SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.serVI número3Dependência do uso de smartphones em alunos de enfermagemSuporte imediato de vida na pessoa em situação crítica: Contributos da intervenção do enfermeiro índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista de Enfermagem Referência

versão impressa ISSN 0874-0283versão On-line ISSN 2182-2883

Rev. Enf. Ref. vol.serVI no.3 Coimbra dez. 2024  Epub 17-Jul-2024

https://doi.org/10.12707/rvi23.83.31983 

ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO (ORIGINAL)

Interrupções e distrações durante a preparação e administração de medicamentos de alto risco: Estudo transversal

Interruptions and distractions during the preparation and administration of high-risk medications: A cross-sectional study

Distracciones e interrupciones durante la preparación y administración de medicamentos de alto riesgo: Estudio transversal

Olga Lucia Gaitan-Gómez1 
http://orcid.org/0000-0002-9252-1457

Luz Stella Bueno-Robles2 
http://orcid.org/0000-0002-9842-536X

Fabio Alberto Camargo-Figuera3 
http://orcid.org/0000-0001-6070-9327

Silvia Regina-Secoli4 
http://orcid.org/0000-0003-4135-6241

1 Universidad Antonio Nariño, Faculdade de Enfermagem, Popayán, Cauca, Colombia

2 Universidad Nacional da Colombia, Faculdade de Enfermagem, Bogota, Cundinamarca.

3 Universidad Industrial de Santander, Facultade de Saúde, Escola de Enfermagem, Santander, Bucaramanga

4 Universidade de São Paulo, Escola de Enfermagem, São Paulo, Brasil


Resumo

Enquadramento:

Estudos indicam que as interrupções contribuem para erros clínicos e falhas em procedimentos.

Objetivo:

Analisar as interrupções vivenciadas pelos enfermeiros durante a preparação e administração de medicamentos de alto risco.

Metodologia:

Foi realizado um estudo transversal numa unidade de cuidados intensivos e numa unidade de internamento. As interrupções vivenciadas pelos enfermeiros durante o processo de medicação foram observadas com a ajuda de duas checklists. A amostra foi selecionada por conveniência em abril e maio de 2019. Os dados quantitativos foram analisados através de estatística descritiva no programa IBM SPSS Statistics, versão 24.0, enquanto os dados qualitativos foram tratados por meio da análise de conteúdo.

Resultados:

Observaram-se 137 interrupções em 193 processos de medicação. A maioria das interrupções foi iniciada por outros membros da equipa de cuidados de saúde por meio de conversas. Estas interrupções foram maioritariamente prejudiciais e ocorreram durante a fase de preparação. A estratégia multitarefa foi utilizada para as gerir.

Conclusão:

As interrupções ocorridas durante o processo de medicação eram maioritariamente associadas com comunicações profissionais e sociais. A sua relevância diferiu consoante a fase do processo.

Palavras-chave: hospitalização; unidades de terapia intensiva; erros de medicação; enfermagem; segurança do paciente

Abstract

Background:

Interruptions have been reported to contribute to clinical errors and procedural failures.

Objective:

To analyze the interruptions experienced by nurses during the preparation and administration of high-risk medications.

Methodology:

A cross-sectional study was conducted in an intensive care and inpatient unit. The interruptions experienced by nurses during the medication process were observed through two checklists. The sample was selected by convenience in April-May 2019. Descriptive statistics was used to analyze quantitative data in IBM SPSS Statistics software, version 24.0, while content analysis was used to analyze qualitative data.

Results:

In 193 medication processes, there were 137 interruptions. Other members of the healthcare team initiated most interruptions through conversations. These interruptions were mostly negative and occurred during the preparation phase. The multitasking strategy was used to manage them.

Conclusion:

Interruptions during the medication process were primarily associated with professional and social communications. The impact of these interruptions varied depending on the phase of the process.

Keywords: hospitalization; intensive care units; medication errors; nursing; patient safety

Resumen

Marco contextual:

Se ha reportado la participación de distracciones en errores clínicos y fallos de procedimiento.

Objetivo:

Analizar las distracciones del personal de enfermería durante la preparación y administración de fármacos de alto riesgo.

Metodología:

Estudio transversal desarrollado en una unidad de cuidados intensivos y una unidad de hospitalización. Se observaron distracciones del personal de enfermería durante el proceso de medicación a través de dos listas de control. La muestra fue seleccionada por conveniencia (abril-mayo 2019). Los datos cuantitativos se analizaron mediante estadística descriptiva (IBM SPSS Statistics, versión 24.0). Los datos cualitativos se analizaron mediante análisis de contenido.

Resultados:

Hubo 137 distracciones en 193 procesos de medicación. La mayoría de las distracciones fueron iniciadas por otros miembros del equipo sanitario a través de conversaciones. La mayoría se produjeron en la fase de preparación y fueron negativas y se gestionaron mediante la estrategia multitarea.

Conclusión:

Las distracciones durante el proceso de medicación se referían principalmente a las comunicaciones profesionales y sociales. La importancia de esas distracciones variaba en función de la fase del proceso.

Palabras clave: hospitalización; unidades de cuidados intensivos; errores de medicación; enfermería; seguridad del paciente

Introdução

As interrupções são um resultado prejudicial do ambiente de trabalho e da falta de coesão da equipa e, como tal, podem afetar gravemente a execução passo-a-passo de um procedimento, especialmente quando se manipulam medicamentos de alto risco (MAR) como o tramadol, a norepinefrina e os eletrólitos (ISMP-España, 2012; Westbrook et al., 2010). Os MAR têm processos de preparação e administração complexos, janelas terapêuticas estreitas e exigem uma dupla verificação da prescrição médica. A preparação de MAR é demorada e envolve apresentação do medicamento, diluição, cálculos de dosagem complicados e administração através de bomba de infusão. Além disso, requerem parâmetros fisiológicos (peso, idade, sinais vitais) e laboratoriais (níveis séricos, função renal) para a sua indicação e monitorização (Cohen, 2007; Elfering et al., 2015; Kane-Gill et al., 2010). Por conseguinte, a preparação e administração dos MAR pode ser propensa a interrupções, o que pode ter consequências negativas para os doentes, para os prestadores de cuidados de saúde (conhecidos como segundas vítimas) e para a comunidade que suporta o peso social e económico destas consequências. Este estudo tem como objetivo analisar as interrupções vivenciadas pelos enfermeiros durante a preparação e administração de MAR.

Enquadramento

A literatura mostra que um terço dos erros de medicação está relacionado com MAR (anticoagulantes, eletrólitos, vasoativos e sedoanalgésicos), metade dos quais causa danos moderados a graves devido a erros de comunicação, falhas de procedimento, falta de educação ou formação, condições do ambiente de trabalho e ausência de trabalho em equipa (Cohen, 2007; Tyynismaa et al., 2017). Os erros mencionados acima ocorreram de forma sequencial, começando com a prescrição e continuando até a fase de administração, o que significa que envolveram vários profissionais de saúde, incluindo médicos, farmacêuticos, enfermeiros e auxiliares de enfermagem, ou seja, os erros poderiam ter sido evitados e foram causados por múltiplos fatores (Tyynismaa et al., 2017).

As interrupções são responsáveis por mais mortes por ano do que o cancro da mama, os acidentes de viação ou a sida (Kohn et al., 1999). As interrupções podem prejudicar as relações interpessoais e causar atrasos nos tratamentos, levando a um aumento da morbilidade nos doentes. São heterogéneas e reiterativas e podem prejudicar o processo de cuidados de saúde, podendo levar a práticas inseguras (Tucker, 2004).

Experiências psicológicas demonstram que as interrupções e ambientes de trabalho exigentes, como as unidades de internamente e cuidados intensivos, podem levar ao rápido esquecimento das intenções que motivam uma ação, resultando em erros (Einstein et al., 2003). De igual modo, a literatura mostra que as interrupções estão associadas a atrasos nos cuidados de saúde (Rivera-Rodriguez & Karsh, 2012), a um desempenho inferior ao esperado em termos de tempo e qualidade (Capasso et al., 2012), a encargos económicos institucionais (Tucker, 2004) e a atividades adicionais necessárias para gerir a interrupção e regressar à tarefa interrompida (Donaldson et al., 2014; Westbrook et al., 2010).

Existem duas abordagens complementares ao conceito de interrupção em enfermagem: uma abordagem macrossistémica proposta por Theresa Pape (2003) e uma abordagem microssistémica proposta por Juliana Brixey (Brixey et al., 2007). A perspetiva de Pape aborda a interrupção num sistema aberto composto por vários níveis que inclui instituições de cuidados de saúde, unidades e enfermeiros. A interrupção é um dos muitos outros elementos que rodeiam a prática clínica e que podem interagir para facilitar ou dificultar as atividades de enfermagem. Brixey propõe uma visão microssistémica, que não só fornece um modelo de como a interrupção ocorre, mas também uma taxonomia para ser utilizada por futuros investigadores.

Questão de investigação

Quais são as interrupções vivenciadas pelos enfermeiros durante a preparação e a administração de MAR?

Metodologia

Trata-se de um estudo quantitativo transversal realizado numa unidade de internamento e numa unidade de cuidados intensivos para doentes adultos em duas instituições de saúde de elevada complexidade no sudoeste da Colômbia. Os hospitais servem 42 municípios e aproximadamente 3.789.874 pessoas. A unidade de cuidados intensivos conta com 19 enfermeiros que trabalham em turnos de 6-12 horas, com dois enfermeiros por turno e um rácio enfermeiro-doente de 1:4-5. Por outro lado, a unidade de internamento tem sete enfermeiros que trabalham em turnos de 6-2 horas, com dois enfermeiros em turnos diurnos nos dias úteis, um responsável pelos cuidados de enfermagem e o outro por funções administrativas. O rácio enfermeiro-doente é de 1:11. Os medicamentos são reconstituídos, diluídos ou transferidos numa sala limpa que é exclusivamente dedicada à preparação de medicamentos. A sala está equipada com materiais, equipamento de proteção individual, um lavatório para lavagem das mãos, um desinfetante à base de álcool, um caixote do lixo e um frigorífico. Os medicamentos são administrados nos quartos dos doentes. As instalações não dispõem de um sistema de duplo controlo como parte do protocolo de preparação e administração de medicamentos.

Este estudo examinou as interrupções que ocorrem durante a preparação e a administração de MAR realizadas por enfermeiros. A amostra era constituída por 26 enfermeiros que trabalhavam nos turnos da manhã, tarde e noite, de segunda a domingo, em ambas as unidades de cuidados. Os participantes foram selecionados por conveniência e os critérios de inclusão exigiam que ambas as fases do processo de medicação fossem totalmente observáveis. O estudo excluiu os processos de medicação realizados por enfermeiros em formação, auxiliares de enfermagem, pessoal externo à unidade ou os relacionados com uma emergência.

Dois investigadores recolheram os dados entre abril e maio de 2019, utilizando a técnica de observação estruturada orientada por duas checklists. A primeira checklist, “The Medication Administration Distraction Observation Sheet (MADOS)”, registou a frequência e a origem das interrupções (Gaitan Gómez et al., 2022). A segunda checklist, “Folha de Caracterização de Interrupções”, foi criada pelos autores com base na literatura (Bower et al., 2015; Hayes et al., 2015) e recolheu informação sobre a duração das interrupções em segundos, utilizando um cronómetro no HUAWEI Mate 20 lite SNE-LX3 v. 9.1., o motivo da interrupção (conteúdo da interrupção, resposta aberta) e o impacto da interrupção para a atividade em curso (classificado como positivo se fornecesse informação importante para os cuidados ao doente ou negativo se perturbasse o fluxo de trabalho e não beneficiasse os cuidados ao doente).

A estratégia de gestão dos enfermeiros para lidar com as interrupções foi classificada como imediata quando interrompiam a atividade principal para encontrar uma solução para a interrupção, negociação quando debatiam ou decidiam lidar com a situação num momento mais apropriado, mediação quando delegavam a atividade secundária a outra pessoa (interrupção), agendamento, quando ajustavam a sua lista de prioridades e atribuíam uma sequência para a execução da tarefa, e multitarefa, quando realizavam ambas as tarefas ao mesmo tempo, o que significa que prepararam e administraram os MAR evitando interrupções (Brixey et al., 2007).

Procedeu-se à análise descritiva dos dados, usando medidas de tendência central, frequência e proporção, no IBM SPSS Statistics, versão 24.0. Para as respostas abertas, foi utilizada a técnica de análise de conteúdo de Bardin para agrupar sistematicamente as afirmações em categorias que captassem a essência da mensagem, preservando o significado original. O objetivo deste processo foi operacionalizar os códigos em frequências e proporções. Os investigadores realizaram este processo manual e individualmente e os resultados foram triangulados, podendo ser auditados pelos enfermeiros em reunião (Bardin, 2010).

O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética em Investigação da Escola de Enfermagem da Universidade Nacional da Colômbia (AVAL 050-18) e pelas Comissões de Ética das instituições de saúde do sudoeste da Colômbia. Vinte e seis enfermeiros concordaram em participar no estudo, assinando o termo de consentimento informado, e nenhum deles retirou o seu consentimento. Os investigadores mantiveram a confidencialidade e a custódia das informações recolhidas, limitando o acesso aos dados apenas aos investigadores principais. Os dados foram armazenados em ficheiros protegidos por palavra-passe. Os enfermeiros receberam a informação através de uma atividade educativa, enquanto as instituições foram informadas através de uma apresentação que destacava as áreas a melhorar no futuro. O estudo apresentou um risco mínimo para os participantes, uma vez que não envolveu quaisquer variáveis biológicas, psicológicas ou sociais. Este artigo segue a checklist STROBE para estudos transversais.

Resultados

O estudo observou 193 processos de preparação e administração de MAR. Foram identificados 17 medicamentos de cinco grupos terapêuticos (Figura 1). Os medicamentos foram administrados durante o dia (n = 150; 77,7%) e em dias úteis (segunda a sexta-feira; n = 164, 85%). Em 113 processos ocorreu pelo menos uma interrupção, tendo ocorrido mais de duas interrupções durante a administração de cisatracúrio e morfina.

Figura 1: Medicamentos de alto risco 

As interrupções ocorreram a uma taxa de 1,4 por processo de medicação (n = 193 MAR/137 interrupções). As Tabelas 1 e 2 apresentam as características estas interrupções. As principais origens das interrupções foram as conversas, os profissionais médicos, outros membros da instituição e comunicações (chamadas telefónicas ou mensagens de texto) em ambas as fases. A estratégia de gestão mais utilizada foi a multitarefa.

Tabela 1 : Características das interrupções durante a preparação e administração de medicamentos de alto risco 

Fase Número de interrupções* Frequência Duração de interrupção (s**) Origem Frequência Duração por origem (s**)
n % n %
Preparação 1 77 84,6 26,4 (DP = 10,7) Interferência verbal-auditiva 86 94,5 26,4 (DP = 19,8)
2 7 15,4 Problemas com materiais de trabalho 5 5,5 73,9 (DP = 53,2)
Administração 1 36 78,3 27 (DP = 20,2) Interferência verbal-auditiva 41 89,1 27 (DP = 20,2)
2 2 8,7 Problemas com materiais de trabalho 5 10,9 49,4 (DP = 33,6
3 3 13

Nota: n = Frequência de interrupção; % = Percentagem; DP = Desvio padrão; * = Número de interrupções durante os processos de medicação. ** = Segundos. Interferência verbal-auditiva: conversas, telefonemas, profissionais médicos, outros funcionários e ruídos; Problemas com materiais de trabalho: problemas com medicamentos, equipamentos e outros.

Tabela 2 : Impacto e conteúdo das interrupções e estratégia de gestão durante a preparação e administração de medicamentos de alto risc o 

Fase Características de interrupções Frequência
n %
Preparação Impacto Positivo 33 36,3
Negativo 58 63,7
Gestão da interrupção Imediata 15 16,5
Multitarefa 76 83,5
Conteúdo Conversas entre enfermeiros e outros membros da instituição sobre temas relacionados ou não com os cuidados 56 61,5
Gestão de processos administrativos 12 13,2
Atividades relacionadas com a equipa médica 9 9,9
Várias interrupções (procura de material, realização de atividades de cuidados que não foram feitas anteriormente ou atividade circundante intensa) 14 15,4
Administração Impacto Positivo 30 65,2
Negativo 16 34,8
Gestão de interrupção Imediata 11 23,9
Agendamento 1 2,2
Multitarefa 34 73,9
Conteúdo da interrupção Conversas entre enfermeiros e outros membros da instituição, familiares e doentes sobre assuntos relacionados com cuidados de saúde 30 65,2
Várias interrupções (procura de material, realização de atividades de cuidados que não foram feitas anteriormente e gestão de processos administrativos) 4 8,7
Conversas entre colegas sobre temas não relacionados com o trabalho e atividade circundante intensa 8 17,4
Movimentação e ruído perto do local de trabalho 4 8,7

Nota. n = Frequência de interrupção; % = Percentagem.

Discussão

O estudo realizado em unidades de cuidados de elevada complexidade de hospitais de referência na Colômbia constatou que as interrupções eram frequentes durante a fase de preparação de MAR. Os dias úteis e os turnos diurnos foram os mais suscetíveis a interrupções. As comunicações profissionais e sociais foram as principais origens de interrupção, e o seu impacto variou consoante a fase do processo de medicação. No entanto, a estratégia de gestão de interrupção mais utilizada foi a multitarefa, em que o enfermeiro integrou atividades secundárias no curso da atividade principal.

Metade dos processos de medicação foram interrompidos pelo menos uma vez devido a necessidades de comunicação, tal como relatado em unidades cirúrgicas e médicas (Thurayya et al., 2022). A frequência de interrupção durante os processos de medicação varia entre 1-3 (Johnson et al., 2017). A duração das interrupções é um desafio devido à falta de dados comunicados na maioria dos estudos. Quando relatados, geralmente são baseados na atividade primária (por exemplo, o turno todo, todas as rondas de medicação ou apenas uma ronda de medicação), o que pode não coincidir com o período de tempo deste estudo. No entanto, as interrupções ocorridas durante o processo de medicação variaram entre 1 e 5 minutos. De acordo com Duruk et al. (2016), as origens verbais, como conversas presenciais e chamadas telefónicas, foram mais longas do que as observadas neste estudo. Isto sugere que estudos anteriores podem ter ignorado certos atributos que poderiam impactar o trabalho de enfermagem.

O conteúdo das interrupções relatadas no estudo está de acordo com o que a literatura reporta para cada fase. Durante a fase de preparação, os profissionais participam tanto em conversas profissionais (tais como pedidos de informação e tomada de decisões) como em conversas sociais (tais como questões familiares e refeições) na sala de preparação da medicação. Esta sala é acessível a certos funcionários, o que permite conversas mais pessoais. As conversas durante a fase de administração, no entanto, devem centrar-se inteiramente na educação do doente e da família. Esta é a oportunidade ideal para discutir com a equipa de saúde aspetos relacionados com os cuidados, como o estado da pele, o acesso venoso, os padrões de eliminação e a administração intravenosa (Prates & Silva, 2016).

Relativamente ao impacto, mais de metade das interrupções vivenciadas pelos enfermeiros durante a fase de administração foram positivas. Estas comunicações foram necessárias para a atividade e não devem ser consideradas interrupções, mas sim avisos ou notificações. É importante avaliar se todas as origens relatadas na literatura, incluindo o doente, a família, os alarmes da bomba de infusão e os monitores ou as conversas entre profissionais sobre assuntos relacionados com os cuidados devem ser referidas como interrupções. Em vez disso, estas atividades devem ser realizadas de forma mais eficaz e sem qualquer coerção nos cenários clínicos.

A estratégia de gestão preferida é a multitarefa, em que o enfermeiro incorpora eficientemente as interrupções no curso da sua atividade, sem ter de mediá-las ou agendá-las. Isto pode dever-se à perceção de ser o responsável no serviço ou de não parecer mal-educado para a outra pessoa (Craker et al., 2017). Johnson et al. (2017) descobriram que a estratégia imediata, que consiste em aceitar e lidar com a interrupção imediatamente, nem sempre é preferida. Outras estratégias incluem negociação, mediação e agendamento. Os enfermeiros podem dar prioridade às Interrupções, avaliando a sua importância para a atividade principal e selecionando a estratégia mais adequada. Esta estratégia pode ajudar a controlar situações inesperadas, reduzindo a probabilidade de ocorrência de erros. No entanto, não é claro se o desenvolvimento deste sistema e das estratégias de controlo se deve à antecipação, à experiência, ao exemplo dos colegas ou à tentativa e erro. Também não é claro se esta estratégia de gestão difere entre enfermeiros experientes e principiantes. O impacto de cada estratégia nas fases do processo de medicação não foi determinado, nem qual é o processo mais benéfico.

Inúmeras medidas foram implementadas nas instituições estudadas para prevenir erros de medicação com este tipo de medicamento. Estas medidas incluíram o não armazenamento dos medicamentos no stock do serviço, a rotulagem com cores vivas de acordo com o risco que representam, a dupla verificação da prescrição médica pelo enfermeiro e pelo farmacêutico, a solicitação e o recebimento de medicamentos e materiais por um profissional de saúde (médico e/ou enfermeiro), a revisão dos protocolos do processo de medicação durante as entregas de turno, a atualização anual de temas relacionados, a autoavaliação e avaliação de conhecimentos e práticas pelos pares e sessões formativas. É importante abordar os incidentes e eventos adversos de forma construtiva.

Este estudo teve uma limitação metodológica, uma vez que as observações foram efetuadas presencialmente em vez de se utilizar a tecnologia. O efeito Hawthorne foi minimizado expondo repetidamente os enfermeiros ao observador, imergindo-os no cenário ao longo de várias semanas, exibindo um comportamento discreto, usando o mesmo uniforme e utilizando expressões verbais e não-verbais cuidadosas que ajudam o observador a passar despercebido. Esta prática permitiu que os profissionais regressassem ao seu comportamento habitual. O estudo utilizou os instrumentos mais completos disponíveis na literatura para captar as variáveis. No entanto, considera-se que instrumentos curtos e específicos poderiam ser úteis em estudos futuros e permitiriam flexibilidade na amostragem.

Conclusão

Este estudo constatou que um em cada dois processos de medicação envolveu uma interrupção que desviou a atenção do profissional de saúde dos MAR durante cerca de 27 segundos. As interrupções mais frequentes foram conversas com colegas, outros membros da equipa de saúde e pessoal administrativo. O impacto da interrupção foi positivo durante a administração e negativo durante a preparação. A estratégia de gestão mais comummente usada foi a multitarefa.

Este estudo pretende contribuir para a compreensão do conceito de interrupção, introduzindo quatro novos atributos: duração, impacto, gestão e conteúdo. Estas características têm recebido pouca atenção em estudos anteriores sobre este conceito e em indicadores empíricos.

A maioria das interrupções são conversacionais, pelo que uma comunicação clínica eficaz é crucial. Isto implica promover padrões de diálogo claros, completos e atempados através de um processo de reaprendizagem. Os profissionais de saúde devem assumir a responsabilidade de controlar as interrupções negativas que podem afetar os colegas durante os momentos críticos dos cuidados, como os procedimentos invasivos. Além disso, devem obter as informações necessárias para concluir a tarefa de forma eficiente e evitar interrupções que não sirvam um objetivo terapêutico. Embora as interações sociais sejam comuns em equipas de trabalho que passam várias horas por dia ao longo de anos, as conversas triviais devem ser limitadas a espaços e momentos específicos.

Estudos futuros devem analisar outros atributos que ainda não foram explorados, como o contexto em que as interrupções ocorrem e o impacto das alterações físicas no ambiente para as atenuar, a eficácia do regresso dos enfermeiros à sua tarefa principal e a forma como os profissionais desenvolvem competências para atenuar os efeitos negativos das interrupções durante os primeiros anos de prática profissional. Além disso, é crucial investigar os efeitos reais das interrupções no desempenho profissional e examinar os custos associados tanto para a instituição como para o sistema de saúde. Por último, a investigação sobre o mecanismo e a qualidade da comunicação poderá permitir o desenvolvimento de intervenções que visem a verdadeira origem das interrupções.

Referências Bibliográficas

Bardin, L. (2010). Análisis de contenido (4ª ed.). Ediciones Akal. [ Links ]

Bower, R., Jackson, C., & Manning, J. C. (2015). Interruptions and medication administration in critical care. Nursing in Critical Care, 20(4), 183-195. https://doi.org/10.1111/nicc.12185 [ Links ]

Brixey, J., Robinson, D., Johnson, G., Johnson, T., Turkey, J., & Zhang, J. (2007). A concept analysis of the phenomenon of interruption. Advances in Nursing Science, 30(1), 26-42. https://doi.org/10.1097/00012272-200701000-00012 [ Links ]

Capasso, V., & Johnson, M. (2012). Improving the medicine administration. Journal of Healthcare Management, 57(6), 384-391. https://www.proquest.com/openview/f42d876c9b9e5f2353176d032898427a/1?pq-origsite=gscholar&cbl=7080Links ]

Cohen, M. R. (2007). Medication errors (2nd ed.). American Pharmacists Association. [ Links ]

Craker, N. C., Myers, R. A., Eid, J., Parikh, P., McCarthy, M. C., Zink, K., & Parikh, P. J. (2017). Nursing interruptions in a trauma intensive care unit: A prospective observational study. Journal of Nursing Administration, 47(4), 205-211. https://doi.org/10.1097/NNA.0000000000000466 [ Links ]

Donaldson, N., Aydin, C., Fridman, M., & Foley, M. (2014). Improving medication administration safety: Using naıve observation to assess practice and guide improvements in process and outcomes. Journal for Healthcare Quality, 36(6), 58-68. https://doi.org/10.1111/jhq.12090 [ Links ]

Duruk, N., Zencir, G., & Eşer, I. (2016). Interruption of the medication preparation process and an examination of factors causing interruptions. Journal of Nursing Management, 24(3), 376-383. https://doi.org/10.1111/jonm.12331 [ Links ]

Einstein, G. O., McDaniel, M. A., Williford, C. L., Pagan, J. L., & Dismukes, R. K. (2003). Forgetting of intentions in demanding situations is rapid. Journal of Experimental Psychology: Applied, 9(3), 147-162. https://doi.org/10.1037/1076-898X.9.3.147 [ Links ]

Elfering, A., Grebner, S., & Ebener, C. (2015). Workflow interruptions, cognitive failure and near-accidents in health care. Psychology, Health and Medicine, 20(2), 139-147. https://doi.org/10.1080/13548506.2014.913796 [ Links ]

Gaitan Gómez, O. L., Bueno-Robles, L. S., & Pape, T. (2022). Medication administration distraction observation sheet checklist: Cultural adaptation and validation into spanish. Revista CuidArte, 11(22), 6-19. https://doi.org/10.22201/fesi.23958979e.2022.11.22.80074 [ Links ]

Hayes, C., Jackson, D., Davidson, P. M., & Power, T. (2015). Medication errors in hospitals: A literature review of disruptions to nursing practice during medication administration. Journal of Clinical Nursing, 24(21-22), 3063-3076. https://doi.org/10.1111/jocn.12944 [ Links ]

Instituto para el Uso Seguro de los Medicamentos. (2012). Medicamentos de alto riesgo. https://bit.ly/39ho7T2Links ]

Johnson, M., Sanchez, P., Langdon, R., Manias, E., Levett-Jones, T., Weidemann, G., Aguilar, V., & Everett, B. (2017). The impact of interruptions on medication errors in hospitals: An observational study of nurses. Journal of Nursing Management, 25(7), 498-507. https://doi.org/10.1111/jonm.12486 [ Links ]

Johnson, M., Weidemann, G., Adams, R., Manias, E., Levett-Jones, T., Aguilar, V., & Everett, B. (2017). Predictability of interruptions during medication administration with related behavioral management strategies. Journal of Nursing Care Quality, 33(2), e1-e9. https://doi.org/10.1097/NCQ.0000000000000260 [ Links ]

Kane-Gill, S., Jacobi, J., & Rothschild, J. (2010). Adverse drug events in intensive care units: risk factors, impact and the role of team care. Critical Care Medicine, 38(6 suppl), S83-S89. https://doi.org/10.1097/CCM.0b013e3181dd8364 [ Links ]

Kohn, L., Corrigan, J., & Donaldson, M. (1999). To err is human: Building a safer health system. Epidemiology & Infection, 126(1), 157. https://doi.org/10.1017/S095026880100509X [ Links ]

Pape, T. (2003). Applying airline safety practices to medication administration. Medsurg Nursing, 12(2), 77-93. https://interruptions.net/literature/Pape-MEDSURG_Nursing03.pdfLinks ]

Prates, D. O., & Silva, A. E. (2016). Interruptions of activities experienced by nursing professionals in an intensive care unit. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 24, 1-9. https://doi.org/10.1590/1518-8345.0997.2802 [ Links ]

Rivera-Rodriguez, A. J., & Karsh, B. T. (2012). Interruptions and distractions in healthcare: Review and reappraisal. Quality & Safety in Health Care, 19(4), 304-312. https://doi.org/10.1136/qshc.2009.033282 [ Links ]

Thurayya, E., Sabo, M., & Rehan, E. (2022). Interruptions during medication work in a Saudi Arabian hospital: An observational and interview study of nurses. Journal of Nursing Scholarship, 54(5), 639-647. https://doi.org/10.1111/jnu.12765 [ Links ]

Tucker, A. L. (2004). The impact of operational failures on hospital nurses and their patients. Journal of Operations Management, 22(2), 151-169. https://doi.org/10.1016/j.jom.2003.12.006 [ Links ]

Tyynismaa, L., Honkala, A., Airaksinen, M., Shermock, K., & Lehtonen, L. (2017). Identifying high-alert medications in a university hospital by applying data from the medication error reporting system. Journal of Patient Safety, 17(6), 417-424. https://doi.org/10.1097/PTS.0000000000000388 [ Links ]

Westbrook, J. I., Woods, A., Rob, M. I., Dunsmuir, W. T., & Day, R. (2010). Association of interruptions with an increased risk and severity of medication administration errors. Archives of Internal Medicine, 170(8), 690-692. https://doi.org/10.1001/archinternmed.2010.65 [ Links ]

15Como citar este artigo:Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S., Camargo-Figuera, & Secoli, S.R (2024). Interrupções e distrações durante a preparação e administração de medicamentos de alto risco: Estudo transversal. Revista de Enfermagem Referência, 6(3), e31983. https://doi.org/10.12707/RVI23.83.31983

Recebido: 12 de Julho de 2023; Aceito: 29 de Dezembro de 2023

Autor de correspondência Olga Lucia Gaitan-Gómez E-mail: gaitanol2012@yahoo.com

Conceptualização: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S., Camargo-Figuera, F. A., Secoli, S. R.

Tratamento de dados: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S., Camargo-Figuera, F. A., Secoli, S. R.

Análise formal: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S., Camargo-Figuera, F. A., Secoli, S. R.

Financiamento: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S.

Investigação: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S.

Metodologia: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S., Camargo-Figuera, F. A., Secoli, S. R.

Administração do projeto: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S.

Recursos: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S.

Software: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S.

Supervisão: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S.

Validação: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S., Camargo-Figuera, F. A., Secoli, S. R.

Visualização: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S., Camargo-Figuera, F. A., Secoli, S. R.

Redação - rascunho original: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S., Camargo-Figuera, F. A., Secoli, S. R.

Redação - análise e edição: Gomez, O. L., Bueno-Robles, L. S., Camargo-Figuera, F. A.

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons