Estratégia de pesquisa e identificação dos estudos

A estratégia de pesquisa foi restrita ao espaço temporal de 2019 até à atualidade e aos idiomas português, inglês e espanhol. Numa primeira fase, procedeu-se a uma pesquisa limitada às bases de dados MEDLINE via PubMed e CINAHL via EBSCO, com as palavras-chave COVID-19 e presenteeism, e o operador booleano AND, de forma a analisar os termos de linguagem natural presentes no título e resumo, com o objetivo de promover uma pesquisa posterior adequada. Numa segunda fase, procedeu-se à pesquisa nas bases de dados científicas MEDLINE via PubMed, CINAHL via EBSCO, MedicLatina via EBSCO, Psychology and Behavioral Sciences Collection via EBSCO e Scientific Electronic Library Online (SciELO), no dia 29 de novembro de 2020. De forma a identificar literatura não publicada, foi procedido à pesquisa nos Repositórios Científicos de Acesso Aberto de Portugal (RCAAP). Na Tabela 2 é apresenta a estratégia de pesquisa adotada na base de dados MEDLINE via PubMed. As estratégias de pesquisa foram adaptadas para cada base de dados. Por fim, numa terceira fase foi pertinente analisar as referências bibliográficas dos estudos incluídos.

O processo de seleção de estudos foi concretizado por dois autores de forma independente, com recurso ao gestor bibliográfico Mendeley. Primeiramente, procedeu-se à análise do título e do resumo e, seguidamente à análise do texto completo. As divergências entre autores foram discutidas/analisadas, com vista a atingir um consenso entre os mesmos.

Extração de dados

A extração de dados foi orientada por um instrumento desenvolvido pelos autores. Os dados foram extraídos e sintetizados por dois autores de forma independente. As divergências entre os mesmos foram discutidas/analisadas, atingindo um consenso entre autores.

Síntese dos dados

A síntese dos dados foi concretizada de forma narrativa e com recurso a tabelas, por dois autores de forma independente.

Apresentação dos resultados

Através da pesquisa nas bases de dados, obteve-se um resultado total de 13 registos (oito resultados na MEDLINE via PubMed, quatro na CINAHL via EBSCO, zero na MedicLatina via EBSCO, na Psychology and Behavioral Sciences Collection via EBSCO e na SciELO, e um no RCAAP). Após a eliminação dos duplicados, foram identificados nove registos. Através da leitura e da análise dos resumos, foi excluído um registo por não apresentar o critério de inclusão referente à população. Após a recuperação do texto completo, os oito estudos foram analisados de forma integral, tendo sido excluídos três estudos por não apresentarem a população (um estudo) e o contexto (dois estudos) de interesse desta revisão. Posto isto, foram incluídos cinco estudos nesta scoping review. Na Figura 1 encontra-se o Fluxograma do processo de seleção e inclusão dos estudos, segundo os PRISMA-ScR(^{Tricco et al., 2018}).

Figura 1: Fluxograma do processo de seleção e inclusão dos estudos 

Na Tabela 3 e 4 encontra-se uma lista dos estudos incluídos, com os respetivos autores, ano de publicação, títulos e revista de publicação (3), bem como o idioma de publicação, país relatado no estudo, desenho de estudo, população e contexto (4).

Autores, ano e revistas dos estudos incluídos

Os autores dos estudos incluídos nesta revisão foram: Daniel (²⁰²⁰); Grech et al. (²⁰²⁰); Mosteiro‐Díaz et al. (²⁰²⁰); Simms et al. (²⁰²⁰); Wee et al. (²⁰²⁰). Todos os estudos foram publicados no ano 2020. As revistas de publicação foram: The American Journal of Gastroenterology (^{Daniel, 2020}); Early Human Development (^{Grech et al., 2020}); International Nursing Review (^{Mosteiro‐Díaz et al., 2020}); Occupational Medicine (^{Simms et al., 2020}); Infection Control & Hospital Epidemiology (^{Wee et al., 2020}).

Idioma dos estudos incluídos

Todos os estudos foram publicados na língua inglesa (^{Daniel, 2020}; ^{Grech et al., 2020}; ^{Mosteiro‐Díaz et al., 2020}; ^{Simms et al., 2020}; ^{Wee et al., 2020}).

Países de realização dos estudos

Os estudos desta revisão foram desenvolvidos em diferentes países do continente Europeu, Americano e Asiático. Especificamente, na China e no Reino Unido (^{Daniel, 2020}), apenas no Reino Unido (^{Simms et al., 2020}), em Itália (^{Grech et al., 2020}), em Portugal, Espanha e Brasil (^{Mosteiro‐Díaz et al., 2020}), e em Singapura (^{Wee et al., 2020}).

Desenho dos estudos incluídos

Os estudos desenvolvidos por Daniel (²⁰²⁰) e por Grech et al. (²⁰²⁰) são considerados artigos teóricos, e os estudos desenvolvidos por Mosteiro‐Díaz et al. (²⁰²⁰), Simms et al. (²⁰²⁰) e por Wee et al. (²⁰²⁰) são de abordagem quantitativa.

População e Contexto

Os estudos incluídos abordaram médicos (^{Daniel, 2020}), enfermeiros (^{Mosteiro‐Díaz et al., 2020}) e profissionais de saúde sem especificação (^{Mosteiro‐Díaz et al., 2020}; ^{Simms et al., 2020}; ^{Wee et al., 2020}). O contexto pandémico da doença COVID-19 foi o contexto considerado por todos os estudos.

Fatores potenciadores do presenteísmo nos profissionais de saúde durante a pandemia COVID-19

Os cinco estudos incluídos foram analisados, através do foco central desta revisão: a identificação dos fatores potenciadores do presenteísmo nos profissionais de saúde durante a pandemia COVID-19 (Tabela 5).

Tabela 5: Fatores potenciadores do presenteísmo nos profissionais de saúde durante a pandemia COVID-19 

Posto isto, foi possível identificar 12 fatores potenciadores diferentes. A cultura de autossacrifício, a prevenção da sobrecarga dos colegas, a preocupação com os doentes e equipa, e a falta de preocupação dos administradores perante a prática de presenteísmo pelos profissionais de saúde foram fatores identificados pelo autor Daniel (²⁰²⁰), como potenciadores do presenteísmo pela classe médica. Também a vergonha dos sintomas associados à COVID-19 e as consequências advindas da quarentena/isolamento (utilização dos dias de férias e diminuição da remuneração) foram considerados fatores potenciadores deste fenómeno de interesse identificados pelo mesmo autor.

O estudo desenvolvido por Grech et al. (²⁰²⁰) mencionou a vacinação da gripe e os sintomas ligeiros da doença COVID-19. A vacinação da gripe foi considerada como um fenómeno que originava a perceção de imunização a 100% pelos profissionais de saúde, sendo que pode ser considerado um fator precursor da atividade clínica com sintomas ligeiros da gripe durante esta pandemia. Também, uma vez que a doença COVID-19 pode apenas apresentar sintomas deste grau (ligeiros), este facto poderá desencadear o presenteísmo nos profissionais de saúde. Os autores Wee et al. (²⁰²⁰) corroboram esta hipótese, uma vez que apresentaram também como fator potenciador do presenteísmo os sintomas ligeiros da doença COVID-19, bem como a ansiedade de faltar ao trabalho numa condição pandémica, como a atual, onde são necessários inúmeros profissionais de saúde para dar resposta às necessidades populacionais.

Os autores Mosteiro‐Díaz et al. (²⁰²⁰) mencionaram as condições laborais precárias como um fator potenciador do presenteísmo pelos enfermeiros.

Por fim, os autores Simms et al. (²⁰²⁰) referiram que a perceção da utilização de equipamentos de proteção individual inadequados desencadeava sentimentos de stress e insegurança por parte dos profissionais de saúde, originando a prática de presenteísmo por parte dos mesmos.

Interpretação dos resultados

A análise dos estudos incluídos permitiu mapear os fatores potenciadores do presenteísmo nos profissionais de saúde durante a pandemia desencadeada pela doença COVID-19. Após a aplicação dos critérios de inclusão, cinco estudos foram incluídos e analisados, pelo que neste capítulo objetiva-se interpretar os resultados apresentados anteriormente e confrontar os mesmos com outras evidências atuais, no sentido de dar resposta à questão de revisão e de definir implicações para a prática dos profissionais de saúde e gestores em saúde, bem como para futuras investigações.

A evidência científica disponível até à data sobre o presenteísmo nos profissionais de saúde durante a pandemia COVID-19 permitiu, como anteriormente referido, identificar 12 fatores potenciadores. A cultura de autossacrifício, a prevenção da sobrecarga dos colegas, a preocupação com os doentes e com a equipa, a falta de preocupação por parte da administração referente a este fenómeno, a vergonha dos sintomas, as consequências da quarentena (^{Daniel, 2020}), a vacinação da gripe (^{Grech et al., 2020}), as condições laborais precárias (^{Mosteiro‐Díaz et al., 2020}), o aumento do stress/insegurança desencadeado pela utilização de equipamentos de proteção individual inadequados (^{Simms et al., 2020}) e, por fim, a ansiedade por faltar ao trabalho (^{Wee et al., 2020}) foram fatores potenciadores identificados na literatura apenas nos respetivos estudos, como exposto na Tabela 5.

Especificamente, em relação ao fator potenciador do presenteísmo - a cultura de autossacrifício (^{Daniel, 2020}), um estudo de desenho qualitativo publicado em 2020, referiu que uma cultura de autossacrifício desencadeia a prática de presenteísmo, nomeadamente pelas equipas de enfermagem, bem como outros fenómenos (insatisfação no trabalho, burnout) com impacto negativo na qualidade da prestação de cuidados (^{Ciezar-Andersen & King-Shier, 2020}).

A prevenção da sobrecarga dos colegas, a preocupação com os doentes e com a equipa, e a ansiedade por faltar ao trabalho foram fatores potenciadores do presenteísmo nos profissionais de saúde identificados também por diferentes autores fora do contexto pandémico COVID-19 (^{Schneider et al., 2018}). Também, torna-se importante salientar, que segundo Oliveira et al. (²⁰¹⁸), o apoio dos colegas e dos membros da gestão em saúde diminui as preocupações/ansiedade, e consequentemente a prática de presenteísmo por parte dos profissionais de saúde. Assim como, segundo Daniel (²⁰²⁰), o desenvolvimento de uma listagem com profissionais de reserva para possível substituição minimiza a prática de presenteísmo, e os fatores supramencionados (sobrecarga dos colegas e preocupação com os mesmos).

A falta de preocupação por parte da administração referente à prática de presenteísmo aumenta a presença deste conceito de interesse nos profissionais de saúde (^{Daniel, 2020}). Segundo diferentes estudos disponíveis na literatura atual a preocupação por parte dos administradores com a prática de presenteísmo pelos profissionais de saúde, bem como a adoção de estratégias de prevenção pelos gestores nos diferentes contextos de saúde, torna-se essencial para diminuir a prevalência deste conceito de interesse relatado nesta revisão (^{Oliveira et al., 2018}; ^{Schneider et al., 2018}).

As condições laborais precárias são também mencionadas diversas vezes na literatura em contextos de não pandemia, nomeadamente as horas extra concretizadas e as condições ambientais desfavoráveis à prestação de cuidados de saúde de qualidade (^{Mach et al., 2018}). Sendo que segundo o estudo incluído nesta revisão, estes fatores encontram-se agravados em contexto pandémico COVID-19, apresentando como consequência a elevada incidência de prática de presenteísmo pelos profissionais de saúde (^{Mosteiro‐Díaz et al., 2020}).

A vergonha dos sintomas da doença COVID-19 e as consequências da quarentena (férias ou cortes na remuneração) foram fatores potenciadores do presenteísmo referidos apenas por um estudo na literatura (^{Daniel, 2020}), não tendo sido identificados por nenhum outro estudo, tanto neste contexto como extra ambiente pandémico.

Os equipamentos de proteção individual inadequados foram mencionados também apenas por um estudo (^{Simms et al., 2020}). Este fator apresenta como consequência o aumento do stress e do medo em ficar infetados, aumentando o presenteísmo. Também, referente a este fator não foi encontrado nenhum outro estudo que abordasse o mesmo.

A vacinação da gripe associada aos sintomas ligeiros foi correlacionada com a prática de presenteísmo num ambiente pandémico (^{Grech et al., 2020}). A presença de sintomas ligeiros foi o único fator potenciador abordado em dois estudos (^{Grech et al., 2020}; ^{Wee et al., 2020}). Segundo os autores supramencionados, os profissionais de saúde ao apresentarem sintomas ligeiros optam por trabalhar, tendo em vista a minimização das consequências da sua ausência ao trabalho, nomeadamente a sobrecarga dos colegas, a diminuição da remuneração, bem como o uso dos dias de férias para a quarentena, tal como descreve o autor Daniel (²⁰²⁰). No entanto, segundo o mesmo autor, estas atitudes poderão originar consequências nefastas para o doente como também para os colegas de trabalho, pelo que se torna essencial despertar os gestores em saúde e os profissionais para este fenómeno, com vista a minimizar as suas consequências e a aumentar a qualidade dos cuidados de saúde.

Por fim, referente às limitações presentes nesta revisão, é possível destacar que apenas foram incluídos estudos desenvolvidos nos idiomas português, inglês e espanhol, pelo que estudos com idiomas diferentes poderiam também ter sido benéficos para analisar este conceito de interesse. Também, uma vez que se trata de uma scoping review, onde se objetiva o mapeamento da evidência, não foi concretizada a avaliação da qualidade metodológica dos estudos incluídos, pelo que as implicações para a prática concretizadas no próximo capítulo poderão apresentar limitações.