Introdução
As infeções associadas aos cuidados de saúde (IACS) apresentam-se atualmente como as infeções mais frequentes a nível mundial segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), do Centers for Disease Control and Prevention (CDC) e do European Centre for for Disease Prevention and Control (ECDC), realçando que aproximadamente 10% dos doentes internados nos hospitais adquirem pelo menos uma infeção no decorrer do internamento (Observatório Português dos Sistemas de Saúde [OPSS], 2018).
As referidas infeções, contribuem não só para o aumento da morbilidade e mortalidade, mas também para elevadas consequências económicas e sociais, sendo classificadas como uma das principais ameaças à segurança do doente e à qualidade dos cuidados (OPSS, 2018).
Embora dados recentes indiquem uma melhoria na incidência de infeção em Portugal nos últimos anos, em particular relativamente à pneumonia associada à intubação, às bacteriemias relacionadas com cateter venoso central (CVC) e por MRSA e à infeção de prótese de joelho e de cólon e reto, não é suficiente para debelar completamente a infeção, particularmente no caso do CVC (Direção-Geral da Saúde [DGS], 2017).
Neste contexto, apresenta-se o presente estudo com o propósito de conhecer uma problemática previamente identificada na prática profissional diária de enfermagem.
Para concretizar a presente investigação foi definido como objetivo conhecer a prática clínica e o nível de conhecimentos dos enfermeiros sobre a prevenção da infeção associada ao CVC.
Enquadramento
Pela relevância que tem vindo a ser destacada no âmbito dos cuidados de saúde, a nível mundial, pelos dados da mortalidade associada e pelo aumento da resistência das bactérias aos antimicrobianos, as IACS, inicialmente designadas como infeções nosocomiais, foram definidas como infeções adquiridas em contexto hospitalar por doentes internados que não apresentavam essa patologia na admissão, as que são diagnosticadas após alta, ou ainda as diagnosticadas a profissionais de saúde, no exercício das suas funções (DGS, 2017).
Neste contexto, Campos (2016) e Silva e Oliveira (2017) consideram que a melhor definição sobre IACS diz respeito a um diagnóstico relacionado diretamente com uma reação adversa quando na presença de um agente infecioso, desde que não diagnosticado no momento da admissão na unidade hospitalar ou cujo diagnóstico seja feito após as primeiras 48h de admissão hospitalar.
Para dar resposta aos resultados apresentados, foram criados programas de vigilância epidemiológica da incidência de IACS que são coordenados, atualmente, pelo Programa Nacional de Prevenção e Controlo das Infeções e das Resistências aos Antimicrobianos (PPCIRA) e funcionam regularmente na rede europeia e nacional (DGS, 2017). No entanto, a responsabilidade de prevenir e controlar as IACS é sempre individual e coletiva, estando o êxito dos programas desenvolvidos neste contexto diretamente relacionado com o envolvimento de todos.
A presente investigação foca-se apenas nas infeções relacionadas com o CVC que, pela sua complexidade resulta da diminuição da integridade da pele e tecidos que promove contactos entre o meio ambiente e a circulação sanguínea, sendo considerado como um local de entrada para microrganismos, que podem facilmente chegar à circulação sistémica, aumentando as taxas de morbilidade e mortalidade bem como os custos associados aos cuidados de saúde, já que a sua utilização e manutenção prolongadas podem elevar o potencial de contaminação e as subsequentes infeções clínicas (Costa, 2017; Goulão, 2014; Nunes & Alminhas, 2012; Silva, 2016).
A DGS (2015, p. 9) define os feixes de intervenção associados ao CVC como “um conjunto de intervenções (geralmente 3 a 5) que, quando agrupadas e implementadas de forma integrada, promovem melhor resultado, com maior impacto do que a mera adição do efeito de cada uma das intervenções individualmente”, apresentando como objetivo primordial “assegurar que os doentes recebam tratamentos e cuidados recomendados e baseados na evidência, de uma forma consistente”.
A utilização do CVC é um procedimento bastante frequente e utilizado em doentes críticos que necessitam de cuidados complexos com recurso ao sistema intravascular para administração de fluidoterapia, de fármacos, infusão de derivados sanguíneos, nutrição parenteral, monitorização hemodinâmica, terapia renal substitutiva, entre outros, permitindo a sua utilização por períodos temporais médios a longos (Costa, 2017; Fortunatti, 2017; Goulão, 2014; Santos et al., 2014; Silva, 2014).
Neste sentido, têm sido publicadas orientações, essencialmente pelo Instituto de Melhorias na Saúde (Institute for Healthcare Improvement [IHI], 2012), com o objetivo de orientar a nível mundial, as organizações de saúde, na implementação de intervenções multimodais baseadas no conceito de care bundles (feixes de intervenções no cuidar). Estes feixes incluem um conjunto de intervenções, que se tem associado a um maior impacto na diminuição das infeções. Aspetos importantes a considerar são a formação dos profissionais de saúde, a higiene das mãos, o uso de barreira máxima de proteção na inserção do CVC, o uso de clorexidina alcoólica na antissepsia da pele, a escolha adequada do local de inserção do CVC e a sua retirada logo que possível. A implementação destas bundles deve envolver a equipa multidisciplinar de prestação de cuidados. A monitorização de boas práticas durante a inserção do CVC, respeitando uma execução conjunta em detrimento da individual, reforça o trabalho em equipa, contribuiu para uma comunicação eficaz e implica claramente a gestão integrada das intervenções e objetivos, sendo atualmente consideradas como cuidados-padrão (Fernandes et al., 2019; Silva, 2016).
A DGS (2015) considera que a aplicação de medidas de prevenção das infeções associadas ao CVC incluem os feixes de intervenções ou bundles necessárias e implementadas em conjunto para o sucesso ser atingido, ocorrendo num tempo e num local ou área específicos e que demonstraram melhoria de qualidade de cuidados e melhores resultados clínicos através da implementação destas estratégias.
Sintetizando, atualmente é cada vez mais imprescindível que se reconheça a relevância do enfermeiro enquanto agente primário de prestação de cuidados de saúde, particularmente na manutenção do CVC, exigindo-se cuidados de qualidade executados de forma criteriosa, aplicando conhecimentos e competências que cumpram as orientações emanadas a nível internacional e adaptadas para o nosso país, pela DGS, no contexto da execução dos feixes de intervenção (bundles) e dos procedimentos que lhes estão associados.
Questão de investigação
Existe relação entre a prática clínica e o nível de conhecimentos dos enfermeiros sobre a prevenção de infeção na manutenção do CVC?
Metodologia
Estudo analítico e transversal, com uma metodologia quantitativa, utilizando para o efeito um instrumento de recolha de dados aplicado em dezembro de 2018, através da técnica de amostragem por bola de neve, com a inserção do instrumento de recolha de dados na rede social Facebook, a 272 enfermeiros selecionados aleatoriamente. Da pesquisa bibliográfica realizada, o instrumento de recolha de dados baseou-se no estudo de Silva (2014) sobre Prevenção da infeção relacionada com o CVC: procedimentos de enfermagem, tendo sido solicitada autorização à autora para a sua utilização na presente investigação. Da mesma forma e no sentido de preservar o anonimato, os questionários foram apenas numerados e após o seu preenchimento as respostas foram recebidas de imediato na plataforma referida e através do endereço eletrónico criado para o efeito, facilitando e tornando mais célere todo o procedimento da recolha de dados, salvaguardando-se o direito à autodeterminação, à intimidade, ao anonimato e à confidencialidade, seguindo os princípios éticos da Declaração de Helsínquia. Foi ainda incluído o consentimento informado para preenchimento voluntário dos participantes, no sentido de garantir o respeito pelo Regulamento Geral da Proteção de Dados.
O tratamento estatístico foi realizado no programa IBM SPSS Statistics, versão 23.0 para o Windows, através da estatística descritiva, sendo calculadas as frequências relativas e absolutas, a média e o desvio-padrão. Pela aceitação do Teorema do Limite Central, em que se pressupõe normalidade quando n > 30, a presente investigação utilizou o teste de Correlação de Pearson, quando verificada a correlação entre variáveis quantitativas, o Rô de Spearman, quando verificada a correlação entre variáveis ordinais, o teste t-Student, para verificar a relação entre duas amostras independentes e o teste ANOVA, para verificar a relação entre três ou mais amostras independentes, respeitando um nível de significância de 0,05.
Resultados
A amostra apresenta uma prática clínica na realização do penso do CVC, com maior frequência de resposta nos itens “Uso as unhas curtas” (77,6%), “Uso as unhas limpas” (87,1%), “Retiro todos os adornos das mãos antes de iniciar o procedimento” (75,4%), “Registo as caraterísticas do local de inserção” (82,4%), “Registo as caraterísticas da pele circundante” (74,6%), “Higienizo as mãos imediatamente após a realização do procedimento” (79,0%), “Realizo o penso sempre que este se encontrar com perda de integridade, descolado, repassado, húmido ou o doente referir queixas” (84,%) e “Registo as queixas do doente” (74,3%). Embora os valores sejam indicadores de uma prática que cumpre as normas padronizadas relativamente à realização do penso do CVC, salientam-se ainda alguns valores indicadores de práticas diferenciadas, acerca desta área de intervenção, nomeadamente os itens “Realizo o penso 24 horas após a inserção do CVC” (21,3%), “Quando o penso é realizado com compressas faço-o de 2 em 2 dias” (10,7%) e “Quando utilizo penso transparente semipermeável realizo o penso uma vez por semana” (13,6%). De realçar que os itens “Não registo as caraterísticas do local de inserção” (86,0%), “Utilizo anéis, uma vez que as mãos estão protegidas com luvas” (76,8%), “Não higienizo as mãos entre a retirada do penso antigo e o início da antissepsia” (72,4%) são indicadores de um preenchimento adequado pois as questões foram formuladas na negativa.
Os valores obtidos sobre a prática clínica em relação à manutenção do CVC apresentam maior frequência de respostas nos itens “Retiro todos os adornos das mãos antes de iniciar o procedimento” (80,1%), “Higienizo as mãos imediatamente antes da realização do procedimento” (83,5%), “Higienizo as mãos após a realização do procedimento” (84,9%), “Substituo os sistemas e prolongadores quando têm sangue, coágulos ou sedimentos” (76,1%), “Realizo lavagem com soro fisiológico após a administração de terapêutica” (80,9%), “Após a colheita de sangue pelo lúmen realizo lavagem com soro fisiológico” (80,1%). Salienta-se maior frequência de respostas nos itens “Realizo a higienização das mãos imediatamente antes do procedimento só quando estão visivelmente conspurcadas” (81,6%), “Utilizo adornos nas mãos ou nos pulsos” (87,1%), “Quando utilizo luvas estéreis dispenso a desinfeção de acessos e torneiras antes de serem manipulados” (83,1%) e “Não higienizo as mãos imediatamente após o procedimento se tiver utilizado luvas” (82,4%).
A prática clínica apresenta níveis altos de frequência de respostas (90,1%), apresentando valores médios de resposta de 147,1. Salienta-se que 9,9% da amostra indica níveis médios de frequência de resposta.
Prática Clínica | n | % | Medidas de tendência central |
---|---|---|---|
Média = 147,1 Mediana = 148 DP = 12,78 | |||
Nível baixo (Até 66 pts) | 0 | 0,0 | |
Nível médio (67-133 pts) | 27 | 9,9 | |
Nível alto (134-200 pts) | 245 | 90,1 | |
Total | 272 | 100,0 |
Nota. DP = desvio-padrão.
Acerca do nível de conhecimentos dos enfermeiros, verifica-se uma frequência de respostas mais elevada que a encontrada na prática clínica, particularmente nos itens “As características do local de inserção devem ser registadas” (90,1%), “As unhas devem estar curtas” (85,3%), “As unhas devem estar limpas” (89,7%), “As unhas devem estar sem verniz” (77,9%), “Quando o CVC está inserido na veia subclávia, e a situação do doente o permite, deve lateralizar-se ou pedir ao doente para lateralizar a cabeça para o lado oposto, ou colocar-lhe uma máscara durante a realização do penso” (75,4%), “Deve usar-se máscara para realizar o penso” (74,3%), “Deve utilizar-se clorohexidina 2% na antissepsia” (77,7%), “Devem ser retirados todos os adornos das mãos antes de iniciar o procedimento” (82,4%), “As características da pele circundante devem ser registadas” (86,8%), “Deve-se higienizar as mãos imediatamente após a realização do procedimento” (83,5%), “Deve realizar-se o penso sempre que este se encontrar com perda de integridade, descolado, repassado, húmido ou o doente referir queixas” (90,1%). De salientar que as questões formuladas inversamente apresentam também frequência alta de resposta, nomeadamente nos itens “Não é necessário higienizar as mãos entre a retirada do penso antigo e o inicio da antissepsia” (82,4%), “Se higienizar as mãos imediatamente antes de entrar no quarto é desnecessário fazê-lo antes da realização do penso” (71,3%), “É desnecessário registar as características do local de inserção” (71,3%) e “Utilizar anéis desde que as mãos estejam protegidas com luvas, não aumenta o risco de infeção” (76,8%).
No nível de conhecimentos sobre a manutenção do CVC, verifica-se uma frequência de respostas alta, particularmente nos itens “Deve utilizar-se sempre que possível uma via única para administração de hemoderivados” (78,7%), “Deve utilizar-se sempre que possível uma via única para administrar soluções lipídicas” (76,1%), “Devem ser retirados todos os adornos das mãos antes de iniciar o procedimento” (79,8%), “Os sistemas que contenham soluções lipídicas devem ser mudados a cada 24h” (73,5%), “Deve-se higienizar as mãos imediatamente antes da realização do procedimento” (88,2%), “Deve-se higienizar as mãos após a realização do procedimento” (85,7%), “Quando existem sedimentos, sangue ou coágulos nas paredes internas dos sistemas ou prolongadores, estes devem ser substituídos” (83,5%), “Após cada administração de terapêutica é necessário efetuar lavagem com soro fisiológico” (80,5%), “É necessário fazer lavagem com soro fisiológico após colheita de sangue pelo lúmen” (81,6%). Salienta-se ainda que as questões formuladas na negativa apresentam frequência alta de respostas, nomeadamente “A higienização das mãos imediatamente antes do procedimento só deve ser feita quando estas estão visivelmente conspurcadas” (86,0%), “A utilização de adornos nas mãos ou nos pulsos não aumenta o risco de infeção” (73,2%), “A utilização de luvas estéreis dispensa a desinfeção de acessos e torneiras antes de serem manipulados” (83,8%), “Não é necessário higienizar as mãos imediatamente após o procedimento se tiverem sido utilizadas luvas” (84,6%).
Observou-se um nível de conhecimentos alto (85,7%), para a realização do penso e manutenção do CVC, apresentando valores médios de resposta de 144,2.
Salienta-se que 13,6% da amostra indica níveis médios de conhecimentos e 0,7% da amostra apresenta níveis baixos de conhecimentos.
Nível de Conhecimentos | n | % | Medidas de tendência central |
Média = 144,2 Mediana = 145,5 DP = 12,72 | |||
Nível baixo (Até 66 pts) | 2 | 0,7 | |
Nível médio (67-133 pts) | 37 | 13,6 | |
Nível alto (134-200 pts) | 233 | 85,7 | |
Total | 272 | 100,0 |
Nota. DP = desvio-padrão.
Os resultados obtidos da correlação entre o nível de conhecimentos e a prática clínica indicam uma correlação positiva, moderada e estatisticamente significativa, isto é, quando um aumenta o outro segue a mesma tendência. Os resultados indicam uma correlação estatística altamente significativa pois p = 0,000, validando-se o objetivo, isto é, existe relação entre os conhecimentos dos enfermeiros sobre normas preconizadas e a sua prática clínica em relação à manutenção do CVC, ou seja, a um nível de conhecimentos alto corresponde a uma prática clínica alta.
Prática Clínica na Realização do Penso do CVC, Manutenção do CVC | |||
---|---|---|---|
Nível de conhecimentos sobre a Realização do Penso e Manutenção do CVC | Correlação de Pearson | 0,702** | |
p | 0,000 | ||
** A correlação é significativa no nível 0,01 (2 extremidades).
No sentido de contextualizar teoricamente os dados obtidos na investigação empírica, descreve-se de seguida a discussão dos resultados.
Discussão
Nos valores da prática profissional dos participantes na realização do penso do CVC, as técnicas com maior frequência de aplicação incluíram os itens relacionados com a forma como são tratadas as unhas na aplicação da prática, enquanto fonte provável de infeção, assim como os adornos utilizados, a higienização, a forma como se realiza o penso e ainda os registos associados. Os resultados obtidos são concordantes com a revisão da literatura efetuada, nomeadamente, com o estudo de Furuya et al. (2011) e Silva (2014).
Os resultados obtidos sobre a prática clínica em relação à manutenção do CVC indicam maior frequência de resposta nos itens relacionados com os adornos, com a higienização das mãos, substituição de equipamentos, forma de realizar as lavagens e utilização de luvas. Neste sentido, os resultados são corroborados por Silva (2014) e Fernandes et al. (2019).
Os resultados obtidos relativamente ao nível de conhecimentos dos enfermeiros acerca da realização do penso do CVC indicam maior frequência de respostas nos itens relacionados com as caraterísticas do local de inserção, a forma de tratamento das unhas, enquanto foco provável de infeção, a técnica de colocação do doente, os equipamentos a utilizar aquando da realização do penso do CVC, a higienização e a forma de realização do penso. Os dados obtidos na presente investigação são também corroborados por Osorio et al. (2013) que indicam que a aplicação dos feixes de intervenção contribuiu para uma adesão dos profissionais ao cumprimento das medidas superior a 80% e para a redução da taxa de infeções da corrente sanguínea associada ao CVC entre 3,26 e 5,56 por 1000 dias de presença deste dispositivo.
Já relativamente aos resultados sobre o nível de conhecimentos dos enfermeiros em relação à manutenção do CVC, os que apresentam maior frequência de resposta são os itens relacionados com a administração de hemoderivados e soluções lipídicas, com os adornos das mãos, com a mudança ou substituição dos sistemas, com a higienização, com a forma como deve ser efetuada a lavagem do sistema e com a utilização de luvas. Os resultados globais altos obtidos acerca da prática clínica na realização do penso do CVC e à manutenção do CVC, indicam que a maioria da amostra, na sua prática clínica, aplica de forma contínua, as estratégias relacionadas com a prevenção da infeção do CVC.
Relativamente ao nível de conhecimentos acerca da realização do penso do CVC e à manutenção do CVC, a amostra apresenta níveis altos de conhecimentos, na sua maioria. Os dados obtidos são opostos aos resultados apresentados no estudo de Ullman et al. (2014), que concluíram que os enfermeiros do estudo apresentaram algumas lacunas nos conhecimentos acerca da prevenção das infeções associadas ao CVC, assim como grandes diferenças entre o que reconhecem como teoria e o que aplicam na sua prática profissional diária, aconselhando uma atenção redobrada da parte da equipa de prestação de cuidados, na prevenção deste tipo de infeções. O mesmo referem Silva e Oliveira (2017), concluindo que existe baixa adesão global à higiene das mãos (22,7%) e desinfeção do cateter (10,4%) pelos enfermeiros, salientando que o nível de conhecimentos não apresenta associação estatística direta com a prática clínica.
Relativamente à questão de partida, os resultados obtidos indicam uma correlação estatística altamente significativa, isto é, existe correlação estatística significativa entre os conhecimentos dos enfermeiros sobre normas preconizadas e a prática clínica sobre a manutenção do CVC. Os resultados obtidos são também defendidos por Cherifi et al. (2013), no seu estudo sobre o impacto de um programa de aplicação de feixes de intervenção para controlo de infeção do CVC em cinco Unidade de Cuidados Intensivos da Bélgica, tendo concluído que houve redução da taxa de infeções associada ao CVC pela utilização de feixes de intervenção, acrescentando ainda que quanto maior a monitorização sobre a utilização de feixes de intervenção, maior a redução da taxa de infeção associada ao CVC. Realçaram também que os fatores mais relevantes que influenciaram a eficácia na aplicação dos feixes de intervenção se pautaram pela falta de liderança, o apoio dentro da própria UCI e a alta rotatividade de enfermeiros. O mesmo, consideram Lopes et al. (2012) reforçando que uma baixa incidência de infeção pode ser explicada por um forte programa de controlo de infeção ativo associado à educação permanente dos profissionais de saúde e à revisão frequente dos protocolos de cuidado. Já Perin et al. (2016) reforçam que a associação de técnicas assépticas com a adesão à aquisição contínua de conhecimentos e responsabilização pela aplicação direta destas técnicas pelos profissionais de saúde são estratégias que contribuem diretamente para a diminuição das taxas de infeção do CVC, particularmente em UCI.
Salienta-se ainda que os dados obtidos na presente investigação, na sua grande maioria, vão ao encontro das orientações internacionais e nacionais sobre a manutenção do CVC, particularmente o que refere o IHI, a OMS, o CDC e o ECDC quando aconselham à aplicação de feixes de intervenções que respeitem a higienização das mãos; as precauções máximas de barreira; a antissepsia do local de inserção; o otimizar do local de inserção (preferencialmente a veia subclávia), rever diariamente a necessidade de manter o cateter, removendo-o precocemente e ainda o que considera como fulcral a DGS (2017), quando exige o cumprimento dos protocolos associados à prevenção da infeção do CVC, no respeito pelos feixes de intervenção. Os resultados obtidos no presente estudo são similares aos resultados apresentados por Costa (2017) e Fernandes et al. (2019).
Salienta-se que os resultados não permitem a sua extrapolação para a população geral, apresentando-se como uma das limitações ao estudo. Paralelamente, foram ainda sentidos alguns condicionalismos pessoais nomeadamente a dificuldade em articular a disponibilidade temporal.
Dos resultados apresentados assume-se que a prática clínica, quando aliada ao nível de conhecimentos é de extrema importância enquanto fator de diferenciação na prestação de cuidados de enfermagem especializados contribuindo diretamente para a garantia da qualidade dos cuidados prestados. A prevenção da infeção é atualmente uma necessidade altamente evidenciada, considerando os contextos globais e pandémicos em que nos encontramos.
Conclusão
A questão “Existe relação entre a prática clínica e o nível de conhecimentos dos Enfermeiros sobre a prevenção da infeção associada ao Cateter Venoso Central?” foi claramente respondida, concluindo-se que a amostra apresenta um nível alto de conhecimentos acerca das normas de manutenção do CVC preconizadas para a prevenção da infeção e uma prática clínica que respeita, na sua maioria, as orientações sobre a aplicação dos feixes de intervenção nas práticas de prevenção da infeção do CVC.
Concluiu-se ainda que as intervenções mais frequentes no decurso de qualquer intervenção relacionada com o CVC vão ao encontro das normas publicadas por organizações de saúde internacionais e nacionais, nomeadamente no que diz respeito à higienização das mãos, à utilização das precauções máximas de barreira, à antissepsia e otimização do local de inserção; à revisão diária da necessidade de manter o cateter ou removê-lo quando necessário, bem como ao cumprimento dos protocolos associados à prevenção da infeção do CVC, no respeito pelos feixes de intervenção, dando como integralmente concretizado o objetivo definido previamente. Concluiu-se também que existe correlação estatística significativa entre a prática clínica e os conhecimentos dos enfermeiros sobre normas preconizadas em relação à manutenção do CVC, concretizando-se assim a questão de partida. Os resultados obtidos na presente investigação estão de acordo com os protocolos adotados pelas organizações de saúde públicas e privadas em Portugal, no que diz respeito à prevenção da infeção associada à manutenção do CVC, garantindo que a sua incidência diminua, potenciando um nível elevado de qualidade na prestação dos cuidados de saúde e prevenindo o aumento das taxas de mortalidade, ainda elevadas, relacionadas com a infeção associada ao CVC. Neste contexto, o papel do enfermeiro tem vindo a ser cada vez mais valorizado como primeiro elemento de intervenção para a prevenção, particularmente no âmbito da infeção associada ao CVC, na aplicabilidade dos protocolos, na concretização de ensinos e na consequente monitorização dos procedimentos de prevenção da infeção associada à manutenção do CVC, contribuindo diretamente para a implementação das competências teórico/práticas. Enquanto contributo para a melhoria da qualidade dos cuidados de saúde prestados e pela evidência e relevância da temática da presente investigação, pretende-se apresentar os dados no contexto futuro de formação em serviço. Pela pertinência que a intervenção no âmbito prático dos cuidados de enfermagem apresenta, a formação especializada no contexto das boas práticas de manutenção do CVC garante a diminuição de focos de infeção, envolvendo diretamente os profissionais de saúde e permitindo mudanças comportamentais.