Introdução
Na atualidade, os cuidados de saúde proporcionam ganhos em saúde sem precedentes às gerações vindouras de doentes e suas famílias, porém, estas conquistas acarretam riscos associados, como o das infeções associadas aos cuidados de saúde (IACS; Aloush, 2018). Em 2011, a World Health Organization (WHO) definiu as IACS como infeções adquiridas em meio hospitalar no decurso da prestação de cuidados ao doente durante o seu período internamento, sem que as mesmas estejam presentes no período de admissão. As IACS representam na atualidade uma significativa ameaça à segurança do doente e à qualidade dos cuidados (Souza et al., 2015). Segundo a Ordem dos Enfermeiros (OE, 2017), as IACS são definidas como uma situação clínica resultante de reações orgânicas de agentes infeciosos ou das suas toxinas, adquirida pelas pessoas em consequência dos cuidados e procedimentos de saúde prestados, podendo afetar também os profissionais de saúde durante o exercício da sua atividade. Dos vários serviços de internamento a nível hospitalar, um dos que representa maior risco de infeção é o serviço de medicina intensiva (SMI). Este serviço apresenta-se como um serviço especializado, que dispõe de assistência médica e de enfermagem ininterrupta, recursos humanos extremamente qualificados e acesso às tecnologias de diagnóstico e terapêuticas mais sofisticadas. Uma das mais predominantes é a infeção nosocomial da corrente sanguínea (INCS) com origem em microrganismos da flora da pele, resultante da infeção do local de inserção do cateter, da perfusão de soluções intravenosas contaminadas, pela ligação de dispositivos médicos e pelas mãos dos profissionais de saúde. Em 2017 foram realizados novos estudos sobre a infeção hospitalar em Portugal, e a prevalência de IACS foi de 7,8% (10,5% em 2012), ocorrendo também um decréscimo positivo na pneumonia associada à intubação endotraqueal em UCI de adultos em 2016, com valores de 7,1 por 1000 dias de intubação (Direção-Geral da Saúde [DGS], 2017). E segundo o mesmo autor, no que se refere à infeção associada ao cateter venoso central (CVC) em UCI de adultos, a taxa de incidência por 1000 dias de cateter foi de 0,9.
Borges e seus colaboradores, em 2018, estabeleceram uma relação entre o risco de adquirir infeção com o tipo de solução em perfusão, permanência do cateter no doente, bem como a experiência dos profissionais em doentes críticos.
Apesar de os resultados apresentarem uma tendência decrescente, estas infeções hospitalares, atualmente, assumem um desafio aquando da prestação de cuidados ao doente crítico hospitalizado, bem como a prevenção e o controlo de procedimentos invasivos (Souza et al., 2015). Por conseguinte, segundo o mesmo autor, ao longo do seu exercício profissional o enfermeiro deve perspetivá-la como essencial na sua ação e no seu contexto de trabalho. Face ao exposto, o objetivo deste trabalho é analisar o Índice de Qualidade de Manutenção (IQM) do CVC num SMI de um centro hospitalar do norte de Portugal.
Enquadramento
No SMI, os cuidados prestados assumem maior complexidade, devido ao uso de métodos cada vez mais invasivos de tratamento e diagnóstico, mas também a fatores relacionados com a própria pessoa as IACS desenvolvem-se com maior facilidade (Oliveira, Meneses, et al., 2015). O doente crítico apresenta um risco consideravelmente mais elevado para a aquisição destas infeções (Tajeddin et al., 2016). Esta realidade emerge do uso de dispositivos invasivos, em particular linhas centrais, cateteres urinários e tubos endotraqueais (Tajeddin et al., 2016). Assim, o CVC é um dispositivo médico invasivo de acesso à circulação venosa e a sua utilização no doente crítico tornou-se prática diária e imprescindível, em ambiente de cuidados intensivos, devido não só ao acesso vascular de alto débito para a administração de fluidos, sangue, hemodiálise e suporte nutricional, mas também a questões relacionadas com a monitorização hemodinâmica (Aloush, 2018; Günther et al., 2016; Mushtaq et al., 2018). Na atualidade, o uso do CVC com fins diagnósticos e terapêuticos é cada vez mais frequente, mas, simultaneamente, são responsáveis por cerca de 90٪ das bacteriemias a nível hospitalar (Mushtaq et al., 2018). A nível europeu, em 2017, cerca de 8,3% dos doentes críticos internados nos SMI adquiriram durante o seu internamento neste serviço uma IACS: pneumonia, infeção da corrente sanguínea (ICS) ou infeção do trato urinário (European Centre for Disease Prevention and Control, 2017). A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) em 2017 referiu que as contaminações pelo CVC são a principal causa de INCS.
Deste modo, a introdução da Norma n.º 022/2015 (DGS, 2015) e a adesão do SMI ao programa HELICS-UCI contribuiu para a introdução dos feixes de intervenção bem como para vigilância epidemiológica da infeção da corrente sanguínea associada ao CVC. As guidelines relativas à prestação de cuidados à pessoa com CVC encontram-se descritas como feixes de intervenção, quer para a fase de inserção, quer para a fase de manutenção do CVC (DGS, 2015).
Metodologia
Trata-se de um estudo analítico e transversal, realizado no SMI de uma unidade hospitalar do Norte de Portugal, no período de abril a junho de 2019. A amostra foi constituída por 35 enfermeiros, que realizaram 170 procedimentos de manutenção do CVC. A recolha de dados através da grelha de observação direta foi efetuada pela investigadora, nos seus turnos de trabalho (roulement), em colaboração com a equipa de enfermagem do Programa Nacional para a Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência aos Antimicrobianos (PPCIRA). Foram realizadas 170 observações diretas de forma aleatória aos participantes no estudo respeitantes aos feixes de intervenção na Prevenção da Infeção Relacionada com o CVC (PIRCVC) no momento da manutenção. O número de observações por profissional foi em média de 4,8 observações.
Foram respeitadas todas as normas éticas e os direitos dos participantes, tendo por base o que está consignado na Declaração de Helsínquia e na Convenção de Oviedo. O estudo foi submetido para análise e autorização ao Presidente do Conselho de Administração e à Comissão de Ética do hospital, tendo obtido a sua aprovação em 20/12/2018, com o n.º 494/2018. Todos os participantes deram o seu consentimento informado, após conhecerem os objetivos do estudo. Os dados foram codificados, inseridos e analisados em programa informático de forma a garantir e respeitar o anonimato dos participantes no software informático IBM SPSS Statistics, versão 25.0. Recorremos à estatística descritiva, através do cálculo da frequência absoluta e relativa para todas as variáveis categóricas em estudo. Para analisar a correlação entre variáveis contínuas foram utilizados os seguintes testes estatísticos: o coeficiente de correlação de Pearson (r), para a comparação de médias, o teste t-Student e análise de variância a dois fatores (Anova). O IQM foi calculado dividindo a soma das respostas positivas pelo número de respostas aplicáveis. Para a definição da amostra partiu-se de um IQM esperado do CVC de pelo menos 80%. Consideramos como valor de significância 0,05.
O instrumento de recolha de dados utilizado para a caraterização sociodemográfica foi um questionário constituído por 12 questões fechadas, que inclui: idade, sexo, habilitações académicas e profissionais, experiência profissional, formação na área de PIRCVC e perceção dos conhecimentos de cada elemento acerca da temática em causa. Foi também aplicada uma grelha de observação direta como instrumento de recolha de dados junto da equipa de trabalho anteriormente referida. Esta foi adaptada com base no feixe de intervenções de PIRCVC da Norma n.º 022/2015 (DGS, 2015). Face à importância das guidelines emanadas na PIRCVC, tornou-se imprescindível o acrescento de mais feixes de intervenções a serem observados na grelha de manutenção/realização de penso do CVC, tais como: evidência de utilização de via única para administração de hemoderivados, soluções lipídicas e para nutrição parentérica total (NPT); evidência de substituição de sistemas e prolongadores a cada 96 horas; evidência de substituição dos sistemas que contenham soluções lipídicas a cada 24 horas (NPT); evidência de substituição de sistemas que contenham propofol a cada 6 a 12 horas; evidência da substituição dos sistemas e prolongadores que contêm sangue, coágulos ou sedimentos; evidência de realização de lavagem com soro fisiológico após a administração de terapêutica em bólus; evidência de manutenção das torneiras protegidas com campo estéril; evidência de registo das queixas do doente quando possível e higienização das mãos após a realização do procedimento.
Resultados
A média de idades da equipa de enfermagem (n = 35) foi de 33,9 anos (DP ± 6,0 anos) com um mínimo de 26 anos e um máximo de 59 anos. A maioria dos participantes era do sexo feminino (71,4%), sendo a habilitação académica predominante a licenciatura com 48,6%, seguida de 34,3% de enfermeiros com categoria profissional de enfermeiro especialista. Destes, 91,7% eram detentores de especialização em enfermagem médico-cirúrgica (Tabela 1).
Variáveis | n % | |||
Sexo | Masculino | 10 | 28,6 | |
Feminino | 25 | 71,4 | ||
Idade | 26 - 29 anos | 7 | 20,0 | |
30 - 39 anos | 24 | 68,6 | ||
40 - 49 anos | 3 | 8,6 | ||
50 - 59 anos | 1 | 2,9 | ||
Média ± DP | 33,9 ± 6,0 | |||
Habilitações académicas | Licenciatura | 17 | 48,6 | |
Pós-graduação | 6 | 17,1 | ||
Especialidade | 4 | 11,4 | ||
Mestrado | 8 | 22,9 | ||
Área de especialização da equipa de enfermagem | EMC | 11 | 91,7 | |
Reabilitação | 1 | 8,3 | ||
Regime de trabalho | Por turnos | 34 | 97,1 | |
Horário fixo | 1 | 2,9 |
Nota. DP = desvio-padrão; EMC = enfermagem médico-cirúrgica.
No que concerne à experiência profissional da equipa, podemos verificar na Tabela 2 que a média do tempo de serviço é elevada, com aproximadamente 11 anos, havendo um decréscimo relativo ao exercício profissional na instituição (7,5 anos), sendo a permanência no SMI o que apresenta menor média (5,6 anos).
Variáveis | Média ± DP |
Tempo de exercício profissional | 10,8 ± 6,7 |
Tempo de exercício profissional na instituição | 7,5 ± 6,7 |
Tempo de exercício profissional no SMI | 5,6 ± 5,9 |
Nota. SMI = serviço de medicina interna; DP = desvio-padrão.
Na Tabela 3, pode-se observar que todos os participantes afirmaram possuir conhecimentos relativamente à PIRCVC, dos quais 60% classificaram esse conhecimento como bom. De entre os 35 enfermeiros inquiridos, 85,7% admitiu ter formação nesta área. Quando questionados acerca da proveniência da formação, 93,3% referiu que a mesma foi em contexto de trabalho.
Variáveis | n | (%) | ||
---|---|---|---|---|
Conhecimentos sobre PIRCVC | Sim | 35 | 100 | |
Autoavaliação dos Conhecimentos sobre PIRCVC | Suficiente | 13 | 37,1 | |
Bom | 21 | 60 | ||
Excelente | 1 | 2,9 | ||
Formação sobre PIRCVC | Sim | 30 | 85,7 | |
Não | 5 | 14,3 | ||
Formação: | Em serviço | Sim | 28 | 93,3 |
Não | 2 | 6,7 | ||
Académica | Sim | 6 | 20 | |
Não | 24 | 80 | ||
Congressos, seminários | Sim | 3 | 10 | |
Não | 27 | 90 | ||
Tempo decorrido desde a última formação | < 6 meses | 20 | 57,1 | |
1 ano | 10 | 28,6 | ||
>2 anos | 0 | 12,5 | ||
>3 anos | 5 | 14,3 | ||
Conhecimento da existência de norma sobre CVC | Sim | 35 | 100 | |
Padronização cuidados na colocação/manutenção do CVC | Sim | 35 | 100 |
Nota. PIRCVC = prevenção da infeção relacionada com o cateter venoso central; CVC = cateter venoso central.
O IQM geral do CVC foi de 89,2%. Os níveis de adesão mais baixos estão relacionados com a higiene das mãos com água e sabão de pH neutro (67,1%), desinfeção alcoólica das conexões (71,8%), substituição do sistema do Propofol 12h/12h (24,4%) e realização do penso CVC com técnica assética (72,2%; Tabela 4).
Critérios | Categoria | ||
S ₊ N | S | IQ (%) | |
1 - Avaliação diária da razão da manutenção do CVC | 170 | 132 | 77,6 |
2 - Higiene das mãos com água e sabão de pH neutro | 170 | 114 | 67,1 |
3 - Desinfeção alcoólica das mãos | 170 | 166 | 97,6 |
4 - Desinfeção alcoólica das conexões | 170 | 122 | 71,8 |
5 - Realização do penso CVC com técnica assética | 90 | 65 | 72,2 |
6 - Periodicidade da realização do penso CVC | 90 | 89 | 98,9 |
7 - Desinfeção alcoólica/lavagem das mãos no final dos procedimentos | 170 | 133 | 78,2 |
8 - Via única para perfusão de sangue até um máximo de 4h após início | 8 | 8 | 100 |
9 - Via única para NPT | 24 | 24 | 100 |
10 - Substituição do sistema da NPT às 24h | 24 | 24 | 100 |
11 - Substituição do sistema do Propofol 12h/12h | 82 | 20 | 24,4 |
12 - Substituição de sistemas de soros, soluções eletrolíticas e perfusões de 96h/96h | 170 | 170 | 100 |
13 - Substituição de sistemas e/ou prolongadores com sangue ou coágulos | 33 | 33 | 100 |
14 - Lavagem com SF (0,9%) após terapêutica em bólus | 160 | 159 | 99,4 |
15 - Torneiras 3 vias obturadas e protegidas com campo estéril | 170 | 169 | 99,4 |
Índice de Qualidade da Manutenção do CVC | 1601 | 1428 | 89,2 |
Nota. CVC = cateter venoso central; NPT = nutrição parenteral total; SF = soro fisiológico; S ₊ N = número de respostas aplicáveis. Obtém-se subtraindo o número de respostas não aplicáveis do número de questões avaliadas. S = respostas positivas; IQ= Índice de Qualidade.
De acordo com a Tabela 5 foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre o IQM do CVC e o sexo, registando o sexo feminino uma média maior que o masculino (t = 2,474; p = 0,019).
O IQM do CVC, é influenciado pela categoria profissional, verificamos que os enfermeiros especialistas apresentam maior IQM do CVC (t = 4,110; p < 0,001).
Foram também detetadas diferenças estatisticamente significativas entre o IQM do CVC e as habilitações académicas dos enfermeiros (F = 4,779; p = 0,008). De acordo com o teste Post hoc de Bonferroni foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre as habilitações académicas licenciatura e mestrado (p = 0,018).
Não foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre o IQM do CVC, a idade, o tempo de exercício profissional na instituição e o tempo de exercício no SMI, com um valor de p > 0,05 (Tabela 5).
Variável dependente | Variável independente | Categoria | n | ± DP | t | p | ||||||
IQM | Equipa enfermagem (n = 35) | Sexo | Masculino | 10 | 77,9±9,3 | -2,474 | 0,019 | |||||
Feminino | 25 | 84,8±6,9 | ||||||||||
Equipa Enfermagem (n = 35) | Categoria profissional | Enfermeiro | 23 | 78,9±8,3 | - 4,110 | 0,000 | ||||||
Enfermeiro especialista | 12 | 88,8±2,3 | ||||||||||
F | p | |||||||||||
IQM | Equipa Enfermagem (n = 35) | Habilitações académicas | 4,779 | 0,008 |
Nota. IQM = índice de qualidade médio; DP = desvio-padrão; t = Teste t-Student; p = valor de significância F = Leneve.
Discussão
A amostra deste estudo foi constituída por 35 profissionais de enfermagem, predominantemente do sexo feminino com idade entre os 30 e os 39 anos. Estes resultados vão ao encontro do perfil encontrado por Nunes em 2018, os quais justificam este perfil pelo facto de estes serviços serem promotores de um maior desafio, complexidade e motivação para os jovens profissionais em início de carreira. Assim, segundo o mesmo autor, os profissionais mais velhos não apresentam maioritariamente motivação para a formação contínua e atualização de conhecimentos não tolerando a pressão que lhes é exercida nestes serviços, acabando por serem transferidos. Constatámos também que a maioria da nossa amostra era constituída por elementos do sexo feminino, resultados que estão em consonância com os dados emanados pela Ordem dos Enfermeiros (2018), onde se pode verificar que 82,2% dos enfermeiros a exercer funções nesse ano no território nacional são do sexo feminino. Além disso, ser do sexo feminino também foi associado a maior pontuação no IQM do CVC (84,9% vs 77,9%). Resultados similares foram obtidos por Oliveira et al. (2016), através dos quais verificou que profissionais do sexo feminino e possuir mais treino em prevenção de infeção, melhora o IQM do CVC. Nas habilitações académicas verificou-se que 48,6% dos enfermeiros possuem licenciatura e 34,3% formação pós-graduada (especialidade e mestrado), com predomínio de especialização em enfermagem médico-cirúrgica (EMC; 91,7%). Este resultado é bastante relevante tendo em conta que a Ordem dos Enfermeiros (2018), referiu que apenas 21,6 % dos enfermeiros especialistas nestes serviços possuíam especialização em EMC. De acordo com o Regulamento n.º 743/2019, de 25 de setembro, assume cada vez mais relevância a importância de que as equipas dos SMI tenham na sua constituição pelo menos 50% de enfermeiros especialistas em EMC, preferencialmente na área da enfermagem à pessoa em situação crítica, em permanência nas 24 horas, devendo idêntica regra ser assegurada na constituição de cada turno. Pela análise dos resultados podemos constatar que, de entre a equipa, 34,2% são enfermeiros especialista (12), dos quais 91,7% são detentores da especialidade médico-cirúrgica. Apesar de no presente estudo do total de enfermeiros apenas 34,3% apresentarem formação pós-graduada (especialidade e mestrado), destes a percentagem de especialistas em EMC é superior (91,7%) à recomendação emanada pelo regulamento anteriormente referido.
A experiência profissional no SMI foi uma variável analisada para perceber se os profissionais seriam experientes na manipulação do CVC, uma vez que é uma prática comum nestes serviços e pouco ou nada utilizada noutros contextos do exercício profissional. Verificou-se que a maioria dos participantes tinha em média mais de 5 anos de exercício profissional no atual SMI, pelo que podemos afirmar que são experientes ou mesmo peritos na sua área de prestação de cuidados tal como verificado em outro estudo, visto possuir pelo menos 5 anos de experiência profissional em ambiente de cuidados intensivos (Oliveira et al., 2016).
Para a DGS (2015), os feixes de intervenção, quando agrupados e implementados de forma integrada, promovem melhor resultado, com maior impacto do que a adição do efeito de cada uma das intervenções individualmente. O IQM do CVC foi de 89,2%, considerado dentro do recomendado, uma vez que se encontra acima de 80%, ou próxima de 95%, resultado corroborado por outros estudos (Oliveira, Caetano, et al., 2015, Oliveira, Meneses, et al., 2015; Oliveira et al., 2016; Padilla Fortunatti, 2017). Ainda de acordo com os mesmos autores, o valor IQ individual relacionado com a desinfeção alcoólica das conexões, foi de apenas 17,5% comparativamente com o detetado no presente estudo, que foi de (71,8%). O conhecimento da equipa de enfermagem mostrou-se homogéneo no que respeita à periocidade da realização do penso do CVC, com um IQ de 98,9%. Ou seja, quando este é realizado com compressa o mesmo deve ser trocado a cada 24 horas, e no caso de utilização de penso transparente o mesmo deve ser substituído ao fim de 7 dias e, sempre que se apresente húmido, descolado ou repassado com sangue deve ser imediatamente trocado (Bell & O’Grady, 2017; DGS, 2015; Oliveira, Caetano, et al., 2015; Oliveira, Meneses, et al., 2015; Oliveira et al., 2016). No que respeita à realização do penso com técnica assética, no nosso estudo o valor do IQ foi de apenas 72,2%. Assim, a equipa de enfermagem atinge uma taxa de incumprimento neste parâmetro de 27,8%, onde 43,8% dos enfermeiros não utilizaram campo esterilizado/kit de penso, 25% destaca-se pelo não cumprimento do uso de máscara e luvas esterilizadas e, por fim, 6,2% dos enfermeiros não efetuaram corretamente a antissepsia da pele com clorohexidina a 2%, quer no momento de aplicação, quer no momento de secagem.
Relativamente à prática da higiene das mãos levadas a cabo em diferentes momentos, verificamos que o IQ individual obtido na higiene das mãos antes da manipulação do CVC foi de apenas 67,1% e o IQ individual da desinfeção alcoólica/lavagem das mãos no final dos procedimentos foi superior com 78,2%, resultados que se situam abaixo do IQ considerado ideal (80%). Estes resultados são corroborados pelo estudo de Oliveira, Meneses, e seus colaboradores (2015), onde o procedimento da higienização das mãos foi nulo, ou seja, não se realizou, o que demonstrou a falta de adesão dos profissionais ao procedimento de higienização das mãos. Diferentes autores (Oliveira, Caetano, et al., 2015; Padilla Fortunatti, 2017) realçam a importância da higiene das mãos, visto que esta é baseada na capacidade de as mãos alojarem microrganismos e transferi-los de uma superfície para outra, por contacto direto, pele com pele, ou indireto, através de objetos potencialmente contaminados. Deste modo, o controlo destas infeções por intermédio da higienização cuidadosa e frequente das mãos (os cinco momentos) atende às exigências legais e éticas, promove a segurança e qualidade da atenção prestada ao doente crítico. Outros estudos (Oliveira, Meneses, et al., 2015; Padilla Fortunatti, 2017) referem que a origem da negligência dos profissionais de saúde para com a realização da técnica da higienização das mãos, pode estar relacionada com reações cutâneas nas mãos, falta de motivação, tempo, preparação e consciência sobre a importância das mãos na transmissão de microrganismos; contudo, no nosso estudo acredita-se que a baixa adesão à higienização das mãos antes dos procedimentos selecionados possa estar relacionada com o tempo de higienização ou desinfeção menor que o recomendado e, por isso, tenha sido contabilizado como incorreto; ou simplesmente pelo uso frequente de luvas, não ocorrendo sempre a higienização das mãos aquando de cada troca de luvas. Destaca-se o não cumprimento por parte dos enfermeiros da substituição do sistema de perfusão do propofol 12/12 horas na sua totalidade (IQ de 24,4%). Os sistemas de perfusão para a administração de propofol devem ser substituídos a cada 6 ou 12 horas, dependendo das indicações do laboratório (ANVISA, 2017; Bell & O’Grady, 2017; DGS, 2015). Este resultado deve-se ao facto de a equipa de enfermagem efetuar maioritariamente a troca de seringa de propofol quando esta termina, e não ao fim das 6h-12h, nomeadamente quando o ritmo de perfusão da mesma é baixo, a fim de minimizar desperdício de terapêutica e de material de consumo clínico.
A categoria profissional influenciou também o valor obtido do IQM do CVC, isto porque ser detentor de uma especialidade tem influência no IQM do CVC com um valor de p < 0,001. Considerando que o Regulamento n.º 429/2018, de 16 de julho, considera como competências específicas do enfermeiro especialista em enfermagem médico-cirúrgica tratar a pessoa em situação crítica e maximizar a prevenção, intervenção e controlo da infeção e de resistência a antimicrobianos, provavelmente o elevado IQM do CVC obtido no presente estudo deve-se à elevada percentagem de enfermeiros com esta especialidade. Assim, podemos dizer que ser detentor desta especialidade permite obter melhores IQM do CVC, provavelmente porque estes conteúdos foram abordados na teoria e na prática ao longo da formação académica/profissional. O desafio das instituições de saúde atualmente está em criar um modelo adequado, de acordo com a orgânica de cada serviço, com vista a garantir o sucesso da intervenção, motivando os profissionais de saúde no seu exercício profissional (ANVISA, 2017; Oliveira et al., 2016). Com esse intuito, e de acordo com o Regulamento n.º 743/2019, de 25 de setembro (OE), assume cada vez mais relevância a importância de que as equipas dos SMI, tenham na sua constituição pelo menos 50% de enfermeiros especialistas em EMC, preferencialmente na área da enfermagem à pessoa em situação crítica, devendo idêntica regra ser assegurada na constituição de cada turno.
A formação e o treino permanente de toda a equipa são estratégias fundamentais no que respeita à inserção e aos cuidados de manutenção e manipulação do CVC para a equipa de enfermagem, nomeadamente para a prevenção das INCS associadas ao CVC (ANVISA, 2017; Oliveira et al., 2016). Estes resultados são animadores e provavelmente refletem o valor apresentado pelo IQM do CVC encontrado. Embora os dados apresentados apenas digam respeito à subjetividade dos inquiridos, com diferentes percursos e experiências, considerámos ser válida a opinião que assumem ter sobre a prevenção da infeção associada ao CVC e a sua adesão no momento da manutenção neste serviço, bem como o que esta representa nas suas vidas profissionais. As principais limitações deste estudo são essencialmente a reduzida amostragem e, consequentemente, a reduzida frequência de observações, bem como a restrição a um único SMI.
Conclusão
Verificou-se que o IQM do CVC está dentro do recomendado, acima de 80%, com exceção dos parâmetros de higiene das mãos com água e sabão de pH neutro, desinfeção alcoólica das conexões, realização do penso CVC com técnica assética e substituição do sistema do Propofol 12h/12h. As habilitações académicas, o ser enfermeiros especialista e o sexo influenciou o valor do IQM do CVC obtido, apresentando valores médios mais altos. Pelos resultados obtidos, pensamos que a formação dos profissionais de saúde é uma estratégia essencial para a prevenção e redução dos riscos de infeção, pelo que realçamos a importância da formação contínua, visando os indicadores com menor adesão neste estudo, a formação académica para a constante atualização de conhecimentos, apontando a prestação de cuidados de enfermagem de elevada qualidade. Sugerimos dotar estes serviços de enfermeiros especialistas, e em particular na área da EMC, cumprindo o legalmente estipulado. A implementação de campanhas de sensibilização para a importância da lavagem das mãos com vista a aumentar a taxa de conformidade neste feixe de intervenção. Sugerimos, ainda, a realização de outros estudos com amostras maiores e por um período mais alargado, em serviços distintos, identificando outros fatores de riscos, permitindo retirar inferências por forma a otimizar os cuidados de enfermagem, garantindo cuidados de saúde de maior qualidade.