Introdução
O ambiente hospitalar é considerado um dos ambientes mais perigosos para trabalhar, colocando em risco os profissionais de saúde, o que se pode refletir na qualidade e eficiência dos cuidados prestados (Mutifasari et al., 2018). De todos os profissionais de saúde, os enfermeiros são os mais expostos ao risco, tendo em conta que são o maior grupo profissional no hospital e os responsáveis pelo cuidado direto aos utentes (Loro et al., 2016; Mutifasari et al., 2018).
O serviço de urgência (SU), por se caracterizar como um serviço dinâmico, de atendimento imediato e provisório, acarreta consigo um maior risco para os enfermeiros, tornando, não só a instituição, mas também os enfermeiros, responsáveis por minimizar o risco, sempre que possível (Loro et al., 2016).
De todos os riscos que os enfermeiros enfrentam, destaca-se o risco de infeção (Loro et al., 2016). No entanto, estes profissionais podem, também, ser uma fonte de transmissão, surgindo a necessidade de proteger tanto enfermeiros como utentes (Brown et al., 2019).
Estima-se que, mundialmente, as infeções associadas aos cuidados de saúde (IACS) afetem um em cada 10 utentes (World Health Organization [WHO], 2016). Em 2016, em Portugal, 7,8% dos utentes adquiriram uma IAC em contexto hospitalar (Direção-Geral da Saúde [DGS], 2017). A sua maioria relaciona-se com a falta de uso ou o uso inadequado de medidas de prevenção (WHO, 2019).
Estas infeções são causa de significativa morbilidade e mortalidade, conduzindo a um consumo acrescido de recursos hospitalares e comunitários. Relacionam-se, ainda, com a resistência dos microrganismos a antibióticos. Estima-se que cerca de um terço destas são evitáveis (DGS, 2015, 2017).
A infeção é um dos motivos mais frequentes na procura dos serviços do SU pelos utentes. Além disso, em consequência das suas características específicas, o SU apresenta desafios próprios no que toca ao controlo e prevenção da infeção, em especial devido ao grande fluxo e concentração de pessoas. Sinais e sintomas inespecíficos podem atrasar o diagnóstico de uma infeção e, consequentemente, atrasar o isolamento e o uso de Equipamentos de proteção individual (EPIs) apropriado, levando ao aumento do potencial de transmissão (Liang et al., 2018).
Considera-se EPIs a panóplia de dispositivos com função de barreira, que previnem a contaminação de um indivíduo através de fluídos corporais. Nestes, incluem-se todas as secreções e excreções, inclusive as partículas transportadas pelo ar, que possam provir do contacto direto com o utente ou com o meio envolvente. Os EPIs funcionam num fluxo duplo, prevenindo a contaminação do profissional de saúde, mas, também, da pessoa a quem presta cuidados (Brown et al., 2019).
Apesar do exposto anteriormente, particularmente sobre a importância do uso dos EPIs e as particularidades do SU, é evidenciado em vários estudos que a adesão aos mesmos, por parte dos enfermeiros, é inferior ao que se considera adequado (Brown et al., 2019; Porto & Marziale, 2016).
Uma pesquisa preliminar realizada na MEDLINE (PubMed), Cochrane Database of Systematic Reviews, Joanna Briggs Institute (JBI) Evidence Synthesis, PROSPERO e Open Science Framework (OSF), revelou que não existe nenhuma revisão (publicada ou a ser realizada), neste âmbito e limite temporal estabelecido.
A metodologia utilizada, com vista a dar resposta à questão de revisão “Quais os fatores que determinam a adesão ao uso de EPIs pelos enfermeiros no SU?”, consiste numa scoping review, orientada pela metodologia proposta pelo JBI for Scoping Reviews (Peters et al., 2020). Deste modo, na presente, objetiva-se, especificamente, o mapeamento de fatores promotores e inibidores à adesão ao uso de EPIs pelos enfermeiros do SU.
Método de revisão sistemática
Optou-se por realizar uma scoping review, dado que era objetivo dos autores: mapear as evidências existentes, identificar lacunas na evidência existente, realizar um exercício preliminar que justifique e informe a realização de uma revisão sistemática da literatura. A melhor abordagem para alcançar todos os objetivos referidos é uma scoping review (Peters et al., 2020).
Os critérios de inclusão e exclusão foram selecionados com base nos elementos da população, contexto e conceito (PCC).
Utilizando estes elementos, foram incluídos na scoping review estudos que: a) quanto ao tipo de participantes, abordem enfermeiros; b) quanto ao conceito, abordem os EPIs; c) quanto ao contexto, abordem o SU.
Quanto ao tipo de estudos, foram incluídos estudos qualitativos e quantitativos e revisões da literatura publicados.
Estratégia de pesquisa e identificação dos estudos
A estratégia de pesquisa incluiu estudos publicados e não publicados, e foi constituída por três passos: 1) Pesquisa inicial limitada nas bases de dados MEDLINE (via PubMed) e CINAHL (via EBSCO), seguindo-se uma análise de palavras de texto nos títulos e resumos e dos termos de índice usados para descrever o artigo; 2) Segunda pesquisa usando todas as palavras-chave e termos de índice identificados, em todas as bases de dados incluídas (Tabela 1); 3) As referências bibliográficas dos artigos incluídos foram analisadas para identificar estudos adicionais. Foram considerados para inclusão nesta revisão estudos escritos em inglês, espanhol e português, no intervalo temporal de 5 anos (2015-2020). Este limite temporal foi estabelecido com o intuito de obter a evidência científica mais atualizada, uma vez que foi identificada uma revisão realizada neste âmbito, datada de 2016 (Porto & Marziale, 2016).
Base de dados: CINAHL Complete (via EBSCOhost) Resultados: 18 Limitadores: Data de publicação: (2015 - 2020); Excluir registos do MEDLINE; Idioma (English, Portuguese, Spanish) Estratégia de pesquisa (31 de março de 2020): | |
S7 | S1 AND S4 AND S5 |
S6 | S1 AND S4 AND S5 |
S5 | S2 OR S3 |
S4 | TI "emergency room" OR AB "emergency room" OR TI "emergency department" OR AB "emergency department" OR MH Emergency Service |
S3 | TI respirator OR AB respirator OR TI gown OR AB gown OR TI "face shield" OR AB "face shield" OR MH Protective Devices |
S2 | TI "individual protection equipment" OR AB "individual protection equipment" OR TI glove OR AB glove OR TI gloves OR AB gloves OR TI mask OR AB mask OR TI masks OR AB masks OR TI goggles OR AB gogogles |
S1 | TI nurs* OR AB nurs* OR MH nurses |
Base de dados: Cochrane Central Register of Controlled Trials (via EBSCOhost) Resultados: 6 Limitadores: Data de publicação: (2015 - 2020) Estratégia de pesquisa (31 de março de 2020): | |
S6 | S1 AND S4 AND S5 |
S5 | S2 OR S3 |
S4 | TI "emergency room" OR AB "emergency room" OR TI "emergency department" OR AB "emergency department" |
S3 | TI respirator OR AB respirator OR TI gown OR AB gown OR TI "face shield" OR AB "face shield" |
S2 | TI "individual protection equipment" OR AB "individual protection equipment" OR TI glove OR AB glove OR TI gloves OR AB gloves OR TI mask OR AB mask OR TI masks OR AB masks OR TI goggles OR AB googgles |
S1 | TI nurs* OR AB nurs* |
Base de dados: MEDLINE (via PubMed) Resultados: 18 Estratégia de pesquisa (31 de março de 2020): | |
Search: (((nurses[MeSH Terms]) OR (nurs*[Title/Abstract])) AND (((emergency room[Title/Abstract]) OR (emergency department[Title/Abstract])) OR (Emergency Departments[MeSH Terms]))) AND (((((((individual protection equipment[Title/Abstract]) OR ((glove[Title/Abstract]) OR (gloves[Title/Abstract]))) OR ((masks[Title/Abstract]) OR (mask[Title/Abstract]))) OR (gown[Title/Abstract])) OR (respirator)) OR (face shield[Title/Abstract])) OR (Personal Protective Equipment[MeSH Terms])) Filters: in the last 5 years, English, Portuguese, Spanish, MEDLINE | |
Base de dados: SciELO Resultados: 18 Estratégia de pesquisa (31 de março de 2020): | |
((ti:(nurs*)) OR (ab:(nurs*))) AND ((((ti:("emergency department")) OR (ab:("emergency department"))) OR ((ti:("emergency room")) OR (ab:("emergency room")))) OR (ti:("emergency services")) OR (ab:("emergency services"))) AND ((((ti:("individual protection equipment")) OR (ab:("individual protection equipment")) OR (ti:(glove)) OR (ab:(glove)) OR (ti:(gloves)) OR (ab:(gloves)) OR (ti:(mask)) OR (ab:(mask)) OR (ti:(masks)) OR (ab:(masks)) OR (ti:(gown)) OR (ab:(gown)) OR (ti:(respirator)) OR (ab:(respirator)) OR (ti:("protection measures")) OR (ab:("protection measures"))) OR (ti:("face shield")) OR (ab:("face shield")))) | |
Base de dados: DART-artEurope Resultados: 0 Limitadores: Data de publicação (2015-2020) Estratégia de pesquisa (31 de março de 2020): | |
S2 | nurses AND personal protective equipment = 0 |
S1 | nurse AND personal protective equipment = 0 |
Base de dados: OpenGrey Resultados: 0 Estratégia de pesquisa (31 de março de 2020): | |
S2 | nurses AND personal protective equipment = 0 |
S1 | nurse AND personal protective equipment = 0 |
Base de dados: Repositórios Científicos de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP) Resultados: 1 Limitadores: Data de publicação (2015-2020) Estratégia de pesquisa (31 de março de 2020): | |
S4 | AB: nurses AND personal protective equipment = 0 |
S3 | AB: nurse AND personal protective equipment = 0 |
S2 | TI: nurses AND personal protective equipment = 0 |
S1 | TI: nurse AND personal protective equipment = 1 |
A relevância dos artigos para a revisão foi analisada por dois revisores independentes, com base nas informações fornecidas no título e resumo. O artigo completo foi recuperado para todos os estudos que cumpriam os critérios de inclusão da revisão. Sempre que os revisores tiveram dúvidas sobre a relevância de um estudo a partir do resumo, o artigo completo foi recuperado. Dois revisores examinaram, de forma independente, o texto completo dos artigos para verificar se cumpriam os critérios de inclusão. Desacordos entre os revisores foram resolvidos com um terceiro revisor.
Estudos identificados a partir de listas de referência foram avaliados quanto à relevância com base no seu título e resumo.
Extração de dados
A extração de dados foi realizada por dois revisores independentes, com recurso a um instrumento desenvolvido pelos investigadores, alinhado com o objetivo e questões de revisão. Desacordos entre os revisores foram resolvidos através de discussão ou com um terceiro revisor. Quando surgiu a necessidade de esclarecimentos adicionais os autores dos artigos foram contactados.
Apresentação dos resultados
Através da pesquisa realizada foram identificados 44 estudos potencialmente relevantes. Tal como apresentado na Figura 1, destes 44 artigos, quatro foram excluídos por serem duplicados; dos restantes, 30 foram excluídos após avaliação do título e resumo. Por fim, foram selecionados dois artigos, que após leitura integral do texto, cumpriam os critérios de inclusão definidos.
O estudo qualitativo, publicado em 2017, foi desenvolvido na Austrália, com recurso à entrevista individual de 13 enfermeiros de um SU. Concretamente, os enfermeiros entrevistados descrevem fatores que promovem e inibem a adesão ao uso de EPIs (Baduge et al., 2017).
O estudo quantitativo, de 2016, realizado num SU de Boston, nos Estados Unidos da América, contou com a participação de 88 enfermeiros, recorrendo a observação e ao desenvolvimento de uma intervenção educacional (Peponis et al., 2016).
A Tabela 2 apresenta as respostas à questão de revisão.
Estudo | Fatores promotor de adesão ao uso de Equipamentos de proteção individual | Fatores inibidor de adesão ao uso de Equipamentos de proteção individual |
Baduge et al., 2017 | - Responsabilidade familiar; - Responsabilidade profissional; - Responsabilidade com a comunidade; - Conhecimento das repercussões da não adesão. | - Idade; - Patologias; - Falta de treino e avaliação; - Falta de conhecimento sobre o uso correto de EPIs; - Insegurança. |
Peponis et al., 2016 | - Intervenção educacional; - Feedback, pelos colegas, em tempo real. | - Falta de tempo; - Falta de avaliação do risco potencial de exposição; - Esquecimento. |
Interpretação dos resultados
O objetivo desta scoping review foi mapear estudos que identificassem os fatores promotores e os fatores inibidores ao uso de EPIs no SU. Para dar resposta a este objetivo, dois estudos primários foram incluídos na revisão.
Fatores promotores da adesão ao uso de equipamentos de proteção individual
O estudo de Baduge et al. (2017) foca a responsabilidade profissional dos enfermeiros como fator promotor da adesão ao uso de EPIs, de modo a salvaguardarem os indivíduos a quem prestam cuidados de saúde, o ambiente, a comunidade e a si.
Com efeito, preconiza-se que a prestação de cuidados de enfermagem deve assentar no conhecimento científico e na avaliação sistemática de melhores práticas clínicas. Particularmente, é expectável que o enfermeiro reflita de forma crítica e sustentada sobre as práticas de enfermagem que possam comprometer a segurança do indivíduo (Ordem dos Enfermeiros (OE), 2015). Deste modo, e tendo por base a importância do uso de EPIs na prevenção da disseminação da contaminação e na segurança do utente, a adesão aos EPIs surge como fator intimamente relacionado com a responsabilidade profissional do enfermeiro.
Ainda no estudo de Baduge et al. (2017), a responsabilidade para com a comunidade e com a família constituem fatores promotores da adesão ao uso de EPIs. O estudo realizado por Fernandes et al. (2017), embora realizado noutro contexto, corrobora as responsabilidades profissional, particularizando a segurança do utente, e com a comunidade e, consequentemente, familiar, como essenciais na prestação de cuidados de saúde seguros, com recurso a EPIs.
Os enfermeiros devem usar EPIs conscientes da vulnerabilidade a que as pessoas a quem prestam cuidados estão sujeitos, a fim de reduzir potenciais danos e promover o bem-estar dessas. Assim, a aquisição de conhecimento pertinente aos EPIs pode contribuir para o cumprimento da prática clínica assente nos princípios que regulam a profissão, como, para a perceção e interiorização da importância do uso de EPIs.
Efetivamente o conhecimento dos enfermeiros acerca das repercussões associadas à não adesão ao uso de EPIs constitui um fator promotor à adesão destes (Baduge et al., 2017). Também no estudo de Fernandes et al. (2017) foi identificada uma associação entre os conhecimentos que os profissionais de enfermagem são detentores e os fatores já mencionados, indicando que os primeiros são claramente promotores de comportamentos responsáveis acerca da adesão ao uso de EPIs.
Igualmente, o estudo de Peponis et al. (2016) evidencia a importância do investimento na educação dos profissionais de saúde para promover o uso de EPIs, tendo a adesão aos EPIs aumentado após uma intervenção educacional. Contudo, os dados obtidos, em particular, a diminuição da adesão a determinados EPIs pelos enfermeiros, permitem sugerir que seria adequado desenhar intervenções educacionais específicas para cada subgrupo profissional, de modo a alcançar uma maior adesão ao uso de todos os EPIs.
Porto e Marziale (2015), corroboram o supracitado ao constatarem que as intervenções educacionais são frequentemente consideradas, em diferentes contextos, incluindo o SU, como medidas promotoras da adesão aos EPIs. As mesmas constatam, ainda, que a inclusão de outros temas para além dos EPIs, como a perceção do risco potencial de exposição e as normas que regulamentam o trabalho em saúde, nas intervenções educacionais, é promotora de uma maior adesão aos EPIs, nomeadamente no SU (Porto & Marziale, 2015). No entanto, o estudo realizado por Morioka et al. (2019), ainda que realizado num contexto distinto ao contexto em estudo, revela que a educação, só por si, não é suficiente, já que existe evidência de que certas intervenções educacionais falharam em aumentar a adesão ao uso dos EPIs. Assim, é necessário, através da realização de outros estudos primários, identificar a priori quais as metodologias e/ou intervenções educacionais eficazes para aumentar a adesão ao uso de EPIs.
Associado à intervenção educativa, surge o feedback em tempo real, fornecido pelos colegas, que também se apresenta como uma estratégia promotora da adesão ao uso de EPIs (Peponis et al., 2016). Num ambiente onde os colegas de equipa se incentivam e relembram, continuamente, para aderirem aos EPIs, a relutância tende a desaparecer, para além de combater problemas como o esquecimento, que foi indicando pelos autores como um dos motivos para a fraca adesão aos EPIs pelos enfermeiros (Peponis et al. 2016).
Em síntese, os fatores identificados encontram-se interligados. Em enfermagem, existe uma necessidade constante de atualização dos conhecimentos existentes, a qual constitui uma responsabilidade dos enfermeiros. Ainda, o feedback implica conhecimento por parte dos enfermeiros, invocando a responsabilidade do enfermeiro de manter um ambiente seguro, e de contribuir para a promoção da saúde dos colegas de trabalho e do próprio.
Fatores inibidores da adesão ao uso de equipamentos de proteção individual
Foi possível identificar no artigo de Baduge et al. (2017) que a idade do enfermeiro e as patologias desse, por vezes, consequentes da primeira, inibem a adesão ao uso de EPIs, devido à dificuldade acrescida que a colocação e remoção desses representa. Adjacente a este aspeto, foi identificada a experiência profissional como um fator inibidor da adesão ao uso de EPIs. Silva et al. (2019) constataram, em diversos contextos, incluindo o SU, que os anos de prática clínica constituem um fator inibidor da adesão ao uso de EPIs, provocado pelo excesso de autoconfiança que os enfermeiros adquirem com a experiência profissional. Esta confiança excessiva surge com a habilidade e agilidade crescentes na prestação de cuidados, o que, consequentemente, promove o pensamento da possibilidade de realizar procedimentos de forma rápida e segura sem recurso aos EPIs adequados.
Outro fator identificado foram as patologias dos enfermeiros, havendo relatos de que patologias limitantes fazem com que os enfermeiros não se sintam motivados a aderir à utilização dos EPIs, devido às dificuldades inerentes à paramentação (Baduge et al., 2017). Este fator encontra-se intimamente relacionado com a idade, uma vez que as patologias limitantes identificadas frequentemente advêm do aumento dessa.
A educação e o conhecimento potenciam a utilização dos EPIs. Proporcionalmente, a falta de conhecimento sobre a utilização de EPIs é fator inibidor da adesão ao uso destes (Baduge et al., 2017). Também Yuliana (2018) concluiu que quando o nível de conhecimento é inferior existe uma menor adesão aos EPIs. Importa, também, referir que a falta de conhecimento pode levar a falsas crenças, comprometendo a segurança dos cuidados (Peponis et al., 2016).
Porto e Marziale (2015) identificaram um déficit de conhecimento sobre as PBCI e os EPIs, nomeadamente sobre o uso de EPIs e a importância da sua utilização, por parte dos enfermeiros de vários contextos clínicos, sendo que, em alguns desses estudos, a falta de conhecimento foi reconhecida como o motivo da reduzida adesão aos mesmos. Morioka et al. (2019), identificaram também a falta de conhecimento como um fator inibidor da adesão aos EPIs, constatando que os enfermeiros consideram as PBCI como fundamentais na presença de sinais sugestivos ou de diagnóstico de infeção, mas que podem ser suspensas quando não existe infeção.
Assim, apesar da evidência anteriormente plasmada não se restringir ao contexto do SU, está claro que há uma necessidade de investir na formação dos enfermeiros, combatendo a falta de conhecimento. Providenciar informação nesta área é visto como um desafio, mas métodos alternativos como packs de aprendizagem digitais podem ser uma mais-valia. É, ainda, preciso estabelecer protocolos internos e divulgar os mesmos para que os enfermeiros possam ter acesso a esses e conhecimento sobre como atuar perante os mesmos. Os fluxogramas e guidelines de fontes internacionalmente reconhecidas são, também, uma opção para adquirir ou solidificar conhecimento sobre os EPIs (Brown et al., 2019; Porto & Marziale, 2015).
Outro dado relevante prende-se com a falta de treino sobre a utilização de EPIs e com falta de avaliação da adesão e da sua utilização correta (Baduge et al., 2017). Neste sentido, protocolos que visem a melhoria à adesão dos EPIs devem incluir o treino e a avaliação, além da educação e demonstração (Reddy et al., 2019).
A insegurança em relação à utilização dos EPIs também pode inibir a utilização dos EPIs pelos enfermeiros, existindo relatos de que os mesmos não se sentem seguros no cumprimento dos protocolos de prevenção de infeção e na utilização dos EPIs (Baduge et al., 2017). Esta problemática poderá, de alguma forma, ser consequência da falta de conhecimento e treino. No entanto, mais estudos teriam de ser realizados para testarem a veracidade desta hipótese.
Ainda, Peponis et al. (2016) identificam a falta de tempo, o esquecimento e a falta de avaliação do risco potencial de exposição como fatores que inibem a adesão ao uso de EPIs. A revisão realizada por Porto e Marziale (2015) corrobora o esquecimento como fator inibidor da adesão ao uso de EPIs e identifica, do mesmo modo, fatores como o número insuficiente de enfermeiros e a sobrecarga de trabalho. Embora estes últimos não corroborem diretamente os fatores identificados por Peponis et al. (2019), podem desencadear uma cascata de falta de tempo e esquecimento dos enfermeiros. Diversos estudos (Henderson et al., 2020; Morioka et al., 2020), ainda que noutros contextos, corroboram a falta de tempo como fator inibidor, sendo categorizado por Henderson et al. (2020) como falta de recursos humanos.
Relativamente à falta de avaliação do risco potencial de exposição, este fator é corroborado como inibidor da adesão ao uso de EPIs por vários estudos (Brown et al., 2019; Harrod et al., 2019; Porto & Marziale, 2015). Harrod et al. (2019), constata que os enfermeiros sentem que estão constantemente em risco de exposição, independentemente das precauções adotadas e, ainda, que a exposição permanente promove a sua imunidade fazendo com que os mesmos não adotem estratégias preventivas. Em última análise, este último fator poderá surgir associado à falta de tempo e de conhecimento do enfermeiro, assim como ao excesso de autoconfiança, fator promotor da adesão a comportamentos não preventivos.
Relativamente às limitações dos estudos incluídos, embora a qualidade metodológica dos estudos incluídos não tenha sido realizada, uma vez que não é um passo preconizado nas scoping reviews, algumas indicações devem ser mencionadas, de modo a fornecer informações para futuros estudos.
No artigo de Peponis et al. (2016) verificou-se a possibilidade de ter ocorrido o efeito Hawthorne. Permanecem as incertezas da duração da adesão ao uso de EPIs, atingida no fim do estudo, e da influência do turno realizado nos dados obtidos, sendo que as observações foram realizadas maioritariamente durante o dia.
Relativamente ao artigo de Baduge et al. (2017), verificaram-se limitações ao nível do tamanho reduzido (13 enfermeiros) e na homogeneidade (sexo feminino) da amostra.
Em ambos os artigos, evidenciou-se uma limitação geográfica que compromete a extrapolação dos resultados e, inclusive, para outros contextos, uma vez que ambos são conduzidos em contextos reduzidos.
No que concerne às limitações da presente scoping review, dado que no desenvolvimento de scoping reviews não é preconizada a avaliação da qualidade metodológica dos estudos incluídos, na presente revisão não são apresentadas implicações para a prática clínica. Adicionalmente, só foram incluídos estudos nos idiomas português, inglês e espanhol, podendo eventualmente existir artigos relevantes para esta revisão, noutros idiomas. Por último, outra limitação prende-se com o número de bases de dados pesquisadas. A inclusão de outras bases poderia, eventualmente, traduzir-se na inclusão de outros artigos relevantes para esta revisão.
Como implicações para a investigação, o mapeamento realizado pode ser utilizado como base para o planeamento e desenvolvimento de intervenções dirigidas ao aumento da adesão ao uso de EPIs, pelos enfermeiros do SU, enfatizando o que se consideram os fatores promotores da sua adesão e tentando contornar os fatores inibidores.
Não obstante, dada a importância amplamente descrita sobre a utilização dos EPIs no contexto do SU, mais estudos, de cariz quantitativo e qualitativo, acerca dos fatores promotores e inibidores do uso de EPIs no SU precisam de ser realizados. Futuros estudos deverão recorrer a uma amostra maior.
Conclusão
Atualmente, a evidência sobre a relevância da utilização de EPIs pelos profissionais de saúde e, em particular, pelos enfermeiros, é abrangente. Não obstante, também há evidência de que a adesão à utilização destes não é tão significativa quanto seria expectável, pelo que é relevante o mapeamento dos fatores que promovem e dos fatores que inibem a utilização deste recurso por parte dos enfermeiros do SU. Como fatores promotores da adesão ao uso de EPIs por parte dos enfermeiros do SU foram identificados: a responsabilidade profissional, familiar e para com a comunidade, o conhecimento das repercussões da não adesão, as intervenções educacionais, e a correção de comportamentos pelos colegas em tempo real. Como fatores inibidores foram identificados: a idade e as patologias, a falta de treino e avaliação, a falta de conhecimento acerca do uso correto de EPIs, a insegurança, a falta de tempo, a falta de avaliação do risco potencial de exposição, e o esquecimento.
O mapeamento realizado permitiu identificar lacunas que devem ser contempladas em futuros estudos primários, bem como a necessidade de realização de uma revisão sistemática da literatura, a fim de verificar qual dos estudos apresenta melhor evidência científica. Adicionalmente, o mesmo pode constituir um ponto de partida para o desenvolvimento de intervenções dirigidas ao aumento da adesão ao uso de EPIs, pelos enfermeiros do SU.