Introdução
Intervir de forma centrada nas necessidades da pessoa submetida a cirurgia ambulatória, dar resposta aos seus objetivos e expectativas, exige do enfermeiro o planeamento do regresso a casa. Este planeamento é primordial para que haja adesão terapêutica por parte da pessoa. Assim, a consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia ambulatória assume-se como um instrumento fundamental para identificar, documentar e comunicar fatores de risco da pessoa (Malley et al., 2015). Evidentemente, que neste contexto se colocam aos enfermeiros exigências, nomeadamente ao nível da comunicação, informação e relação de ajuda. Salienta a evidência científica, que deve ser dado ênfase ao desenvolvimento de competências ao nível da comunicação, educação e informação (Mitchell, 2016).
Também sustenta que a preparação para o regresso a casa de forma inadequada, a falta de acompanhamento dos profissionais de saúde, o défice de informação, uma inadequada articulação entre os serviços hospitalares e os cuidados de saúde primários, associados a expectativas irrealistas por parte da pessoa doente, contribuem para baixos níveis de satisfação e comprometem a continuidade dos cuidados (Mitchell, 2016).
Realça-se que a cirurgia ambulatória em Portugal, em 2016, representava mais de 60% da totalidade das cirurgias (Administração Central dos Serviços de Saúde, 2017), constituindo-se, assim, num grande desafio para os serviços de saúde, na medida em que enfatiza uma necessidade de cuidados mais humanizados e adequados às necessidades não só físicas, como também, psicológicas, sociais e espirituais da pessoa doente submetida a cirurgia ambulatória.
A consulta de enfermagem pós-cirurgia assume, portanto, grande importância frente à complexidade que envolve este processo, de forma a maximizar os pontos fortes da pessoa submetida a cirurgia, contribuindo para a recuperação de níveis ótimos de saúde, função, conforto e autorrealização (Meleis, 2010).
Este estudo tem como objetivo conhecer a perspetiva dos enfermeiros acerca das vantagens da existência da consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia ambulatória, tendo como finalidade contribuir para a criação de uma consulta de enfermagem pós-cirúrgica com caráter presencial, prevenindo complicações e eventos adversos, bem como promovendo saúde e, consequentemente, obtendo ganhos em saúde.
Enquadramento
Em Portugal, a cirurgia ambulatória tem um histórico recente, com o seu início nos anos 90, contudo, tem vindo a desenvolver-se muito rapidamente devido às vantagens que lhe são associadas, tais como a melhoria de acesso à cirurgia pela diminuição do tempo de espera; um impacto positivo para a pessoa doente com redução da dor pós-cirúrgica e recuperação num ambiente familiar; menor taxa de complicações pós-cirurgia como o risco diminuído de trombo-embolismo pela possibilidade de deambulação precoce e menor exposição a infeções nosocomiais, traduzindo-se numa incidência de regressos ao hospital que não ultrapassa a registada no pós-operatório da cirurgia de internamento; e ainda uma melhor organização da estrutura hospitalar disponibilizando o internamento para situações mais complexas e possibilidade de racionalização da despesa e reorientação dos custos hospitalares (Despacho n.º 1380/2018). Tende ainda, a contribuir para a diminuição dos níveis de stress nas pessoas submetidas a um procedimento cirúrgico, quando devidamente informadas acerca do processo e do acompanhamento da sua recuperação em ambiente familiar, favorecendo a satisfação das pessoas e família (Resolução do Conselho de Ministros, n.º 159-A/2008).
Realça-se que, a diminuição do tempo de internamento hospitalar, para além de todas as vantagens mencionadas, e o consequente regresso mais rápido da pessoa submetida à cirurgia ambulatória ao domicílio, contribui para a minimização do stress da pessoa doente e do seu familiar, e para o aumento da sua satisfação (Resolução do Conselho de Ministros n.º 159-A/2008). Pelo menor tempo de exposição ao ambiente hospitalar, a cirurgia ambulatória também se associa a menores taxas de complicações pós-cirúrgicas e a incidência de regressos ao hospital não é mais elevada que no caso de cirurgias convencionais com necessidade de internamento (Despacho n.º 1380/2018).
No entanto, a cirurgia em regime ambulatório também apresenta algumas desvantagens, nomeadamente, o receio do desconhecido, do procedimento em si e do prognóstico ou evolução pós-cirúrgica. Alguns receios dissipam-se com o desenrolar do processo de uma cirurgia ambulatória, em que a pessoa tem oportunidade de participar nas consultas médicas e de enfermagem pré-cirúrgicas, ajudando-os a ultrapassar algumas dessas dificuldades. Outra das desvantagens está relacionada com a diminuição do tempo de contacto entre as pessoas e o enfermeiro, provocando aumento do medo e ansiedade, o que dificulta a comunicação, a coordenação e consequente continuidade dos cuidados prestados pelos enfermeiros que enfrentam a necessidade de uma preparação prévia nestes aspetos.
Para Santos et al. (2014), é indiscutível que a pessoa que se submete a uma intervenção cirúrgica tem o seu estado emocional alterado, podendo vivenciar sentimentos como a ansiedade, depressão e stress, pelo que é essencial a utilização de estratégias para diminuir ansiedade pós-cirúrgica de forma a conseguir uma prática de cuidados de qualidade, já que a pessoa doente, menos ansiosa, recupera mais rapidamente da cirurgia, com reflexos no seu bem-estar.
Conhecidos os sentimentos de ansiedade e medo que envolvem a pessoa no momento do regresso ao domicílio após uma intervenção cirúrgica é pertinente a utilização de uma comunicação efetiva entre a pessoa e o enfermeiro para permitir a sequência do tratamento na fase pós-cirúrgica, sendo a comunicação o elemento básico da interação humana. O enfermeiro deve ter consciência da importância dos comportamentos verbais e não-verbais presentes na comunicação, reconhecendo assim emoções da pessoa (Oliveira et al., 2012), podendo redirecionar as suas ações de acordo com as suas necessidades, aumentando a sua segurança e satisfação.
Desta forma, urge a necessidade da implementação de estratégias que sistematizem os cuidados de enfermagem, favoreçam a adaptação dos profissionais de saúde, das pessoas e dos seus cuidadores, a esta realidade da cirurgia ambulatória, e, consequentemente, a qualidade dos cuidados prestados. Santos et al. (2014), reforçam que a avaliação da pessoa deve ser realizada de uma forma holística e que reflita as suas necessidades físicas, psicológicas, espirituais, culturais ou sociais, pois só assim será possível a uniformização de protocolos e procedimentos de atuação. Neste sentido, a consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia adquire real importância, na medida em que permite informar, identificar e atender às expectativas e necessidades da pessoa/família, favorecendo o conforto e a segurança (Lima, 2014).
Em síntese, apesar das desvantagens que a cirurgia ambulatória possa apresentar, ela é um modelo organizativo centrado na pessoa, e como tal, associada a um aumento da qualidade de vida pela humanização que fornece em termos de cuidados de saúde, proporcionando benefícios não só para as organizações hospitalares como para a pessoa, assumindo-se a consulta de enfermagem presencial como um elemento facilitador para cuidados de qualidade.
Questão de investigação
Qual a perspetiva dos enfermeiros acerca das vantagens da existência da consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia ambulatória?
Metodologia
A opção metodológica insere-se no paradigma qualitativo, focalizada em conhecer a perspetiva dos enfermeiros do bloco operatório ambulatório e da unidade de cardiologia acerca das vantagens da existência da consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia ambulatória. Para a recolha de dados foi aplicada uma entrevista semiestruturada, realizada durante o mês de fevereiro de 2020, no período da manhã e num gabinete de uma unidade hospitalar, favorecedor de privacidade e de um clima de confiança. Cada entrevista demorou em média cerca de 15 minutos, sendo utilizado um guião de forma a orientar o desenvolvimento da mesma e o conteúdo obtido foi sujeito a uma codificação de forma a proteger o anonimato e a confidencialidade. Participaram no estudo 13 enfermeiros de uma unidade hospitalar do norte de Portugal. Estes, foram devidamente informados da finalidade e dos objetivos do estudo, sendo elaborado um consentimento informado, garantindo o sigilo e a confidencialidade dos dados. Foi-lhes explicado que toda a informação seria protegida e tratada de forma confidencial. Efetuada a análise de conteúdo segundo o referencial de Bardin (2016). O procedimento de análise dos dados baseou-se nas seguintes etapas: organização do material recolhido, codificação, categorização, inferência e interpretação teórica. Inicialmente, foi efetuada a transcrição das entrevistas realizadas para se proceder à sua análise de conteúdo. É de referir que, para garantir a confidencialidade e o anonimato dos participantes, as entrevistas foram codificadas de E1 a E13. De seguida, passamos à redução dos dados, estabelecemos as unidades de registo, as áreas temáticas e as respetivas categorias e subcategorias.
A comissão de ética da instituição onde ocorreu o estudo emitiu parecer favorável tendo-lhe sido atribuído o código: parecer nº 59/2019-CES.
Resultados
Para que o planeamento do regresso a casa da pessoa submetida a uma intervenção cirúrgica em regime ambulatório seja bem-sucedido na recuperação da saúde e na prevenção de complicações, tornou-se pertinente identificar a perspetiva dos enfermeiros relativamente às vantagens que consideraram existir com a realização da consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia ambulatória.
De forma a ter uma melhor perceção das categorias apresentadas, expomos e analisamos as unidades de análise inerentes à temática Perspetiva dos enfermeiros acerca das vantagens da existência da consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia ambulatória, como apresentado na Tabela 1.
Um enfermeiro referiu o acompanhamento do doente como uma vantagem da consulta presencial. | “. . . não temos acompanhamento dos doentes . . . era preferível uma consulta presencial do que uma consulta não presencial . . .” E7 |
A avaliação de eventuais complicações foi identificada por um enfermeiro. | “. . . Se for presencial provavelmente (…) até conseguimos resolver o problema sem os mandar à urgência, conseguimos identificar complicações. . . .” E5 |
A consulta de enfermagem também foi referida por dois enfermeiros como facilitadora da segurança. | “. . . desmistificar medos, favorecendo a segurança dos doentes . . .” E2 |
A expressão de sentimentos e emoções foi identificada por um enfermeiro. | “. . . com a consulta de enfermagem presencial, nós podemos chegar mais próximo do doente, e este por sua vez consegue verbalizar os seus medos, as suas preocupações, muitas vezes eles têm muitas duvidas que não conseguem expor ao médico e muitas vezes recorrem a nós. . . com a consulta de enfermagem presencial podemos ir ao encontro dos seus sentimentos e ajudá-los no seu processo de doença . . .” E6 |
Oito enfermeiros consideraram que consulta de enfermagem presencial permite uma avaliação centrada no discurso. | “. . . Na consulta presencial . . . conseguimos ver se compreende, como é que ele reage àquilo que se diz, conseguimos observar as suas reações não comunicacionais . . .” E1 |
A validação da educação para a saúde realizada pelos enfermeiros, foi mencionada por dois enfermeiros. | “. . . que é muito importante esta consulta para ver, para validar os ensinos que nós fizemos naquele pós imediato, portanto mais à posteriori para ver se a pessoa conseguiu absorvê-los . . .” E2 |
O reforço da educação para a saúde foi referido por um enfermeiro. | “. . . vantagem no reforço dos ensinos . . . “ E4 |
A avaliação do grau de satisfação do doente foi mencionada por um enfermeiro. | . . . consulta pós-operatória tem a vantagem para fazer uma avaliação adequada do utente, ver se o doente ficou satisfeito com todo o percurso desde a entrada até à alta . . . . E6 |
Dois enfermeiros referiram o estabelecimento de uma comunicação empática como sendo uma vantagem da consulta de enfermagem presencial. | “ter uma noção melhor, a empatia que se cria para perceber se as dificuldades que teve são diferentes. . . .” E8 |
Discussão
Os enfermeiros deste estudo, identificaram várias vantagens associadas à consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia ambulatória, tais como: acompanhamento do doente; avaliação de eventuais complicações; segurança; expressão de sentimentos e emoções; avaliação centrada no discurso; validação da educação para a saúde realizada pelos enfermeiros; reforço da educação para a saúde; avaliação do grau de satisfação do doente; estabelecimento de uma comunicação empática.
Um efetivo acompanhamento ajuda a pessoa a adaptar-se a uma nova realidade, ou seja, facilita o ajuste neste processo transicional. Este processo, requer que a pessoa incorpore um novo conhecimento para alterar comportamentos e, consequentemente, mudar a definição do eu no contexto social da saúde/doença ou nas necessidades internas ou externas que afeta o status da saúde (Meleis, 2010). Neste sentido, as intervenções de enfermagem deverão ter como propósito, partilhado e perfilhado por toda a equipa de saúde, ajudar as pessoas a gerir as transições ao longo do ciclo de vida, de modo a evitar ou minimizar períodos de crise.
No que concerne ao enfermeiro especialista, este tem a competência na conceção de planos de intervenção para ajudar a pessoa no processo de transição decorrente de uma cirurgia, deve valorizar o seu potencial e priorizar intervenções para a prevenção de complicações e adaptação ao processo de transição saúde/doença decorrente do processo cirúrgico (Regulamento n.º 429/2018). É essencial perceber as capacidades e dificuldades da pessoa e incentivá-la ao desenvolvimento de intervenções e estratégias que promovam os seus cuidados e bem-estar, estabelecendo uma parceria de cuidados.
Alguns enfermeiros identificaram a avaliação de eventuais complicações e a expressão de sentimentos e emoções como vantagens decorrentes da consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia ambulatória.
Assegurar a melhor recuperação possível e o regresso da pessoa ao domicílio de forma segura, exige que o enfermeiro reconheça precocemente complicações para a saúde. Assim, no nosso estudo verificamos que avaliar eventuais complicações, contribui para o sucesso no regresso a casa. Oliveira et al. (2012, p. 156) salienta que a consulta de enfermagem previne “situações evitáveis” visto que “viabiliza o trabalho do enfermeiro durante o atendimento ao doente, facilitando a identificação de problemas e as decisões a serem tomadas”.
A segurança também foi referida como vantagem da consulta de enfermagem presencial. O contacto presencial e a informação fornecida são pilares fundamentais para o devido esclarecimento de dúvidas e receios, favorecendo a relação empática “que, consequentemente, incutem na pessoa doente um estado de segurança” (Melo et al., 2013, p. 181) visto que promovem a confiança e a tranquilidade necessárias para a procura e criação de estratégias alternativas à condição inicial, de forma a ultrapassar a sua experiência menos positiva, atingindo estados mais favoráveis.
No sentido de promover a segurança desejada, é pertinente identificar as ações preventivas que já existem e realizar a avaliação das medidas efetuadas, bem como, verificar a ocorrência de incidentes e assegurar a tomada de medidas preventivas e corretivas.
A comunicação eficaz é fundamental para a segurança da pessoa doente, e a sua presença física na consulta permite ao enfermeiro estabelecer uma relação empática com a pessoa e avaliar as suas várias dimensões.
A comunicação também permite à pessoa o esclarecimento de dúvidas, medos e anseios, receber, reforçar ou corrigir informação, de forma ajustada às suas necessidades, para que reforce as suas estratégias e aumente a sua sensação de segurança ao sentir que tem a quem recorrer, caso tenha necessidade.
A pessoa que enfrenta um processo cirúrgico, mesmo em regime ambulatório que não necessita de internamento, vivencia diferentes estados emocionais, vive uma realidade que muitas vezes provoca alterações profundas na sua vida e implicações na sua saúde e bem-estar, nomeadamente nos padrões habituais da vida individual e familiar, com mudanças de papéis, de relações e de comportamentos (Santos et al., 2014), necessitando de ajuda para expressar os sentimentos e emoções.
Como referido por Damásio, qualquer pessoa tem emoções, procurando as boas e evitando as desagradáveis. A emoção humana pode ser desencadeada pelo mais pequeno ato, pelas coisas aparentemente mais insignificantes, mas, gera sempre sentimentos. Os sentimentos “são dirigidos para o interior e são privados”, as emoções “são dirigidas para o exterior e são públicas” (2000, p. 56).
O estado emocional pode apresentar-se como ansiedade, stress ou depressão e é influenciado pelas características individuais de cada pessoa, pelo processo cirúrgico em si e experiências prévias ou complicações pós-cirurgia ambulatórias que se possam desenvolver (Santos et al., 2014). Assim, é importante que as pessoas consigam expressar os seus sentimentos e os seus estados emocionais.
Também Cabrita (2017), é da opinião que o contacto efetivo, face a face, conseguido numa consulta presencial facilita o estabelecimento de uma relação empática entre o enfermeiro, pessoa, sendo mais fácil avaliar as perceções do outro, bem como as suas expectativas, ajustando a informação e realizando ensinos adequados promovendo educação para a saúde.
Sendo a consulta de enfermagem uma atividade autónoma, o enfermeiro desempenha aqui um papel importante de apoio emocional, apoio esse que se inicia na fase pré-operatória (Santos et al., 2014) e continua no pós-operatório. Através da proximidade entre as partes, o enfermeiro tem oportunidade de perceber a sobrecarga emocional que a pessoa vivencia, nomeadamente o medo e a ansiedade, e intervir no sentido de aliviar essa sobrecarga (Santos et al., 2014). O enfermeiro especialista, na fase perioperatória, deve desenvolver estratégias que promovam a esperança adaptada à realidade da pessoa, aliviando a ansiedade e o medo, capacitando-os assim, para uma gestão adequada da sua experiência cirúrgica.
Não é uma tarefa fácil, como refere Cerqueira (2010, p. 169), mas é decerto um desafio compensador:
lidar com a complexidade das emoções e sentimentos humanos, quer na pessoa do cuidador quer da pessoa cuidada, é um desafio para os profissionais de saúde porque ultrapassa a esfera profissional e entra na esfera das relações humanas no seu todo.
Os enfermeiros defendem que a avaliação centrada no discurso favorece uma relação empática e a verbalização por parte do utente (Formiga, 2012). Com a verbalização da pessoa é possível ao enfermeiro colher mais informação. Essa verbalização será mais facilitada na presença do enfermeiro, favorecendo o contacto pessoal e aproximação de ambas as partes.
Como referem Oliveira et al. (2012), a comunicação é crucial na consulta de enfermagem, em que o enfermeiro deve ter consciência para a importância dos comportamentos verbais e não-verbais reconhecendo sinais e comportamentos que possam interferir ou alterar a assistência devida. Esta relação próxima entre enfermeiro a pessoa e o estabelecimento de uma comunicação eficaz com troca de informações verbais e não-verbais de forma recíproca, proporciona sensações de segurança, confiança e, consequentemente, contribui para a adesão ao tratamento ou medidas a instituir por parte da pessoa.
A validação da educação para a saúde e o seu reforço, são aspetos evocados pelos enfermeiros do estudo.
As práticas que favorecem a educação para a saúde promovem vínculos entre os profissionais de enfermagem e as pessoas, família e até comunidade envolvida, contribuindo para melhor informação e aperfeiçoamento de atitudes fundamentais em determinada situação.
Santos et al. (2014), referem que a informação que a pessoa possui ajuda-a à construção e efetivação de posturas positivas e benéficas face à doença, levando-a a optar por atitudes adequadas à sua condição. Mesmo que o cenário pós-cirúrgico esteja a decorrer dentro da normalidade, é natural que a pessoa sinta ansiedade e receios, necessitando de validação para as suas atitudes.
O enfermeiro na consulta de enfermagem presencial tem a oportunidade de efetuar essa validação, fornecendo informação que reforce os conhecimentos e incentive adoção de comportamentos adequados, capacitando a pessoa. Cabe ao enfermeiro manifestar de forma clara e concreta a empatia cognitiva ou a empatia afetiva de acordo com a validação que a pessoa que se apresenta na consulta necessita. O enfermeiro especialista tem competência para estabelecer uma relação de ajuda com a pessoa no sentido de a capacitar para o desenvolvimento de estratégias que promovam a sua saúde e bem-estar. Tem oportunidade de otimizar o ambiente e os processos terapêuticos, criando condições para que a pessoa se sinta acolhida e esclarecida no desenrolar do seu processo cirúrgico.
Este momento pode servir também para priorizar intervenções, adequar recursos e planos de intervenção com vista à gestão do processo saúde/doença.
Percebemos assim que a relação estabelecida entre o enfermeiro e a pessoa numa consulta de enfermagem presencial é fundamental para o seu sucesso.
A consulta de enfermagem presencial permite diálogo e facilita o estabelecimento de uma relação empática e terapêutica. Permite criar canais de comunicação que estimulam a demonstração de sentimentos como o medo e ansiedade, desejos e perceções por parte da pessoa, facilitando o ajustamento dos seus comportamentos (Formiga, 2012). A troca de informações entre o enfermeiro e a pessoa adquire, assim, um caráter educativo com a possibilidade de reforço positivo.
Avaliar o grau de satisfação do doente é, para os enfermeiros, uma das vantagens da consulta de enfermagem pós-cirúrgica e presencial. Para isso, o enfermeiro na sua intervenção deve ter a preocupação central de avaliar o grau de satisfação das pessoas acerca dos cuidados prestados, e às instituições de saúde compete recolher informação acerca da qualidade da assistência prestada (Berwanger, 2019).
O enfermeiro deve primar pela excelência de cuidados, para isso deve realizar uma abordagem centrada na pessoa, identificando as necessidades presentes e dando resposta aos seus desejos, respeitando as suas crenças, a sua cultura e o seu meio envolvente.
A satisfação da pessoa também se relaciona com o estabelecimento de parcerias entre o enfermeiro e a pessoa no planeamento do seu processo de cuidados. Ao sentir que participa nesse planeamento, a pessoa assume de forma mais consciente e responsável a necessidade de cumprir o que estabelece em parceria com o enfermeiro.
O enfermeiro especialista, na área médico-cirúrgica procura da excelência no exercício profissional com vista a alcançar a satisfação da pessoa e, baseado nos padrões de qualidade, deve utilizar um sistema de avaliação para mensurar essa satisfação, tendo em consideração a comunicação interpessoal a estabelecer, a capacitação da pessoa para a autodeterminação, o empoderamento da pessoa para a tomada de decisão e o ajuste das expectativas da pessoa à realidade do processo cirúrgico (Ordem dos Enfermeiros, 2017).
Para Melo et al. (2013) e Cabrita (2017), ao realizar a consulta de enfermagem presencial, o enfermeiro deve considerar vários aspetos relacionados com a pessoa, como a sua condição física e psicológica, a condição social e familiar e as convicções religiosas e crenças, no sentido de otimizar uma relação empática e de confiança que facilite o diagnóstico de necessidades e permita traçar um plano de cuidados adequado, fornecendo a informação pertinente à pessoa que vá de encontro às suas expectativas.
O enfermeiro especialista tem um papel fundamental na envolvência da pessoa no processo do cuidar, com o objetivo da sua independência e bem-estar. É crucial que os enfermeiros se sintam motivados a desenvolver estratégias de comunicação junto das pessoas alvo das suas intervenções. Assim, os mesmos autores acreditam que se conseguem “ganhos em saúde, observáveis pela diminuição da ansiedade dos familiares, melhor relação destes com os familiares doentes e, por sua vez, menos internamentos dos doentes identificados” (Gomes et al., 2012, p. 55).
Desta forma, “o enfermeiro assume uma posição muito especial junto da pessoa doente, ao que lhe cabe uma função também muito especial na humanização” (Louro, 2014, p. 21).
O cuidar humanizado é um ato intimamente ligado à enfermagem tendo como objetivo a manutenção da dignidade do ser humano e o respeito pelos seus direitos, em que o acolhimento - associado diretamente à empatia, é uma das formas de aplicar o cuidado humanizado à pessoa (Ribeiro et al., 2016).
Perante o exposto, esquematiza-se na Figura 1 a perspetiva dos enfermeiros relativamente às vantagens que consideram existir com a realização da consulta de enfermagem presencial pós-cirurgia ambulatória.
Conclusão
A consulta de enfermagem pós-cirurgia ambulatória de carater presencial, deve ser reconhecida como um espaço onde a comunicação/interação se estabelece e se define um conjunto de estratégias para obtenção dos melhores resultados em saúde de quem experiência a complexidade que envolve o processo pós cirúrgico.
Porém, para o sucesso da sua implementação, é fundamental canalizar recursos humanos para esta área de intervenção, com modelos de cuidados assentes em metodologias de cuidados ativas, integrativas e cooperativas, considerando a pessoa como um sistema dinâmico de inter-relações entre as diversas dimensões: fisiológica, psicológica, sociocultural, e em interação com o meio envolvente.
Os enfermeiros defendem que a consulta de enfermagem pós-cirurgia presencial, é um momento crucial para o enfermeiro realizar educação para a saúde, para avaliar eventuais complicações, para promover a expressão de sentimentos e emoções, para dar segurança ao doente e à família e para estabelecer uma comunicação empática.
Finalizando, é fundamental a implementação da consulta de enfermagem pós-cirurgia ambulatória com caráter presencial, de forma a que a pessoa submetida a cirurgia e a sua família, possam usufruir de uma gama completa de cuidados e, por conseguinte, maior qualidade de vida.
É necessária uma maior aposta no marketing destes cuidados para que a sociedade, em geral, os possa reconhecer como fundamentais para o processo de recuperação da pessoa submetida a cirurgia ambulatória.
É necessário, ainda, que o enfermeiro especialista em enfermagem médico-cirúrgica estabeleça intervenções orientadas para as necessidades efetivas da pessoa submetida a cirurgia ambulatória e sua família, baseada na informação relevante e nas potenciais consequências.
Considera-se que este estudo tem implicações para a prática de cuidados em contexto de cirurgia ambulatória e para a investigação, na medida em que, no que diz respeito à importância de existir uma consulta de enfermagem pós-cirurgia presencial, a sociedade científica e em geral devem perceber que o modelo humanista deve nortear a prática de cuidados.