Introdução
No final de 2019 o mundo conheceu um vírus altamente contagioso, que conseguiu espalhar o medo um pouco por todo o lado, colocando-nos a todos num estado constante de alerta e de apreensão. Desde janeiro de 2020 que a pandemia tem vindo a conquistar um lugar de destaque nas notícias mundiais, tendo a World Health Organization (WHO) declarado, a 11 de março de 2020, estado de emergência em saúde pública e de grande relevância internacional (Gerolin et al., 2020).
Desconhece-se um tratamento específico para as infeções por coronavírus, recorrendo-se a fármacos para tratar os sintomas, como antipiréticos e analgésicos. Em quadros mais graves da doença, associados a quadros de insuficiência respiratória grave e pneumonia, exige internamento, muitas vezes em unidades de cuidados intensivos, com necessidade de intubação orotraqueal e ventilação mecânica (Direção-Geral da Saúde [DGS], 2020). À data, por desconhecimento deste novo coronavírus, das suas formas de transmissão e de tratamento definido e eficaz para a COVID19, o uso dos equipamentos de proteção individual (EPIs) foi a medida mais eficaz de prevenir e controlar a transmissão (Hu et al., 2020). Os serviços e as instituições tiveram de se organizar e reinventar para dar resposta a este grave problema, com criação de serviços dedicados a pessoas com COVID19, com equipas próprias e com horários prolongados, dada a elevada afluência (Luz et al., 2020). Os profissionais das instituições de saúde estão, na linha da frente, no combate a este problema, arriscando as suas vidas e vivendo situações muito adversas com desgaste físico e psicológico (Chen & Chi, 2020). Encontram-se em alto risco de contrair a doença, por estarem mais expostos, inicialmente, pela limitada disponibilidade de EPI, pelo seu uso inadequado e ainda pela débil formação especifica na área (Darlenski & Tsankov, 2020). A utilização prolongada de EPIs leva a relatos de complicações, físicas e psicológicas (Luz et al., 2020). Vários estudos identificam elevada prevalência de efeitos adversos, variando entre 42,8% e 95,1%. A elevada frequência do uso de luvas e da higienização das mãos, tem contribuído para um aumento de dermatites e dermatoses, levando a prurido, eritema, desidratação, fissuras, infeções, alergias, entre outros distúrbios da pele e agravo de patologias cutâneas pré-existentes (Darlenski & Tsankov, 2020). O uso dos respiradores, como N95 ou filtering face piece do tipo 2 (FFP2), e dos óculos também elevam o risco de ferimento por pressão e fricção na face. Existem, também, relatos de médicos e enfermeiros que se sentem exaustos e que perderam peso devido à desidratação, depois de longos turnos passados a usar os EPIs e pela dificuldade em comer, beber ou fazer pausas para irem à casa de banho, de modo a evitarem terem de retirar os EPIs (Duan et al., 2021). Assim, este estudo tem como objetivo identificar as complicações decorrentes da utilização de EPIs.
Enquadramento
A DGS (2020, p. 6) considera EPI “qualquer equipamento usado como barreira protetora, com o objetivo de proteger as mucosas, pele e roupa do contacto com agentes infeciosos”. As recomendações, para o tipo de EPI, para os profissionais de saúde, dependem do contexto de atendimento para COVID-19, indo desde máscaras, luvas, óculos ou protetor facial transparente de plástico ou equivalente, roupa/avental resistente à água, fato de corpo inteiro, touca, botas especiais ou sapatos fechados (DGS, 2020; Duan et al., 2021). Estas recomendações divulgaram a adequada utilização dos EPIs pelos profissionais de saúde, com o intuito de garantir a sua proteção e total segurança, bem como a sustentabilidade do acesso aos equipamentos. A DGS (2020) recomenda que todos os profissionais - em ambiente hospitalar ou de cuidados de saúde primários - usem máscara cirúrgica, substituindo-a de 4 a 6 horas ou sempre que estiver húmida, durante todo o período de permanência nas instituições de saúde. Os profissionais que estiverem na prestação de cuidados diretos a casos suspeitos ou confirmados de COVID-19 recomenda a utilização de EPIs recomendados para o isolamento de contacto e de gotícula, nomeadamente: a) bata, com abertura atrás, descartável, impermeável/resistente a fluidos, de manga comprida e que vá até abaixo do joelho; b) máscara; c) proteção ocular (óculos ou viseira de abertura); d) luvas descartáveis e não esterilizadas; e) cobre-botas, se os profissionais não estiverem a usar calçado dedicável e não higienizável; f) touca; g) acrescem, ainda, as medidas adicionais de isolamento de via aérea (DGS, 2020). Almeida (2020) considera que o papel dos EPIs na proteção da saúde dos profissionais na atual pandemia é ímpar, pelo que havendo um risco de contaminação biológica, eles atuam como barreiras que podem evitar a infeção. De acordo com a World Health Organization (WHO, 2020), todos os trabalhadores e prestadores de cuidados de saúde devem receber formação em práticas de prevenção e controle de infeções, incluindo avaliação de riscos, precauções estandardizadas e baseadas na transmissão, na colocação e retirada dos EPIs, de modo a assegurar que estes últimos são usados de forma efetiva e não constituem uma fonte de contaminação para quem os usa. Duan e Zhu (2020) assinalam que os profissionais de saúde experienciam muitas vezes dificuldades na prestação de cuidados aos pacientes devido ao uso de EPIs incómodos e multicamadas, impactando no seu desempenho, o que acresce, por exemplo, o facto de cada fabricante e marca requerem que estes profissionais sigam procedimentos diferentes no seu uso. Sabemos que, apenas o uso de um EPIs pode causar declínio no desempenho, vários EPIs utilizados em simultâneo podem prejudicar significativamente a capacidade de um profissional de saúde para prestar cuidados aos pacientes (Duan & Zhu, 2020). Desta forma, não será de descurar a análise dos efeitos causados pela necessidade do uso prolongado dos EPIs no atendimento de doentes por COVID-19, considerando inicialmente a escassez destes equipamentos, assim como posteriormente a sobrecarga de trabalho que os profissionais de saúde foram expostos (Galanis et al., 2021). O uso prolongado de máscaras e respiradores, especialmente a N95/FFP2 e óculos de proteção, parecem aumentar o risco de lesão por pressão e/ou fricção na face (Darlenski & Tsankov, 2020). De acordo com a WHO (2020) o uso contínuo de máscara cirúrgica pode levar ao desenvolvimento de lesões cutâneas na cara, dermatite irritante ou agravamento da acne, quando as máscaras são usadas frequentemente durante longas horas. Elston (2020) demonstrou igualmente que os profissionais de saúde desenvolvem lesão por pressão associada a dispositivo médico, designadamente com o uso prolongado da N95, relatando uma prevalência de 97% de alterações na pele. Foi encontrada, igualmente, lesão por pressão com o uso de óculos de proteção. Tal como assinalam Luz et al. (2020) os locais mais acometidos por essas lesões são a região nasal, malar, zigomática, temporal e frontal. Também Lan et al. (2020), no seu estudo, concluíram que 97% dos profissionais de saúde apresentaram alterações na pele devido ao uso dos EPIs (N = 542). Os principais locais de lesões foram sob o osso nasal (83%) associadas ao uso dos óculos; bochechas (74,5%), devido ao uso da máscara N95 e testa (57,2%) devido ao uso da viseira (face shield). As lesões nas mãos (74,5%) ocorreram naqueles profissionais que higienizavam as mãos mais do que 10 vezes por dia e utilizavam as luvas por tempo prolongado. Estudos realizados por Hu et al. (2020) concluíram que as lesões de pele são muito comuns em enfermeiras, e encontraram uma correlação positiva entre as lesões e as noções de autoeficácia, resiliência e apoio social. Além disso, verificou-se que um grande número de enfermeiros não tratou as lesões de pele devido à falta de conhecimento ou à falta de medicamentos disponíveis, devendo, por isso, garantir-se formação adequada sobre a prevenção de lesões cutâneas e medicamentos adequados para o seu tratamento. Também o estudo de Jiang et al. (2020) conclui que cerca de 43% dos profissionais de saúde apresentava lesões de pele devido ao uso prolongado dos EPIs, destacando-se três tipos de lesões: i) por pressão relacionada com dispositivos médicos; ii) danos na pele associados à humidade; e iii) ao lacrimejamento. Moura et al. (2020) ressaltaram a importância de proteger o profissional de saúde neste âmbito, uma vez que as lesões ou as alterações na pele são portas de entrada para outras infeções virais, fúngicas ou bacterianas adquiridas no ambiente hospitalar, alterando a flora bacteriana normal da pele e, consequentemente, a sua função protetora natural (Galanis et al., 2021). Ong et al. (2020) entrevistou 158 profissionais de saúde com idades entre os 21-35 anos, e constatou que 29,1% tinha histórico de cefaleia prévia e 81% desenvolveu cefaleia associada ao uso dos EPIs, sendo os intensivistas os mais acometidos. No surto de COVID-19, 91,3% dos entrevistados com diagnóstico prévio de cefaleia concordaram que o uso dos EPIs afetou as dores de cabeça. Outro dos efeitos adversos do uso de EPIs é a dispneia. O desconforto respiratório devido ao uso de máscaras, já reportado pela literatura, vem confirmar a dispneia ser um evento adverso comum associado à utilização deste EPI. Não obstante, outros fatores-como maiores níveis de ansiedade e stress durante a pandemia-poderão também ter contribuído para aumentar a dificuldade respiratória (Galanis et al., 2021). Também, Ruskin et al. (2021) dão o exemplo das máscaras N95, na medida em que a pressão dentro da máscara é mais baixa que a pressão do ambiente durante a inspiração, o que aumenta o esforço da respiração.
Existem relatos de médicos e enfermeiros que se sentem exaustos e que perderam peso devido à desidratação, depois de longos turnos com EPIs (Duan et al., 2021). As equipas de cuidados intensivos reportaram dificuldades em comer, beber ou até mesmo fazer pausas para irem à casa de banho, para evitar retirar os EPIs (Alves et al., 2020; Duan et al., 2021). Outro dos impactos negativos do uso dos EPIs reflete-se no desempenho dos profissionais de saúde, tal como sugere o estudo desenvolvido por Duan et al. (2021), no qual foram reportadas as seguintes consequências: i) redução da destreza devido à espessura do vestuário e/ou luvas de proteção (28%); ii) deficiência visual devido ao uso de óculos de proteção (27%); iii) obstáculos de comunicação (19%); iii) tempo despendido para vestir o material de proteção (12%); iv) aumento do risco de contaminação com a remoção de vestuário de proteção (12%); e v) risco de ferimentos devido a ferramentas afiadas (2%). De salientar que este estudo também se debruçou sobre o desconforto e lesões provocadas pelos EPIs, sendo que 97% referiram sentir desconforto, incluindo problemas de respiração (20%), fadiga (16%), lesões por pressão relacionadas com dispositivos (13%), ansiedade (12%), acne facial (10%), insónia (8%), depressão (6%), dermatite alérgica (4%) e maceração das mãos ou erosão dos pés (4%), erupção cutânea do tronco ou membros (3%), conjuntivite ou ceratite (2%), e maceração perineal ou tínea corporal (2%). Para além das dificuldades individuais, acrescem os desafios nas colaborações em equipa, na medida em que é necessário mais tempo para se organizarem e reconhecerem, atendendo a que estão todos vestidos da mesma forma (Duan et al., 2021). Para além disso, respiradores como os KN95, por exemplo, podem abafar a fala, tornado a comunicação difícil ou quase impossível, nomeadamente em situações críticas, como a comunicação de doses de medicamentos (Duan et al., 2021; Ruskin et al., 2021).
Questão de investigação
Quais as complicações da utilização de EPIs em trabalhadores de uma unidade local de saúde do Norte de Portugal em contexto de pandemia COVID-19?
Metodologia
Desenvolveu-se um estudo transversal descritivo, em profissionais dos serviços de Medicina Intensiva, serviço de Urgência e serviço de Medicina Interna B Poente, de uma unidade local de saúde do Norte de Portugal, que estiveram no atendimento a doentes por COVID-19. Foram definidos como critérios de inclusão: critérios de inclusão: i) profissionais que prestaram cuidados a doentes com COVID-19; ii) profissionais que utilizaram EPIs. Foram excluídos os questionários que, quando foram devolvidos, não estavam totalmente preenchidos. Obtivemos, assim, uma amostra total de 118 participantes. Como instrumento de recolha de dados, foi elaborado, um questionário, para dar resposta ao objetivo. Este encontra-se dividido em duas partes: i) caraterização sociodemográfica da população (sexo, idade, habilitações académicas, estado civil, classe profissional, tempo de serviço e serviço onde trabalha); e ii) itens relativos às dificuldades e às complicações de uso dos EPIs. Os autores, neste estudo, consideraram dificuldades os obstáculos que os profissionais tiveram na utilização dos EPIs, como complicações as consequências, os danos, e as alterações que resultaram da utilização dos EPIs. O instrumento foi inserido no Google Docs, e foi gerado um handle de convite que o gestor do serviço distribuiu, via email, aos elementos da sua equipe. Estes, após acederem, encontravam uma nota introdutória, seguida do consentimento informado e, após consentirem participar no estudo, o questionário sem qualquer identificação. A recolha de dados decorreu entre 12 de janeiro e 08 de fevereiro de 2022. O estudo obteve o consentimento favorável da Comissão de Ética (N.º 25/2021). Os dados foram inseridos na base de dados do IBM SPSS® Statistics, recorremos à estatística descritiva, com calculo de frequências absolutas e relativas para todas as variáveis e média e desvio padrão para as variáveis quantitativas continuas.
Resultados
Dos 118 participantes, 28 eram médicos, 60 enfermeiros e 30 assistentes operacionais distribuídos pelos 3 serviços.
Predominou o sexo feminino (72%), a média de idade foi de 40 anos (DP = 38,5 anos), 44,1% possui bacharelato/licenciatura, 61,9% é casado(a)/união de facto, 50,8% são enfermeiros, a média de tempo de serviço foi 12,6 anos (DP = 12 anos), e 52,5% trabalha no serviço de Urgência.
Variáveis | n | % | M | DP | |
---|---|---|---|---|---|
Sexo | Feminino | 85 | 72,0 | ||
Masculino | 33 | 28,0 | |||
Idade (anos) | 40 | 38,5 | |||
Habilitações académicas | Até 12.º ano | 25 | 21,2 | ||
Bacharelato ou Licenciatura | 52 | 44,1 | |||
Mestrado | 38 | 32,2 | |||
Doutoramento | 3 | 2,5 | |||
Estado civil | Solteiro | 37 | 31,4 | ||
Casado(a)/União de facto | 73 | 61,9 | |||
Divorciado(a)/separado(a) | 6 | 5,1 | |||
Viúvo(a) | 2 | 1,7 | |||
Classe profissional | Enfermeiro | 60 | 50,8 | ||
Médico | 28 | 23,7 | |||
Assistente operacional | 30 | 25,4 | |||
Tempo de serviço (anos) | 12,6 | 12,0 | |||
Serviço | Urgência | 62 | 52,5 | ||
Medicina Intensiva | 36 | 30,5 | |||
Medicina Interna B Poente | 20 | 16,9 |
Nota. n = Frequência absoluta; % = Frequência relativa, M = Média; DP = Desvio-padrão.
Os EPIs utilizados por mais tempo são a bata (42,4%), as luvas (51,7%), a máscara cirúrgica (51,7%), o respirador KN95 (40,7%), FFP2 (60,2%) e a touca (39,8%) (Tabela 2).
Equipamentos | Tempo de utilização de EPI (%) | |||
---|---|---|---|---|
< 2 h | ≥ 2 h e < 3 h | ≥ 3 h e < 4 h | ≥ 4 h | |
Avental | 51,7 | 15,3 | 11,8 | 21,2 |
Bata | 25,4 | 10,2 | 22,0 | 42,4 |
Fato integral | 52,5 | 7,6 | 9,4 | 30,5 |
Cobre botas/pés | 52,5 | 7,6 | 16,2 | 23,7 |
Luvas | 25,4 | 10,2 | 12,7 | 51,7 |
Manguitos | 74,6 | 8,5 | 6,7 | 10,2 |
Máscara cirúrgica | 33,1 | 6,8 | 8,4 | 51,7 |
Respiradores KN95 | 35,6 | 10,2 | 13,5 | 40,7 |
Respiradores FFP2 | 11,0 | 8,5 | 20,3 | 60,2 |
Máscara FFP3 | 73,7 | 9,4 | 5,9 | 11,0 |
Óculos | 44,1 | 16,1 | 13,5 | 26,3 |
Touca | 34,7 | 11,0 | 14,5 | 39,8 |
Viseira | 58,5 | 10,2 | 13,5 | 17,8 |
Nota. h = Horas; Nota. EPI = Equipamento de proteção individual.
Os EPIs com maiores complicações, quando usados, foram o respirador FFP2 (96,6%) e o fato integral (89,3%). As maiores dificuldades verificaram-se para a colocação do fato integral (71,2%), óculos e viseira (62,7%) e respirador FFP2 (52,5%; Tabela 3).
EPI | Complicações (%) | Dificuldades (%) | ||
---|---|---|---|---|
Com complicação | Sem complicação | Com dificuldade | Sem dificuldade | |
Avental | 24,6 | 75,4 | 24,6 | 75,4 |
Bata | 79,6 | 20,4 | 39,8 | 60,2 |
Fato integral | 89,3 | 10,7 | 71,2 | 28,8 |
Cobre botas/cobre pés | 47,5 | 52,5 | 49,2 | 50,8 |
Luvas | 75,4 | 24,6 | 36,4 | 63,6 |
Manguitos | 22,8 | 77,2 | 41,5 | 58,5 |
Máscara cirúrgica | 80,5 | 19,5 | 28,8 | 71,2 |
Respirador KN95 | 6,7 | 93,3 | 45,8 | 54,2 |
Respirado FFP2 | 96,6 | 3,4 | 52,5 | 47,5 |
Máscara FFP3 | 7,6 | 92,4 | 31,4 | 68,6 |
Óculos de proteção | 83,9 | 16,1 | 62,7 | 37,3 |
Touca | 42,3 | 57,7 | 38,1 | 61,9 |
Viseira | 80,5 | 19,5 | 62,7 | 37,3 |
Nota. EPI = Equipamento de proteção individual.
As complicações mais frequentes foram a hiperidrose por uso de avental (93,1%), bata (92,9%) e fato integral (95,3%). As quedas pelo uso de cobre botas (94,6%), a xerodermia (65,2%) e irritação da pele (64,0%) para uso de luvas, o prurido (48,1%) para os manguitos e para a touca. Para o uso de óculos, viseiras, máscaras e respiradores a complicação mais identificada foi dificuldade na visão, na expressão e as úlceras na testa e nasal (Tabela 4).
Discussão
No que concerne à caracterização da amostra, observou-se um predomínio de indivíduos do sexo feminino, com o bacharelato/licenciatura, enfermeiros e a trabalhar no serviço de Urgência, idade média de 40 anos e de tempo de serviço de 12.6 anos. Estes dados são corroborados por vários estudos onde se evidencia maior predomínio do sexo feminino, nas profissões da saúde, com exigência de licenciatura como formação inicial (Duan et al., 2021; Moura et al., 2020). Também é sabido que os enfermeiros representam metade dos trabalhadores das instituições de saúde (Galanis et al., 2021). Quanto à idade, os nossos dados não corroboram outros estudos, que apontam idades mais jovens nos contextos de urgência e cuidados intensivos, devido ao elevado nível de stress e exigência técnica e científica (Alves et al., 2020; Duan et al., 2021; Jiang et al., 2020). Os EPIs com maiores complicações quando usados, foram o respirador FFP2, o fato integral, os óculos, a máscara cirúrgica e a viseira. A maior dificuldade foi para o uso do fato integral , dos óculos e viseira, e da máscara. Os EPIs são uma proteção essencial da saúde dos profissionais de saúde, que exigem uma manipulação rigorosa para impedir a propagação de partículas, na colocação e remoção, com recurso a formação e treino. O respirador FFP2, o fato integral, os óculos foram identificados, também, em outros estudos como os EPIs com mais dificuldade na sua utilização (Almeida, 2020). A WHO (2020), refere que todos os trabalhadores e prestadores de cuidados de saúde devem receber formação em práticas na colocação e retirada dos EPI, de modo a assegurar que estes são usados de forma efetiva e não constituem uma fonte de contaminação para quem os usa. Duan e Zhu (2020) referem que os profissionais de saúde experienciam, muitas vezes, dificuldades na prestação de cuidados aos pacientes devido ao uso de EPIs incómodos e em multicamadas, impactando no seu desempenho. Os resultados mostraram, ainda, que a bata, as luvas descartáveis, a máscara cirúrgica, o respirador KN95, FFP2 e a touca, são os EPIs mais utilizados e por mais tempo, seguindo as recomendações da DGS (2020), sobre a obrigatoriedade de todos os profissionais de saúde colocarem máscara cirúrgica à entrada da instituição de saúde, e permanecer com máscara durante todo o período de permanência na instituição de saúde, substituindo-a a cada 4-6 horas ou sempre que a mesma se encontre húmida. A complicação mais referida foi a hiperidrose por uso de avental, bata e fato integral, as quedas para o uso de cobre botas, a xerodermia e irritação da pele para uso de luvas, o prurido na pele para os manguitos e para a touca. Para os óculos, viseiras e máscaras a complicação mais identificada foi dificuldade na visão, na expressão e as úlceras na testa e nasal. Estes dados encontram-se alinhados com os estudos que referem os impactos negativos dos EPIs no desempenho dos profissionais, exacerbando-se quando há recurso a vários EPIs, provocando limitações na locomoção, hiperidrose, quedas, entre outros (Duan & Zhu, 2020; Duan et al., 2021). Diversos estudos evidenciam que a xerodermia e o prurido são complicações associadas à necessidade de higienização excessiva, ao uso de luvas descartáveis e manguitos, o que parece associar-se ao aumentado do risco de dermatites e dermatoses, agravamento de doenças de pele e outras alterações (Casey et al., 2018; Choi et al., 2020; Darlenski & Tsankov, 2020; Galanis et al., 2021; Hu et al., 2020; Lan et al., 2020; Luz et al., 2020; Moura et al., 2020). Os nossos dados são corroborados por outros estudos que referem as complicações da utilização de EPIs no desempenho dos profissionais, exacerbando-se quando se recorre a vários EPIs, provocando limitações na locomoção, hiperidrose, quedas, entre outros (Duan & Zhu, 2020; Duan et al., 2021). Vários estudos apontam dificuldade na visão, na expressão e as úlceras na testa e nasal associadas ao uso de mascaras, óculos e viseiras, facto agravado pelo tempo de utilização prolongado dos EPIs (Alves et al., 2020; Casey et al., 2018; Choi et al., 2020; Darlenski & Tsankov, 2020; Duan et al., 2021; Duan & Zhu, 2020; Elston, 2020; Galanis et al., 2021; Hu et al., 2020; Jiang et al., 2020; Lan et al.,2020; Luz et al., 2020; Moura et al., 2020; Ong et al., 2020; Ruskin et al., 2021; WHO, 2020). O uso dos respiradores, especialmente a N95/FFP2 e óculos de proteção, parecem aumentar o risco de lesão por pressão e/ou fricção na face (Darlenski & Tsankov, 2020). Elston (2020) demonstrou igualmente que os profissionais de saúde desenvolvem lesão por pressão associada a dispositivo médico, designadamente com o uso da N95, relatando uma prevalência de 97% de alterações na pele dos profissionais. Foi encontrada, igualmente, lesão por pressão com o uso de óculos de proteção. Segundo Luz et al. (2020), os locais mais acometidos por essas lesões são a região nasal, malar, zigomática, temporal e frontal. Paralelamente existem também relatos de médicos e enfermeiros que se sentem exaustos e que perderam peso devido à desidratação, depois de longos turnos a usar EPIs (Duan et al., 2021). Dado que este é o primeiro estudo realizado em Portugal sobre esta temática, é difícil a comparar os nossos resultados. O tamanho reduzido da amostra e a própria recolha de dados, por via online, são algumas das limitações dos nossos resultados. Por ser o primeiro estudo realizado neste contexto, os resultados permitem evidenciar as dificuldades e as complicações a que os profissionais de saúde estão sujeitos quando utilizam EPIs por longos períodos, como ocorreu em período da pandemia COVID19. Devem ser desenvolvidos EPI com materiais que minimizem as complicações descritas neste estudo.
Conclusão
Os EPIs que registaram maiores complicações foram o fato integral, o respirador FFP2 e os óculos e a viseira. As complicações mais frequentes foram a hiperidrose, as quedas, xerodermia e dificuldade na expressão oral. Os EPIs utilizados por mais tempo foram a bata, as luvas descartáveis, a máscara cirúrgica, o respirador KN95, FFP2 e a touca. Nos que foi identificada mais dificuldade na sua utilização foram o fato integral, a viseira, os óculos de proteção e os respiradores FFP2 e KN95.
Sugerimos a utilização de medidas preventivas para minimizar as complicações como reforço na hidratação e a redução do número de horas de utilização, sempre que possível. A formação e treino dos profissionais, na colocação e remoção dos EPI, em particular do fato integral. A realização de outros estudos com amostras maiores, prospetivos e com outras variáveis que permitam generalizações.