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Revista de Enfermagem Referência
versão impressa ISSN 0874-0283versão On-line ISSN 2182-2883
Rev. Enf. Ref. vol.serV no.1 Coimbra jan. 2020
https://doi.org/10.12707/RIV19063
ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)
RESEARCH PAPER (ORIGINAL)
Qualidade de vida do doente portador de patologia oncológica da próstata
Quality of life of patients with prostate cancer
Calidad de vida de los pacientes con cáncer de próstata
Joana Margarida Pinheiro Teixeira*1
https://orcid.org/0000-0001-7430-1488
Germano Rodrigues Couto2
https://orcid.org/0000-0002-5423-7375
Ana Paula Prata3
https://orcid.org/0000-0001-7552-9716
Pedro Lopes Ferreira4
https://orcid.org/0000-0002-9448-9542
1 Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. Hospital Fernando Pessoa, Gondomar, Portugal
2 Universidade Fernando Pessoa, Porto, Portugal
3 Escola Superior de Enfermagem do Porto, Porto, Portugal
4 Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal
RESUMO
Enquadramento: O cancro da próstata é a segunda principal causa de morte por cancro nos homens. O diagnóstico e tratamento podem provocar alterações significativas na vida dos homens e, por consequência, modificar a sua qualidade de vida.
Objetivo: Avaliar as alterações na qualidade de vida do doente com patologia oncológica da próstata, desde o momento do diagnóstico da doença até aos 6 meses de tratamento.
Metodologia: Foi desenvolvido um estudo descritivo, analítico e longitudinal com a participação de doentes oncológicos, utilizando as escalas HRQoL, SF-12 e EQ-5D em quatro momentos.
Resultados: Foram observadas alterações em dimensões da QVRS ao longo de quatro momentos de avaliação, bem como ao nível da funcionalidade e dos sintomas.
Conclusão: Este estudo apresenta novas evidências sobre a QVRS dos doentes portadores de patologia oncológica da próstata, nomeadamente em dimensões relacionadas com funções emocionais e sociais, fadiga, náusea e vómito, insónia, sintomas de obstipação e diarreia, atividade sexual, sintomas urinários, intestinais e relacionados com o tratamento hormonal, desde o diagnóstico da doença aos 6 meses de tratamento. Uma intervenção dos profissionais de saúde direcionada para os domínios mais afetados pode proporcionar uma melhor qualidade de vida aos doentes.
Palavras-chave: qualidade de vida; neoplasias da próstata; medidas de resultados relatados pelo paciente
ABSTRACT
Background: Prostate cancer is the second leading cause of death from cancer in men. Its diagnosis and treatment can significantly change their life and affect their quality of life.
Objective: To assess the changes in the quality of life of patients with prostate cancer, from diagnosis to the 6th month of treatment.
Methodology: A descriptive, analytical, and longitudinal study was conducted with prostate cancer patients, using HRQoL, SF-12, and EQ-5D scales in four moments.
Results: Changes were found in HRQoL dimensions across the four moments, as well as in functioning and symptoms.
Conclusion: This study provides new evidence on dimensions of HRQoL of patients with prostate cancer, namely emotional and social functions, fatigue, nausea and vomiting, insomnia, constipation and diarrhea symptoms, sexual activity, urinary, bowel symptoms, and hormonal treatment-related symptoms, from diagnosis to the 6th month of treatment. Health professionals should intervene in the most affected domains to improve the quality of life of prostate cancer patients.
Keywords: quality of life; prostatic neoplasms; patient reported outcome measures
RESUMEN
Marco contextual: El cáncer de próstata es la segunda causa principal de muerte por cáncer en los hombres. Su diagnóstico y tratamiento puede causar cambios significativos en la vida de los hombres y, en consecuencia, alterar su calidad de vida.
Objetivo: Evaluar los cambios en la calidad de vida de los pacientes con cáncer de próstata, desde el diagnóstico de la enfermedad hasta el 6 mes de tratamiento.
Metodología: Se desarrolló un estudio descriptivo, analítico y longitudinal con la participación de pacientes oncológicos, para el cual se utilizaron las escalas HRQoL, SF-12 y EQ-5D en cuatro momentos.
Resultados: Cambios en las dimensiones de la HRQoL a lo largo de cuatro etapas de evaluación, y en el nivel de funcionamiento y de síntomas.
Conclusión: Este estudio aporta nuevas evidencias sobre la HRQoL de los pacientes con cáncer de próstata, concretamente sobre las dimensiones como funciones emocionales y sociales, la fatiga, las náuseas y los vómitos, el insomnio, los síntomas de estreñimiento y diarrea, la actividad sexual, los síntomas urinarios e intestinales y el tratamiento hormonal, desde el diagnóstico de la enfermedad hasta los 6 meses de tratamiento. La intervención de los profesionales de la salud orientada hacia los dominios más afectados puede garantizar a los pacientes una mejor calidad de vida.
Palabras clave: calidad de vida; neoplasias de la próstata; medición de resultados informados por el paciente
Introdução
O cancro da próstata representa 12% de todos os casos de cancro na Europa. Nos países desenvolvidos, o cancro da próstata é responsável por uma em cada 10 mortes por cancro nos homens (Sequeira et al., 2015). Mais de 1 milhão de casos são diagnosticados por ano e a mortalidade aumentou para mais de 300,000 mortes por ano (Cooperberg & Chan, 2017). O cancro da próstata é a segunda principal causa de morte por cancro nos homens, apenas ultrapassado pelo cancro do pulmão (Sequeira et al., 2015). O diagnóstico e o tratamento do cancro da próstata podem alterar significativamente a vida dos homens e, por conseguinte, alterar a sua qualidade de vida (QV). Trata-se de um tema atual, cuja elevada incidência e prevalência motivaram a realização deste estudo. O objetivo deste estudo foi avaliar as alterações na QV do doente com patologia oncológica da próstata, desde o momento do diagnóstico da doença até aos 6 meses de tratamento.
Enquadramento
O cancro da próstata é o tumor mais frequente em homens com mais de 50 anos de idade, representando cerca de 3,5% de todas as mortes a nível mundial e 10% de todas as mortes por cancro nos homens (Organisation for Economic Co-operation and Development, 2018; Sequeira et al., 2015). A incidência e a mortalidade variam de acordo com as regiões geográficas e as populações, refletindo impactos multifactoriais da variação genética, de fatores relacionados com a nutrição, estilo de vida e ambiente, do acesso aos cuidados de saúde, e de variaçaões na prestação de serviços de rastreio do antígeno específico da próstata (PSA; Cooperberg & Chan, 2017). Esta é uma doença predominante em homens mais velhos, ou seja, com idade igual ou superior a 70 anos. De acordo com o National Cancer Institute, a média de idade, no momento do diagnóstico, é de 68 anos, e 71,2% das mortes por cancro da próstata ocorrem em homens com idade igual ou superior a 75 anos. Com o crescente envelhecimento da população e o aumento da esperança média de vida nos países desenvolvidos, os casos de cancro da próstata devem aumentar drasticamente no futuro (Droz et al., 2010). À medida que a população envelhece, há uma necessidade urgente de criar uma forma de caracterizar a idade funcional dos doentes idosos com cancro, a fim de adaptar as decisões de tratamento e estratificar os resultados com base noutros fatores para além da idade cronológica, bem como desenvolver intervenções de otimização do tratamento do cancro (Hurria, Lachs, Cohen, Muss, & Kornblith, 2006). Existe uma grande heterogeneidade nas funções físicas e psicológicas dos doentes idosos com cancro que partilham a mesma idade cronológica. O envelhecimento é um processo altamente individualizado e as mudanças envolvidas nesse processo não podem ser todas previstas apenas com base na idade cronológica. Alguns irão tolerar a quimioterapia tão bem quanto os seus pares mais jovens, mas outros poderão experienciar uma grande toxicidade, tendo necessidade de reduzir, adiar ou interromper permanentemente o tratamento, ou mesmo estar numa situação na qual a melhor opção de tratamento não é a quimioterapia. Portanto, os oncologistas enfrentam uma importante questão no tratamento de doentes mais velhos com cancro, ou seja, a escolha do tratamento mais adequado para cada doente (Pallis, Wedding, Lacombe, Soubeyran, & Wildiers, 2010). Foram desenvolvidos instrumentos específicos de avaliação da qualidade de vida relacionada com a saúde (QVRS), especialmente em adultos idosos, para identificar de forma geral os sintomas e as necessidades de grupos específicos. As alterações longitudinais nas funções físicas, na carga dos sintomas e na avaliação da QV dos doentes podem promover o desenvolvimento de uma intervenção interdisciplinar centrada no doente (Sequeira et al., 2015; Wallwiener et al., 2017). A Organização Mundial da Saúde (OMS) define QV como “a percepção que um indivíduo tem sobre a sua posição na vida, dentro do contexto dos sistemas de cultura e valores nos quais está inserido e em relação aos seus objectivos, expectativas, padrões e preocupações” (World Health Organization, 2019, p. 1). Este estudo foi desenvolvido tendo em conta a necessidade de avaliar a QVRS em doentes portadores de patologia oncológica da próstata e identificar quais os domínios da QV que são mais afetados.
Questão de investigação
Quais são as mudanças na qualidade de vida dos doentes portadores de patologia oncológica da próstata, desde o momento do diagnóstico da doença aos 6 meses de tratamento?
Metodologia
Foi realizado um estudo descritivo, analítico e longitudinal com a participação de doentes oncológicos numa unidade hospitalar oncológica no norte de Portugal. A amostra não-probabilística de conveniência foi composta por 60 doentes em ambulatório que estiveram presentes em consultas médicas entre outubro de 2015 e julho de 2016. Os critérios de inclusão utilizados foram: doentes com idade superior a 18 anos e portadores de patologia oncológica da próstata que aceitaram participar no estudo. Foram excluídos os doentes incapazes de ler e escrever em português e os doentes com doenças neurológicas e cognitivas incapazes de preencher o questionário.
Foram utilizadas escalas genéricas e específicas da QVRS em doentes oncológicos. Entre as escalas criadas especificamente para doentes oncológicos, selecionamos o questionário EORTC QLQ-C30, que mede as seguintes dimensões: (i) Estado de saúde/qualidade de vida global; (ii) Estado funcional, incluindo funcionamento físico, funcionamento de papel, funcionamento emocional, funcionamento cognitivo e funcionamento social; e (iii) Sintomas, por exemplo, fadiga, náuseas e vômitos, dor, dispneia, insónia, perda de apetite, obstipação, diarreia e dificuldades financeiras (Fayers et al., 2001; Ferreira, 1997). Também foi aplicado o módulo específico EORTC QLQ-PR25 para o cancro da próstata, que inclui escalas funcionais (atividade sexual e funcionamento sexual) e de sintomas (sintomas urinários, sintomas intestinais e sintomas relacionados com o tratamento hormonal, bem como um item para avaliar o impacto da utilização de produtos para a incontinência; van Andel et al., 2008).
As pontuações de ambas as escalas EORTC variam entre 0 e 100. No caso das escalas funcionais e da escala sobre a QV global, um resultado mais elevado representa um nível mais elevado de funcionamento ou uma maior QV global. Resultados mais elevados nas escalas dos sintomas representam mais problemas, isto é, pior qualidade de vida. Os instrumentos foram preenchidos pelos próprios doentes após uma informação contextual apresentada pelo investigador.
Relativamente aos instrumentos genéricos sobre o estado de saúde e a qualidade de vida, o questionário SF-12 avalia essencialmente a dimensão física e mental do estado de saúde (Ferreira, 2000a; Ferreira, 2000b). O questionário EQ-5D é um instrumento genérico autoadministrado para avaliação do estado de saúde. As dimensões avaliadas por este instrumento são: (i) Mobilidade, (ii) Cuidados pessoais, (iii) Atividades habituais, (iv) Dor/desconforto e (v) Ansiedade/depressão (Herdman et al., 2011). É ainda possível obter o valor que cada indivíduo atribui ao seu estado de saúde, numa escala de 0 a 100, representando o pior e o melhor estado de saúde imaginável, respetivamente.
Os dados foram recolhidos em quatro momentos, coincidindo com o acompanhamento nas consultas de enfermagem. A fim de compreender as alterações na QVRS, e de acordo com os momentos definidos pela instituição para o acompanhamento dos doentes, iniciou-se a recolha de dados na primeira consulta após o diagnóstico (M0), ao 1º mês (M1), ao 3º mês (M2) e ao 6º mês (M3) após o início do tratamento.
Os dados recolhidos foram analisados com recurso ao IBM SPSS® Statistics, versão 25.0 para Windows. Foram usadas estatísticas descritivas para descrever a amostra e calcular os valores médios para cada instrumento, tendo em conta os quatro momentos de avaliação. Estes valores foram comparados através de uma ANOVA, seguida do teste post-hoc de Scheffé.
Ao longo deste estudo, todas as considerações ético-legais foram cumpridas. Destacamos a natureza voluntária da participação e a assinatura de um termo de consentimento livre e esclarecido por cada participante. Este estudo obteve o parecer favorável do Conselho de Administração da instituição e da Comissão de Ética (Parecer n.º 107/014).
Resultados
A Tabela 1 destaca as características da amostra utilizada no presente estudo. Estes resultados mostram que a média de idades foi 69,9 anos, variando entre um mínimo de 51 anos e um máximo de 90 anos. A faixa etária 65-74 anos inclui 36,7% dos doentes, a maioria dos quais com menos do que o 12º ano de escolaridade (53,3%) e reformados (53,3%).
Relativamente ao tipo de tratamento, 45% dos doentes não realizaram qualquer tratamento cirúrgico, isto é, quimioterapia e/ou radioterapia e/ou braquiterapia e/ou hormonoterapia, e 30% dos doentes realizaram uma cirurgia.
Os resultados apresentados na Tabela 2 referem-se às alterações na QVRS reportadas pelos participantes ao longo do tempo para cada domínio dos instrumentos QLQ-C30 e do módulo PR25. Os sinais =, ↗ e ↘ representam a ausência de diferenças, o aumento e a diminuição dos valores médios, respetivamente, ao longo dos quatro momentos de avaliação.
Em primeiro lugar, é importante referir que não foram observadas diferenças significativas entre M0 e M1 relativamente ao funcionamento e os sintomas, quer pelos instrumentos genéricos quer pelos instrumentos específicos de avaliação do cancro da próstata. Apesar de, de uma forma geral, o QLQ-C30 não apresentar diferenças significativas ao longo dos quatro momentos, foram observadas algumas diferenças em relação ao estado funcional e aos sintomas. De facto, após uma ligeira redução não significativa entre M0 e M1, a dimensão emocional apresentou melhorias funcionais significativas entre M1 e M3 (p = 0,030) e entre M2 e M3 (p = 0,016). Além disso, com uma menor diferença significativa, a dimensão social aumentou entre M1 e M2 (p = 0,015).
Em relação aos sintomas, foram observadas diferenças significativas entre M1 e M2 em termos da fadiga (p = 0,014), náuseas e vómitos (p = 0,031), insónia (p = 0,028), obstipação (p = 0,017) e diarreia (p = 0,014). Por outro lado, houve uma diminuição significativa entre M1 e M2 na dor (p = 0,021) e outros sintomas, tais como insónia (p = 0,026) e perda de apetite (p = 0,007). A diminuição das dificuldades financeiras (p = 0,015) também foi significativa entre M2 e M3.
Relativamente ao módulo PR25, a atividade sexual registou um aumento significativo entre M1 e M2 (p < 0,001) e houve uma diminuição nos sintomas urinários (p = 0,002), intestinais (p = 0,05) e relacionados com o tratamento hormonal (p = 0,001). Não foi observada nenhuma diferença significativa entre M2 e M3.
Os doentes preencheram outro instrumento, o SF-12, que mede a perceção do indivíduo sobre o seu estado de saúde. Foi observada uma diferença significativa na dimensão mental entre M1 e M2 (p = 0,042) e entre M2 e M3 (p = 0,028), tal como demonstra a Tabela 3.
Por fim, a avaliação da perceção da qualidade de vida através do EQ-5D-5L, em linha com a dimensão da qualidade de vida no EORTC QLQ-C30, não revelou mudanças significativas entre os vários momentos de avaliação. De referir que os instrumentos utilizados foram testados quanto à sua validade e fiabilidade interna e todos obtiveram um alfa de Cronbach com uma consistência muito boa (> 0,9).
Discussão
A faixa etária da amostra estudada foi 51-60 anos, com maior frequência entre 61 e 74 anos (36,7%) e uma média de 69,9 anos, o que está de acordo com a literatura na qual a maioria dos diagnósticos de cancro da próstata estão associados a homens com idade superior a 65 anos (Quijada, Fernandes, Oliveira, & Santos, 2017).
Quanto ao estado civil, 68,3% dos doentes eram casados. De referir que os doentes casados apresentaram melhores resultados em alguns domínios, nomeadamente nos domínios físico e social (Kao et al., 2015). Relativamente a outros determinantes, 53,3% dos doentes na amostra estudaram até ao 12º ano. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, 21,9% da população portuguesa em 2018 completou o 12º ano, cujos valores são inferiores aos encontrados no presente estudo. Quanto à situação de reforma, 53,3% dos doentes nesta amostra eram reformados. A mesma fonte refere que, em 2017, 41% da população portuguesa estava reformada, valores inferiores aos encontrados no presente estudo (Instituto Nacional de Estatística, 2019).
Analisando a evolução do estado de saúde global, e considerando os diferentes momentos de avaliação, os melhores resultados foram encontrados na comparação entre o M1 e o M2, principalmente em relação ao aumento da função emocional e social e à evolução dos sintomas de fadiga, náuseas e vómitos, insónia, obstipação e diarreia. A diminuição da dor, insónia, perda de apetite e dificuldades financeiras também foi evidente entre M2 e M3. Estes resultados também foram confirmados por outros estudos (Cooperberg & Chan, 2017; Sequeira et al., 2015), demonstrando que, nos primeiros 6 meses após a intervenção cirúrgica, os domínios social, físico e sexual registaram os piores resultados e os melhores resultados foram surgindo 6 e 12 meses após a intervenção. Por outro lado, os domínios relacionados com dor, diarreia, dificuldades financeiras, fadiga e insónia foram considerados fatores que contribuem para alterações na QVRS num estudo sobre cancro da próstata (Torvinen et al., 2013). A fadiga, a dor e a insónia também foram apresentadas como fatores geradores de mudanças (Sequeira et al., 2015).
Relativamente a aspetos mais específicos relacionados com a próstata, entre M1 e M3, houve um aumento significativo na atividade sexual e uma diminuição significativa nos sintomas urinários, intestinais e relacionados com o tratamento hormonal. No estudo realizado por Chien et al. (2017), a incontinência urinária apresentou piores resultados nos primeiros meses após a cirurgia. Este mesmo estudo refere que a qualidade de vida dos doentes que foram submetidos à cirurgia sofreu um impacto maior em M3, resultados diferentes daqueles encontrados nesta amostra, onde o pior impacto foi registado entre M1 e M2.
Por outro lado, a revisão da literatura revelou que, em alguns estudos, os homens com cancro da próstata apresentam mudanças na QVRS, especialmente problemas urinários (Eton & Lepore, 2002). Relativamente ao funcionamento sexual e à ausência de diferenças estatisticamente significativas ao longo do período em análise, podem ser considerados problemas de manutenção da privacidade, tal como afirmado por Sequeira et al. (2015). Por fim, Chien et al. (2017) concluíram que existem mudanças no funcionamento sexual, independentemente do tipo de tratamento, pois o funcionamento sexual diminui nos primeiros 24 meses, apresentando um declínio maior nos primeiros meses após o doente ser submetido a uma cirurgia. No entanto, o declínio no presente estudo não foi significativo. Este estudo reforça a importância de valorização da avaliação da qualidade de vida pelos profissionais de saúde de forma rotineira, a fim de identificar as dimensões afetadas, algo que atualmente não é realizado nos hospitais portugueses, de modo a que os cuidados sejam personalizados e, não menos importante, a saúde seja o valor essencial no processo de decisão clínica.
Conclusão
Os resultados do presente estudo fornecem novas evidências sobre a QVRS de doentes portadores de patologia oncológica da próstata, nomeadamente nas dimensões relacionadas com Funções Emocionais e Sociais, Fadiga, Náuseas e vómitos, Insónia, Sintomas de Obstipação e Diarreia, Atividade sexual, Sintomas Urinários e Intestinais e relacionados com o Tratamento hormonal, a partir do diagnóstico da doença até aos seis meses de tratamento. Estes resultados sugerem a importância de implementar a avaliação da QVRS como rotina, a fim de identificar os domínios da qualidade de vida mais afetados e que devem ser geridos através de uma prática clínica centrada no doente, nomeadamente pelos enfermeiros que são os principais agentes durante o período de internamento. Uma intervenção centrada nos domínios mais afetados pode contribuir para uma melhoria contínua da qualidade de vida dos doentes.
A metodologia utilizada permitiu identificar fatores que dificilmente seriam percetíveis através de outras estratégias de recolha de dados. Este estudo apresenta algumas limitações, nomeadamente quanto ao tamanho da amostra. De facto, se a amostra fosse maior, poderíamos, eventualmente, obter respostas mais robustas em alguns domínios da qualidade de vida. Por outro lado, a recolha de dados foi complexa devido ao tamanho dos questionários e à dinâmica das instituições, o que levou à perda de alguns doentes elegíveis para participação no estudo.
No entanto, as escalas utilizadas revelaram ser instrumentos de avaliação adequados para o aprofundamento do fenómeno em estudo. Seria importante desenvolver ferramentas mais simples que exijam menos tempo e recursos para monitorizar a QVRS de forma regular, não só nestes momentos mas também durante todo o processo de acompanhamento do doente oncológico. É recomendada a realização de novos estudos longitudinais para monitorizar a QVRS destes doentes.
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Contribuição de autores
Conceptualização: Teixeira, J. M.
Análise formal: Teixeira, J. M., Couto, G. R., Prata, A. P., Ferreira, P. L.
Metodologia: Teixeira, J. M.
Investigação: Teixeira, J. M., Couto, G. R., Prata, A. P., Ferreira, P. L.
Redação - preparação do rascunho original: Couto, G. R., Teixeira, J. M., Prata, A. P., Ferreira, P. L.
Redação - revisão e edição: Couto, G. R., Teixeira, J. M., Prata, A. P., Ferreira, P. L.
Supervisão: Teixeira, J. M., Couto, G. R., Prata, A. P., Ferreira, P. L.
* Autor de correspondência:
Joana Margarida Pinheiro Teixeira
Como citar este artigo: Teixeira, J. M., Couto, G. R., Prata, A. P., & Ferreira, P. L. (2019). Qualidade de vida do doente portador de patologia oncológica da próstata. Revista de Enfermagem Referência, 5(1), e19063. doi: 10.12707/RIV19063.
Recebido: 09.09.19
Aceite: 21.11.19