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Psicologia
versão impressa ISSN 0874-2049
Psicologia vol.15 no.1 Lisboa jan. 2001
Construcionismo social, discurso e género
Social constructionism, discourse and gender
Conceição Nogueira*
*Departamento de Psicologia. Instituto de Educação e Psicologia, Universidade do Minho.
RESUMO
Os desafios colocados no presente à psicologia, e nomeadamente à psicologia social, podem ser considerados como fazendo parte dos debates iniciados pelo pós-modemismo como corrente geral, mas que na psicologia social se organizam em tomo da escola do "construcionismo social" (Gergen, 1994a; 1994b; Shotter, 1993,1995), ou mesmo da "psicologia discursiva" (Harré, 1995; Harré & Gillett, 1994; Parker, 1992; Potter & Wetherell, 1987). Depois de sistematizados os pressupostos destas perspectivas e apresentada a emergência de novas realidades e recursos de acção, analisar-se-á como o género pode ser concebido nestas novas abordagens, no quadro de uma breve reflexão sobre a problemática do relativismo nestas perspectivas. Terminamos apresentando as alternativas e estratégias necessárias a uma psicologia feminista, que tem pela frente um conjunto de questões que representam desafios estimulantes para o debate que urge continuar, sem esquecer a acção política, sempre necessária à construção da igualdade entre homens e mulheres.1
Palavras-chave Construcionismo social, feminismo, género.
ABSTRACT
The challenges faced by psychology, and especially by social psychology, might be considered as part of the debate introduced by post modernism. In social psychology, this debate is currently organized around "social construccionism" (Gergen, 1994a; 1994b; Shotter, 1993, 1995), or even "discursive psychology" (Harre, 1995; Harr§ & Gillett, 1994; Parker, 1992; Potter & Wetherell, 1987). This article presents a review of the literature that shapes the framework of this ongoing debate. Firstly, a brief presentation of the background of those new theoretical perspectives, as well as the emergence of new realities and resources for action will be introduced. In the second part of the article, we will discuss how gender can be conceived within these new approaches, through a brief reflection over the problems raised by relativism. We will conclude by presenting the alternatives and strategies that are needed for a feminist psychology, considering the set of questions that represent stimulating challenges for the development of the debate in social psychology. In this discussion we bear in mind the political action, which is always necessary to the construction of equality between men and women.
Introdução
O descontentamento com o projecto empírico-positivista de acumulação de conhecimento em psicologia social (Gergen, 1994a) iniciou-se com a designada "crise da psicologia social" (Gergen, 1985; Jesuíno, 1993; Soczka, 1993), em meados dos anos 60.
Para Pepitone (1976,1981) e Augoustinos e Walker (1995), a localização da crise situa-se ao nível epistemológico, no pressuposto de que o "indivíduo está no centro de todas as coisas" e por isso deve ser a principal unidade de pesquisa e análise. Esta individualização da psicologia social é largamente atribuída à junção das forças da experimentação e do positivismo que acabaram por dominar a disciplina, mascarando-a de uma respeitabilidade científica. Segundo Farr (1989), foram essas forças que levaram também à diminuição do interesse pelos fenómenos colectivos que tinham interessado os primeiros psicólogos como Wundt e Ross.
Apesar deste descontentamento, pouco se escreveu sobre a "crise" desde os anos 70. Como referem Augoustinos e Walker (1995) a crise foi essencialmente de epistemologia, não apenas de confiança, e os problemas epistemológicos dos anos 60 e 70 são tão problemáticos nos anos 90 como o eram antes. No prefácio da segunda edição do seu livro Toward transformation in social knowlcdge, em 1994, reedição do anterior de 1982, Gergen refere um certo desencanto quando avalia como os psicólogos sociais rapidamente saíram do descontentamento, proferiram acusações de niilismo, e voltaram ao quotidiano, continuando a fa/.er as suas pesquisas habituais, de forma que o conteúdo das questões nunca foi devidamente debatido.
No entanto, na última década começou a emergir uma segunda cultura académica, muito variada nas suas origens, mas unida no cepticismo face ao projecto empiricista para as ciências humanas e sociais e, no caso particular da psicologia, relativamente à sua visão do conhecimento como algo de individual. Segundo Gergen (1994a) a ciência psicológica encontra-se num impasse, parecendo ser necessária uma forma alternativa de produção de conhecimento, assim como das práticas culturais com ele relacionadas. Para uma visão alternativa, que na psicologia se tem vindo a consubstanciar no construcionismo social e nas perspectivas discursivas, são de importância fundamental três grandes linhas teóricas de crítica. A linha crítica proveniente dos pressupostos da própria Teoria Crítica, a linha crítica literária-retórica, onde se destacam os trabalhos de Derrida e, finalmente (sendo para alguns autores a fundamental), a linha da crítica social, com particular relevância para os trabalhos de Kuhn e Foucault.
Cada uma destas linhas críticas coloca dúvidas quanto às reivindicações empiricistas e realistas de que a ciência sistemática possa produzir descrições culturalmente descontextualizadas, isto é, dizer o que é verdade sem respeitar as organizações de significado humanas. Segundo Gergen (1994b), estas ideias estão na base de uma inflexão pós-modema no mundo académico, e na psicologia em particular (Kvale, 1992).
O livro de Jean-François Lyotard A condição pós-modema (1989) é um referencial importante para todo o debate sobre o pós-modemismo. Para Lyotard, o pós-modernismo consubstancia uma condição geral da civilização ocidental contemporânea, onde as "grandes narrativas da legitimação" já não são possíveis e, por isso, rejeita também a noção de que a mudança social se baseia na descoberta e consequente alteração das estruturas subjacentes da vida social, através da aplicação de uma grande teoria ou metanarrativa.
Segundo Flax (1990), as grandes dúvidas, ou as mais radicais, acerca das crenças ainda prevalecentes em determinadas culturas ocidentais e derivadas do Iluminismo, que são agora alvo de intensas críticas, dizem respeito a: a) a existência de um self estável e coerente; b) a Razão permitir um conhecimento objectivo de confiança e de fundamentação universal; c) o conhecimento adquirido pela utilização correcta da Razão ser verdadeiro, isto é, representar algo real e não mutável (universal) acerca da mente e da estrutura do mundo natural; d) a possibilidade de o conhecimento poder ser, quer neutro (estabelecido na base da Razão universal e não em interesses particulares), quer socialmente benéfico; e) a ciência como exemplo do correcto uso da Razão e paradigma para todo o conhecimento verdadeiro, neutra nos seus métodos e conteúdos, mas socialmente benéfica nos seus resultados; f) a linguagem ser, em certo sentido, transparente (a ideia de que os objectos não são linguística ou socialmente construídos e que se tornam presentes na consciência através do uso correcto da linguagem).
Assim, quer caracterizemos a idade contemporânea como moderna ou pós-moderna, a maioria das pessoas parece estar já preparada para admitir ou defender a ideia de que são poucos os aspectos da condição humana que sejam básicos no sentido ontológico ou trans-histórico. Com o pós-modernismo caíram "os mitos da verdade e da uniformidade" (Villegas, 1992, p. 6). Os pós-modernistas tornaram o convencional em arbitrário e promoveram a teoria e a política da descrença face à linguagem dos direitos, à racionalidade, aos interesses e à autonomia, como características do self humanista que legitimava a vida social moderna (Di Stefano, 1990); modernidade encarada agora como fonte de subjugação, opressão e repressão (Bordo, 1990; 1992; Rosenau, 1992).
A ciência moderna legitimou as preferências do poder e justificou posições normativas que eram mais valorativas do que factos científicos. Os resultados da pesquisa científica foram utilizados para "provar" de forma ad hoc o valor subjectivo das orientações das ideologias políticas. A ciência moderna foi inclusive acusada de "cobrir" os abusos dos governos, nas sociedades democráticas e "trabalhar" para a sustentação dos regimes totalitários (Riger, 1992; Rose, 1990).
Assim, o pós-modernismo tomou conta e aparece frequentemente na ciência social que se faz hoje. As mudanças que exige parecem não ter fim: rejeita pressupostos epistemológicos, refuta convenções metodológicas, resiste às pretensões do conhecimento, obscurece todas as formas de verdade. Tem versões mais radicais e outras mais moderadas, mas quer umas quer outras representam um grande desafio para o conhecimento estabelecido no século XX (Rosenau, 1992). Como diz Jane Flax (1990), algo se está a passar, já que um conjunto de alterações culturais tem mudado significativamente as nossas condições de vida e essas mudanças necessitam de ser nomeadas, descritas e compreendidas.
Sintetizando, o pós-modernismo representa o questionar e a rejeição dos pressupostos fundamentais do modernismo, o movimento intelectual que o precedeu, tendo incorporado muitas das ideias intelectuais e artísticas que tinham surgido de forma desconexa desde o tempo do Iluminismo (Burr, 1995). Rejeita as ideias de verdade última, de estruturalismo (a ideia de que o mundo como o vemos é o resultado de estruturas escondidas), de que o mundo possa ser compreendido em termos de grandes teorias ou metanarrativas (Lyotard, 1989), enfatizando, ao mesmo tempo, a coexistência de uma multiplicidade e variedade de formas de vida dependentes das situações (muitas vezes referindo-se a pluralismo) (Smart, 1993). Rejeita também a noção de que, através da aplicação de uma grande teoria ou meta-narrativa, a mudança social dependa da descoberta, e posterior alteração, das estruturas subjacentes da vida social. Apropria palavra "descobrir" pressupõe uma realidade estável e existente que pode ser revelada através da observação e da análise (Burr, 1995).
Construcionismo social e discurso
Para Ibaftez (1994), na psicologia é o construcionismo social a escola que melhor se adequa ao pensamento pós-moderno. Os construcionistas criticam a “ideologia da representação" característica da modernidade, ideologia que alimenta quatro grandes mitos, agora em desconstrução. São eles: a) o mito de um conhecimento válido que possa representar correctamente, e de forma fiel, a realidade; b) o mito do objecto como elemento constitutivo do mundo; c) o mito da realidade como independente dos indivíduos; e, finalmente, d) o mito da verdade como critério decisório.
O construcionismo pretende sintetizar de várias formas todas as críticas já apresentadas e mover-se para além da crítica, no sentido de uma descrição mais positiva do potencial científico. Sendo o conhecimento não o que se tem, mas o que se faz em conjunto com outras pessoas, o objectivo da pesquisa construcionista desloca-se da natureza das pessoas ou da sociedade para as interacções e para as práticas sociais dai resultantes (Gergen, 1994a). Segundo Burr (1995), são sobretudo a sua orientação anti-essencialista e anti-realista, o seu entendimento da linguagem como pré-condição para o pensamento e como forma de acção social e o seu enfoque na interacção e nas práticas sociais, aliados á perspectiva do conhecimento como especificamente histórico e cultural, que o diferenciam da abordagem da psicologia mais tradicional.
Questionando os pressupostos do essencialismo e do humanismo, a teoria construcionista social deslocou o centro da atenção da pessoa para o domínio social. A psicologia, nesta perspectiva, toma-se o estudo do ser socialmente construído, o produto de discursos histórica e culturalmente contingentes, discursos que trazem consigo uma rede complexa de relações de poder. A pessoa fica como que "encaixada" num sistema histórico, social e político do qual não pode ser retirada e estudada de forma independente.
Segundo Parker (1998), nos últimos 10 anos tem-se assistido a um interesse crescente pelas perspectivas construcionistas sociais, de uma forma geral, e pelas abordagens que localizam os fenómenos psicológicos no discurso, em particular (Gergen, 1985; Harré & Gillett, 1994; Parker, 1992; Potter & Wetherell, 1987). Este interesse parece representar um movimento reflexivo e crítico da psicologia social tradicional positivista, no sentido de uma valorização da construção social, histórica, cultural e politicamente comprometida da experiência humana. A atraeção por estas novas perspectivas reside essencialmente nas suas promessas libertadoras, dada a sua postura crítica face ao positivismo exacerbado da disciplina, que conduziu ao essencialismo psicológico (Burr, 1995; 1998b). Assumir a construção social dos factos psicológicos através de meios humanos, torna possível imaginar uma reconstrução dos mesmos sob formas mais atractivas e libertadoras e a um nível social mais amplo (Burr, 1998b). Esta ideia não implica assumir uma possibilidade ilimitada de alternativas, nem uma simplificação que possa dispensar os discursos opressores. No entanto, ela parece não só tomar possível pensar nos indivíduos que reconstroem aspectos de si próprios, mas também repensar um conjunto de categorias sociais, como o género, a sexualidade, a raça, a deficiência ou a doença (Burr, 1998b).
O construcionismo social oferece também uma leitura crítica da própria psicologia (Burr, 1998b), que se tem esforçado arduamente por se proclamar como apolítica. Esta proclamação de neutralidade política é, em si mesma, extremamente comprometedora do ponto de vista ideológico e político, precisamente porque acaba por legitimar práticas sociais que poderiam ser questionáveis, ao representá-las como derivadas de factos psicológicos ou sociais, livres de valor (value-free). O construcionismo social questiona radicalmente esta ideia de factos objectivos, ao mesmo tempo que caracteriza a disciplina e a prática psicológicas como parciais, dominadas por valores e movidas por direitos adquiridos implícitos.
Apesar de não existir uma definição única de construcionismo social, adequada para todos os autores (Burr, 1995), poder-se-á assumir que existem características partilhadas, algo que os liga numa espécie de "parecença familiar". Assim, pode-se certamente classificar como construcionista social qualquer abordagem que tenha na base um, ou mais, dos pressupostos fundamentais para uma ciência construcionista social (Gergen & Davis, 1997):
Posição crítica face ao conhecimento fornecido como "verdade" O construcionismo social insiste numa posição crítica face ao conhecimento disponível, às observações objectivas do mundo que remetem para a "natureza" individual e para a ausência de enviesamentos. Surge como oposição ao positivismo e ao empiricismo nas ciências sociais tradicionais, à suposição de que a natureza do mundo pode ser revelada através da observação, e que aquilo que "existe" é aquilo que se percebe que existe.
Sugere ainda que as categorias com as quais se apreende o mundo não se referem necessariamente a divisões "reais". Um exemplo radical desta questão diz respeito ao género. As observações do mundo sugerem que existem duas categorias de seres humanos—homens e mulheres. Gergen (1992) questiona a necessidade de distinção entre masculinidade e feminilidade, por não reflectirem nenhuma realidade palpável e independente. Embora se tenha bem claro que existem diferenças nos órgãos de reprodução que estão presentes em muitas espécies, deve-se questionar o porquê dessa distinção ter sido sempre tão importante, para que o conjunto das categorias da personalidade se baseasse nela (homem e mulher) (Burr, 1995).
Os termos e as formas pelas quais se consegue compreender o mundo e cada um individualmente, são artefactos sociais, produtos de inter-relações entre as pessoas, com especificidade histórica e cultural Para os construcionistas, as descrições e explicações não são nem motivadas pelo mundo como ele é, nem o resultado inexorável de propensões estruturais genéticas dentro do indivíduo. Pelo contrário, elas são o resultado de uma acção humana coordenada. As palavras apenas possuem significado dentro de um contexto relacional. Elas são, segundo Shotter (1989), o resultado não da acção e reacção individuais, mas de acção conjunta, da co-acção. Se, e como diz Bakhtin (1981, citado por Gergen, 1994a), as palavras são inerentemente interindividuais, isto quer dizer que para conseguir inteligibilidade é necessário participar num padráo relacional reiterativo ou, se sufícientemente expandido, numa tradição.
Segundo o construcionismo social, as formas como se compreende normalmente o mundo, as categorias e os conceitos que se utilizam são específicos de um tempo histórico e cultural (Burr, 1995; Gergen, 1985). Quer se compreenda o mundo em termos de homem ou mulher, vida urbana ou vida rural, passado ou futuro, tudo isso depende do "onde" e do "quando" do mundo em que se vive. O conhecimento é relativo e dependente do tempo e da cultura, isto é, não só é específico de culturas particulares e períodos da história, como também é produto dessa cultura e história e dependente dos arranjos prevalecentes, quer económicos quer sociais. As formas particulares de conhecimento que abundam numa determinada cultura são artefactos dela, e não se deve assumir que determinadas formas de compreensão são necessariamente melhores (em termos de estarem mais próximas da verdade) do que outras (Burr, 1995).
Determinada descrido do mundo ou do self é sustentada ao longo do tempo, não por validade objecliva, mas devido às vicissitudes do processo social Segundo Burr (1995), este pressuposto implica que o conhecimento é sustentado pelo processo social. O conhecimento do mundo e as formas comuns de o compreender não derivam da natureza do próprio mundo em si mesmo. As versões do conhecimento constroem-se através das interacções diárias entre as pessoas, no decurso da vida. Por isso, todo o tipo de interacção social e particularmente a linguagem é de grande interesse para os construcionistas sociais.
As ocorrências entre as pessoas no decurso da sua vida de todos os dias, são encaradas como práticas durante as quais as versões partilhadas de conhecimento são construídas. O que se pensa ser a "verdade" (que varia quer histórica quer transculturalmente), isto é, as ideias correntes e aceites de compreensão do mundo, é apenas um produto, não da observação objectiva do mundo, mas do processo social e das interacções nas quais as pessoas estão constantemente envolvidas.
Como o conhecimento e a acção social "caminham" juntos, as compreensões "negociadas" do mundo podem tomar uma grande variedade de formas, e por isso pode-se falar de numerosas e possíveis "construções sociais", onde cada construção pode convidar a uma determinada acção.
O significado da linguagem deriva do seu modo de funcionamento dentro dos padrões de relacionamento. A linguagem é algo de único nos seres humanos. Os animais comunicam entre si através de sons, marcas, gestos e posturas para assinalar perigo, ocupação do território, paradas sexuais, etc. Apesar de esses comportamentos terem um significado que suscita respostas dos outros animais (luta, fuga, cópula, etc.), este significado é sempre fixo e estável e esta é a principal diferença em relação à linguagem humana (Burr, 1995).
O papel que a linguagem desempenha na perspectiva do construcionismo social é radicalmente diferente do que é assumido pela psicologia tradicional. A psicologia tradicional assume que a linguagem representa uma expressão fácil de compreensão do pensamento, e não que aquela é uma pré-condição deste. Pensa-se na linguagem como um conjunto de "etiquetas" que podem ser escolhidas de forma a melhor descrever os estados internos (pensamentos e sentimentos). Naquela perspectiva a natureza da pessoa surge em primeiro lugar, sendo o papel da linguagem o de encontrar a forma de expressar essa natureza, ou seja, as pessoas usam a linguagem para dar expressão a algo já existente em si mesmas ou no mundo.
A ideia tradicional, e assumida pelo senso comum, da "linguagem como transparência" é questionada pelo construcionismo social que não considera a linguagem um meio claro e puro através do qual os pensamentos e sentimentos se podem tornar acessíveis aos outros, ou uma espécie de "janela sem irregularidades no vidro" que possam distorcer a visão através dela. O uso da linguagem é uma forma de acção, tendo por isso um carácter "performativo". Quando as pessoas falam umas com as outras o mundo é construído e por isso a linguagem não é apenas um veículo passivo para os pensamentos e emoções (Burr, 1995). Apedra base do construcionismo social é a insistência sobre a natureza partilhada dos códigos da linguagem, em constante mudança, e variando nos seus significados em função dos contextos.
Se a forma de compreender o mundo não provém de nenhuma realidade objectiva, (antes das pessoas passadas ou presentes), isso representa que os indivíduos nascem num mundo onde já existem os campos conceptuais e as categorias usadas pelas pessoas numa dada cultura. As pessoas adquirem esses conceitos e essas categorias pelo uso da linguagem, que todos os dias se reproduz na cultura. Isto é, a forma como as pessoas pensam, os conceitos e as categorias que lhes permitem um campo de significados são fornecidos pela sua linguagem.
Para Hoffman (1992), os teóricos construcionistas sociais acreditam que as ideias, os conceitos e as memórias surgem do intercâmbio social e são mediatizadas pela linguagem. Todo o conhecimento desenvolve-se entre as pessoas, no mundo quotidiano.
Avaliar as formas de discurso existentes é ao mesmo tempo avaliar padrões de vida cultural Dentro de uma comunidade de inteligibilidade, onde as palavras e as acções estão relacionadas de forma segura, é possível avaliar o que se designa por "validade empírica" de uma frase ou ideia. Apesar de esta forma de avaliação ser útil, quer na ciência quer na vida quotidiana, ela é essencialmente não reflexiva.
Apesar de todos os pressupostos anteriormente enunciados serem igualmente fundamentais para as perspectivas discursivas, as questões da linguagem e dos discursos assumem particular relevo. Neste sentido poderemos dizer que os dois últimos pressupostos constituem propostas que se aproximam das configurações actuais da psicologia social discursiva, que tem em Jonathan Potter (Potter & Wetherell, 1987) e em Ian Parker (Parker, 1989; 1992) os seus mais reconhecidos teóricos. A "viragem para a linguagem" está assim reflectida no desenvolvimento da análise do discurso e da pesquisa da análise discursiva, dentro da psicologia social (Potter & Wetherell, 1987). Ian Parker (1992; 1998), mais identificado com perspectivas pós-estruturalistas, procura analisar como os objectos (personalidade, atitudes, preconceitos, por exemplo) são construídos nos discursos e como neles se constroem os sujeitos. Potter e os seus colaboradores referem essencialmente o conjunto de termos, lugares-comuns e descrições usadas em construções gramaticais e estilísticas específicas (noção de repertório interpretativo) (Spink & Frezza, 1999); daí que a sua proposta se situe mais no uso da linguagem, ancorando-se preferencialmente na tradição da etnometodologia. Neste artigo, as posições adoptadas assim como as perspectivas teóricas abordadas serão essencialmente provenientes de uma postura mais identificada com as posições de Ian Parker.
Segundo Burman e Parker (1993), a pesquisa da análise do discurso trouxe pelo menos três contribuições úteis que é importante salientar.
Em primeiro lugar, a análise do discurso incorporou na psicologia o trabalho de Michel Foucault (1972; 1979), permitindo que as ideias deste autor servissem para uma descrição crítica da função da própria disciplina (poder disciplinar). Do ponto de vista de uma desconstrução da psicologia, Rose (1990) realiza a desconstrução da psicologia social, mostrando como os seus conceitos e práticas podem ser vistos como parte de um. fenómeno geral de emergência do indivíduo tal como ele é entendido nas sociedades ocidentais.
Em segundo lugar, a análise do discurso chamou a atenção para a forma como as descrições psicológicas operam de maneira a chamar a atenção para determinadas suposições. Permitiu desafiar o estatuto de "verdade" que a disciplina promove.
Em terceiro lugar, introduziu a problemática da reflexividade, agora entendida como inerente à própria teoria e pesquisa psicológicas, ou seja, a avaliação crítica e pública dos processos e dos recursos interpretativos.
Uma atenção ao discurso facilitou, portanto, uma descrição histórica do conhecimento psicológico (a forma como a psicologia é construída na cultura), uma crítica à prática psicológica, desafiando as suas proclamações de verdade, e uma transformação nas perspectivas metodológicas.
A popularidade da análise do discurso também lhe advém da possibilidade de os seus utensílios de pesquisa poderem ser usados para moldar uma prática política. A análise do discurso é usada para comentar os processos sociais que participam na manutenção das estruturas de opressão. Na psicologia, esta abordagem tem sido utilizada, por exemplo, para trabalhar o discurso racista (Potter & Wetherell, 1992), as práticas da maternidade (Llombart, 1995), o discurso de mulheres em posições de poder (Nogueira, 1997) e todas as questões associadas ao feminismo (Wilkinson & Kitzinger, 1995).
E cada vez mais necessária a introdução da dimensão política numa disciplina que, como a psicologia social, deve responder ao pedido de relevância que provém dos sectores afectados pelas contradições existentes na ordem social (Gill, 1995; Lombart, 1995). Não sendo a única via, a análise do discurso pode servir este objectivo (Nogueira, no prelo). A análise do discurso, ao permitir um aprofundamento da compreensão das estratégias discursivas que moldam as formas distintas de construção do meio social, colocando-as abertamente sob crítica, acaba por facilitar os processos de transformação, não os reproduzindo.
Tendo presente que, a nível da análise discursiva, não existem critérios definidos de correspondência para decidir ou potenciar umas versões interpretativas sobre outras, isto origina um posicionamento difícil para o investigador: não permite uma resposta fácil quando se pergunta qual é a melhor interpretação e especialmente qual a linha de acção a seguir depois da análise. No entanto, é possível assumir uma determinada interpretação (baseada não num nível metodológico, mas pragmático), se se valorizar o potencial transformador da ordem social dominante que essa interpretação acarretará. Este critério, que depende do analista, permite assumir algumas escolhas, entre versões produzidas sobre a realidade social, não tanto em função da adequação do método utilizado mas sim no que diz respeito às implicações derivantes da análise.
Avaliar os efeitos de um determinado discurso (de entre uma pluralidade de efeitos possíveis) constitui uma responsabilidade ético-política. Esta posição pode apenas ser exercida se se tiver um compromisso de crítica face à ordem social dominante e não apenas numa crítica metodológica. Enfatizar as discussões e argumentações meramente metodológicas sem um mínimo de crítica social diminui a possível repercussão pragmática dessa análise, acabando por manter apenas a ordem já estabelecida (Lombart, 1995).
No que diz respeito à ligação da análise do discurso com o construcionismo social, pode-se dizer que uma posição teórica construcionista social não implica necessariamente que se utilize a abordagem da análise do discurso na pesquisa, assim como usar a abordagem da análise do discurso não significa que os investigadores que a utilizam se refiram a si próprios como construcionistas sociais. O construcionismo social, como um conjunto de pressupostos teóricos, e a análise do discurso, como uma abordagem para fazer pesquisa, não têm uma correspondência unívoca. Embora a análise do discurso tenha sido entusiasticamente usada por muitos construcionistas sociais como abordagem de pesquisa (Burr, 1995), estes podem usar qualquer outro método qualitativo (Burman & Parker, 1993). Segundo Burr (1995) e Burman e Parker (1993), a análise do discurso é uma espécie de "guarda-chuva " que cobre uma ampla variedade de práticas com metas distintas e suportes teóricos diversos.
No entanto, podemos assumir que, enquanto o construcionismo social permite conceptualizar a psicologia como um conjunto de relações sociais, a "viragem para o discurso" ajuda a reflectir de que modo a disciplina está comprometida com o poderoso psy-complex (Rose, 1990) da cultura moderna, o qual permite a regulação e constituição das subjectividades (Burman et al, 1996).
Esta forma de nos posicionarmos face ao conhecimento implica, por um lado, abdicar de uma visão representacionista, que tem como pressuposto a concepção da mente como espelho da natureza (Rorty, 1992) e, por outro lado, adoptar a concepção do conhecimento como uma prática partilhada (Gergen, 1985; 1994); por estas razões, estes pressupostos exigem um esforço de desconstrução de noções profundamente enraizadas na nossa cultura (Spink & Frezza, 1999). Assim, o conhecimento é um produto das trocas sociais; o que designamos por conhecimento é simplesmente aquilo que concordamos designar por "verdade" (Bohan, 1997).
Esta viragem para perspectivas construcionistas e discursivas parece indicar, segundo Ibanez (1996), que a psicologia começa finalmente a abandonar as "ingenuidades" herdadas da modernidade: por um lado, a crença na existência de uma "realidade" independente do nosso modo de acesso a ela e, por outro, acreditar que a objectividade constitui um modo privilegiado de "ver a realidade tal como é". Como consequência destas ingenuidades e, muito particularmente, da adesão acrítica ao mito da objectividade, a psicologia, enquanto ciência, acabou por se restringir ao papel de simples cronista da realidade, desvinculando-se de toda a responsabilidade e compromisso. Acreditando na existência de uma realidade face à qual podem existir modos privilegiados de acesso, a psicologia acabou por aderir a uma ideologia que confere à razão científica um estatuto a-histórico, afirmando-se como uma potente retórica da verdade. Tomas Ibanez não propõe que vivamos num mundo sem verdades; sugere apenas que elas são sempre específicas e construídas a partir de convenções pautadas por critérios de coerência, utilidade, inteligibilidade, moralidade, o que quer dizer que são adequadas às finalidades que colectivamente são designadas como relevantes (Spink & Frezza, 1999).
O que a postura construcionista reivindica é a necessidade de remeter a "verdade" à esfera da ética, isto é, pautar a sua importância não como verdade em si, mas como relativa a pessoas, grupos e relações (Spink & Frezza, 1999). Veremos adiante como esta forma de encarar a verdade é fundamental para as análises feministas construcionistas/discursivas relativas ao estudo do género.
Depois dos primeiros anos de entusiasmo geral pelas perspectivas construcionistas e discursivas, começou progressivamente a assistir-se ao tomar de posições, dentro destas novas abordagens, que justificam debate e esclarecimentos (Parker, 1998). As principais contestações ao construcionismo e às perspectivas discursivas baseiam-se no reducionismo linguístico (Spink & Frezza, 1999) e sobretudo na problemática do relativismo (Burr, 1998b; Gill, 1995; Parker, 1998). A questão do debate realismo/relativismo tem a ver com a questão de se saber como conhecer a realidade ou como podemos aceder a ela. Assim, as críticas dizem respeito essencialmente ao carácter relativista que muitos autores assumem, o que implica, ou pode implicar, uma paralisia da acção, ou uma possibilidade ilimitada de alternativas, todas de igual valor (Burr, 1998b), posições que colocam em risco o projecto de uma psicologia crítica (Parker, 1998) e emancipatória. A esta situação alguns autores respondem com a possibilidade de um realismo crítico (Bhaskar, 1986), enquanto outros advogam a possibilidade de relativismo crítico (Parker, 1998), no sentido de continuar a manter o potencial crítico e emancipador que as abordagens construcionistas e do discurso trouxeram aquando do seu aparecimento.
No entanto, segundo Burr (1998), este debate tão actual entre realismo/relativismo parece ser a manifestação de uma dicotomia construída de forma possivelmente mais limitativa do que interessante. Muitos dos mal-entendidos e do debate desgastante à volta desta dicotomia têm a ver provavelmente com algumas ambiguidades relativas àquilo que se considera a realidade e as suas diferentes dimensões. Uma forma de ultrapassar o problema poderá ser assumir que as coisas são construídas socialmente e ao mesmo tempo "reais" (Brown, Pujol & Curt, 1998). Apesar do aparente simplismo e pragmatismo, perigo maior será que o construcionismo e a análise do discurso, receosos de reificar determinadas construções sobre outras, acabem por ficar meros "observadores e comentadores", deixando a acção para outros (Burr, 1998).
Segundo Willig (1998), a psicologia enquanto disciplina não pode dizer que não age, já que as coisas estão em constante movimento e a inactividade é em si mesma uma forma de acção. Apenas podemos estar a favor ou contra, aceitar ou resistir às posições que os discursos nos oferecem, não nos podemos abster; nessa situação, estamos de acordo com o status quo, por defeito, legitimando-o. Esta autora enfatiza o poder da análise do discurso, precisamente pela possibilidade de mostrar que as coisas podem ser diferentes. Burr (1998), na mesma linha de Willig, reafirma que a análise do discurso deve, e tem a responsabilidade de fazer recomendações para a acção, baseada em valores e salvaguardando a sua capacidade reflexiva e crítica. Esta perspectiva será defendida precisamente aquando da apresentação destas abordagens para as questões do género.
Assim, um posicionamento relativista crítico (apesar da coexistência de algumas divergências entre autores) poderá permitir uma abordagem mais reflexiva na psicologia, que é em si mesma mais próxima das pesquisas radicais, que pretendem situar os debates críticos no contexto mais amplo das ciências humanas (Parker, 1998).
Abordagem construcionista social e discursiva do género
Segundo Lígia Amâncio (1999)," apesar da já longa existência do conceito de género, as ciências sociais têm tido dificuldade em construir um modelo de análise teórico e consistente das relações entre os sexos que corresponda a uma verdadeira descentração epistemológica do dualismo associado ao sexo biológico" (p. 2). Podemos questionar-nos como esta situação é possível, passados mais de 30 anos desde que as cientistas sociais identificaram o género como uma dimensão de análise importante (Howard & Hollander, 1997; Wilkinson, 1997), com toda a produção científica consequente. Esta situação dá origem ao debate actual entre feministas relativamente ao que se pode compreender como verdade ou realidade acerca do género (Gergen, & Davis, 1997).
A distinção relativa a diferentes posicionamentos feministas nos estudos de género, proposta por Sandra Harding (1986), surge como imprescindível para a compreensão deste fenómeno. Esta autora descreve três tipos de posturas ou programas feministas: a perspectiva empiricista, a de standpoint feminista e a perspectiva pós-moderna.
O padrão tradicional, ainda predominante na psicologia, é o padrão empiricista (Gergen & Davis, 1997). Neste tipo de abordagem as cientistas procuram estudar os acontecimentos, procurando recolher informação de forma objectiva e fiável, apresentando os resultados objectivamente. Apesar de as psicólogas feministas desta perspectiva terem demonstrado que, de todos os trabalhos relacionados com as diferenças sexuais, poucos podem ser considerados válidos, já que parecem existir mais semelhanças entre os sexos do que diferenças, elas afirmam que só dentro do paradigma poderão demonstrar o contrário (Eagly, 1994; Halpern, 1994). Nesse sentido, advogam a continuação da cruzada empiricista, provando que não há diferenças, onde outros as encontram. Esta perspectiva é cada vez mais questionada, já que colocar as questões em termos de diferenças, mesmo partindo da premissa de que possivelmente não se encontrarão, implica assumir que se acredita que existem dois grupos distintos (homens e mulheres) que podem ser estudados como categorias universais e diferenciadas.
Uma alternativa importante ã abordagem empiricista é identificada como uma posição de standpoint feminista. Esta posição enfatiza o aumento do conhecimento como uma actividade pessoal, onde pesquisador e sujeito estão em interseção contínua, sendo indissociáveis das suas próprias experiências. Esta abordagem distancia-se da ênfase de procura de objectividade e neutralidade característica da abordagem empiricista (Haraway, 1988). Os estudos centram-se nas próprias mulheres, produzindo conhecimento que consideram verdadeiramente feminino porque exclusivamente centrado nas experiências particulares (Rose, 1990). Nos Estados Unidos o bem divulgado trabalho de Carol Gilligan é o expoente máximo característico desta posição. No seu livro clássico In a Diffcrent Voice (1982), a autora salienta a capacidade das mulheres de falarem sobre as suas próprias experiências, apresentando uma teoria alternativa do desenvolvimento moral. Muitas psicólogas aderentes desta perspectiva, ao estudarem as experiências individuais como uma forma de enriquecer a psicologia das mulheres, pretendiam indirectamente desafiar a validade tradicional dos métodos científicos. No entanto, ao rejeitarem a negatividade associada aos estereótipos sobre as mulheres, estas cientistas acabaram frequentemente por celebrar a natureza especial das mulheres e, por isso, enfatizar mais do que negar importantes diferenças entre os sexos (Hartsock, 1990).
Antes de se apresentar a terceira abordagem no estudo do género, que Sandra Harding designa por pós-moderna e que na psicologia é protagonizada pelo construcionismo social (análise do discurso ou mesmo psicologia crítica em função de diferences nuances dentro da mesma postura epistemológica), pareceu-nos importante discutir, em primeiro lugar, o modo como se pode conceber um feminismo pós-moderno e, em segundo lugar, as críticas às duas abordagens anteriores. Estas breves apresentações constituem o pano de fundo para a compreensão da terceira e última abordagem que pretendemos salientar neste artigo.
A teoria pós-modema feminista deve pressupor múltiplas categorias, imbuídas de temporalidade, não-universalistas (Flax, 1990; Fraser & Nicholson, 1990; 1 laraway, 1990). Os métodos devem ser mais comparativos, atentos às mudanças e aos contrastes, em vez de procurarem leis; devem evitar o conforto metafísico de um único método feminista ou de uma epistemologia feminista. Finalmente, a teoria pós-modema feminista deve substituir as noções unitárias de mulher e de identidade de género feminina, por concepções construídas, complexas e plurais de identidade social, tratando o género como algo relevante e importante entre outras coisas, atendendo também à etnicidade, à idade e à orientação sexual (Haraway, 1990).
A grande vantagem deste tipo de teoria reside na sua utilidade para a prática política feminista contemporânea, já que esta é cada vez mais uma questão de alianças, e não uma unidade à volta da universalidade partilhada de interesses ou identidade. Reconhecer a diversidade das necessidades e experiências das mulheres significa não aceitar soluções únicas e universais. Nenhuma solução para questões como o cuidar das crianças, a segurança social, etc., pode ser simples e única, adequada a todos as circunstâncias, já que nem todas as mulheres partilham dos mesmos interesses e enfrentam os mesmos "inimigos". Neste sentido, pode-se falar do termo "plural" como prática de feminismos (Fraser & Nicholson, 1990; Kappeli, 1991). Segundo Flax (1990), o feminismo pós-moderno pode contribuir para uma perspectiva pluralista, já que o modelo monolítico de racionalidade, autenticidade e verdade foi sempre baseado numa forma (masculina) de conhecimento.
Como referimos atrás, para melhor se compreender o género numa perspectiva construcionista social (aquela que se insere na perspectiva pós-moderna apresentada por Sandra Harding) é importante ter presentes as críticas fundamentais às duas abordagens anteriores (empiricista e de stcmdpoint feminista), já que esta se apresenta como radicalmente distinta.
Segundo Bohan (1997) e Howard e Hollander (1997), aquelas duas perspectivas são fundamentalmente essencialistas, isto é, conceptualizam o género como característica permanente e estável nos indivíduos. O essencialismo não implica necessariamente determinismo biológico ou uma ênfase do biológico para a explicação das especificidades do género (embora historicamente o determinismo biológico tenha sido uma forma de essencialismo referente ao género). É o facto de se assumir a existência de qualidades ou características de e nos indivíduos, e não as suas origens (biológicas ou sociais) que define o essencialismo (Crawford, 1995). Os modelos essencialistas assumem o género em termos de atributos internos e persistentes, mas separados das experiências de interacção que se vão sucedendo nos contextos diários, sociopolíticos da vida (Crawford, 1995). Como referem Hare-Mustin & Marecek (1990), a reafirmação de qualidades essenciais negligencia a complexidade e o dinamismo do comportamento genderizado que se estabelece no decurso das relações sociais, reificando um jogo de diferenças que estão sempre em mudança, em dualismos estáticos e exagerados (Hare-Mustin & Marecek, 1990).
A distinção entre os termos "sexo" e "género", sugerida e desenvolvida durante a segunda vaga do feminismo, foi uma tentativa (significativa) de separar o sexo biológico do sexo social — o género (Amâncio, 1994), e deste modo possibilitar a crítica social (Crawford, 1995). No entanto, a força cultural do essencialismo acabou por manter a distinção, dando lugar a confusão, inconsistência e problemas de terminologia. Isto é, novas diferenças sexuais, virtualmente idênticas às publicadas décadas atrás, começaram a ser e são etiquetadas como diferenças de género. Estas novas diferenças são iguais às antigas mas "vestidas" de outro modo, isto é, continuam a situar-se dentro dos indivíduos, a ser socialmente descontextualizadas e rapidamente biologizadas. Ironicamente, uma pretensão feminista que visava teorizar a construção social da masculinidade e da feminilidade, tornou-se precisamente na estratégia que a obscurece (Crawford, 1995).
Apropria noção de "psicologia da mulher" é essencialista, porque sugere que as mulheres (como grupo unitário) partilham uma psicologia (um conjunto de qualidades, traços e capacidades, inatas ou adquiridas) que, presumivelmente, lhes condiciona o comportamento (Hare-Mustin & Marecek, 1990e). Outra consequência importante é que, quando os traços estão localizados nos indivíduos, a responsabilidade da mudança passa a ser das pessoas e não da sociedade (Bohan, 1997).
Na psicologia, a perspectiva construcionista social do género pode ser incluída nas abordagens pós-modernas assumidas por Sandra Harding. Em contraste com uma perspectiva essencialista, o construcionismo social assume o género como uma construção social, um sistema de significados que se constrói e se organiza nas interacções e que governa o acesso ao poder e aos recursos (Crawford, 1995; Denzin, 1995). Não é, por isso, um atributo individual, mas uma forma de dar sentido às transacções: ele não existe nas pessoas mas sim nas relações sociais.
Os processos relacionados com o género influenciam o comportamento, os pensamentos e os sentimentos dos indivíduos, afectam as interacções sociais e ajudam a determinar a estrutura das instituições sociais (Crawford, 1995). Como o género é uma ideologia dentro da qual as diferentes narrativas são criadas, as distinções de género ocorrem disseminadamente na sociedade. O discurso do género envolve a construção da masculinidade e da feminilidade como pólos opostos e a essencialização das diferenças daí resultantes.
O construcionismo social (Gergen, 1982; 1994), assim como a filosofia de tendência pós-modernista (Flax, 1990) reconhecem a contradição como parte fundamental da realidade social, e isso é consistente com a argumentação de que categorias importantes como o sexo e o género podem funcionar com definições distintas e em simultâneo numa situação particular. Diferentes participantes, ou mesmo e apenas um só indivíduo, podem, no decorrer de uma interacção social, afirmar diferentes perspectivas de género, dependendo dos aspectos salientes das categorias no momento (Hare-Mustin & Marecek, 1990a).
Nesta perspectiva as pessoas desenvolvem o seu sentido de self, nos e através dos discursos disponíveis à sua volta (Burr, 1995; Shotter & Gergen, 1989), como acontece com o discurso do género. Sendo o conhecimento aquilo que concordamos ser considerado verdade num determinado contexto de relações sociais, é precisamente nesse processo de acordo que é criada a realidade de determinado fenómeno. O género não é um fenómeno que existe dentro dos indivíduos, pronto a ser descoberto e medido pelos cientistas sociais. Pelo contrário, o género é um acordo que existe nas interacções sociais: é precisamente aquilo que concordamos que seja (Hare-Mustin & Marecek, 1990; Unger, 1990). Em maior ou menor grau, tanto homens como mulheres acabam por aceitar as distinções de género visíveis a nível estrutural e que se estabelecem ao nível interpessoal, tornando-se tipificados do ponto de vista do género, ao assumirem para si próprios os traços de comportamento e papéis normativos para as pessoas do seu sexo, na sua cultura (Crawford, 1995). Para além desta internalização de traços, comportamentos e papéis, as mulheres internalizam também a sua desvalorização e subordinação (Crawford, 1995).
O género é, deste modo, uma invenção das sociedades humanas, uma "peça de imaginação" com facetas múltiplas: construir adultos (homens e mulheres desde a infância), construir os "arranjos sociais" que sustêm as diferenças nas consciências de homens e mulheres (divisão das esferas da vida privada/pública, por exemplo) e a produção de significado, em resumo, criar as estruturas linguísticas que modelam e disciplinam a nossa imaginação (Hare-Mustin & Marecek, 1990a).
Através da interacção, negociamos interpretações particulares, isto é, criamos significados. Através da linguagem, através da participação nos rituais da interacção social, através do nosso envolvimento activo com os símbolos e as realidades materiais da vida de todos os dias, nós literalmente criamos aquilo que reconhecemos como real. Um mínimo de compreensão das regras partilhadas e das realidades é necessário para sustentar a comunicação humana e a interacção e em última instância as sociedades (Howard & Hollander, 1997, p. 35).
Conforme referem estas autoras, o género é "performativo" podendo, por isso, dizer-se "que o género se faz.
O género, nesta perspectiva, é o significado que concordamos imputar a determinada classe de transacções entre indivíduos e contextos ambientais. Os factores que definem uma transacção particular como feminina ou masculina não são o sexo dos actores mas sim os parâmetros situacionais nos quais determinada performance ocorre. Ninguém pode ser considerado muito, pouco ou nada, feminino ou masculino; em contextos particulares, as pessoas fazem feminino e noutros possivelmente masculino (West & Zimmerman, 1987). Esta perspectiva pode ser compreendida se se pensar nas investigações que mostram, por exemplo, mulheres em posições de liderança serem consideradas "masculinas" (Nogueira & Amâncio, 1996), ou pais (homens) sozinhos comportarem-se de forma mais "feminina" que pais casados (Risman, 1987). A disjunção entre sexo e género evidenciada nestes dois exemplos ilustra como o género não é um traço inerente aos indivíduos, mas sim que qualidades usualmente vistas como relacionadas com o sexo dos actores são de facto determinadas pelos contextos. Desta maneira o género pode ser concebido apenas como o termo dado a um conjunto de interacções comportamento-meio envolvente, com as quais concordamos para caracterizar os membros de um sexo.
Assumindo esta perspectiva podemos questionar como certas interacções são consideradas femininas ou masculinas. Segundo Lott (1990), a resposta encontra-se nos contextos diferenciais das experiências. A exposição selectiva de homens e mulheres a contextos genderizados suscita comportamentos onde o sexo é compatível com o género, reforçando desse modo a percepção que o género é sexualmente diferenciado e sexualmente definido. Assim, o processo contínuo de fazer género recria a construção desse mesmo género. As mulheres são diferentes, por virtude de serem mulheres, mas paradoxalmente isso não acontece porque sejam mulheres. As exigências dos contextos sociais constituem os primeiros determinantes do comportamento de forma genderizada ( idem, 1990), sendo que este processo toma-se tão familiar que acaba por ser vivenciado como uma parte da maneira de ser: as pessoas percebem-se como intrinsecamente genderizadas porque o género inunda completamente as experiências. Esta identificação com a compreensão socialmente construída de género guia o comportamento, dirigindo as pessoas a conformar-se com as expectativas genderizadas e deste modo a fazer o género de uma forma compatível com a sua construção num determinada contexto social. Além disto, a experiência do género, como um aspecto da identidade interna e como uma qualidade "natural" das pessoas, corrobora a construção social do género como um traço intrapsíquico relacionado com o sexo.
Nesta perspectiva o género é também e essencialmente uma questão de poder, sendo possível reconhecer o seu papel na construção social desse mesmo género, na sua activação e na sua auto-sustentação reprodutiva (Hare-Mustin & Marecek, 1990; Kitzinger, 1994).
Conforme referimos no fim do ponto anterior, as abordagens construcionistas sociais e discursivas confrontam-se actualmente com a questão relativa às posições realistas ou relativistas, sendo que as grandes críticas apontam para a possibilidade de se assumir um relativismo extremo. Esta mesma situação toma-se de extrema importância quando nos referimos à construção social do género, já que este traz consigo a possibilidade (ou impossibilidade) de políticas feministas activas. Será que reconhecer a inexistência de categorias universais impossibilita a defesa da igualdade entre "mulheres" e "homens"? Como defender o feminismo face a uma pluralidade de identidades?
Tentando reflectir sobre esta problemática relativamente ao género, GUI (1995) oferece uma alternativa que nos parece ser, de momento, a mais útil aos propósitos de uma psicologia que não se quer convencional nem empiricista e de um feminismo que se pretende emancipatório. Como refere, os cépticos acabaram por reinstalar, paradoxalmente, em vez de desafiar, a noção de pesquisa livre de valores ou neutra, já que uma pesquisa desinteressada (ideal regulador dos relativistas) não parece ser muito distinta dos ideais dos pesquisadores positivistas. Uma posição relativista é extremamente problemática para as feministas e para todos aqueles interessados na transformação social, essencialmente porque nega os compromissos políticos na pesquisa. No entanto, a solução não passa por renegar o relativismo e abraçar novamente o realismo, acreditando que é possível obter conhecimento "correcto" acerca do mundo social; deve-se evitar que as escolhas recaiam numa polarização entre relativismo e realismo. Segundo a autora, é possível levar a cabo uma pesquisa "não neutra" que represente uma espécie de princípio fundador das perspectivas construcionistas e discursivas, uma espécie de relativismo sem vergonha de ser político, através do qual as feministas possam fazer das transformações sociais as preocupações explícitas do seu trabalho. Para isso será necessário reinventar um novo vocabulário de valores, com o qual se possam fazer intervenções políticas e sem o qual as feministas ficarão teórica e politicamente paralisadas perante as desigualdades, a injustiça e a opressão.
Para o estabelecimento de uma posição de princípio que represente um novo vocabulário de valores é necessário, por um lado, ter uma atitude relativamente cínica face ao abandono das "metanarrativas emancipatórias" (como é sugerido pelo movimento pós-modernista em geral e por Lyotard em particular), isto é, evitar cair no impasse que isso acarretaria. A solução parece estar numa articulação entre as ideias pós-estruturalistas e pós-modernistas e um projecto político emancipatório, que envolva a construção de uma posição que parta das vantagens de ambos os projectos. Para isso, Gill (1995) propõe a reflexividade, como uma posição que o(a) analista deve adoptar relativamente às suas posições e interpretações, que por sua vez devem ser explícitas, reconhecidas e reveladas, sendo desta forma o(a) responsável claro(a) pelas suas análises. Com esta proposta pretende-se criticar a aparente reflexividade dos(as) relativistas que, não colocando a perspectiva de valor, a qualidade e possibilidade de qualquer interpretação, acabam por proteger os seus argumentos do criticismo. Embora esta forma possa ser adequada, por exemplo, na literatura, nas ciências sociais essa posição pode ser perigosa, dando crédito a qualquer posição social e qualquer ideologia.
Em síntese, o que é necessário é uma espécie de relativismo ou cepticismo epistemológico que não evite ou faça desaparecer a questão dos valores. Os valores devem ser explicitados e colocados numa arena onde possam ser discutidos, o que implica que haja um repensar da noção de reflexividade. As perspectivas construcionistas sociais e discursivas devem adoptar uma reflexividade que enfatize a necessidade do(a) analista reconhecer os seus próprios compromissos e de reflectir criticamente sobre eles. Procurando explicar e justificar a base para as suas leituras ou análises, a análise do discurso torna-se responsável pelas suas interpretações e pelas suas consequências sociais e políticas (Gill, 1995).
Parece-nos que Parker (1992) faz uma leitura interessante desta problemática, quando assume, relativamente à análise do discurso, que o facto de esta se ter associado ao "quebrar" das ideias da psicologia moderna implicou tornar-se, ao mesmo tempo, uma análise problemática, mas também curiosa, útil, perigosa, libertadora e radical.
Assim, uma política de articulação feminista implica traçar ou delinear as dinâmicas do poder de diferentes discursos de feminilidade, investigar as maneiras como a comunidade das mulheres tem sido construída em diferentes contextos, questionar abertamente a formulação de discursos dominantes sobre as mulheres e evidenciar as alternativas até aí subordinadas (Wetherell, 1995).
No entanto, é vital trabalhar com a ambiguidade, e com a ambivalência, reconhecendo que a feminilidade é uma categoria negociável, que toma uma forma particular de identidade dentro de discursos contrastantes, e num determinado contexto histórico e cultural. Ao aceitar que não existe "algo" a ser descoberto, a feminilidade deve ser encarada como um método de descrição, não um atributo psicológico. Envolve viver com o conhecimento, desconfortável (para alguns), de que os discursos têm múltiplos usos e significados (Potter & Wetherell, 1987), com o facto de que nada é simples, nem existe um significado inerente às coisas, tudo é ambíguo.
A psicologia, como o feminismo, não é unitária, mas representa uma variedade de pontos de vista, métodos e áreas de estudo (Phoenix, 1990). A pesquisa conduzida pelas feministas tem muito a dar à disciplina da psicologia, apesar de não existir uma metodologia feminista que todas as feministas subscrevam. As feministas são distintas e têm diferentes perspectivas do feminismo. Esta diversidade afecta a pesquisa que elas escolhem fazer e os métodos que usam, existindo, no entanto, grandes temas com os quais as feministas parecem concordar (Phoenix 1990; Wilkinson 1986) e que normalmente implicam uma avaliação crítica do processo de pesquisa em si mesmo.
Concordamos com Kitzinger (1990) quando afirma que, tal como ser feminista significa ser responsável face a outras feministas pela psicologia que se faz, também ser psicóloga significa ser responsável face à psicologia pelo feminismo que se pratica. Identificando-se com os dois grupos, a autora pretende oferecer algo de positivo a cada um deles. Ao feminismo oferece as análises acerca dos perigos da psicologização que invade o movimento feminista, os criticismos e os conhecimentos (por dentro) de uma disciplina. E à psicologia oferece as análises acerca do papel da retórica dentro das ciências sociais, o assumir de uma perspectiva construcionista crítica como alternativa às abordagens positivistas-empiricistas e o conhecimento (por dentro) do feminismo. Apesar de considerar a etiqueta de psicologia feminista como uma contradição nos termos (no sentido de uma ciência neutra e objectiva), Celia Kitzinger considera-se "apaixonada" pelo comprometimento simultâneo com o feminismo e com a psicologia, já que o desafio intelectual e o impacto prático da pesquisa acabam por se situar no espaço criado pela própria contradição.
Conclusão
O nosso posicionamento situa-se claramente no contexto conceptual e de pesquisa metodológica crítica, na psicologia, e nos estudos de género, em particular. Nesta perspectiva questionam-se os factos apresentados pela disciplina como dados adquiridos e evidentes, assumindo-os como construídos dentro de narrativas especificamente culturais, regimes de verdade, padrões de poder ou formas de ideologia. Apesar de poder haver algum desacordo quanto aos melhores termos a usar e alguma ambiguidade quanto àquilo que uns referem como narrativas e outros como ideologia, os debates têm em si mesmos potencial suficiente para encetar a crítica à reificação (o risco do realismo) e à neutralidade relativa aos valores (o risco do relativismo) na psicologia tradicional. Todos os que partilham, de uma forma geral, destas abordagens compreendem como a psicologia reproduz, por exemplo, as noções de individualidade e de natureza humana, e procuram desconstruir esses discursos e transformá-los, isto é, construir algo diferente e socialmente libertador.
Conforme refere Ibahez (1996), é da nossa responsabilidade, enquanto psicólogas(os), eleger o conhecimento que queremos produzir: um conhecimento de tipo autoritário, alienante, normalizador, que passe a fazer parte dos múltiplos dispositivos de dominação ou, pelo contrário, um conhecimento libertador e emancipatório, que dê visibilidade às lutas das pessoas contra a dominação. Deve-se promover uma mudança radical; mas, para fazer da psicologia uma prática libertadora, é necessário começar a construí-la em oposição aos pressupostos que fazem dela uma arma de dominação.
Seguindo a sugestão de Potter (2000), parece importante que seja o que for que o novo século implique, a psicologia deve começar por estudar o que as pessoas fazem, isto é, pesquisar as práticas localizadas das pessoas humanas. Situando-nos numa perspectiva de psicologia feminista, concordamos com aquele autor quando diz que o grande desafio que estas perspectivas trazem reside no facto de mostrarem que, apesar da quantidade de pesquisa psicológica já produzida, todo o trabalho está ainda virtualmente por fazer
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Notas
1Toda a correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Conceição Nogueira, Departamento de Psicologia, Instituto de Educação e Psicologia, Campus de Gualtar, 4710 Braga. Portugal. Telefone: 253604241, Fax: 253678987; e-mail: cnogiep.uminho.pt