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Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283versão On-line ISSN 2182-2883

Rev. Enf. Ref. vol.serV no.2 Coimbra abr. 2020

https://doi.org/10.12707/RIV19065 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)

RESEARCH PAPER (ORIGINAL)

 

Perceção sobre a importância do aleitamento materno pelas mães e dificuldades enfrentadas no processo de amamentação

Mothers' perceptions of the importance of breastfeeding and difficulties encountered in the process of breastfeeding

Percepción de la importancia de la lactancia materna para las madres y dificultades

 

Isanete Coelho de Moraes 1
https://orcid.org/0000-0003-2305-0150

Nayara de Lima Sena 1
https://orcid.org/0000-0002-5062-6146

Hyana Kamila Ferreira de Oliveira 1
https://orcid.org/0000-0002-8070-0263

Firmina Hermelinda Saldanha Albuquerque* 1
https://orcid.org/0000-0002-0697-2789

Karla Maria Carneiro Rolim 2
https://orcid.org/0000-0002-7914-6939

Henriqueta Ilda Verganista Martins Fernandes 3, 4
https://orcid.org/0000-0002-8440-3936

Nair Chase da Silva 1
https://orcid.org/0000-0002-5880-4138

 

1 Universidade Federal do Amazonas, Manaus, Amazonas, Brasil

2 Universidade de Fortaleza, Fortaleza, Ceará, Brasil

3 Escola Superior de Enfermagem do Porto, Porto, Portugal

4 Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde - CINTESIS, Porto, Portugal

 

RESUMO

Enquadramento: O aleitamento materno (AM) oferece benefícios comprovados tanto para a mãe como para o bebé.

Objetivo: Conhecer a perceção das mães sobre a importância do AM e identificar as principais dificuldades enfrentadas para a prática do AM e/ou da sua manutenção.

Metodologia: Estudo descritivo, transversal de natureza quantitativa com 50 mães de crianças registadas em 2 unidades básicas de saúde de Coari - Amazonas, Brasil. Utilizou-se um guião de entrevista semiestruturado. A análise foi realizada através do software Excel 2010 e IBM SPSS Statistics, versão 23.0.

Resultados: A perceção das mães sobre o AM foi positiva, 40 (80%) descreveram corretamente os benefícios para a mãe e 42 (84%) para a criança, 23 (46%) afirmaram dificuldades no processo de amamentação, sendo os mais recorrentes o ingurgitamento mamário e lesões mamilares (13; 56,5%).

Conclusão: As mães demonstraram conhecimento sobre a importância do AM, o ingurgitamento mamário e lesões mamilares foram as dificuldades apontadas mais recorrentes, podendo estas ser revertidas através de uma correta orientação pelos profissionais de saúde.

Palavras-chave: aleitamento materno; saúde da criança; saúde da mulher

 

ABSTRACT

Background: The breastfeeding (BF) offers proven benefits to both mother and baby.

Objective: To understand the perceptions of mothers about the importance of breastfeeding and to identify the main difficulties of breastfeeding and/or its maintenance.

Methodology: Cross-sectional, descriptive study of quantitative nature with 50 mothers of children registered in 2 primary health units of Coari - Amazonas, Brazil. A semi-structured interview script was used. The analysis was performed using the Excel 2010 software and IBM SPSS Statistics, version 23.0.

Results: The perceptions of mothers about BF were positive, 40 (80%) described the benefits to the mother correctly, and 42 (84%) to the child, 23 (46%) reported difficulties in the process of breastfeeding, in which the most frequent were the breast engorgement and lesions of the nipple (13; 56.5%).

Conclusion: The mothers demonstrated knowledge about the importance of breastfeeding. Breast engorgement and lesions of the nipple were the most frequently reported difficulties, which may be reversed through the correct orientation by health professionals.

Keywords: breastfeeding; child health; women's health

 

RESUMEN

Marco contextual: La lactancia materna (aleitamento materno - AM) ofrece beneficios comprobados tanto para la madre como para el bebé.

Objetivo: Conocer la percepción de las madres sobre la importancia de la AM e identificar las principales dificultades a las que se enfrentan en la práctica de la AM y/o su mantenimiento.

Metodología: Estudio descriptivo y transversal de carácter cuantitativo con 50 madres de niños registrados en 2 unidades básicas de salud en Coari, Amazonas (Brasil). Se utilizó un guión de entrevista semiestructurado. El análisis se realizó con el programa Excel 2010 y con IBM SPSS Statistics, versión 23.0.

Resultados: La percepción de las madres sobre la AM fue positiva, 40 (80%) describieron correctamente los beneficios para la madre y 42 (84%) para el niño, 23 (46%) señalaron dificultades en el proceso de lactancia, de entre las cuales las más recurrentes fueron la congestión mamaria y las lesiones en los senos (13; 56,5%).

Conclusión: Las madres demostraron que conocen la importancia de la AM. La congestión mamaria y las lesiones en los senos fueron las dificultades más recurrentes, las cuales se pueden revertir mediante la correcta orientación de los profesionales de la salud.

Palabras clave: lactancia materna; salud del niño; salud de la mujer

 

Introdução

O aleitamento materno (AM) é uma prática milenar com reconhecidos benefícios para a saúde do lactente, desde aspetos nutricionais, imunológicos, cognitivos, gastrointestinais, económicos e sociais, além de proporcionar uma maior interação entre a mãe e o bebé (Machado et al., 2014).

O Ministério da Saúde do Brasil, reforçando as recomendações da World Health Organization (WHO), recomenda aleitamento materno exclusivo (AME) nos primeiros seis meses e complementado até aos dois primeiros anos ou mais (Ministério da Saúde, 2015).

Existem benefícios comprovados tanto para o lactente, como para a mãe. No caso do bebé, há uma diminuição da probabilidade de adoecer, reduzindo as taxas de mortalidade infantil e de internamentos hospitalares. Há também uma redução no aparecimento de doenças crónicas. Na mãe, há uma involução uterina mais breve durante o período de pós-parto, perda de peso, diminuição dos riscos de cancro de mama e do colo do útero, sendo também a alternativa mais económica de alimentação do bebé (Lima, Nascimento, & Martins, 2018).

Estudos e inúmeras organizações em saúde comprovam os benefícios do AM sobre outras formas de alimentação no crescimento e desenvolvimento de crianças e, em todo o mundo, estão a ser realizados esforços para a manutenção do AM, no entanto, os índices de AM no Brasil e no mundo, principalmente o AME, ainda se encontram distantes do que é preconizado pela WHO (Ministério da Saúde, 2009; Ministério da Saúde, 2015).

Um estudo realizado em 2009 no Brasil, mostrou que a permanência do AME nos primeiros dias de vida tem diminuído consideravelmente em todo o país, sendo esses números mais acentuados na região nordeste (37%), com maior probabilidade de interrupção do AME. As regiões norte (45%) e centro-oeste (45%) apresentaram maiores probabilidades de manutenção do AME nesse mesmo período (Ministério da Saúde, 2009).

O impacto do AM reflete-se diretamente no número de mortes de crianças com menos de 5 anos, a sua prática alcança, isoladamente, uma redução que nenhuma outra ação foi capaz de alcançar na redução da mortalidade infantil. Estima-se que o AM, quando não realizado conforme o recomendado, se torna o principal responsável por mortes em crianças dos 0 aos 6 meses causadas por doenças diarreicas (55%) e por infeção do trato respiratório (53%) e cerca de 20% de todas as causas de morte na primeira infância (Ministério da Saúde, 2015).

Mesmo com todos os benefícios da amamentação e a sua ampla promoção por organizações mundiais, ainda é crescente a tendência para o abandono da amamentação. É necessário compreender a importância do AM e as dificuldades enfrentadas que podem ocasionar a sua interrupção sob a ótica das mães, a fim de identificar os obstáculos que impedem a manutenção dessa prática, subsidiando a criação e aprimoramento de políticas públicas efetivas que favoreçam o desenvolvimento saudável e a saúde das crianças.

Diante disto, o presente estudo tem como objetivos conhecer a perceção das mães sobre a importância do AM e identificar as principais dificuldades enfrentadas para a prática do AM e/ou da sua manutenção.

 

Enquadramento

Segundo a WHO, o AM pode ser definido e classificado de diferentes formas (WHO, 2007):

O AME consiste na oferta de leite materno (LM) exclusivamente à criança, por meio de extração, da mama, ou de outras fontes que sejam adquiridas o leite humano, salvo exceção de vitaminas, solução de reidratação oral, suplementação mineral e medicações tais como, xarope ou gotas. Além disso, o AME é considerado, como a alimentação capaz de nutrir e suprir todas as necessidades fisiológicas da criança, sem haver a necessidade de complementos, durante os primeiros seis meses de vida (WHO, 2007; Moraes, Oliveira, Alvin, Cabral, & Dias, 2014).

O AM predominante baseia-se, além da oferta do LM, na oferta de água ou líquidos adoçados, chás e sumo de frutas para o bebé. O AM consiste na oferta de LM, seja direto da mama ou por extração, independentemente de o bebé receber outros tipos de alimentos ou não. O AM complementado é quando para além do LM, são oferecidos também alimentos sólidos ou semissólidos como forma de complemento. Por fim, o AM misto ou parcial é quando o bebé recebe outros tipos de leite para além do LM (WHO, 2007). Apesar da superioridade do LM em relação a outros tipos de leite, ainda é considerada baixa a prevalência do AM, configurando um importante problema de saúde pública. Estudos nacionais sobre o AM mostram que apenas 41% dos bebés com menos de 6 meses são alimentados exclusivamente com LM (Ministério da Saúde, 2009). Esta taxa é semelhante à média mundial, a qual é de 39%. No entanto, encontra-se distante da percentagem ideal preconizada pelos órgãos nacionais e internacionais, que é entre 90% e 100%, sendo necessária a identificação das causas que levam o abandono do AM e a introdução cada vez mais precoce da alimentação complementar em crianças (Victora, Fuchs, Barros, & Francisco, 2000).

Compreender as dificuldades enfrentadas no processo de amamentação pode ditar a manutenção ou interrupção da sua prática, estas por sua vez, podem decorrer por diversos fatores, implicando maior risco para a saúde do bebé e aumentando os índices de morbimortalidade infantil. A influência negativa da família em afirmar que o leite é insuficiente, a ausência de conhecimento das mães e a falta de incentivo dos profissionais de saúde no período pré-natal, pós-parto e puerpério repercutem-se na interrupção do AM. Existem outros fatores que podem influenciar a mãe na forma como nutre o seu filho, como o nível de escolaridade, a situação financeira e emocional da família, além da grande oferta de fórmulas infantis (Lima et al., 2018).

Um estudo de 2014 realizado no Brasil, analisou a tendência negativa ou positiva para o AM, tendo sido identificado como fatores negativos o aumento de moradores no domicílio, mães de idade avançada, maior escolaridade da progenitora, utilização de creches e maior renda. Como fatores positivos para a manutenção do AM foram apontados, possuir mais filhos, e ser mãe de raça preta ou parda. Além disso, o estudo identificou que as diferenças regionais podem influenciar a prática de amamentação, sendo a região norte a de maior prevalência para o AM, e as regiões sudeste e sul as com menores prevalências (Wenzel & Souza, 2014).

Tessari, Soares, Soares, e Abreu (2019) realizaram um estudo qualitativo numa maternidade do Paraná com 10 mães e um pai adolescentes, onde foi identificado que apesar das mães apresentarem conhecimento sobre a importância do AM, também relataram dificuldades na sua prática, principalmente nos primeiros dias de vida do bebé. O amplo conhecimento sobre a importância do AM, pode minimizar intercorrências, garantindo todos os seus benefícios para a mãe e bebé, superando dificuldades e diminuindo as probabilidades de interrupção da sua prática (Ministério da Saúde, 2015).

Existe ainda muito a ser feito para que crianças não sejam privadas dos benefícios da amamentação e, dessa forma, estudos que abordam a forma como as mães percebem a prática do AM e a importância por elas atribuídas a este ato, assim como, o entendimento acerca das dificuldades enfrentadas nesse processo, tornam-se necessários, subsidiando estratégias de incentivo à amamentação e de prevenção de doenças provenientes da ausência do AM.

 

Questão de investigação

Qual é a perceção das mães sobre a importância do AM? Quais são as principais dificuldades enfrentadas para a prática do AM e/ou da sua manutenção pelas mães?

 

Metodologia

Tendo em consideração os objetivos da investigação, foi desenhado um estudo descritivo, transversal de natureza quantitativa. Foram selecionadas duas unidades básicas de saúde (UBS) do município de Coari - Amazonas, Brasil, escolhidas por conveniência e facilidade de acesso por parte das investigadoras, a colheita de dados ocorreu no período de junho a novembro de 2016. O município de Coari possui uma população estimada de 84,762 habitantes, e está localizado na margem direita do lago de Coari, na confluência com o rio Solimões, estado do Amazonas, Brasil.

Como população do estudo, foi selecionada toda a população de duas UBS de mães de crianças registadas no programa Crescimento e Desenvolvimento (CD). Através de uma amostragem por conveniência, as participantes foram selecionadas a partir da autorização prévia dos coordenadores das duas UBS, tendo sido solicitada posterior autorização à lista de crianças registadas no programa com os seus respetivos endereços, chegando a um total de 50 mães de crianças registadas. A idade das crianças variou de 0 meses a 2 anos de idade. Desta forma, foi estabelecido como critério de inclusão: mães cujos filhos estão registados no programa CD nas duas UBS selecionadas. As entrevistas foram realizadas por duas investigadoras nas residências das participantes, posteriores à leitura e entrega do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), que especifica todas as informações necessárias a respeito do estudo. Após a leitura e assinatura do TCLE, a entrevista foi realizada.

Para a colheita de dados foi utilizado um questionário semiestruturado com quatro perguntas abertas e 11 fechadas, distribuídas em três blocos. O bloco A incluía as varáveis de caracterização da amostra, a saber, idade, escolaridade, estado civil, profissão, renda familiar e número de filhos. No bloco B enfatizaram-se os antecedentes obstétricos, idade da primeira gestação, número de gestações, tempo de amamentação, acompanhamento e informações sobre os benefícios do AM no período pré-natal, finalizando os blocos de perguntas fechadas. Do bloco C faziam parte as questões acerca do entendimento materno e sobre a importância do AM e dificuldades enfrentadas nesse processo, a saber: Quais os benefícios do AM para a mãe e para o bebé?; Apresentou alguma dificuldade para amamentar o seu bebé? Se sim, qual?; Já deixou de amamentar o(a) seu(sua) filho(a) em algum momento? Se sim, por qual motivo?; Houve oferta de outros alimentos além do leite materno ao seu bebé antes dos 6 meses de idade? Se sim, por qual motivo?. As respostas geradas do bloco C foram agrupadas por similaridade gerando as variáveis que originariam as duas últimas partes do estudo.

Os dados foram organizados com o auxílio do Microsoft Office Excel, versão 2010. A análise descritiva e inferencial foi feita através do software IBM SPSS Statistics, versão 23.0. Os dados foram apresentados através de tabelas de frequências.

A colheita de dados foi iniciada somente após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Amazonas e aprovado sob parecer nº.: 1.221.644, de acordo com o estabelecido na Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde que diz respeito a investigação que envolve seres humanos.

 

Resultados

Caracterização da amostra

Para a caracterização da amostra foram utilizadas as seguintes variáveis: idade; escolaridade; estado civil; profissão; renda familiar; e número de filhos. No que diz respeito à variável idade, constatou-se que 35 entrevistadas (70%) tinham idade superior a 18 anos e 15 eram menores de 18 anos (30%).

Relativamente aos dados obtidos na variável escolaridade, observou-se que 20 (40%) entrevistadas possuem o ensino médio incompleto, sete possuem o ensino médio completo (14%), 10 o ensino fundamental incompleto (20%), 10 o ensino fundamental completo (20%) e apenas 3 declararam possuir o terceiro grau (ensino superior) (6%). A distribuição da amostra em relação à variável estado civil demonstra que a maioria das mulheres possui companheiro fixo, sendo que 28 vivem em união estável (56%), 13 são solteiras (26%), sete casadas (14%) e duas são viúvas (4%).

No que diz respeito à profissão, 17 mães (34%) declaram-se donas de casa, 16 (32%) estudantes, e 17 (34%) trabalham fora. Relativamente à variável renda familiar, verificou-se que 35 entrevistadas (70%) vivem com uma renda até um salário mínimo, 10 (20%) possuem uma renda acima de um salário mínimo e cinco (10%) não souberam indicar o valor da sua renda. Em relação à variável número de filhos, 29 entrevistadas (58%) são multíparas e 21 (42%) primíparas.

A segunda parte do estudo aborda os antecedentes obstétricos. Os dados obtidos na variável idade da primeira gestação mostraram que 32 mães (64%) tiveram o primeiro filho com idade menor ou igual a 18 anos, o tempo de amamentação encontrado foi de 3 a 6 meses em 23 (46%), outras 14 mães (28%) afirmaram ter amamentado além dos 6 meses mínimos preconizados pela WHO, 11 (22%) não souberam indicar e duas (4%) amamentaram por um tempo inferior a 30 dias. Todas as entrevistadas realizaram acompanhamento no período pré-natal, sendo que 43 (86%) afirmaram ter recebido informações sobre a importância do AM nas suas consultas.

Perceção das mães sobre a importância do AM

Na Tabela 1 encontram-se as variáveis relacionadas com a perceção das mães sobre a importância do AM. Sobre os benefícios do AM para as mães, 20 mães (40%), afirmaram que ajuda na perda de peso. A amamentação como fonte de fortalecimento do vínculo entre mãe/bebé foi apontada como benefício para a saúde da mulher por 10 mães (20%) entrevistadas. O estudo demonstrou que os benefícios para a saúde materna ainda são desconhecidos para 10 entrevistadas (20%).

Na variável benefícios do AM para a saúde da criança, 25 mães (50%) relataram que é importante para o crescimento e desenvolvimento saudável do bebé, enquanto que 8 mães (16%) não souberam responder.

Principais dificuldades enfrentadas para a prática do AM e/ou da sua manutenção

A terceira parte do estudo é referente a manutenção do AM e dificuldades enfrentadas pelas participantes do estudo. Foi questionado às mães se em algum momento haviam deixado de amamentar o lactente antes dos 6 meses de idade, 38 mães (76%) responderam que não, configurando uma baixa taxa de abandono da amamentação nos primeiros 6 meses de vida, e 12 (24%) responderam que sim. A introdução de alimentação complementar precoce foi elevada no presente estudo, correspondendo a 26 das entrevistadas (52%), a insaciedade da criança foi apontada como o principal motivo (13; 50%), seguido pela falta de tempo (5; 19,23%), 3 mães (11,54%) afirmaram que introduziram alimentação por orientação médica e 5 (19,23%) para complementar a alimentação do bebé.

Quando questionadas se tiveram dificuldades no processo de amamentação, a maioria, 27 (54%) respondeu que não, 23 mães (46%) apresentaram dificuldades na amamentação. Das mães que relataram dificuldades no processo de amamentação (23; 46%), o ingurgitamento mamário e lesões mamilares foram as mais recorrentes (13; 56,5%). Fatores como o bebé não se saciava com LM (4; 17,4%) e a rejeição do lactente ao LM (3; 13%), seguidos da baixa produção de leite (2; 8,7%) e mamilos invertidos (1; 4,4%) também foram apontados pelas mães.

 

Discussão

Os resultados encontrados em relação à perceção das mães sobre a importância do AM mostram-nos que as mães relatam corretamente os benefícios do AM para a mãe e para o bebé. Acerca dos benefícios para a mãe, a resposta citada pelo maior número de participantes foi que auxilia na perda de peso. A literatura mostra que na gravidez, há uma acumulação de reservas na ordem das 100-150 calorias/dia. De facto, muitas vezes, a mulher termina o período de gestação com peso a mais. No processo de amamentação, o corpo extrai reservas calóricas para a produção do LM, fazendo com que a mãe retorne ao peso anterior à gravidez mais rapidamente. Mães que deixam de amamentar mais cedo, possuem maior dificuldade em gastar essas reservas calóricas, retardando o processo de perda de peso (Rea, 2004).

O fortalecimento do vínculo mãe/bebé também foi apontado como benefício para a mãe pelas entrevistadas. Segundo o Ministério da Saúde (2015), o ato de amamentar pode fortalecer os laços afetivos entre mãe e filho, esse contacto através dos olhos oportuniza intimidade, troca de afeto, sensação de segurança para a criança e autoconfiança e realização para a mulher.

A redução da hemorragia no período pós-parto e o auxílio na involução uterina citados pelas mães como benefícios para a saúde materna são ocasionados pela produção de ocitocina, por meio de terminações nervosas na hipófise, e a sua produção é estimulada durante as mamadas. A amamentação também previne o cancro do ovário, mama e o aparecimento de fraturas a que as mulheres estão propensas na menopausa (Coutinho, Soares, & Fernandes, 2014).

A respeito dos benefícios do AM para a criança, metade das mães entrevistadas afirmou ser importante para o crescimento e desenvolvimento do recém-nascido (RN). De facto, o AM quando fornecido de forma adequada, é fonte de energia, nutrientes, rico em óleos, vitaminas, proteínas, gorduras, ácidos gordos e água. O LM supre todas as necessidades nutricionais do bebé nos primeiros meses de vida, tornando-o insubstituível para o desenvolvimento e o crescimento saudável da criança (Ministério da Saúde, 2015).

O AM tem como benefício o ganho de peso do RN para oito das mães entrevistadas (16%). Quando oferecido em livre vontade o AM reduz a perda de peso esperada nos primeiros dias de vida do RN, acelerando o ganho de peso que foi perdido no nascimento (Ribeiro, Said, Vieira, Rocha, & Gomes, 2004).

A prevenção de doenças foi citada pelas mães como benefício do AM para o bebé. De facto, segundo a WHO e apoiado pelo Ministério da Saúde, quanto menor a criança, maior a proteção fornecida pelo LM (Victora, et al., 2000; Ministério da Saúde, 2015). Dentre os benefícios para a saúde do RN estão: prevenção da mortalidade infantil, infeções respiratórias, gastrointestinais, alergias, redução do risco de hipertensão, colesterol elevado e diabetes, diminuição de quadros de obesidade, entre outros (Ministério da Saúde, 2015).

Os resultados positivos quanto ao entendimento das mães sobre os benefícios do AM foram semelhantes ao estudo de Silva, Goetz, e Santos (2017) realizado com 20 gestantes atendidas na Estratégia de Saúde da Família (ESF) num bairro de um município de Santa Catarina, Brasil, onde se verificou que das 20 gestantes, apenas duas demonstraram falta de conhecimento sobre o AM, 18 afirmaram ser a amamentação benéfica e saudável tanto para a mãe como também para o crescimento e desenvolvimento dos seus bebés.

Apesar de a maioria das entrevistadas citar corretamente benefícios do AM para a mãe e para o bebé, uma percentagem ainda desconhece a sua importância. A falta de conhecimento das mães acerca da amamentação e sobre os benefícios do leite materno para o desenvolvimento saudável do RN contribuem para a interrupção do AM e para o seu alto índice no Brasil. O suporte dado pelos profissionais da área de saúde pode favorecer o AM e o prolongamento do tempo de amamentação (Machado, et al., 2014).

A baixa taxa de abandono da amamentação encontrada no presente estudo seria considerada favorável para a manutenção da amamentação exclusiva nos primeiros meses, no entanto, contrariando a resposta negativa das entrevistadas quando questionadas se haviam deixado de amamentar por algum momento antes dos 6 meses, foi verificado na pergunta posterior um índice elevado de introdução alimentar precoce, isto é, a introdução de outros alimentos que não o LM, antes dos 6 meses de idade, sendo a insaciedade da criança o principal motivo.

O índice de introdução alimentar precoce encontrado no estudo é semelhante a um estudo transversal de Campos, Chaoul, Carmona, Higa, e Vale (2015), realizado com 309 parturientes num hospital universitário do interior de São Paulo, onde 30% das entrevistadas referiram a introdução de outros líquidos antes dos 6 meses de vida, mesmo afirmando estar em AME.

A crença do leite fraco ou insuficiente reportado por parte das mães é um fator cultural, um mito, pois os elementos contidos no LM são suficientes para nutrir a criança. Esta conceção equivocada pode estar vinculada ao desconhecimento das mães quanto aos valores do seu leite, sobre como o LM é produzido e a sua fisiologia e ao facto de relacionarem o choro do bebé à carência de alimento, o que nem sempre é verdadeiro (Rocci & Fernandes, 2014). Esses entraves são solucionados à medida que as mães permanecem com a amamentação, a mama estimulada pela sucção do bebé irá aumentando gradualmente a produção do LM (Machado et al., 2014).

Entre as dificuldades encontradas na amamentação, o ingurgitamento mamário e as lesões mamilares foram as mais apontadas pelas entrevistadas. O ingurgitamento mamário ocorre quando há compressão dos ductos lactíferos, o que torna mais difícil a descida do leite. A acumulação de leite na mama torna-o mais denso e viscoso, sendo denominado de leite empedrado, termo popularmente conhecido no Brasil. A mama pode apresentar-se distendida, edemaciada, com eritema e brilhante, causando grande desconforto, mal-estar e febre em algumas mães (Ministério da Saúde, 2015).

As lesões mamilares, por sua vez, são ocasionadas pelo posicionamento e pega inadequados do bebé, que quase sempre podem vir associados ao ingurgitamento mamário, causando eritema, edema, fissuras, hematomas e bolhas nas mamas, sendo que os sintomas são extremamente dolorosos e uma importante causa para a interrupção da amamentação nos primeiros dias de vida (Ministério da Saúde, 2015).

A percentagem encontrada neste estudo para ingurgitamento mamário e lesões mamilares é semelhante a outros estudos realizados sendo estes os dois problemas mais referidos na literatura como impeditivos ou dificultadores da amamentação (Rocci & Fernandes, 2014; Souza, Araújo, Teixeira, & Mota, 2016; Alvarenga et al. 2017). Os traumas mamilares/dor devem ser percebidos pela equipe de saúde como dificuldades e podem ser evitados quando se adotam medidas preventivas durante as consultas no período pré-natal, momento em que há a oportunidade de promoção e incentivo à amamentação (Alvarenga, et al., 2017).

Existem, ainda, mães que escolhem não amamentar por opção e utilizam algum motivo na tentativa de justificar para a sociedade e para si mesmas a escolha pela interrupção do AM dos seus filhos (Rocci & Fernandes, 2014). Tendo em consideração que a interrupção do aleitamento acarreta inúmeras consequências indesejáveis para a mãe e bebé, é de suma importância a adoção de medidas efetivas advindas dos profissionais de saúde nesse processo, fazendo com que as mulheres nesta fase da vida se sintam acolhidas e à vontade para expressar as suas dúvidas (Silva et al., 2018).

 

Conclusão

Através do presente estudo, foi possível verificar que a perceção das mães sobre o AM foi positiva, uma vez que a maioria das participantes descreveu corretamente os seus benefícios para a progenitora e para a criança.

O índice de introdução alimentar complementar precoce foi elevado no presente estudo, o que evidencia que a introdução alimentar precoce nem sempre está relacionada com a falta de conhecimento. Fatores culturais, familiares, estilo de vida e crenças pessoais também podem interferir diretamente na decisão da mulher de amamentar.

Entre as dificuldades apontadas na amamentação, o ingurgitamento mamário e lesões mamilares foram as mais recorrentes. Poucas condições podem inviabilizar a amamentação em algumas mães, porém, todos os impeditivos apontados pelas mães no estudo podem ser revertidos através de uma correta intervenção por parte dos profissionais de saúde, durante as consultas no período pré-natal, elucidando sobre os principais mitos que envolvem o processo de amamentação, o que torna necessário a capacitação dos profissionais de saúde da atenção primária, para que as suas orientações sejam efetivas e as mães se possam sentir aptas a superar dificuldades que surjam nesse processo.

As limitações do estudo são o pequeno número de participantes numa amostra de conveniência, o que não torna possível uma inferência populacional.

Como implicações, espera-se que os resultados encontrados neste estudo possibilitem fomento para a manutenção do AM, contribuindo na prevenção da morbimortalidade infantil e na promoção da relação mãe/bebé que a amamentação proporciona. Sugere-se a realização de estudos longitudinais para determinar a relação de causa e efeito, bem como estudos de intervenção para avaliação do impacto de consultas no período pré-natal na prática do AM.

 

Referências bibliográficas

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Contribuição de autores

Conceptualização: Moraes, I. C., Sena, N. L., Oliveira, H. K.

Tratamento de dados: Moraes, I. C., Sena, N. L., Albuquerque, F. H., Oliveira, H. K.

Supervisão: Rolim, K. M., Fernandes, H. I., Silva, N. C.

Redação - rascunho original: Oliveira, H. K.

Redação - análise e edição: Albuquerque, F. H., Oliveira, H. K.

 

*Autor de correspondência:

Firmina Hermelinda Saldanha Albuquerque

E-mail: hermelindaanjo@hotmail.com

 

Como citar este artigo: Moraes, I. C., Sena, N. L., Oliveira, H. K., Albuquerque, F. H., Rolim, K. M., Fernandes, H. I., & Silva, N. C. (2020). Perceção sobre a importância do aleitamento materno pelas mães e dificuldades enfrentadas no processo de amamentação. Revista de Enfermagem Referência, 5(2), e19065. doi:10.12707/RIV19065

 

Recebido: 29.09.19

Aceite: 18.05.20

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