Introdução
A expressão da satisfação, em qualquer contexto, valoriza a experiência e todos os seus atores. Esta expressão de satisfação do utente é, segundo Dinsa et al. (2022), um fator determinante valorativo da satisfação com os cuidados de enfermagem e da experiência hospitalar global. Além desta, a restante literatura atual considera a satisfação percecionada como um indicador fundamental da qualidade dos serviços de saúde, e Bernardo e Lucas (2020) concluíram que a satisfação dos utentes se assume como o valor e reação aos cuidados recebidos. Estes conceitos corroboram os resultados de Valente (2018), no estudo relativo à satisfação dos utentes, ao defenderem que a perceção de satisfação decorre como variável emergente das suas necessidades, tais como: i) o tempo que o enfermeiro disponibiliza para estar junto deles; ii) as medidas de conforto que lhe foram aplicadas; iii) as estratégias de comunicação com que se sentiram bem recebidos; iv) e os cuidados na resposta às suas solicitações. Esta variável de perceção de satisfação é, assim, considerada com pertinência suficiente para que, em cada instituição, se respeite em absoluto as normas conducentes à aplicação dos cuidados e seus contextos, em cada nível de abordagem cuidativa. Em Portugal, a rede dos serviços de urgência integra três níveis: i) o serviço de urgência básica; ii) o serviço de urgência médico-cirúrgico; iii) e o serviço de urgência polivalente (Despacho n.º 10319/2014, 2014, p. 20673). Como se vem apresentando, a qualidade de prestação dos cuidados, nos serviços de saúde, e a importância de se ir ao encontro das necessidades e expetativas dos utentes, são reconhecidas como necessidades dos próprios serviços, fenómeno explicitado em Oliveira (2016), que considerou que a relação entre as necessidades, expetativas e a prestação de cuidados, é um desafio e indicador pertinente dessa qualidade. O propósito da realização deste estudo, é conhecer a perceção de satisfação dos utentes, perante a sua experiência de ser cuidado. Assim, assumem-se como objetivos específicos: i) identificar a perceção de satisfação dos utentes, relativamente aos cuidados de enfermagem; ii) avaliar a relação estatística entre as pontuações médias de perceção de satisfação da amostra e as variáveis sociodemográficas (sexo, faixa etária, estado civil, local de residência, habilitações literárias) e profissionais (tipologia de profissões). Por fim, e em essência, a pertinência de estudar a satisfação do utente, está no argumento de Dinsa et al. (2022), quando defendem que é clinicamente relevante determinar o grau de satisfação dos pacientes, já que, se existir satisfação com os serviços de saúde é mais provável que os doentes adiram aos tratamentos, sejam pró-ativos nos próprios cuidados, e mantenham a utilização desses serviços. Neste sentido, será efetuada uma análise da satisfação relativamente aos cuidados de enfermagem prestados, a partir da perceção de uma amostra de utentes que recorreram a um serviço de urgência médico-cirúrgica de um hospital da região norte de Portugal.
Enquadramento
A satisfação, enquanto fenómeno subjetivo, representa-se como um conceito complexo, com a ideia de difícil operacionalização, à qual Loureiro e Charepe (2018) adicionaram esclarecimento e contributos. As autoras analisaram o conceito de satisfação do paciente com os cuidados de enfermagem no hospital, operacionalizando-o em atributos, antecedentes e consequências. Os atributos são de domínio profissional, pessoal e ambiental. No domínio profissional, as autoras inserem todo o tipo de componente atitudinal executória, como por exemplo, as ações cuidativas, do tipo punções, aplicações de técnicas e de procedimentos técnico-científicos, bem como a comunicação, a capacidade e disponibilidade para educação em saúde e esclarecimentos, disponibilidade e celeridade em eventuais respostas a solicitações do doente/ família). No domínio pessoal, inserem as atitudes de teor afetivo e emocional que a cinésica do profissional permite transparecer, normalmente expressas pela simpatia e pelo suporte afetivo. Finalmente, o domínio ambiental, diz respeito à perceção que os utentes têm acerca do clima social, ou seja, ao tipo de ambiente relacional, das relações intra equipa cuidativa. Outra variável que as autoras explicitam são os antecedentes (tanto dos pacientes como dos enfermeiros), e que esses, por parte dos pacientes, dizem respeito à triangulação entre a perceção das suas necessidades, das suas experiências em contextos cuidativos, e dos cuidados efetivamente recebidos. Por parte dos enfermeiros, estão implícitos os domínios profissional, pessoal e ambiental. E por fim, mas numa perspetiva de à posteriori, como fenómeno comportamental ou atitudinal do doente, estarão também inseridas neste amplo conceito de satisfação, as consequências. Loureiro e Charepe (2018) defendem, assumidamente, que níveis elevados de satisfação estão associados a atitudes de melhor adesão a terapêuticas e tratamentos, intenção de voltar e recomendação da instituição, e por oposição, como a descrença na instituição e nos profissionais, quando eram percebidos níveis baixos de satisfação. Atualmente, considera-se de tal forma importante esta variável, e expressão do sentimento de satisfação, ou não, ao nível dos cuidados de saúde, que as instituições de decisão cuidativa, procuraram definir normativas para atender a este novo paradigma de qualidade em saúde, ideia reforçada em Dinsa et al. (2022), que defendem, que para determinar a qualidade dos serviços, devem ser consideradas as avaliações das perspetivas do paciente, e como resultado, devem ser medidos os benefícios dos cuidados de enfermagem para os pacientes e para a sociedade em geral. Estas perspetivas reforçam também o já anteriormente enunciado das subvariáveis implícitas e a respetiva mensuração, para efeitos de reconhecimento e estudos, o conselho de enfermagem da Ordem dos Enfermeiros (OE) em 2001 (OE, 2012), mas além disto, importa referir, que no âmbito das atitudes que caracterizam o exercício profissional dos enfermeiros, nunca poderá haver absoluto consenso. A unicidade do humano fará sempre diferentes atribuições conforme a pessoa, a sua história de vida e as suas expectativas. E esta diferenciação terá de ser reconhecida e assumida (OE, 2012). Expandindo esta proposta, Valente (2018) ao estudar o grau de satisfação dos utentes relativamente aos cuidados de enfermagem, além de identificar um índice elevado de satisfação relativamente aos cuidados recebidos, apesar das condicionantes intrínsecas ao serviço de urgência, também verificou uma relação estatística negativa entre essa satisfação e a idade, e com a escolaridade. Ou seja, quanto mais velhos e maior era o nível de formação, menor sentido de satisfação era apresentado. Estes resultados são corroborados por Dinsa (2022), já que a amostra com menor nível educacional, e de proveniência rural, apresentaram perceção de maior satisfação com os cuidados do que os seus homólogos na amostra. Além destes resultados, Valente (2018), identifica outras variáveis mais específicas, como por exemplo as competências técnicas e científicas, em simbiose com a disponibilidade relacional e a escuta ativa, bem como as atitudes de educação e respeito, as manifestações de preocupação, e componentes como a empatia e a simpatia, foram variáveis assinaladas em perceção de satisfação com os cuidados. Além destas, foram também identificadas variáveis mais técnicas, como: i) as precauções com segurança; ii) a habilidade executória nos procedimentos; iii) a celeridade no atendimento; iii) as atitudes de conforto e respeito pela privacidade; iv) a interação com estratégias de comunicação assertivas e humanizantes; v) e a avaliação sistemática dos cuidados prestados. Em suma, estão estudadas variáveis pertinentes e contextos diferenciados para poder avançar com o estudo relativamente à perceção de satisfação com os cuidados de enfermagem.
Questões de investigação
(I) Qual a perceção de satisfação dos utentes relativamente aos cuidados de enfermagem no serviço de urgência médico-cirúrgica de um hospital da região do Norte de Portugal?
(II) Qual a relação entre as pontuações médias de satisfação dos utentes e as variáveis sociodemográficas e profissionais?
Metodologia
Estudo exploratório, transversal analítico, de cariz quantitativo. A amostra diz respeito aos utentes atendidos no serviço de urgência médico-cirúrgica de um hospital da região do norte de Portugal, entre junho e julho de 2021. Os critérios de inclusão para constituição amostral foram: i) ter sido atendido por enfermeiros; ii) ter sido alvo de cuidados de enfermagem; iii) apresentar idade igual ou superior a 18 anos; iv) expressão (oral e corporal) de orientação no tempo e espaço e em relação a si próprio (identificação cronológica de dia e hora, local de residência e de filiação); v) participação voluntária no estudo, com assinatura do consentimento informado. Obteve-se uma amostra do tipo não probabilística por conveniência, constituída por 100 utentes. Para recolha da informação e de forma a encontrar respostas às questões de investigação, foi aplicado um instrumento de recolha de dados constituído por duas secções. A primeira secção é referente às variáveis sociodemográficas e profissionais que permitem descrever as características da amostra, tais como sexo, idade, estado civil, habilitações académicas, profissão e local de residência.
A segunda secção é constituída pela Escala de Satisfação do Cidadão face aos Cuidados de Enfermagem (ESCCE), traduzida e adaptada para a população portuguesa por Rodrigues e Dias (2003), que operacionaliza e avalia a variável dependente, ou seja, a perceção de satisfação dos utentes face aos cuidados de enfermagem. A construção da ESCCE teve por base a Newcastle Satisfaction with Nursing Scale (Thomas et al., 1996) e a La Mónica - Oberst Patient Satisfaction Scale (Monica et al., 1986).
A ESCCE descreve os comportamentos de enfermagem, operacionaliza a perceção da satisfação do cidadão face aos cuidados de enfermagem recebidos, e integra duas dimensões: a dimensão Experiência e a dimensão Opinião. A dimensão Experiência é constituída por 28 itens de perceção, operacionalizados através de uma escala de concordância, tipo Likert, com sete alternativas de resposta (1 = discordo completamente; 7 = concordo completamente), com itens necessários à inversão da ordem das pontuações. Desta forma, a dimensão Experiência apresenta as pontuações compreendidas entre o score mínimo de 28 e máximo de 196. A dimensão Opinião integra 19 itens e é operacionalizada através do mesmo processo (1 = insatisfeito; 5 = completamente satisfeito), para um score mínimo de 19 e máximo de 95. Assim, a variável assumida no estudo como variável dependente, a satisfação total, resulta da análise da totalidade de todos os itens das duas subescalas, que no seu total podem atingir uma pontuação mínima de 47, e máxima de 291. Da operacionalização da variável dependente, a sua mensuração indicará que quanto mais elevado for o valor de satisfação total, maior será a satisfação para com os cuidados de enfermagem recebidos. Esta foi também operacionalizada em três níveis, calculado com base na fórmula M ± 0,25 DP (Pestana & Gageiro, 2008): pouco satisfatória ou baixa (≤ M - 0,25 DP); moderadamente satisfatória ou moderada (> M - 0,25 DP e < M + 0,25 DP); e, muito satisfatória ou elevada (≥ M + 0,25 DP).
Após a autorização para a utilização da ESCCE, por parte das autoras que a adaptaram e validaram para a população portuguesa, o protocolo de estudo foi submetido à Comissão de Ética da instituição que autorizou o processo de recolha de dados (parecer n.º 20/2021). Na aplicação do instrumento de recolha de dados, assegurou-se a livre participação, a confidencialidade, o anonimato e a liberdade dos utentes.
Os dados foram tratados e analisados com recurso à estatística descritiva e inferencial. Foram calculadas as frequências absolutas e relativas das variáveis, as respetivas medidas de tendência central e as medidas de dispersão. Para desenvolver a análise da eventual existência de dissemelhança entre as variáveis em estudo, foram utilizados os testes para comparação de médias, quando verificados os pressupostos para a utilização dos testes paramétricos, nomeadamente, a aplicação do teste paramétrico t-student (variáveis sexo e local de residência) para duas amostras independentes. Para comparar as variâncias entre as médias de três ou mais grupos recorreu-se ao teste one-way ANOVA (variáveis faixa etária, estado civil e habilitações literárias).
Quando não cumpridos os pressupostos, e para três ou mais amostras independentes, recorreu-se à aplicação de um teste não paramétrico, o teste de Kruskal-Wallis (profissão - atividade em exercício), dado não existir uma distribuição normal nos diversos grupos independentes em análise.
Em todos os testes de hipóteses realizados, o nível de significância adotado foi de 5% para a tomada de decisões. Para a avaliação da consistência interna, da escala ESCCE, recorreu-se ao cálculo do ( de Cronbach. Todas as análises estatísticas foram realizadas com programa IBM SPSS Statistics para Windows, versão 24.0.
Resultados
A amostra (Tabela 1), apresenta-se maioritariamente do sexo feminino (n = 56; 56%), com média de idades de 45,74 ± 18,5 anos, com grande parte em conjugalidade (40% casados e 6% em união de facto), e a maioria (70%) a residir em ambiente urbano, com grau de escolarização intermédia (35% apresenta o ensino secundário e 23% o grau de licenciado). A caracterização da atividade profissional (em exercício, n = 78) apresenta a amostra, e de acordo com a Classificação Portuguesa das Profissões, maioritariamente em três grupos: especialistas das atividades intelectuais e científicas (22%); trabalhadores não qualificados (17%); trabalhadores qualificados da indústria construção e artífices (11%).
Variáveis sociodemográficas e profissionais | n | % |
---|---|---|
Sexo | ||
Masculino | 43 | 43 |
Feminino | 56 | 56 |
Sem resposta (missing) | 1 | 1 |
Faixa etária | ||
Até 35 anos | 36 | 36 |
36 a 50 anos | 25 | 25 |
Mais de 50 anos | 38 | 38 |
Sem resposta (missing) | 1 | 1 |
Estado civil | ||
Solteiro | 40 | 40,0 |
Divorciado | 9 | 9,0 |
União de facto | 6 | 6,0 |
Casado | 39 | 39,0 |
Viúvo | 6 | 6,0 |
Localidade de residência | ||
Rural | 29 | 29 |
Urbano | 70 | 70 |
Sem resposta (missing) | 1 | 1 |
Habilitações literárias | ||
Não sabe ler nem escrever | 1 | 1,0 |
1º Ciclo | 22 | 22,0 |
2º Ciclo | 1 | 1,0 |
3º Ciclo | 6 | 6,0 |
Secundário | 35 | 35,0 |
Licenciatura | 23 | 23,0 |
Pós-Graduação | 7 | 7,0 |
Mestrado/ Doutoramento | 5 | 5,0 |
Profissão | ||
Especialistas das atividades intelectuais e científicas | 22 | 22 |
Trabalhadores não qualificados | 17 | 17 |
Trabalhadores qualificados da indústria, construção e artífices | 11 | 11 |
Técnicos e profissões de nível intermédio | 7 | 7 |
Agricultores e trabalhadores qualificados da agricultura, da pesca e da floresta | 7 | 7 |
Trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção e segurança e vendedores | 6 | 6 |
Pessoal administrativo | 5 | 5 |
Profissões das Forças Armadas | 1 | 1 |
Representantes do poder legislativo e de órgãos executivos, dirigentes e gestores executivos | 1 | 1 |
Operadores de instalações e máquinas e trabalhadores da montagem | 1 | 1 |
Sem atividade em exercício | 22 | 22 |
No estudo da variável dependente, Tabela 2, a satisfação total apresenta-se com pontuação mínima de 50 e máxima de 291. Em resposta à primeira questão de investigação, a pontuação média obtida foi de 217 ± 57,8. Tendo por base a operacionalização da satisfação total em três categorias (baixa, moderada, elevada), constatamos que 41,8% da amostra se enquadra na categoria elevada de perceção de satisfação, 23,2% na categoria moderada e 35,3% na categoria de baixa perceção de satisfação.
A dimensão Experiência, com uma pontuação média de 148,6 ± 38,8, apresenta a pontuação mínima (31) próxima da mínima possível (28), e a máxima obtida (196) coincidente com a máxima possível (196). Estes dados significam existir uma variabilidade nas respostas. A dimensão Opinião, com pontuação mínima observada de 19 (mínimo possível), e a pontuação máxima de 95, coincidente com a pontuação máxima possível, e média de 68,9 ± 20,0. Com base na classificação descrita por Vilelas (2020), os valores de ( de Cronbach entre 0,8 e 0,9 significam uma consistência interna boa, como se verifica na dimensão Experiência, enquanto os valores acima de 0,9 classificam-na com muito boa, como se verifica na dimensão Opinião (Tabela 2). O resultado encontrado para a satisfação total é ligeiramente superior (0,980) ao encontrado pelas autoras da escala, que foi de 0,96 (Rodrigues & Dias, 2003).
Dimensão Subdimensão | Mínimo | Máximo | M | DP | ( |
---|---|---|---|---|---|
Experiência | 31 | 196 | 148,6 | 38,8 | 0,810 |
Satisfação | 18 | 126 | 94,0 | 27,6 | 0,979 |
Insatisfação | 13 | 70 | 54,3 | 13,9 | 0,933 |
Opinião | 19 | 95 | 68,9 | 20,0 | 0,986 |
Satisfação total | 50 | 291 | 217,9 | 57,8 | 0,980 |
Nota. M = Média; DP = Desvio-padrão; ( = Alpha de Cronbach
Tendo por base a análise por item de cada dimensão da ESCCE (Tabela 3), no que concerne à subdimensão Satisfação da primeira dimensão (Experiência), verificamos que os itens 1, 17 e 26 foram os que revelaram maior pontuação média (concordância). Os itens 10 e 14, foram os que revelaram menores pontuações, respeitantes à explicação fornecida ao utente quanto à sua situação e no respeito pela privacidade do utente, respetivamente. Para a subdimensão Insatisfação (constituído por itens negativos), os itens 6 e 22, foram os que mereceram maior concordância. Na dimensão Opinião, os itens 7, 16 e 18, respeitantes à quantidade de informação fornecida, liberdade proporcionada no serviço e privacidade concedida, respetivamente, foram os que revelaram menor pontuação.
Dimensão Subdimensão Item | M | DP |
---|---|---|
Experiência (28 itens respondido numa escala de 1 a 7) | 148,6 | 38,8 |
Satisfação | 94,0 | 27,6 |
1. Sentia-me à vontade com os enfermeiros. | 5,5 | 1,7 |
7. Estivessem ou não muito ocupados, os enfermeiros arranjavam tempo para mim. | 5,1 | 1,8 |
8. Eu via os enfermeiros como amigos. | 5,1 | 1,8 |
9. Os enfermeiros verificavam regularmente se eu estava bem. | 5,3 | 1,8 |
10. Os enfermeiros explicavam-me o que se passava comigo. | 5,0 | 1,9 |
11. Os enfermeiros explicavam o que me iam fazer antes de fazê-lo. | 5,3 | 1,8 |
12. Os enfermeiros informavam os outros colegas sobre a situação dos meus cuidados. | 5,1 | 1,8 |
14. Os enfermeiros certificavam-se de que os utentes tinham privacidade sempre que dela necessitavam. | 4,7 | 1,9 |
15. Médicos e enfermeiros trabalhavam bem como uma equipa. | 5,4 | 1,7 |
17. Os enfermeiros sabiam fazer o melhor para o utente. | 5,5 | 1,7 |
18. Havia uma atmosfera agradável no serviço, graças aos enfermeiros. | 5,4 | 1,5 |
19. Os enfermeiros explicavam as coisas de forma que eu compreendia. | 5,3 | 1,8 |
21. Se tivesse o mesmo ou outro problema que necessitasse de cuidados de enfermagem, voltaria de bom grado a este serviço. | 5,4 | 1,8 |
23. Os enfermeiros faziam-me coisas que me faziam sentir mais confortável. | 5,1 | 1,9 |
24. Os enfermeiros pareciam saber realmente o que diziam. | 5,3 | 1,7 |
25. Os enfermeiros compreendiam-me quando partilhava com eles os meus problemas. | 5,1 | 1,7 |
26. Sentia-me seguro quando os enfermeiros estavam a cuidar de mim. | 5,5 | 1,7 |
28. Os enfermeiros tranquilizavam os meus familiares ou amigos. | 5,2 | 1,8 |
Insatisfação | 54,3 | 13,9 |
2. Os enfermeiros favoreciam mais uns utentes do que outros. | 5,4 | 1,9 |
3. Os enfermeiros não me disseram o suficiente sobre o tratamento. | 4,9 | 1,9 |
4. Os enfermeiros demoravam a atender-me quando eu pedia. | 5,2 | 1,8 |
5.Os enfermeiros pareciam não compreender o que eu estava a passar. | 5,4 | 1,8 |
6. Os enfermeiros obrigavam-me a fazer coisas antes de eu estar preparado. | 6,0 | 1,4 |
13. Os enfermeiros costumavam ir embora e esqueciam-se do que o utente tinha pedido. | 5,5 | 1,7 |
16. Os enfermeiros pareciam não ter conhecimento sobre o que cada colega fazia. | 5,4 | 1,7 |
20. Os enfermeiros falavam comigo com superioridade. | 5,3 | 1,9 |
22. Os enfermeiros diziam-me coisas que não coincidiam com o que o médico me dizia. | 5,7 | 1,6 |
27. Os enfermeiros pareciam ter pouca vontade de me ajudar quando precisava. | 5,4 | 1,8 |
Opinião (19 itens respondido numa escala de 1 a 5) | 68,9 | 20,0 |
1. O Tempo que os enfermeiros gastaram consigo. | 3,7 | 1,2 |
2. Capacidade com que os enfermeiros desempenharam as suas atividades. | 3,8 | 1,2 |
3. Estava sempre um enfermeiro por perto quando dele precisou. | 3,6 | 1,2 |
4. O quanto os enfermeiros sabiam sobre os cuidados que me deviam prestar. | 3,8 | 1,1 |
5. A rapidez com que os enfermeiros vieram quando os chamou. | 3,6 | 1,2 |
6. A maneira como os enfermeiros o fizeram sentir como se estivessem em sua casa. | 3,5 | 1,1 |
7. A quantidade de informação que os enfermeiros lhe deram sobre o seu estado e tratamento/situação. | 3,4 | 1,2 |
8. A frequência com que os enfermeiros perguntavam se estava bem. | 3,5 | 1,2 |
9. A ajuda que recebeu dos enfermeiros. | 3,8 | 1,2 |
10. A maneira como os enfermeiros lhe explicavam as coisas. | 3,5 | 1,2 |
11. A maneira como os enfermeiros tranquilizaram os seus familiares ou amigos. | 3,7 | 1,2 |
12. A forma como os enfermeiros fizeram o seu trabalho. | 3,8 | 1,1 |
13. O tipo de informações que os enfermeiros lhe deram sobre o seu estado e tratamento/situação. | 3,7 | 1,2 |
14. Como os enfermeiros o trataram como pessoa. | 3,8 | 1,2 |
15. Como os enfermeiros ouviram as suas preocupações. | 3,6 | 1,2 |
16. A liberdade que lhe deram dentro do serviço. | 3,4 | 1,2 |
17. A boa vontade com que os enfermeiros responderam aos seus pedidos. | 3,7 | 1,2 |
18. A privacidade que os enfermeiros lhe deram. | 3,4 | 1,2 |
19. O quanto os enfermeiros estiveram atentos às suas necessidades. | 3,7 | 1,2 |
Nota. M = Média; DP = Desvio-padrão.
No âmbito da segunda questão à investigação, Tabela 4, apresentam-se as pontuações médias e medianas de satisfação total obtidas em função das demais variáveis sociodemográficas e profissionais, bem como o valor de significância obtido na aplicação do respetivo teste de hipótese.
O sexo masculino apresentou valores de pontuação média de satisfação total ligeiramente mais elevada (M = 220,8). Em relação à idade, verifica-se que o grupo de indivíduos com idade superior a 50 anos foi o que revelou uma pontuação média de satisfação total mais elevada (M = 227,1). No que diz respeito ao estado civil, verificou-se que os viúvos apresentaram a pontuação média mais baixa de satisfação total, e o grupo de inquiridos que vive em união de facto apresentou a pontuação média mais elevada (M = 248,2). Em cada uma destas variáveis não foi observada dissemelhança estatisticamente significativa ao nível das pontuações médias de satisfação total entre os grupos analisados (p > 0,05).
O estudo revelou que o grupo de inquiridos com menor escolaridade (até ao ensino básico) foi o que apresentou a pontuação média mais elevada da perceção de satisfação total (M = 239; DP = 60,8). Salienta-se que as diferenças encontradas entre os grupos analisados possuem significância estatística (p < 0,05).
Verificou-se que quem vive em ambiente rural tem uma opinião mais favorável aos cuidados de enfermagem do que os respondentes de meio urbano, contudo esta diferença não possui significância estatística (p > 0,05). No que respeita à categoria profissional (atividade em exercício) verificou-se que as dissemelhanças observadas entre as pontuações medianas para os distintos grupos não são estatisticamente significativas (p = 0,616).
M | DP | Mdn | Teste estatístico | p | |
---|---|---|---|---|---|
Sexo | t-student | 0,756 | |||
Masculino | 220,8 | 58,1 | 236,0 | ||
Feminino | 216,9 | 57,8 | 219,0 | ||
Idade | one-way ANOVA | 0,405 | |||
Até 35 anos | 216,2 | 54,4 | 224,0 | ||
36 a 50 anos | 206,7 | 44,9 | 197,0 | ||
Mais de 50 anos | 227,1 | 67,8 | 265,0 | ||
Estado civil | one-way ANOVA | 0,686 | |||
Solteiro | 220,0 | 43,9 | 219,0 | ||
Divorciado | 221,4 | 65,4 | 238,0 | ||
União de facto | 248,2 | 37,7 | 243,0 | ||
Casado | 211,6 | 67,0 | 227,0 | ||
Viúvo | 208,0 | 81,1 | 220,0 | ||
Habilitações Literárias | one-way ANOVA | <0,05 | |||
Até ao Ensino Básico | 239,0 | 60,8 | 265,0 | ||
Ensino Secundário | 203,4 | 56,1 | 207,0 | ||
Ensino Superior | 212,3 | 52,6 | 208,0 | ||
Local de residência | t-student | 0,226 | |||
Rural | 229,2 | 64,2 | 261,0 | ||
Urbano | 213,1 | 54,7 | 217,5 | ||
Profissão (atividade em exercício) | Kruskal-Wallis | 0,616 | |||
Especialistas das atividades intelectuais e científicas | 214,7 | 57,3 | 209,0 | ||
Trabalhadores não qualificados | 223,8 | 57,3 | 229,0 | ||
Trabalhadores qualificados da indústria, construção e artífices | 229,2 | 58,1 | 160,0 | ||
Técnicos e profissões de nível intermédio | 229,4 | 49,8 | 218,5 | ||
Agricultores e trabalhadores qualificados da agricultura, da pesca e da floresta | 244,3 | 68,2 | 240,0 | ||
Trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção e segurança e vendedores | 184,4 | 57,0 | 272,0 | ||
Pessoal administrativo | 259,6 | 34,5 | 227,0 |
Nota. M = Média; Mdn = Mediana; DP = Desvio-padrão; p = Significância estatística.
Discussão
No presente estudo, as características sociodemográficas da amostra assemelham-se às do estudo desenvolvido por Soeiro (2015), onde foi envolvida uma amostra de 92 utentes que recorreram a um serviço de urgência básica de um hospital da região do norte de Portugal.
No que concerne à primeira questão de investigação, a amostra evidenciou uma pontuação média para a satisfação total (M = 217; DP = 57,8) inferior ao verificado em Soeiro (2015; M = 257,79; DP = 26,96), sendo que esta autora, realizou o estudo num serviço de urgência de primeiro nível. Atendendo que a pontuação máxima possível de alcançar corresponde a 291, sobressai um intervalo passível de melhoria. Tendo por base os níveis de satisfação, 35,3% dos respondentes posicionam o seu nível de satisfação na categoria pouco satisfatória (baixa), resultados muito semelhantes foram encontrados no estudo de Soeiro (2015), com 34,8% na mesma categoria. Tais percentagens significativas devem despertar os profissionais de enfermagem, pois como nos referem Loureiro et al. (2021, p. 2), a satisfação constitui “um importante indicador da qualidade dos cuidados prestados”. A Direção Geral de Saúde (DGS) salienta as preocupações relativas à qualidade no Sistema Nacional de Saúde (SNS), estabelecendo através do Departamento da Qualidade na Saúde, a implementação de sistemas de monitorização periódica do grau de satisfação dos utilizadores do sistema de saúde. A Portaria n.º 159/2012, de 22 de maio de 2022, define as competências específicas do Departamento da Qualidade na Saúde, estabelecendo a necessidade de “Gerir os sistemas de monitorização e perceção da qualidade dos serviços pelos utentes . . . e promover a avaliação sistemática da satisfação” (DGS, 2015, p. 6), pelo que se considera fundamental envolver o cidadão nas decisões da sua própria saúde e do funcionamento do sistema de saúde. Ribeiro et al. (2017) efetuaram um estudo, no qual procuraram analisar a perceção dos enfermeiros quanto à concretização dos padrões de qualidade dos cuidados de enfermagem. Nesse estudo, envolvendo 36 instituições hospitalares portuguesas, constataram três elementos pertinentes relativos à qualidade: a maioria dos enfermeiros concretiza às vezes ou sempre, as atividades promotoras da qualidade dos cuidados; a dificuldade de integrar as pessoas significativas no processo de cuidados; e que 11,1% dos enfermeiros responderam que só poucas vezes envolviam os conviventes significativos do cliente nas suas ações cuidativas (Ribeiro et al., 2017).
Na nossa amostra, pela análise dos itens das duas dimensões da ESCCE, na subdimensão Satisfação, os itens (item 1 - ‘‘sentia-me à vontade com os enfermeiros’’; item 26 - ‘‘sentia-me seguro quando os enfermeiros estavam a cuidar de mim’’) que apresentaram as pontuações médias mais elevada corroboram os valores encontrados por Soeiro (2015), sendo que neste os valores médios foram mais elevados em todos os itens. Em sentido contrário (menores valores médios, menor satisfação), apenas para o item 14, referente a privacidade, foi encontrado um posicionamento semelhante entre ambos os estudos. Para a dimensão opinião, o item 18 - ‘‘A privacidade que os enfermeiros lhe deram’’,e corroborando Soeiro (2015), surge com menor pontuação na questão relativa à privacidade.
Quanto à segunda questão de investigação: identificar a relação entre a satisfação e as variáveis independentes (sexo, idade por classes, estado civil, habilitações literárias, local de residência e profissão), encontrou-se uma relação estatisticamente significativa entre as habilitações literárias e a satisfação total. O grupo amostral menos escolarizado apresentou o valor médio de satisfação total mais elevado, corroborando Valente (2018), que destaca uma associação inversa entre o nível de escolaridade e a satisfação. Integrando um estudo descritivo efetuado por Buchanan et al. (2015), numa amostra de 111 utentes num serviço de urgência, para determinar os níveis de satisfação com os cuidados de enfermagem, referem que esta associação pode explicar-se pelo facto do elevado nível de escolaridade estar associado ao maior acesso à informação, a uma acrescida capacidade de considerar de forma adequada a qualidade dos cuidados. Em todas as restantes variáveis não se encontraram relações estatisticamente significativas, sendo que no estudo de Soeiro (2015) foi verificada uma relação em função da idade: o grupo dos 65 ou mais anos apresentaram pontuações mais elevadas de satisfação para com os cuidados de enfermagem. Os resultados obtidos por amostragem não probabilística, decorrem de um tempo e espaço definido, pelo que não podem assumir-se como representativos de outros serviços, com outros níveis de referenciação e com outras necessidades, constituindo uma limitação do presente estudo.
Conclusão
O presente estudo partiu do objetivo de conhecer a satisfação dos utentes relativamente aos cuidados de enfermagem recebidos, e a relação entre essa satisfação e as variáveis independentes (sociodemográficas e profissionais). A análise dos resultados permitiu constatar que a “satisfação total” apresentava uma pontuação média de 217 ± 57,8, aquém do valor máximo alcançável (291). A análise da perceção de satisfação com os cuidados de enfermagem, permitiu verificar que o nível de satisfação em grande parte da amostra (35,3%) se enquadra na perceção de baixa satisfação. Estes resultados reclamam uma reflexão profunda acerca das intervenções de enfermagem e a forma como são percecionadas. Uma das áreas a descoberto, decorrente da análise dos itens da ESCCE, foi a privacidade do utente, pelo que as estratégias devem englobar este ponto. Na relação com as demais variáveis, encontrou-se uma relação estatisticamente significativa com a variável habilitações literárias. Níveis de literacia mais elevados, irão potencializar a exigência, interferindo na satisfação percecionada pelos utentes, facto que já vem sendo constatado pela literatura científica. É unânime a relação entre monitorização da satisfação dos utentes, e a avaliação das instituições prestadoras de cuidados de saúde, mas acima de tudo pelo facto de se poder contribuir para o planeamento e estabelecimento de estratégias, que permitam a melhoria contínua da qualidade dos cuidados a prestar. A atuação dos profissionais de saúde, onde se incluem os enfermeiros, deve ir ao encontro das necessidades e expetativas dos utentes, proporcionando-se uma relação empática de excelência. Os enfermeiros devem estar consciencializados, de que para além do conhecimento técnico e científico, importa, como vem sendo comprovado, o seu comportamento, a atitude e a recetividade, enquanto determinantes para a prestação de cuidados de qualidade, repercutindo-se concomitantemente na perceção da satisfação por parte de quem os recebe. A competência técnica e relacional, o relacionamento interpessoal e a competência comunicacional, elevam a perceção de satisfação dos utentes com os cuidados recebidos, pelo que a formação/atualização nestes campos, constituirão certamente estratégias a implementar a nível individual e institucional.
Como propostas, assume-se o necessário investimento na realização de estudos neste âmbito, em componente financiada e multicêntrica, com amostras representativas, e áreas geográficas mais alargadas, com maior número de variáveis em estudo, como as variáveis clínicas e de comorbilidades.