Introdução
A infeção é a segunda causa de morte entre pacientes portadores de insuficiência renal crónica terminal. Entre os fatores de risco que podem contribuir para o desenvolvimento de infeções nesses pacientes está a contaminação do acesso vascular necessário para a realização do tratamento (Annual Dialysis Data Report, 2015). Assim, torna-se imprescindível que a equipa de enfermagem, no sentido de prevenir a ocorrência de infeções associadas aos cuidados de saúde do doente renal em terapia dialítica, permaneça capacitada para atuar na promoção e prevenção de complicações, possibilitando maior confiança ao doente para com a equipa, na medida em que a infeção de cateter tem uma íntima correlação com a falta de técnicas assépticas e manipulação inadequada desses dispositivos (Nogueira et al., 2016). Tem-se por objetivo geral deste estudo analisar o Índice de Qualidade (IQ) dos cuidados de enfermagem realizados à pessoa em hemodiálise (HD), na manutenção e manipulação do cateter venoso central (CVC), em unidades de HD do norte de Portugal e os fatores associados.
Enquadramento
De acordo com a Rede Nacional de Especialidade Hospitalar e de Referenciação de Nefrologia (RNEHRN, 2017), Portugal apresenta, face à maioria dos países europeus, uma das taxas mais elevadas de incidência e de prevalência de doença renal crónica em estadio 5. Dados referentes a 2017 mostram que a HD representa a principal terapia de substituição da função renal (TSFR) sendo utilizada pelos portadores desta doença em 59,7% dos casos (RNEHRN, 2017). A realização do tratamento dialítico está dependente de um acesso venoso, que é considerado o maior fator de risco para infeção (Schaefer & Fernandes, 2021). Estima-se que o risco relativo para ocorrência de internamentos hospitalares e morte devido a infeções é de duas a três vezes maior em pacientes portadores de CVC do que os que utilizam a fístula arteriovenosa como forma de acesso (Böhlke et al., 2015). Portanto, o manuseio seguro do CVC deve ser uma prioridade de toda a equipa de enfermagem, de modo que haja rigor técnico e vigilância, objetivando prevenir e controlar o risco de infeção e promover a segurança do doente em HD (Guimarães et al., 2017). Uma das estratégias para a redução e prevenção de infeções relacionadas ao CVC é a utilização de bundles, tendo a sua implementação efeito provado na diminuição da incidência. Em Portugal, recomenda-se, pela norma nº 022/2015 da Direção-Geral da Saúde (DGS), “Feixe de Intervenções” de Prevenção de Infeção relacionada com CVC na manutenção do CVC: avaliar diariamente a necessidade de manutenção do mesmo; higienização das mãos com água e sabão de pH neutro seguido de fricção com solução antissética de base alcoólica antes do seu manuseamento; descontaminar as conexões com clorohexidina a 2% em álcool ou álcool a 70o antes de qualquer manuseamento local; descontaminar os pontos de acesso dos sistemas e prolongadores (obturador, torneiras de três vias, entre outros) por fricção com clorohexidina a 2% em álcool ou álcool a 70o, durante 10 a 15 segundos e deixar secar, antes de conectar qualquer dispositivo estéril; e mudar penso com periodicidade adequada e utilizando técnica assética (DGS, 2015).
Questão de Investigação
Qual o IQ dos cuidados de enfermagem realizados à pessoa em HD, na manutenção e manipulação do CVC, em unidades de HD do norte de Portugal e os fatores associados?
Metodologia
Estudo transversal analítico realizado em unidades de HD do norte de Portugal, no período de 01/06/2019 a 30/09/2019. Participaram no estudo 50 enfermeiros aos quais foi realizada uma observação direta no momento de manipulação e manutenção do CVC. Como instrumento de recolha de dados foi utilizado um questionário para a caracterização socioprofissional da amostra e uma grelha de observação. Para a aplicação do questionário, foi elaborada uma lista com o nome dos enfermeiros das unidades de diálise, sendo atribuído a cada um deles um número de código. Esta listagem é do conhecimento exclusivo da equipa de recolha de dados e foi eliminada imediatamente depois da inserção em base dados dos elementos obtidos após a observação. O questionário foi entregue individualmente a cada enfermeiro, em envelope fechado, correspondente ao número atribuído aleatoriamente, com as devidas indicações para o preenchimento do mesmo e o objetivo do estudo. Após o preenchimento do referido instrumento, este foi devolvido ao observador, que colocou o número correspondente na grelha de observação, aquando da prestação dos cuidados ao CVC, que posteriormente o fez chegar ao investigador sem qualquer identificação. O consentimento livre e informado foi colocado num envelope único para o efeito, separado dos instrumentos de recolha de dados. Esta grelha foi elaborada com base no feixe de intervenções de prevenção de infeção relacionada com o CVC adaptado da Norma 022/2015 da DGS de 16/12/2015. É composta pela avaliação de 4 itens que se prendem com o momento da conexão e da desconexão do CVC, que inclui a higienização das mãos antes do manuseamento do cateter e a utilização dos equipamentos de proteção individual (EPI) aquando da conexão e desconexão do CVC, com a realização e a periodicidade do penso (DGS, 2015). Houve necessidade de realizar algumas adaptações das intervenções de enfermagem descritas para a realidade das práticas executadas ao doente em HD, individualizando a monitorização das práticas no momento da conexão e desconexão, uma vez que o CVC é manipulado nesses dois contextos. Introduziu-se para isso um item referente à conexão e outro à desconexão, com o objetivo de monitorizar as práticas e os procedimentos de enfermagem quanto à utilização dos EPI, higienização das mãos e desinfeção dos lumens com as soluções adequadas nas duas fases do processo. As observações foram realizadas no início e no fim da sessão de HD, pelo investigador do estudo, com a colaboração de um elemento de cada equipa que compõem as unidades de diálise abrangidas na investigação, após a exposição dos objetivos do estudo e de uma explicação meticulosa do instrumento de recolha de dados e dos comportamentos a observar e a registar. Os dados foram codificados e posteriormente introduzidos e analisados com recurso ao IBM SPSS Statistics versão 21.0. O estudo foi submetido a aprovação e autorização pelas administrações das respetivas unidades e obteve parecer favorável da comissão de ética nº 32/2019 de 26/04/2019 e nº 92/2019 de 21/03/2019.
Resultados
A amostra foi constituída por 50 enfermeiros, maioritariamente do sexo feminino (72%), com uma média de idades de 49,84 anos, com licenciatura (72%) e 82% sem especialização em enfermagem (Tabela 1).
Variáveis | n | % | |
---|---|---|---|
Sexo | Feminino | 36 | 72,0 |
Masculino | 14 | 28,0 | |
Idade | Até 40 anos | 9 | 18,0 |
Entre 41 e 50 anos | 17 | 34,0 | |
Mais de 50 anos | 24 | 48,0 | |
Mínimo=31 anos; Máximo= 66 anos Média=49,84 anos; desvio padrão=8,74 anos. | |||
Habilitações Literárias | Bacharelato | 1 | 2,0 |
Licenciatura | 36 | 72,0 | |
Pós-graduação | 11 | 22,0 | |
Mestrado | 2 | 4,0 | |
Especialização em Enfermagem | Sim | 9 | 18,0 |
Não | 41 | 82,0 |
Em relação ao tempo de exercício profissional, 80% dos enfermeiros exerce há pelo menos 20 anos, 74% dos enfermeiros exercem funções em diálise há pelo menos 10 anos ou mais, e a maioria (62%) exerce funções numa unidade pública. 76% possuem formação na área de prevenção da infeção relacionada com o CVC e 62 % conhece a norma n.º 022/2015 da DGS de 16/12/2015 (Tabela 2).
Variáveis profissionais e de formação | n | % | |
---|---|---|---|
Tempo de exercício profissional | Inferior a 20 anos | 10 | 20,0 |
De 20 a 29 anos | 24 | 48,0 | |
Igual ou superior a 30 anos | 16 | 32,0 | |
Xmin=6 anos; Xmáx= 45 anos Média=25,70 anos; desvio padrão=8,36 anos | |||
Tempo de exercício profissional em diálise | Inferior a 10 anos | 13 | 26,0 |
De 10 a 19 anos | 16 | 32,0 | |
Igual ou superior a 20 anos | 21 | 42,0 | |
Xmin=1 anos; Xmáx= 30 anos Média=15,52 anos; desvio padrão=8,38 anos. | |||
Unidade de Diálise | Pública | 31 | 62,0 |
Privada | 19 | 38,0 | |
Formação na área de prevenção de infeção do CVC | Sim | 38 | 76,0 |
Não | 12 | 24,0 | |
Conhecimento da norma nº022/2015 da DGS | Sim | 31 | 62,0 |
Não | 19 | 38,0 |
Nota. CVC = Cateter venoso central; DGS = Direção-Geral da Saúde.
A maioria dos procedimentos no momento da conexão do doente ao Circuito Extracorporal (início da sessão de hemodiálise) e no momento da desconexão do CVC (final da sessão de hemodiálise) foram realizados quase na totalidade. Os itens que se revelaram de menor cumprimento foram: o uso de avental (na conexão e desconexão); a indicação para o doente rodar a cabeça para o lado oposto ao CVC (na conexão e desconexão); e a colocação de bolsa de proteção para cateteres de hemodiálise na desconexão (Tabela 3).
Conexão do CVC | Desconexão do CVC | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
n | % | n | % | |||
Uso de máscara cirúrgica | Sim | 49 | 98,0 | 50 | 100,0 | |
Não | 1 | 2,0 | 0 | 0,0 | ||
Uso de avental | Sim | 21 | 42,0 | 22 | 44,0 | |
Não | 29 | 58,0 | 28 | 56,0 | ||
Uso de luvas estéreis | Sim | 49 | 98,0 | 50 | 100,0 | |
Não | 1 | 2,0 | 0 | 0,0 | ||
Colocação de máscara cirúrgica ao doente | Sim | 50 | 100,0 | 50 | 100,0 | |
Não | 0 | 0,0 | 0 | 0,0 | ||
Não | 22 | 44,0 | 23 | 46,0 | ||
Higienização das mãos com água e sabão de pH neutro ou fricção com solução antissética antes de manusear o CVC | Sim | 49 | 98,0 | 48 | 96,0 | |
Não | 1 | 2,0 | 2 | 4,0 | ||
A nível do CVC, são descontaminados os lumens com clorohexidina 2% ou álcool a 70º durante 10 a 15” antes de conectar o doente ao CEC (conexão) | Sim | 47 | 94,0 | 45 | 90,0 | |
Não | 3 | 6,0 | 5 | 10,0 | ||
Proteção do CVC com compressas e campo esterilizado (conexão) | Sim | 50 | 100,0 | Não se aplica | ||
Não | 0 | 0,0 | ||||
São descontaminadas as zonas das conexões do CEC de linhas e lumens do CVC com clorohexidina 2% ou álcool a 70º durante 10 a 15” antes da colocação das tampas estéreis (desconexão) | Sim | Não se aplica | 45 | 90,0 | ||
Não | 5 | 10,0 | ||||
Colocação de bolsa de proteção para CVC de hemodiálise | Sim | Não se aplica | 30 | 60,0 | ||
Não | 20 | 40,0 |
Nota. CVC = Cateter venoso central; CEC = Circuito extracorporal.
Nos procedimentos de realização do penso do CVC, observámos que os enfermeiros verificam as caraterísticas do local de inserção e utilizam máscara cirúrgica e luvas esterilizadas. Com menor percentagem de cumprimento fazem parte os itens: o uso de kit de penso que foi utilizado por 58% dos enfermeiros; a antissepsia da pele com clorohexidina a 2% realizada por apenas 20% dos enfermeiros da amostra; e a colocação de data no penso efetuada por 18% dos enfermeiros (Tabela 4).
Realização do Penso do CVC | n | % | |||
---|---|---|---|---|---|
Observação das caraterísticas do local de inserção | Sim | 50 | 100,0 | ||
Utilização de máscara cirúrgica | Sim | 50 | 100,0 | ||
Utilização de luvas esterilizadas | Sim | 50 | 100,0 | ||
Uso de campo esterilizado para suporte de material para penso | Sim | 32 | 64,0 | ||
Não | 18 | 36,0 | |||
Uso de kit de penso | Sim | 29 | 58,0 | ||
Não | 21 | 42,0 | |||
Utilização de clorohexidina 2% na antissepsia da pele | Sim | 10 | 20,0 | ||
Não | 40 | 80,0 | |||
Colocação da data do penso | Sim | 9 | 18,0 | ||
Não | 31 | 62,0 | |||
Não se aplica | 10 | 20,0 |
Nota. CVC = Cateter venoso central.
Constatou-se que o IQ varia entre o mínimo de 0,6897 e máximo de 1,000, obtendo-se o valor médio de 0,809. Assim, verificou-se que os enfermeiros obtiveram um IQ de 80% nos procedimentos realizados na manutenção/manipulação do CVC (Figura 1).
Verificou-se uma diferença estatisticamente significativa entre os procedimentos realizados ao CVC e o tipo de unidade, para utilização de avental na conexão e desconexão, a utilização de clorohexidina a 2% em álcool na antissepsia da pele aquando da realização do penso ao local de inserção do CVC, a colocação de bolsa de proteção para cateteres na desconexão, o uso de campo esterilizado para suporte de material de penso e o uso de kit de penso (p < 0,005; Tabela 5).
Relativamente ao IQ para as diferentes variáveis de índole profissional (Tabela 6), observa-se que os enfermeiros das instituições públicas obtiveram, em termos médios, IQ inferior aos que exercem no privado. Quanto aos factos de terem frequentado formação em prevenção da infeção relacionada com o CVC e terem conhecimento da norma nº022/2015 da DGS, constatou-se que estes não são um contributo significativo para a melhoria do IQ.
Variável | IQ | ET(p) | ||
---|---|---|---|---|
X | dp± | |||
Unidade de Diálise | Pública | 0,795 | 0,0847 | -2,323ª (0,020)* |
Privada | 0,832 | 0,0484 | ||
Formação em prevenção de infeção relacionada CVC | Sim | 0,806 | 0,0751 | -0,434 (0,666) |
Não | 0,817 | 0,0765 | ||
Conhecimento da norma nº022/2015 da DGS | Sim | 0,799 | 0,0783 | -1,609ª (0,108) |
Não | 0,825 | 0,0676 |
Nota. ET = Estatística do teste; p = Valor de prova; * = Diferenças significativas a 5%; ª = Teste Mann-Whitney, não se verificou a normalidade das distribuições; IQ = Índice de qualidade; DGS = Direção-Geral da Saúde.
Discussão
A amostra deste estudo é constituída por 50 profissionais de enfermagem, predominantemente do sexo feminino (72%), estando estes resultados em consonância com os dados estatísticos publicados pela Ordem dos Enfermeiros (OE, 2020), nos quais indica o sexo feminino como o mais prevalente, em que 82,3% dos enfermeiros a exercer funções nesse ano no território nacional são do sexo feminino. Quanto à idade, a maioria dos participantes estava compreendida na faixa etária acima dos 50 anos (48%), com a média de idades a situar-se nos 49,8 anos. Estes resultados diferem dos encontrados por Lemos et al. (2015) que no seu estudo transversal exploratório quantitativo, numa amostra constituída por 84 enfermeiros, a idade média dos mesmos foi de 35 anos. O mesmo estudo afirma que esta média de idades demonstra maturidade e experiência, sendo estas características fundamentais para o trabalho em unidades de hemodiálise. Deste modo, e de acordo com a média de idades da amostra deste estudo (49,8 anos), os dados revelam que a amostra é experiente. Relativamente às habilitações literárias concluímos que 72% são detentores de Licenciatura e 18% possuem especialidade em enfermagem. Estes resultados enunciam que a amostra detém um nível baixo de formação avançada e especializada, não indo ao encontro das recomendações da OE (2016, p. 14) que aconselha, “face ao contexto específico da intervenção do enfermeiro em técnicas dialíticas, nomeadamente a elevada complexidade, a exigência e os riscos associados ao tratamento dialítico, a que os serviços/unidades caminhem no sentido de que, pelo menos, 50% dos enfermeiros possuam competências específicas do enfermeiro especialista em Enfermagem em pessoa em situação crítica ou pessoa em situação crónica e paliativa”. A média de tempo de exercício profissional em diálise é de 15,52 anos com 74,0% dos enfermeiros a exercer tal atividade há pelo menos 10 anos, o que revela uma amostra com experiência em diálise. Estes dados permitem-nos afirmar que a amostra foi constituída por profissionais experientes. Amaral e Ferreira (2014), nesta linha de pensamento, advogam que num ambiente complexo de prestação de cuidados de saúde, a experiência e a perícia dos enfermeiros são determinantes para a qualidade do atendimento e para a obtenção de resultados positivos nos doentes. A maioria dos enfermeiros inquiridos neste estudo exerce funções numa unidade de diálise pública (62%), o que não revela a realidade do país, uma vez que, de acordo com o relatório de fluxos de doentes em diálise da DGS (2013), a prestação de cuidados de hemodiálise é maioritariamente assegurada por prestadores privados de saúde. No que concerne à posse de formação em prevenção de infeção relacionada com o CVC (76% da amostra) e ao conhecimento da norma nº 022/2015 da DGS (62% da amostra) os resultados ficam longe do esperado. A frequência de ações educativas contínuas pelos profissionais que estão diretamente responsáveis pelos cuidados ao CVC contribuem para uma melhoria da cultura de segurança, concorrendo para a adesão de estratégias que visam reduzir as taxas de infeção (Perin et al., 2016). Os resultados relativos ao conhecimento da norma obtidos neste estudo são semelhantes aos encontrados por Fernandes et al. (2019) no seu estudo quantitativo transversal, com o objetivo de verificar os conhecimentos dos profissionais de saúde sobre a bundle para a prevenção da Infeção da Corrente Sanguínea (ICS) relacionada ao CVC, em que se indicou que 53,6% da amostra conhecia a bundle. No entanto, a utilização de bundles como estratégia na prevenção da incidência de infeções tem conduzido a resultados positivos (DGS, 2017). Fortunatti (2017) reforça que o uso simultâneo de bundles de inserção e manutenção tem impacto positivo na diminuição da taxa de ICS relacionada a CVC, representando uma alternativa eficiente para melhorar a qualidade e segurança assistencial. Relativamente à utilização de equipamento de proteção individual (EPI) no momento da conexão e desconexão do CVC observou-se uma taxa de cumprimento de praticamente 100%. O uso de avental foi o item com menor taxa de cumprimento, tendo sido apenas colocado por 42% dos participantes na conexão e por 46% na desconexão. A utilização de EPI são parte integrante e importante nas medidas de prevenção e controlo de infeção. A adesão às precauções de controlo de infeção e o uso dos EPI é fundamental para a prevenção da transmissão de agentes patogénicos (Hakim et al., 2016). Quanto à higienização das mãos antes de manusear o CVC no momento da conexão e da desconexão constatou-se um elevado cumprimento deste procedimento. A higienização das mãos é uma das medidas de maior relevância para a prevenção de infeções, garantindo uma assistência segura tanto para o doente quanto para os profissionais da saúde, como é demonstrado no estudo de Fortunatti (2017) no qual houve redução da taxa de infeção de 3,48 para 1,52 episódios/1.000 CVC-dia. No que diz respeito aos resultados obtidos na realização do penso do CVC, salienta-se que todos os enfermeiros, no momento da realização do penso, observaram as características do local de inserção, utilizaram máscara cirúrgica e utilizaram luvas esterilizadas, indo ao encontro dos autores Silva e Oliveira (2016) que referem que a inspeção do local de inserção do CVC é de extrema importância para a verificação de qualquer alteração cutânea que possa ser sugestiva de infeção, como a presença de exsudado no local de saída, e sinais inflamatórios (calor, dor, rubor, edema). Com menor percentagem de cumprimento fazem parte os itens: o uso de kit de penso; a antissepsia da pele com clorohexidina a 2%; e a colocação de data no penso. Estes resultados encontram-se longe daquilo que é preconizado pelas normas respeitantes à realização do penso ao CVC. Segundo a DGS (2015) indica-se para a realização do penso: garantir orifício de inserção limpo; uso de máscara, luvas esterilizadas e campo esterilizado para suporte de material de penso; usar kit de penso; utilizar clorohexidina a 2% em álcool na antissepsia da pele; e colocação de data no penso. Destaca-se que neste estudo, a utilização de clorohexidina a 2% em álcool na antissepsia da pele foi executada por 20% dos enfermeiros, sendo que diversos autores defendem que este deve ser o soluto antissético a aplicar na realização do penso. Cassia et al. (2021) concluiu que o uso de clorohexidina na realização do penso apresenta benefícios significativos, especialmente para a redução dos microrganismos e possíveis colonizações, recomendando-se o seu emprego, pois contribui para a prevenção de infeções primárias da corrente sanguínea. O IQ médio foi de 80% nos procedimentos realizados na manutenção/manipulação do CVC, no entanto, este valor encontra-se aquém da conformidade pretendida, tendencialmente 100% (DGS, 2015). Assim, importa ressaltar que para DGS (2015, p. 9), na Norma 022/2015, os feixes de intervenção associados ao CVC “são um conjunto de intervenções (geralmente 3 a 5) que, quando agrupadas e implementadas de forma integrada, promovem melhor resultado, com maior impacto do que a mera adição do efeito de cada uma das intervenções individualmente”. Por sua vez, no estudo de Fortunatti (2017) observou-se que a bundle de manutenção atingiu conformidade geral de 62,9%. Este nível de conformidade foi baixo em comparação com outros estudos publicados, sendo importante alcançar uma adesão de aproximadamente 95% para conseguir uma redução substancial das taxas de ICS relacionadas com CVC. Os nossos resultados encontram-se igualmente distantes dos referidos pelo autor anterior para a prevenção da infeção do cateter. Quanto ao facto de terem frequentado formação em prevenção da infeção relacionada com o CVC, bem como conhecerem a norma, concluiu-se que estes não constituem um contributo significativo para a melhoria do IQ. Este resultado não está em concordância com a recente investigação científica, como se encontra descrito no estudo de Rodrigues (2019), que concluiu que existem diferenças nas práticas dos enfermeiros na otimização do CVC, antes e após a formação estruturada, tendo-se verificado melhoria das práticas dos enfermeiros após a formação, inferindo-se então o impacto positivo da formação nas práticas dos enfermeiros. De acordo com o exposto, a existência de formação e o conhecimento da bundle por parte dos enfermeiros pressuporia uma associação com os procedimentos que estes realizam na manipulação/manutenção do CVC, não se conseguindo explicar após a procura científica realizada a obtenção destes dados em contraciclo. Há a destacar a diferença estatisticamente significativa encontrada no IQ dos enfermeiros que exercem funções em unidades Públicas e em unidades privadas. Assim, observa-se que os enfermeiros das unidades privadas obtiverem um IQ na manipulação/manutenção do CVC superior do que aqueles que exercem no público. Isto pode ser explicado pelo facto de os enfermeiros de unidades privadas terem apresentado uma maior taxa de conformidade global nos procedimentos de manutenção/manipulação do CVC. Verifica-se, após a análise dos dados, que o uso de avental na conexão e desconexão e a utilização da clorohexidina na antissepsia da pele, não foi cumprido pelos profissionais das unidades privadas (Tabela 5). No público constatou-se um menor cumprimento nos itens da colocação de bolsa para proteção de cateteres, no uso de campo esterilizado para o material de penso, no uso de kit de penso e na utilização da clorohexidina. Os resultados mostraram que houve um maior número de itens da norma que foi cumprido pelos enfermeiros do privado, o que se traduziu num maior IQ nos procedimentos na manipulação e manutenção do CVC, pois nas bundles todas as intervenções são necessárias e se alguma delas não for aplicada o resultado não será o mesmo, tratando-se de um conjunto coeso de medidas que têm de ser implementadas em conjunto para o sucesso ser atingido (DGS, 2015).
Conclusão
O estudo revelou uma média do IQ nos procedimentos realizados na manipulação e manutenção do CVC de 80%. Verificou-se que existe uma parte significativa da amostra que não possui formação na área de prevenção da infeção relacionada com o CVC, nem tem conhecimento da norma nº 022/2015 da DGS. Uma percentagem significativa de profissionais de enfermagem afirmaram não conhecer a norma, denotando assim um déficit de capacitação para o desempenho de cuidados de enfermagem baseados nas melhores evidências científicas que concorrem para a prevenção da infeção relacionada com o CVC. Reforça-se, assim, a relevância da educação dos profissionais de saúde, como estratégia essencial para a prevenção e redução dos riscos de infeção, pelo que se realça a importância da formação contínua, com vista à atualização de conhecimentos, tendo como objetivo a prestação de cuidados seguros e de qualidade. Evidencia-se uma baixa utilização da clorohexidina a 2% em álcool, nos cuidados ao penso do CVC para antissepsia da pele, pelo que se sugere a implementação do uso desta substância como antissético de eleição na realização deste procedimento, através da realização de ações de formação interna, transmitindo a importância do conhecimento e do cumprimento correto da Norma nº 022/2015 nas unidades de HD para a prevenção da infeção do CVC. Verificou-se que os enfermeiros das unidades privadas obtiverem um IQ na manipulação e manutenção do CVC superior aos que exercem nas unidades públicas. Propõe-se a realização de outros estudos com um aumento no número de observações e na amostra, de forma a poder fazer associações e inferências para a população em geral.