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Revista de Enfermagem Referência
versão impressa ISSN 0874-0283versão On-line ISSN 2182-2883
Rev. Enf. Ref. vol.serV no.2 Coimbra abr. 2020
https://doi.org/10.12707/RIV19081
ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)
RESEARCH PAPER (ORIGINAL)
Avaliação do debriefing estruturado como estratégia pedagógica em enfermagem de saúde familiar
Evaluation of structured debriefing as a pedagogical strategy in family health nursing
Evaluación del debriefing estructurado como estrategia pedagógica en la enfermería de salud familiar
Margarida Alexandra Nunes Carramanho Gomes Martins Moreira da Silva*1
https://orcid.org/0000-0003-0031-271X
Maria Teresa de Oliveira Soares Tanqueiro1
https://orcid.org/0000-0003-1606-7464
Cristina Maria Figueira Veríssimo1
https://orcid.org/0000-0002-8836-2828
Marília Maria Andrade Marques Conceição Neves1
https://orcid.org/0000-0001-6087-1869
Clarinda Maria Prazeres Ferreira Silva da Rocha Cruzeiro1
https://orcid.org/0000-0003-2926-8804
Verónica Dias Coutinho1
https://orcid.org/0000-0001-8073-4562
1 Unidade de Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem. Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Coimbra, Portugal
RESUMO
Enquadramento: O impacto da simulação com debriefing estruturado como estratégia pedagógica na formação em enfermagem é hoje inquestionável, contudo, não se encontraram referências à utilização desta estratégia no ensino de enfermagem em saúde familiar.
Objetivo: Avaliar o debriefing estruturado associado à simulação em consultas de enfermagem à família como estratégia pedagógica.
Metodologia: Estudo quantitativo, descritivo e transversal. Amostra de 169 estudantes, 2º ano, do Curso de Licenciatura em Enfermagem. Aplicada a Escala de Avaliação do Debriefing Associado à Simulação (EADaS), em aula de prática laboratorial.
Resultados: A escala revela média global de 4,25 (DP = 0,400) mínimo 3,03 e máximo 5,00. Verifica-se média mais elevada (M = 4,58; DP = 0,462) na Dimensão Valor Afetivo e mais baixa (M = 3,87; DP = 0,621) na Dimensão Valor Psicossocial. A Dimensão Valor Cognitivo apresenta M = 4,35 pontos e DP = 0,435.
Conclusão: O debriefing estruturado associado à simulação, revelou-se uma estratégia pedagógica adequada à aquisição e desenvolvimento de competências dos estudantes em enfermagem de saúde familiar, facilitando a aprendizagem crítica e reflexiva essencial para intervir na família, devendo implementar-se nesta área.
Palavras-chave: debriefing; simulação; enfermagem familiar
ABSTRACT
Background: The impact of simulation with structured debriefing as a pedagogical strategy in nursing education is unquestionable today. However, no references were found regarding the use of this strategy in family health nursing education.
Objective: To evaluate structured debriefing associated with simulation as a pedagogical strategy in family nursing consultations.
Methodology: A quantitative cross-sectional descriptive study was conducted with a sample of 169 students attending the 2nd year of the Bachelor's Degree in Nursing. The Simulation Debriefing Assessment Scale (Escala de Avaliação do Debriefing Associado à Simulação - EADaS) was applied in laboratory classes.
Results: The scale had an overall mean score of 4.25 (SD = 0.400), with a minimum of 3.03 and a maximum of 5.00. The highest mean scores (M = 4.58; SD = 0.462) were found in the Affective Value Dimension and the lowest mean scores (M = 3.87; SD = 0.621) were found in the Psychosocial Value Dimension. The Cognitive Value Dimension had M = 4.35 points and SD = 0.435.
Conclusion: Structured debriefing associated with simulation proved to be a suitable pedagogical strategy for the acquisition and development of students' competencies in family health nursing, facilitating critical and reflexive learning that is essential to intervene within the family and should, therefore, be implemented in this area.
Keywords: debriefing; simulation; family nursing
RESUMEN
Marco contextual: El impacto de la simulación con debriefing estructurado como estrategia pedagógica en la formación en enfermería es incuestionable hoy en día. Sin embargo, no se encontraron referencias al uso de esta estrategia en la enseñanza de la enfermería de salud familiar.
Objetivo: Evaluar el debriefing estructurado asociado a la simulación en las consultas de enfermería familiar como estrategia pedagógica.
Metodología: Estudio cuantitativo, descriptivo y transversal. Muestra de 169 estudiantes de 2.º año del Grado de Enfermería. Se aplicó la Escala de Evaluación del Debriefing Asociado a la Simulación (Escala de Avaliação do Debriefing Associado à Simulação - EADaS) en las prácticas de laboratorio.
Resultados: La escala muestra una media global de 4,25 (DE = 0,400), mínimo de 3,03 y máximo de 5,00. La media más alta (M = 4,58; DE = 0,462) se encuentra en la Dimensión del Valor Afectivo y la más baja (M = 3,87; DE = 0,621) en la Dimensión del Valor Psicosocial. La Dimensión del Valor Cognitivo tiene M = 4,35 puntos y DE = 0,435.
Conclusión: El debriefing asociado a la simulación demostró ser una estrategia pedagógica adecuada para la adquisición y el desarrollo de competencias de los estudiantes en enfermería de salud familiar, pues facilita el aprendizaje crítico y reflexivo esencial para intervenir en la familia, por lo que se debería poner en práctica en esta área.
Palabras clave: debriefing; simulación; enfermería de la familia
Introdução
Os cuidados à família têm acompanhado o desenvolvimento da enfermagem enquanto profissão e disciplina do conhecimento, sendo hoje notável a responsabilidade exigida aos enfermeiros no acompanhamento da saúde da família ao longo do ciclo vital (Silva, 2016).
Na literatura de enfermagem de saúde familiar identificam-se dificuldades na construção das práticas clínicas dos enfermeiros relacionadas com o desfasamento entre a teoria e a prática (Figueiredo, 2009; Hanson, 2005; Martins, 2004; Santos, 2012; Segaric & Hall, 2005; Silva, 2016; Wright & Leahey, 2013). Um estudo primário, realizado na região centro de Portugal, revela que os enfermeiros percecionam divergência entre as suas competências e as exigências das orientações políticas na área da enfermagem de saúde familiar, competindo às escolas de enfermagem encontrar estratégias pedagógicas que facilitem a aquisição e desenvolvimento de competências dos estudantes nesta área (Silva, 2016).
Para o desenvolvimento destas competências são fundamentais os modelos pedagógicos construtivistas, onde a aprendizagem experiencial assume um elemento central e a simulação das práticas clínicas uma estratégia com valor reconhecido (Martins, 2017).
Neste sentido, pretende-se com este estudo avaliar o debriefing estruturado, associado à simulação, em consultas de enfermagem à família, como estratégia pedagógica para desenvolver competências nos estudantes de modo a dar resposta às orientações politicas em Portugal, onde se preconiza que o enfermeiro de família tenha como foco a família como um todo, ao longo do ciclo vital, e, desta forma contribuir para a aproximação do desenvolvimento teórico ao prático.
Enquadramento
A importância dos cuidados de saúde centrados na família tem sido evidenciada, no desenvolvimento teórico na área de enfermagem e no estabelecimento de políticas de saúde em Portugal, sendo hoje clara a relevância do enfermeiro de família nos cuidados de saúde primários (CSP), pela implementação das unidades de saúde familiar (USF), onde o enfermeiro é considerado um elemento central das equipas multiprofissionais (Silva, Costa, & Silva, 2013).
Os princípios e o enquadramento da atividade do enfermeiro de família, definidos no Decreto-Lei n.º 118/2014 de 5 de agosto, destacam a sua responsabilidade pela prestação de cuidados de enfermagem globais à família, em todas as fases da vida e em todos os contextos da comunidade, sendo claro que o enfermeiro de família "cuida da família como unidade de cuidados e presta cuidados gerais e específicos nas diferentes fases da vida do indivíduo e da família . . ." (p. 4070).
Contudo, a implementação destas políticas, bem como, o desenvolvimento teórico na área da enfermagem de saúde familiar, exigem um realinhamento da formação em enfermagem para que os enfermeiros passem de um paradigma centrado no indivíduo em que a família é um contexto, para um paradigma centrado na família como foco e unidade de cuidados (Silva, 2016).
Esta mudança pode vir a colmatar as várias dificuldades na prática clínica, identificadas por diversos autores. Martins (2004) defende que alguns enfermeiros acreditam que a presença da família nos cuidados significa que o seu trabalho está a ser observado e avaliado, sentindo-se por isso ameaçados. Hanson (2005) aponta que: a enfermagem tem ainda fortes laços históricos no modelo biomédico, onde a família, é vista apenas como um contexto da pessoa e não como cliente; a maioria dos enfermeiros não tem tido formação sobre enfermagem de saúde familiar, continuando a orientar as suas práticas com base num padrão de enfoque individual e os enfermeiros acreditam que família e a enfermagem de saúde familiar fazem parte do senso comum e, por esta razão, não necessitam de formação. Silva (2016) defende que a produção dos cuidados de enfermagem à família nos CSP está fortemente relacionada com os processos identitários dos enfermeiros, onde se inclui a formação que possuem, mais orientada para a família ou para a pessoa.
Neste sentido, tem sido preocupação dos docentes da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra a utilização de estratégias pedagógicas centradas no estudante e no desenvolvimento das suas competências globais, sendo prática dos docentes na Unidade Curricular de Enfermagem de Saúde Comunitária e Familiar, do 2º Ano do Curso de Licenciatura em Enfermagem, o uso da simulação com debriefing estruturado, quando são desenvolvidos conteúdos de enfermagem na área da saúde familiar, nomeadamente, em consultas de enfermagem à família, onde o referido conteúdo é transversal à componente teórica, teórico-prática e prática laboratorial.
Os modelos curriculares centrados no estudante considerando-o como agente ativo na sua própria aprendizagem, onde o professor passa a ser um facilitador do desenvolvimento de competências, remete-nos para conceitos que definem a competência como o saber mobilizador de recursos, de conhecimentos e de capacidades para situações complexas da prática diária, exigindo ao estudante pensamento crítico, autonomia, criatividade e capacidade de adaptação (Alarcão, 2001; Le Boterf, 1997; Perrenoud, 2001).
As vantagens de substituir métodos de aprendizagem passivos pela aprendizagem experiencial, são hoje reconhecidas, sendo neste grupo que se integra a simulação (Martins, 2017), estratégia pedagógica, que utiliza uma situação ou ambiente criado para permitir que os formandos experienciem uma representação de um acontecimento real com o objetivo de praticar, aprender, avaliar, testar ou entender sistemas ou ações humanas (Costa, Medeiros, Martins, & Coutinho, 2019).
A simulação permite a tomada de decisão, onde os formandos consolidam os saberes e desenvolvem um conjunto de competências que favorecem o seu desenvolvimento técnico, relacional e ético (Martins, 2009). Constitui-se como uma estratégia pedagógica importante no ensino em enfermagem em todos os níveis de formação, incluindo a formação ao longo da vida (formação permanente). Por outro lado, o impacto da simulação é também reconhecido na satisfação dos formandos (Martins, 2017), o que contribui para a qualidade do ensino.
É uma estratégia pedagógica ativa, que:
ajuda a consolidar conhecimentos e confere-lhes valor, desenvolve habilidades técnicas e relacionais, ajuda a criar regras e hábitos para pensar e refletir e contribui para o desenvolvimento de profissionais globalmente competentes, fazendo-o em ambiente seguro para o estudante, para o docente e para a pessoa e família alvos dos cuidados. (Martins, 2017, p.157)
A utilização do debriefing após a simulação constitui uma forma estruturada de conduzir os formandos na reflexão sobre e para a ação, ajudando-os, não só a consolidar saberes, mas também a mudar comportamentos, através da reflexão sobre o que fizeram, quando fizeram, como fizeram, porque fizeram e como podem melhorar (Coutinho, Martins, & Pereira, 2014). Contudo, os mesmos autores apontam a pouca evidência de resultados associados à prática de debriefing e não foram encontrados estudos desta prática pedagógica no desenvolvimento de competências na área de enfermagem de saúde familiar.
Questão de investigação
O debriefing estruturado associado à simulação em consultas de enfermagem à família é uma estratégia adequada para o desenvolvimento de competências dos estudantes?
Metodologia
Realizou-se um estudo quantitativo, descritivo e transversal numa amostra não probabilística por conveniência, constituída por 169 estudantes nas aulas de prática laboratorial, da Unidade Curricular de Enfermagem Comunitária e Familiar, do 2º ano do Curso de Licenciatura em Enfermagem da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra. Constituíram critérios de inclusão a idade superior a 18 anos e a presença obrigatória na aula da componente prática laboratorial. A recolha de dados foi efetuada durante o mês de janeiro de 2019.
Foi solicitada autorização à Presidente da Escola e parecer à Comissão de Ética da Unidade Investigação em Ciências da Saúde: Enfermagem, da Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (Parecer nº 542/11-2018). Os participantes assinaram o consentimento informado onde foram garantidos a voluntariedade, anonimato e confidencialidade, a inexistência de contrapartida pela participação ou não participação no estudo e a ausência de qualquer relação com a avaliação da unidade curricular.
A aplicação do questionário realizou-se no final de uma aula prática laboratorial, com duração de 2 horas, onde foram desenvolvidos cenários de simulação e respetivos debriefings, tendo participado os estudantes que estavam presentes na referida aula e que aceitaram participar no estudo.
O instrumento de colheita de dados utilizado foi um questionário com duas questões de caracterização demográfica (idade e sexo), e a Escala de Avaliação do Debriefing Associado à Simulação (EADaS), de Coutinho et al. (2014), que avalia o impacto do debriefing estruturado nos estudantes, associado a práticas simuladas. A escala é composta por 34 itens com resposta tipo Likert com cinco hipóteses de opção que vão desde discordo completamente ao concordo completamente. Possui três dimensões: Dimensão Valor Psicossocial (13 itens), Dimensão Valor Cognitivo (9 itens) e Dimensão Valor Afetivo (12 itens). Os valores de Alpha de Cronbach, são valores muito bons para o global da escala (0,899) e para cada uma das suas dimensões: 0,884 para a Dimensão Valor Psicossocial; 0,859 para a Dimensão Valor Cognitivo; e 0,889 para a Dimensão Valor Afetivo.
No presente estudo, a escala apresentou valores de Alpha de Cronbach também muito bons obtendo-se para a escala total 0,91, na Dimensão Valor Afetivo 0,87, na Dimensão Valor Cognitivo 0,84 e na Dimensão Valor Psicossocial 0,90. Os dados foram analisados em IBM SPSS Statistics, versão 24.0.
A experiência clínica simulada nas aulas práticas laboratoriais decorreu no centro de simulação da escola, onde foi criado um cenário para a primeira consulta a uma família, casal heterossexual, numa unidade de saúde familiar. O cenário teve como objetivo: desenvolver a consulta de enfermagem, orientada pelo Modelo de Avaliação de Calgary e pelos programas nacionais de saúde.
A simulação desenvolveu-se durante 20 minutos, seguido de 40 minutos para o debriefing. Após apresentação dos objetivos da simulação a todo o grupo de estudantes (15 por turma), expôs-se o cenário a três estudantes que voluntariamente se disponibilizaram para realizar a mesma, sendo dois estudantes o casal e um estudante o enfermeiro. Os estudantes que representaram o casal foram instruídos e treinados para saber como agir no decorrer do cenário. O estudante que representou o papel de enfermeiro não teve conhecimento prévio do cenário. O restante grupo de 12 estudantes teve conhecimento do cenário e observou a simulação (numa sala espelhada), registando as intervenções efetuadas e não efetuadas numa grelha de observação estruturada e fornecida pela docente. A grelha de observação foi construída pelas autoras, de acordo com o Modelo de Avaliação de Calgary, conteúdos já abordados anteriormente nas aulas teóricas e aplicado em casos clínicos nas aulas teórico práticas.
No final da simulação os três estudantes, que simularam, fizeram a apreciação geral da experiência clínica simulada e seguidamente o grupo de observadores fez um balanço relativo às intervenções corretamente desenvolvidas, com reforço positivo. O estudante, que concretizou o cenário como enfermeiro, fez um balanço relativo às intervenções a melhorar e o que faria diferente no futuro, com respetiva justificação. Finalmente, o docente referiu os pontos-chave relativos ao objetivo da experiência clínica simulada, dando sempre reforço positivo.
Para a aula esperavam-se os seguintes resultados: Que os estudantes desenvolvessem uma consulta de enfermagem, de acordo com os programas nacionais de saúde; utilizassem o Modelo de Avaliação e Intervenção de Calgary no desenvolvimento da consulta; distinguissem as fases do desenvolvimento da consulta; estabelecessem um relacionamento adequado com a família; demonstrassem conhecimento sobre o modelo teórico; selecionassem a informação a colher durante a entrevista integrando o modelo teórico; utilizassem instrumentos que permitam a realização da avaliação familiar; interpretassem a informação recolhida; organizassem a informação recolhida; registassem a informação colhida e realizassem a gestão do tempo de consulta.
Resultados
Os participantes apresentavam uma média de idades de 20,38 anos, sendo a idade mínima 18 anos e máxima 37 anos, desvio padrão 2,97 e mediana 19,0; 81% (136) era do sexo feminino e 19% (32) do sexo masculino e um caso estava omisso. O número total de participantes foi 169, contudo, nas tabelas seguintes, os diferentes valores de N referem-se ao número total de respostas ao item.
Na Tabela 1 verifica-se que a média global da escala foi de 4,25 com desvio padrão de 0,400, mínimo 3,03 e máximo 5,00. A média mais elevada verifica-se na Dimensão Valor Afetivo (4,58) com desvio padrão de 0,462. A média mais baixa foi na Dimensão Valor Psicossocial (3,87) sendo também nesta dimensão que se apresenta o valor de desvio padrão mais elevado (0,621). Na Dimensão Valor Cognitivo o valor médio é de 4,35 pontos e o desvio padrão de 0,435 pontos.
Na Tabela 2, na Dimensão Valor Psicossocial, apresentam-se os valores mais baixos ainda que todas as médias sejam superiores a 3 pontos, isto é, superiores ao ponto médio da escala. Nesta dimensão, o valor da média varia entre 3,31, no item 17 - "Desenvolver competências de liderança" e 4,33 no item 33 - "Eu sentir que o professor tem interesse genuíno no meu desenvolvimento profissional". Com pontuações iguais ou superiores a 4 pontos estão também os itens: 22 - "Reforçar a minha iniciativa em situações futuras" (4,02); 23 - "Desenvolver a relação de ajuda" (4,15); 19 - "Aumentar o potencial de trabalho em equipa" (4,20); 26 - "Identificar dificuldades na minha atuação" (4,21) e 25 - "Reforçar a minha autonomia para atuar como futuro enfermeiro" (4,28).
Nesta Dimensão Valor Psicossocial, os valores mais elevados (superiores a 4 pontos), revelam que os estudantes percecionam a técnica de debriefing como uma mais-valia para o seu futuro profissional, nomeadamente: por aumentar o potencial de trabalho em equipa, reforçar a iniciativa em situações futuras, desenvolver a relação de ajuda, reforçar a autonomia como futuros enfermeiros, identificar dificuldades na atuação, e sentir que o professor tem interesse genuíno no desenvolvimento profissional do estudante.
Na Dimensão Valor Cognitivo, as pontuações da média situam-se acima dos 4 pontos verificando-se entre 4,20, no item 6 - "Refletir sobre as minhas competências" e 4,56 no item 3 - "Aprender mais". Com média de 4,49 encontra-se o item 12 - "Identificar aspetos que devo melhorar em atuações futuras", seguido do item 4 - "Me focar nos aspetos importantes da atuação" (4,43); 13 - "Desenvolver competências para a tomada de decisões acertadas" (4,38); os itens 7 - "Identificar prioridades na atuação" (4,33). Os itens 1 - "Estruturar o meu pensamento" e 8 - "Melhor identificar os recursos a utilizar na atuação" pontuaram a mesma média (4,24) pontos.
Nesta dimensão, os valores analisados revelam que a estratégia pedagógica proporciona o desenvolvimento do raciocino clínico, na, sobre e para a ação concreta da prática clínica, o que facilita a aprendizagem numa atuação futura.
Na Dimensão Valor Afetivo, onde os itens foram invertidos para a análise estatística, destacaram-se os itens com valor igual ou superior a 4,5 pontos: 24 - "Eu sentir que foi uma perda de tempo", (4,93 pontos); 20 - "Eu me sentir desrespeitado" (4,86 pontos); 14 - "Criar conflitos no grupo" (4,80 pontos); 15 - "Não querer participar em mais nenhuma simulação" (4,76 pontos); 9 - "Me humilhar frente aos outros" (4,72 pontos); 18 - "Eu me sentir incompreendido" (4,64 pontos); 34 - "Baralhar as minhas ideias a respeito da atuação" (4,56 pontos) e o item 2 - "Me envergonhar frente aos colegas pelos meus erros" (4,51 pontos). Nesta dimensão, o item pontuado com menor valor foi: 5 - "Me deixar muito ansioso/stressado" (3,98). As elevadas pontuações que se verificam revelam também que o debriefing é uma técnica importante no desenvolvimento afetivo do estudante.
Discussão
A formação em enfermagem exige o desenvolvimento de competências para desempenhar um papel ativo em prol da qualidade e segurança dos cuidados (Valenzuela-Suazo, 2016). Estudos relacionados com o debriefing estruturado no ensino de enfermagem apontam um impacto muito positivo no desenvolvimento de competências, dos estudantes (Coutinho et al., 2014; Coutinho, Martins, & Pereira, 2016; Coutinho, Martins, & Pereira, 2017), contudo, estes estudos desenvolveram-se no âmbito da enfermagem médico-cirúrgica.
Com os resultados obtidos através da aplicação da escala para avaliação do impacto do debriefing nas consultas de enfermagem à família, verificou-se que esta estratégia é também adequada na área da enfermagem de saúde familiar e que a sua utilização contribui para a melhoria das práticas pedagógicas, o que se refletirá na maior qualidade na prestação de cuidados de enfermagem à família.
Na Dimensão Valor Psicossocial, evidenciou-se que os estudantes percecionam a técnica de debriefing, associada à simulação, como uma mais-valia para o seu futuro profissional. Este facto é corroborado também noutros estudos (Coutinho et al., 2014; Coutinho et al., 2016; Coutinho et al., 2017), onde à semelhança do presente estudo a estratégia pedagógica demonstra um melhor desempenho e desenvolvimento de competências no que concerne ao trabalho em equipa, destacando-se também a proximidade dos estudantes e docente como facilitador do desempenho dos estudantes. Este facto aproxima-se do que se encontra no sentir dos estudantes, relativamente à perceção que têm do interesse genuíno do professor face ao seu desenvolvimento profissional. Na formação com foco na reflexão sobre a prática clínica o professor não só ensina, como também estimula o estudante a tomar decisões, a fazer observações, a perceber relações e a trabalhar com indagações, de forma a promover competências profissionais, mas também atitudes que futuramente conduzam à aquisição de poderes para agir em benefício da sociedade (Valenzuela-Suazo, 2016).
Esta constatação evidencia o reforço da autonomia para atuar como futuro enfermeiro, bem como, o ambiente criado na aula que permite que o estudante identifique as suas dificuldades na atuação e as consiga ultrapassar, uma vez que é ele o agente ativo no seu próprio desenvolvimento. Contudo, o facto de esta estratégia exigir aos estudantes serem eles próprios o centro do processo formativo implica que tenham maior iniciativa, que tenham maior capacidade de autoconsciência e de gestão de emoções, o que não tem sido ao longo do seu processo de ensino uma conduta constante, podendo constituir a justificação dos valores mais baixos encontrados nesta dimensão, relativamente às dimensões Valor Cognitivo e Valor Afetivo.
Neste sentido, é importante que no início da simulação o docente informe os estudantes sobre: o ambiente da simulação, objetivos da simulação, possibilidades de ajuda e ou intervenções de outros durante a execução do cenário descrição do caso e, ainda, a possibilidade de manipulação prévia dos equipamentos disponíveis no cenário (Costa et al., 2019).
Já na Dimensão Valor Afetivo, onde a pontuação da escala se mostrou mais elevada, constata-se a importância do ambiente criado pelo docente e da relação estabelecida com os estudantes, e entre eles, possibilitando um ambiente motivador e potenciador da aprendizagem que permite também melhorar o desempenho, fomentar o trabalho em equipa e aumentar a qualidade do desempenho na prática clínica (Valenzuela-Suazo, 2016). Este facto reforça os resultados encontrados noutros estudos (Coutinho et al., 2014; Coutinho et al., 2016; Coutinho et al., 2017), onde os estudantes percecionam o debriefing estruturado como um método que lhes proporciona maior motivação e interesse. Porém, para que aconteça é necessário que o formador tenha perícia na estratégia de debriefing, de modo a facilitar a aprendizagem num ambiente onde se promova a segurança, confiança e confidencialidade ao formando (Costa et al., 2019).
A organização da prática clínica simulada, por objetivos que o estudante conhece à partida, e a utilização do debriefing estruturado e bem definido, com a utilização de reforços positivos face às atitudes e comportamentos dos estudantes, permite-lhes a reflexão sobre a ação e para a ação, facilitando a transferência da aprendizagem para situações e contextos futuros (Martins, 2017), tornando-os agentes ativos da sua aprendizagem.
Na Dimensão Valor Cognitivo, evidenciou-se também que a estratégia pedagógica é muito apropriada no desenvolvimento do raciocínio clínico, sobre e para a ação concreta da prática clínica, o que facilita a aprendizagem numa atuação futura. A perceção que os estudantes demonstraram ao sentir que aprendem mais, que conseguem através da estratégia identificar os aspetos a melhorar, que conseguem focar-se nos aspetos importantes da atuação, que desenvolvem competências para a tomada de decisão acertada, identificando as prioridades na atuação, reforça o que noutros estudos, com outros cenários e com outros objetivos, se concluiu que a utilização do debriefing estruturado após a simulação, conduz os estudantes à reflexão sobre a ação, ajudando-os a consolidar saberes e a mudar comportamentos (Coutinho et al., 2014).
A autorreflexão é um instrumento de autonomia que fomenta a transição entre a prática baseada na racionalidade técnica e a prática reflexiva que conduz à modificação de comportamentos (Coutinho et al., 2017). É essencial uma vez que para a qualidade das práticas é necessário que os enfermeiros possuam uma atitude crítica e reflexiva perante a realidade clínica, o que permitirá construí-la e transformá-la (Valenzuela-Suazo, 2016).
Este estudo revela que a utilização do debriefing estruturado após a simulação é uma estratégia muito adequada também para a aprendizagem de capacidades para interagir com a família, onde é necessária uma intervenção sistémica e orientada para o cuidado ao longo do ciclo vital.
Contudo, o estudo apresenta como limitação o facto de não haver um grupo de controlo o que impossibilitou comparar o método tradicional com a estratégia pedagógica utilizada, assim como o recurso a uma amostra não probabilística. Outra limitação encontrada foi o facto de alguns questionários apresentarem itens não respondidos o que levou a que os valores de N fossem diferentes nesses itens, podendo dificultar a análise dos resultados.
Conclusão
Pode concluir-se que a simulação com debriefing estruturado no ensino de enfermagem de saúde familiar é uma estratégia adequada e que à semelhança dos resultados já conhecidos sobre o desenvolvimento de competências dos estudantes, na simulação de alta e média definição, já estudadas, permite o desenvolvimento de competências afetivas, cognitivas e psicossociais do estudante.
Acredita-se que a utilização desta estratégia pedagógica na formação, na área da enfermagem de saúde familiar, poderá contribuir para a capacitação dos futuros enfermeiros e diminuir o desfasamento entre as orientações políticas e as práticas clínicas. Neste contexto a estratégia revela-se também importante na formação avançada de enfermeiros na área da saúde familiar, onde é necessária a análise das ações e soluções para que se produza mudança nas práticas dirigidas à família enquanto foco de cuidados.
Sugere-se por isso a utilização da simulação com debriefing estruturado na formação em enfermagem com vista à capacitação dos estudantes e profissionais para o desenvolvimento de práticas clínicas centradas na família, ao longo do ciclo vital.
A investigação sobre práticas pedagógicas deve ser uma preocupação do docente, pelo que se sugere também a realização de outros estudos na área da formação em saúde familiar.
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Contribuição de autores:
Conceptualização: Silva, M., Tanqueiro, M., Verissimo, C., & Coutinho, V.
Tratamento de dados: Verissimo, C., & Coutinho, V.
Metodologia: Silva, M., Tanqueiro, M., Verissimo, C., & Coutinho, V.
Redação - preparação do rascunho original: Silva, M., Tanqueiro, M., Verissimo, C., Neves, M., & Coutinho, V.
Redação - revisão e edição: Silva, M., Tanqueiro, M., Verissimo, C., Neves, M., Cruzeiro, C., & Coutinho, V.
* Autor de correspondência:
Margarida Alexandra Nunes Carramanho Gomes Martins Moreira da Silva
Email: margarida@esenfc.pt
Como citar este artigo: Silva, M. A. N., Tanqueiro, M. T. O., Veríssimo, C. M. F., Neves, M. M. A., Cruzeiro, C. M. P., & Coutinho, V. D. (2020). Avaliação do debriefing estruturado como estratégia pedagógica em enfermagem de saúde familiar. Revista de Enfermagem Referência, 5(2), e19081. doi:10.12707/RIV19081
Recebido: 06.11.19
Aceite: 13.01.20