer na prática clínica, em utentes com processos de transição em saúde. Pelo facto de a EDC-R permitir avaliar, além de aspetos físicos, os aspetos psicossociais, nomeadamente a adaptação da pessoa à sua situação de doença, existe a convicção que possa motivar o desenvolvimento de estratégias eficazes que contribuam para a melhoria das intervenções dos enfermeiros especialistas em reabilitação.

 

Referências bibliográficas

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Recebido para publicação: 05.07.18

Aceite para publicação: 28.10.18

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