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Psicologia

versão impressa ISSN 0874-2049

Psicologia vol.28 no.1 Lisboa jun. 2014

 

Discursos socioculturais sobre o amor em Portugal: Um percurso geracional?

Sociocultural discourses about love in Portugal: a generational path?

Ana Rita Dias1, *, Carla Machado2, Rui Abrunhosa Gonçalves1, Celina Manita3

 

1 Escola de Psicologia, Universidade do Minho

2 Publicação póstuma

3 Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, Universidade do Porto

 

*Autor para correspondência

 

RESUMO

No presente estudo procuramos compreender a forma como os diferentes sujeitos conceptualizam e vivenciam o amor e as relações de intimidade. O estudo envolve 28 sujeitos, com os quais se conduziu uma entrevista individual sobre a história de amor da sua vida. Procedeu-se à contrastação do discurso dos jovens com o discurso dos adultos, de diferentes gerações, considerando também o estado civil e o sexo dos sujeitos. Identificam-se algumas especificidades, principalmente diferenças geracionais, que são discutidas sob o seu enquadramento histórico, social e político. Além das especificidades, identifica-se um discurso consensual sobre o amor, amplamente partilhado, bem como o retorno a concepções tradicionalistas e convencionais – com mais assimetrias e desigualdades relacionais, sobretudo, na população juvenil.

Palavras-chave: Repertórios; Amor; Relações; Gerações; Cultura.

 

ABSTRACT

In the present study we aim to understand how people conceptualize and experience love and intimate relationships. The study involved 28 subjects, with whom we conducted an individual interview about their lives’ love story. We compare the speech of young subjects and adults from different generations, also considering their civil status and sex. We found some generational differences and we discuss them under the different historical, social and political background. We conclude that there is a consensual discourse about love, widely shared, as well as a return to more traditional and conventional conceptions about love and relationships - more marked and with more asymmetry and inequality in the youngsters.

Keywords: Repertoires; Love; Relationships; Generations; Culture.

 

Vários autores (e.g., Hatfield & Rapson, 2005; Sternberg, 2006) indicam que o fenómeno do “amor” assume um papel importante na organização da sociedade, dado que as concepções sobre o amor estabelecem o que é adequado e desejável nas relações entre os indivíduos. Tem sido reconhecida, também, a dimensão construída do amor (Dias & Machado, 2011; Neves, 2007; Sternberg, 2006), em que as concepções, experiência emocional e vivência do amor dependem do período histórico, contexto social e especificidades culturais subjacentes à conceptualização do amor (Neves, 2007; Sternberg, 2006). A cultura fornece-nos grelhas de interpretação sobre o amor, influenciando a forma como o conceptualizamos e, estas conceptualizações constrangem as experiências de amor e a forma como as vivenciamos (Hatfield & Rapson, 2005). Assim, o amor não pode deixar de ser entendido no contexto histórico e cultural das suas significações (Dias & Machado, 2011; Neves, 2007; Sternberg, 2006), sendo os discursos e as práticas sociais (histórico e culturalmente construídas) que possibilitam que o amor “exista” da forma como “existe”, que seja sentido da forma como é sentido e que se expresse de determinadas formas (Dias & Machado, 2011; Giddens, 1992; Hatfield & Rapson, 2005).

Considerando a importância que as significações sobre o amor têm nas relações de intimidade, influenciando a forma como os sujeitos o experienciam e o expressam, a sua análise no contexto português não poderia deixar de ser alvo de análise. Os estudos em Portugal são poucos e, além disto, focados em populações muito específicas, como os agressores (Dias, Machado, Gonçalves, & Manita, submetido para publicação) e as vítimas (e.g., Neves, 2007) de violência doméstica, os adolescentes (Saavedra, Nogueira, & Magalhães, 2010) ou, ainda, no discurso dos media (e.g., Dias, 2006).

Assim, no presente artigo, assumindo uma perspetiva construcionista social, procuramos identificar e compreender os significados socioculturais sobre o amor e sua articulação com as práticas relacionais amorosas. Especificamente, pretendemos identificar as grelhas interpretativas socioculturalmente construídas e partilhadas que estão disponíveis para significar o amor e as relações de intimidade e analisar de que forma os sujeitos de diferentes contextos (geracionais, género, experiências relacionais) apropriam e adaptam estas grelhas interpretativas.

 

Revisão de Literatura

A análise teórica e empírica do fenómeno do amor por parte da psicologia tem uma história recente, não sendo alvo de interesse até meados do século XX (Berscheid, 2010) por se considerar que não podia constituir objeto de análise científica e que deveria ser delegado a outras áreas - como a literatura ou a filosofia (Weis, 2006). Maslow (1954) foi o primeiro a chamar a atenção para a necessidade da psicologia atender ao fenómeno, considerando-o central na vida das pessoas. Harlow (1958) e Bowlby (1969) constituem exceções, sendo os primeiros teóricos e investigadores na área da psicologia, havendo, também, por parte da psicologia social, algumas incursões sobre a atração interpessoal mas que acabaram por abordar muito pouco o fenómeno do amor (Lindzey & Byrne 1968, Berscheid & Walster 1969, citados por Berscheid, 2010).

Só a partir da década de 70 é que os estudos da área da psicologia avançaram de forma mais significativa (cf. Weis, 2006), começando a desenvolver-se escalas e instrumentos para avaliar o fenómeno. Assim, à medida que o tema foi tendo maior aceitação pela comunidade científica, a investigação e as teorias proliferaram, sobretudo nas duas últimas décadas (Weis, 2006). Da análise da literatura sobre o tema (cf. Dias & Machado, 2011), identificam-se várias abordagens teóricas e linhas de investigação:

(i) As abordagens inscritas nos paradigmas positivistas e pós-positivistas – que vão desde as teorias biológicas e evolucionistas (Weis, 2006), que defendem que o amor é uma componente instintiva da natureza humana e que é regulado por necessidades de reprodução, segurança e sobrevivência, passando pelas teorias estruturalistas/funcionalistas, que enfatizam o papel dos processos e estruturas sociais na formação e expressão das emoções e do amor (Cancian & Gordon, 1988; Torres, 2001), devendo este ser analisado como expressão das relações sociais (Torres, 2001), até às teorias taxonómicas, que postulam tipologias de amor universais recorrendo a metodologias quantitativas (questionários ou escalas) para “medir” ou quantificar o fenómeno em termos de atitudes, crenças, cognições e comportamentos (e.g., Fehr, 2006; Sternberg, 1986, 1988a, 1998b, 1997, 1998a, citados por Sternberg, 2006).

(ii) As abordagens que se inscrevem no paradigma pós-moderno, as perspetivas críticas e construcionistas, que conceptualizam o fenómeno do amor como intimamente dependente das práticas e discursos socioculturais, equacionando a dimensão cultural como constitutiva e indissociável do fenómeno (e.g., Hatfield & Rapson, 2005; Wetherell, 1995). Estas abordagens recorrem, por um lado, a estudos socioculturais comparativos (Hatfield & Rapson, 2005; Schmitt, 2006) e, por outro, a estudos qualitativos com amostras mais específicas e reduzidas (Neves, 2008; Wood, 2001).

De uma forma global, o amor tem suscitado cada vez mais maior interesse por parte dos investigadores na área da psicologia, nomeadamente, a análise e determinação do papel do amor nas relações. Assim, assistimos a estudos que indicam o amor como condição essencial para o estabelecimento de relações de compromisso, nomeadamente, o casamento (Simpson et al., 1986, citado por Berscheid, 2010), a ausência ou o declínio do amor como a principal causa (e.g., Gigy & Kelly, 1992) ou o fator mais preditivo da dissolução das relações (Gottman & Levenson, 2000) ou ainda a procurarem analisar a possibilidade de - e em que condições – o amor permanece em relações a longo prazo (e.g., Acevedo & Aron, 2009).

Assim, tem havido um investimento na análise do desenvolvimento do fenómeno, de compreender o seu processo, evolução e trajetórias. Berscheid (2010), por exemplo, defende a necessidade de novas abordagens no estudo do amor, referindo que, para uma melhor compreensão do fenómeno, há que atender ao seu processo de mudança e ao facto das relações serem temporais, sugerindo uma abordagem temporal do amor através de estudos longitudinais.

Além disto, verifica-se também o interesse pela análise do amor e das relações amorosas ao longo das várias etapas da vida (e.g., Antonucci, Akiyama, & Takahashi, 2004). Por exemplo, Akiyama e colaboradores (2004), num estudo comparativo entre os Estados Unidos e o Japão, com participantes entre os 13 e os 96 anos, concluíram que em ambos os países as interações positivas nas relações tendem a manter-se estáveis ao longo da vida, enquanto as interações negativas tendem a diminuir, referindo que tal se deve ao incremento da maturidade social, da familiaridade e da frequência dos contactos (citados por Antonucci et al., 2004).

No entanto, é a fase da adolescência que tem sido alvo de maior investigação, sendo considerada uma etapa fulcral para o desenvolvimento de competências que determinarão a qualidade das relações na vida adulta (Haugen, Welsh, & McNulty, 2008). Assim, investigadores de diferentes tradições metodológicas têm-se dedicado à análise da dimensão desenvolvimental das relações amorosas - os processos específicos envolvidos no estabelecimento, desenvolvimento e qualidade das relações românticas dos/das adolescentes, o seu significado e funcionamento (e.g., Furman & Shomaker, 2008; Galliher, Enno, & Wright, 2008).

Apesar da conclusão partilhada de que existem especificidades nas interações românticas dos/das adolescentes comparativamente às outras relações que estabelecem (e.g., Furman & Shomaker, 2008) e continuidade entre as experiências relacionais adolescentes e as adultas (Raley, Crissey, & Muller, 2007), os resultados são díspares: alguns apontam para interações que se caracterizam pela maior conflitualidade, menor responsividade afetiva face ao parceiro e menores competências comunicativas (Furman & Shomaker, 2008); outros indicam interações globalmente positivas e com evitamento de tópicos potencialmente conflituosos e sentimentos negativos nas suas interações (Galliher et al., 2008). No entanto, a maioria aponta para uma minimização das interações negativas e para uma tendência de os/as adolescentes avaliarem positivamente as suas relações amorosas e os comportamentos do parceiro (Furman & Shomaker, 2008; Galliher et al., 2008), na tentativa de “proteger” as suas relações, principalmente os/as adolescentes mais novos/as (Galliher et al., 2008).

Também, no estudo do amor e da intimidade, as questões de género têm sido consideradas relevantes, principalmente no âmbito da análise dos fatores socioculturais (Dias & Machado, 2008; Santos & Amâncio, 2002; Saavedra et al., 2010). O género refere-se às expectativas e comportamentos socialmente aprendidos e construídos que se associam a cada um dos sexos, fornecendo à mulher e ao homem diferentes “guiões” de conduta, de normas e de valores que influenciam as relações que estabelecem (Amâncio, 1998; Neves, 2007; Santos & Amâncio, 2002). Assim, as construções socioculturais de género influenciam a forma como a mulher e o homem significam e vivem as relações de intimidade que, como vários estudos indicam (e.g., Alferes, 1997; Santos, 2004; Santos & Amâncio, 2002), é marcadamente desigual. A investigação, neste âmbito, indica que os papéis e os estereótipos tradicionais de género têm sustentado manifestações de intimidade assimétricas e diferenciadas, em que as relações são pautadas por um duplo padrão moral e sexual que diferencia os comportamentos femininos e os masculinos: incentivam-se, permitem-se ou toleram-se determinados comportamentos no homem (pró-atividade nas relações, iniciação sexual precoce, dissociação entre sexo e amor, vários relacionamentos e relações pré-matrimoniais) que, por sua vez, são proibidos, negados ou censurados na mulher (Alferes, 1997; Pais, 1998; Saavedra et al., 2010).

Procedendo a uma análise transversal dos estudos, apesar da vasta investigação, consideramos que o estudo do fenómeno, em si, tem sido negligenciado. Como vimos, há estudos que se centram na “formalização” do amor, analisando-o no contexto da constituição, manutenção, sucesso/insucesso e qualidade das relações, principalmente as maritais (no caso dos adultos) e as de namoro (no caso dos adolescentes) – o amor é apenas considerado como variável que leva à união/casamento ou cuja diminuição/ ausência acarreta a dissolução das relações/divórcio. Além disso, mesmo quando se procura analisar o fenómeno ao longo das várias etapas da vida ou se focam fases específicas (como a adolescência), a dimensão sociocultural do fenómeno tem sido obscurecida – os poucos estudos existentes (e.g., Furman et al., 2008; Galliher et al., 2008) procedem a uma abordagem comparativa ou referem especificidades mas, na sua maioria, sem uma análise aprofundada do seu enquadramento cultural que contribui para as diferenças ou especificidades encontradas.

Mesmo os estudos feministas sobre o amor (e.g., Jackson, 2001; Neves, 2007; Towns & Adams, 2000; Wood, 2001) - de carácter narrativo e que exploram mais a dimensão construída e sociocultural do fenómeno – são, maioritariamente, desenvolvidos no âmbito da violência na intimidade e acabam por abordar a questão cultural de forma muito circunscrita: limitam-se à exemplificação de determinados ideais de romantismo e aos papéis de género associados, reduzindo a dimensão cultural à estrutura social genderizada pelo foco exclusivo nas desigualdades de género e nas relações de poder (e.g., Jackson, 2001).

No entanto, são os estudos e análises culturais que mais sustentam a leitura construcionista social do fenómeno do amor, nomeadamente a sua especificidade histórica e cultural: de que a experiência do amor é modelada pelos padrões culturais, pelo que não deve ser aceite como algo intrínseco, natural ou predeterminado, mas que deve ser alvo de análise crítica e desconstrução. Assim, conceptualizamos o amor como construção social através das práticas e discursos culturais (Jackson, 2001; Towns & Adams, 2002; Wetherell, 1995) e, assumindo uma perspetiva construcionista social, procuramos analisar discursivamente o fenómeno do amor, de modo a conseguir apreender a sua dimensão “sociocultural” e construída. Neste sentido, a análise do discurso sobre o amor e as experiências amorosas permite-nos compreender como aqueles fenómenos são construídos e reproduzidos através da linguagem, sendo a metodologia qualitativa mais congruente com a perspectiva construcionista social (Holt, 2011; Wiggins & Riley, 2011), a qual postula as seguintes premissas (Burr, 2003; Wiggins & Riley, 2011):

(i) Como toda a vida social, o amor e as relações amorosas são feitos no discurso, ou seja, o discurso é fundamental no modo como vivemos o amor e experienciamos as relações amorosas; as ações ou práticas amorosas que executamos devem ser entendidas sob os conhecimentos e as interações prévias que foram produzidas através do discurso.

(ii) O discurso sobre o amor é performativo, faz o fenómeno. Aqui, a linguagem é fundamental: não é uma forma neutra de descrever o amor, mas uma forma de, ativamente, o construir em interação (Burr, 2003; Holt, 2011); a linguagem é entendida não no sentido linguístico (com foco na gramática, pontuação ou aspetos técnicos do sistema da linguagem) (Wiggins & Riley, 2011) mas no sentido da significação - como elemento construtor de significados, em que as palavras que são usadas para construir os pensamentos e as ideias sobre o amor estão embebidas e assentam em valores sociais, culturalmente partilhados e construídos.

(iii) O amor é múltiplo, ou seja, há várias formas de compreender o amor e não apenas uma, pelo que o “amor” pode ser descrito sob diferentes versões para dar sentido ao fenómeno e às experiências amorosas. Assim, é a possibilidade de podermos construir diferentes versões sobre o mesmo fenómeno que se torna particularmente relevante, fazendo-nos questionar o porquê de determinada versão e não outra e, mais ainda, quais são as consequências de usar determinada versão em detrimento de outra (Wiggins & Riley, 2011; Wetherell, 1998).

Deste modo, conceptualizamos o amor como um sistema de significados que se constrói e organiza continuamente através dos discursos e interações sociais, tendo repercussões nas práticas relacionais (Wetherell, 1995; Wood, 2001; Jackson, 2001). Nesta lógica, o conceito que nos parece melhor para operacionalizar a articulação entre cultura e subjetividade, e que utilizaremos neste estudo, é o de “repertório interpretativo” (Potter & Wetherell, 1987; Wetherell & Potter, 1988) - tendo sido utilizado noutros domínios conceptuais, como o racismo (e.g., van Dijck, 1995), os discursos científicos (e.g., McKinlay & Potter, 1987), etc. Potter e Wetherell (1987, pág. 138) descrevem os repertórios interpretativos como “building blocks speakers use for constructing versions of actions, cognitive processes, and other phenomena (…) basically a lexicon or register of terms and metaphors drawn upon to characterise and evaluate actions and events”. Assim, tratam-se de recursos culturalmente disponíveis e partilhados que permitem aos sujeitos fazerem sentido dos fenómenos e das experiências, pelo que adoptamos esta componente de análise.

Em síntese, é na dimensão “construída” do amor que reside a sua dimensão sociocultural, não se podendo compreender a experiência humana do amor sem considerar o sistema social, histórico, cultural e político onde se insere (Dias & Machado, 2011; Giddens, 1992). Assim, partindo do princípio teórico de que os sujeitos constroem as suas versões do mundo a partir da “seleção do leque de grelhas interpretativas disponíveis na cultura” (Sasson, 1995, p.10), o principal objetivo do estudo prende-se com a identificação e compreensão das grelhas interpretativas culturalmente disponíveis para conferir significado ao amor e às experiências amorosas.

Sendo os discursos simultaneamente constitutivos e construídos dentro das práticas sociais (Burr, 2003; Holt, 2011; Potter, Edwards & Wetherell, 1993), o segundo objetivo pretende identificar de que forma as grelhas interpretativas são aprofundadas e transformadas pelos/as diferentes participantes e de que forma tais significações se relacionam ou constrangem as suas experiências de amor. Para tal, procederemos à contrastação do discurso dos/das jovens atuais com o discurso dos/das adultos/as de diferentes contextos geracionais, considerando, também, os diferentes estados civis/estados relacionais e o sexo dos/das participantes.

Finalmente, dado que acreditamos que o discurso tem um papel constitutivo da “realidade”, sendo performativo (Holt, 2011; Sasson, 1995), pretendemos refletir criticamente sobre as implicações da construção sociocultural dos discursos sobre o amor na vivência da intimidade dos diferentes grupos de participantes.

Para uma melhor definição do âmbito e foco do presente estudo, procedemos à formulação das questões mais específicas que orientaram a análise dos dados.

Questões orientadoras:

1. Quais os repertórios interpretativos sobre o amor que os/as jovens e adultos/as utilizam para significar a experiência do amor e das relações de intimidade? Podemos identificar diferenças entre a população juvenil e a população adulta? O estado civil dos/das participantes adultos/as, constrange o seu discurso? Se sim, em que sentido – aproxima-o ou distancia-o do discurso dos/das jovens?

2. Podemos identificar diferenças geracionais específicas entre a população adulta? Se sim, em que gerações e em que consistem essas diferenças? Aproximam ou distanciam os discursos dos da população juvenil?

3. Podemos identificar diferenças entre os discursos apresentados pelos homens e pelas mulheres? Existindo discursos significativamente diferentes entre os homens e as mulheres, são transversais em termos de gerações ou variam?

De uma forma global, pretendemos compreender se existe multiplicidade de construções discursivas sobre o amor e as relações de intimidade e, a existir, o que diverge nas construções e se há pontos de consenso; ou, pelo contrário, se existe marcadamente uma construção discursiva consensual.

 

Metodologia

Participantes

Como já foi referido, no presente estudo interessa-nos compreender os discursos socioculturais sobre o amor, considerando o contexto histórico, sociocultural e político onde se inserem/desenvolvem. Para tal, o foco central é a análise em profundidade dos discursos dos/das participantes que passaram por períodos histórico, sociais e políticos distintos em Portugal sem, no entanto, desconsiderar outras características importantes, tais como o género e as experiências relacionais (estado civil) dos participantes (ver Tabela 1). Assim, tivemos em consideração os seguintes critérios de inclusão:

 

 

(i) Considerando que a adolescência/juventude tem sido apontada como uma etapa fulcral onde se iniciam e desenvolvem as primeiras interações e interesses românticos (Haugen, Welsh & McNulty, 2008), definimos como principal critério para o processo de seleção dos/das participantes o contexto histórico e social em que os/as participantes vivenciaram esta fase, procurando abranger as diferentes fases significativas do recente percurso histórico e político de Portugal e consequentes transformações nas práticas e discursos culturais. Assim, os/as participantes foram selecionados/as de acordo com os seguintes parâmetros: participantes que vivenciaram a juventude na época ditatorial, antes de abril de 1974 (faixa etária 53 anos ou mais2); participantes que vivenciaram a juventude na época pós-ditatorial, no período de transição (de 1975 a finais de anos 80, faixa etária 40-523); participantes que vivenciaram a adolescência nos anos 90, época de grandes e rápidas transformações sociais e culturais (faixa etária 26-394) e os/as jovens atuais (faixa etária 15-255), numa época ainda de transformação e de grande multiplicidade e, até, ambiguidade nos discursos e práticas.

(ii) Para conseguirmos uma estrutura de participantes mais equilibrada em termos de sexo, dado que as questões de género têm sido consideradas relevantes no estudo dos discursos e mudanças culturais (Dias & Machado, 2008), incluímos o mesmo número de homens e mulheres em cada grupo etário estabelecido.

(iii) Por outro lado ainda, tratando-se de um estudo qualitativo, cuja seleção dos/das participantes não se baseia nos critérios da representatividade mas que é feita de acordo com critérios que possam gerar novas ideais e perspetivas, procurámos a maior diversidade possível em termos de experiências relacionais, pelo que considerámos os diferentes estados civis dos/das participantes adultos/as (casados/as ou em união de facto, divorciados/as e solteiros/as) e os diferentes estados relacionais dos/das jovens (numa relação de namoro, saíram de uma relação de namoro, sem história de relação).

 

Material/Instrumento

Utilizou-se a entrevista semiestruturada “A história de amor da sua vida” (Machado & Dias, 2007), adaptada do guião da entrevista The Life Story Interview. de McAdams (1995). Através deste instrumento, onde era pedido que identificassem e contassem a história de amor da sua vida, obtivemos as suas narrativas sobre o amor e as relações de intimidade, focando os vários tópicos: resumo da história, capítulos da história, momentos importantes (e.g., momento alto, momento baixo, ponto de viragem), desafios, futuro (o melhor futuro possível, o pior futuro possível) e ideologia pessoal (valores e crenças pessoais).

Apesar desta estrutura prévia, as questões foram formuladas de forma a permitir que as narrativas fluíssem de acordo com os interesses dos/das participantes (e.g., “E o que é que pensa sobre o que acabou de me contar?”; “Como se sentiu face a isso?”), explorando-se os pensamentos, os comportamentos, as emoções e os contextos situacionais dos relatos. Assim, apesar de se aplicar todos os tópicos do guião, a ordem e organização do material varia de entrevista para entrevista.

Procedimentos

Para aceder aos participantes, procedeu-se à divulgação do estudo na zona Norte e Centro do País em Juntas de Freguesia, em Associações (e.g., sociedades recreativas, musicais) e em Centros de Formação, bem como se fez uso de contactos informais e da técnica snowballing, considerando as diferentes características dos/das participantes que pretendíamos (idade, estado civil, sexo). As entrevistas foram realizadas nas instalações disponibilizadas pelas instituições que encaminharam voluntários/as para o estudo e nas instalações do Serviço de Consulta da Escola de Psicologia da Universidade do Minho. Foi redigido o consentimento informado, dando a conhecer os objectivos do estudo e todos os procedimentos seguintes (gravação, transcrição, análise e divulgação dos resultados), garantindo o anonimato dos/das participantes. Não houve casos de desistência ou recusa. Todas as entrevistas foram conduzidas pela investigadora responsável pelo estudo, variando o tempo de duração entre os quarenta e cinco minutos e as duas horas e meia. As entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra, no sentido de preservar a integridade dos relatos.

 

Estratégia analítica

Após a transcrição, todas as entrevistas foram codificadas individualmente, codificando-se todo o material recolhido. A unidade de análise é o argumento, ou seja, o conjunto de ideias, significados ou imagens que os participantes pretendem apresentar através das palavras num determinado extrato, não se limitando à frase ou ao parágrafo (Wiggins & Riley, 2011). Na primeira fase da codificação, procedeu-se à categorização dos relatos por temas: “Amor e relações amorosas” e “Outros temas contingentes”( e.g., filhos, trabalho, escola, etc.). Seguidamente, o foco de análise dirigiu-se para o relato categorizado no tema “Amor e relações amorosas” e, no sentido de manter o foco, conduzimos a análise de acordo com as nossas questões de investigação. Tendo em conta o background teórico, descrito na revisão da literatura, a identificação e análise de repertórios interpretativos é a principal componente metodológica da análise do discurso a que precedemos (Wetherell, 1998), seguindo os procedimentos indicados por Potter e Wetherell (1987) e Wiggins e Riley (2011).

Recorremos ao software NVivo 9.0 (QSR, 2010) para o processo de organização, codificação e análise dos dados. Este instrumento foi concebido para organizar e gerir os dados, permitindo-nos importar todas as entrevistas para o programa, associar os atributos ou características dos/das participantes (e.g., sexo, idade, estado civil, etc.), categorizar o conteúdo e criar hierarquias de significados e auxiliar o processo de exploração e análise. O uso de algumas das suas funcionalidades, auxiliou-nos na busca e identificação de padrões ou ligações entre os dados, na identificação de similaridades e diferenças, na contrastação entre os diferentes grupos de participantes, na identificação das categorias mais salientes, etc. Além disto, permitiu-nos movimentar mais facilmente entre os vários níveis de análise, desde a leitura dos dados, passando pelas categorias, até à classificações mais conceptual dos repertórios.

 

Resultados

No sentido de facilitar a leitura e compreensão dos resultados, procedemos, em primeiro lugar, à descrição global dos repertórios interpretativos e, de seguida, passaremos à descrição e discussão dos resultados, seguindo as questões orientadoras, anteriormente definidas. Recorreremos a extractos dos relatos dos/das participantes para ilustrar a análise e discussão.

Repertórios Interpretativos sobre o Amor e Temas associados

Nas entrevistas selecionou-se todo o discurso dos participantes referente ao amor e às relações de intimidade, identificando-se cinco Repertórios Interpretativos: 39.27%6 do discurso sobre o amor remete para o Amor Companheiro, 29.47% para o Amor Romântico, 18.94% para o Amor Pragmático, 6.99% para o Amor Apaixonado e 5.32% para o amor Game-Playing. Procedendo a uma análise global, verificamos que o repertório amor companheiro é o mais utilizado, seguindo-se o amor romântico.

O repertório amor companheiro associa o amor às noções da amizade (“Uma relação tem que ter uma forte componente de amizade, as pessoas têm que ser amigas e respeitar os valores da amizade.”) e do companheirismo (“Acho que o companheirismo entre os dois. O amor pode ter muita força mas sem o companheirismo…”), em que a relação assenta na cumplicidade (“A relação de amor é uma relação de cumplicidade, é uma relação de solidariedade, é uma relação de honestidade, é uma relação que nos faz sentir bem, que nos sentir confortáveis.”), na afinidade (“Conseguir estar muito próximos e ter uma afinidade muito boa um com o outro.”), na ajuda e compreensão mútuas (“Cada um deve estar para ajudar o outro”; “Além do amor, acho que tem de haver compreensão e ajuda mútua, é indispensável.”), na aceitação e na procura de entendimento através do diálogo (“Respeitar a opinião, mesmo não concordando mas temos que respeitar. Respeitar em todas as situações, deixar falar, saber ouvir, dialogar”). Enfatiza a importância da comunicação, do conhecimento entre os parceiros e da partilha comum de experiências, de emoções e de valores básicos (“Espero e acredito na partilha de sentimentos, na partilha das emoções, boas ou más.”; “Partilha de valores, terem valores comuns.”). Como valores básicos, surgem a sinceridade, a confiança, a honestidade e, principalmente, a fidelidade e o respeito, que não devem ser quebrados para manter a relação (“Acho que o primeiro valor é a confiança. Se calhar está ligado à confiança o respeito.”; “Acredito na fidelidade, de ambas partes.”).

O repertório amor romântico remete para o guião tradicional, que associa o amor a uma relação de compromisso e duradoira, que se inicia no namoro e culmina no casamento - conceptualizado como o percurso normal, a consumação do amor e uma fonte de felicidade - (“O momento mais feliz, para mim, foi o dia do nosso casamento. Foi o resultado do nosso amor e acho que veio solidificar ainda mais a nossa relação, acho que sim.”) e prescreve a iniciativa masculina (“A melhor coisa a fazer é agarrar o boi pelos cornos e, nestas questões sentimentais, amorosas, é não deixar andar no chove e não molha. Temos que partir logo… partir logo. É ela que eu quero, vou lutar por isto, vou agarrar…».”) e a passividade feminina (“Nós tivemos uma conversa onde ele se declarou. Mas eu, também, já sabia… estava à espera que ele desse o primeiro passo, é assim que deve ser.”) no estabelecimento da relação. Este guião tradicional inclui a fase cor-de-rosa (“Olhe, eu digo-lhe, o momento feliz: foram todos! Todos os minutos que eu estava com ele parece que tinha o mundo aos meus pés. Parece que tudo brilhava à minha frente”), onde há uma extrema idealização do parceiro e da relação, bem como a expectativa do final feliz: ficar juntos, casar e constituir família (“…apesar de ser uma história com cinco meses e meio, é uma história que eu gostava que durasse, pelo menos, cinco séculos e meio, não é! Porque. E ser feliz! Gostava imenso de fazer uma vida com ela, ter um filhote.”). Destaca-se ainda o “imperativo do amor”, caracterizado globalmente pela expectativa e pressão social para ter uma relação e pelo estigma de não ter uma relação, ou alguém, em termos românticos (“Com a idade a gente começa a sentir alguns problemas de solidão ou de desajustamento social. Embora eu, socialmente, não deixe isso transparecer muito.”; “Há momentos que imagino, se eu tivesse alguém, as coisas seriam super diferentes.”).

Este repertório veicula a crença “fatalista” do amor verdadeiro e da existência da pessoa certa (“O amor, quando é amor, é para sempre.”; “Era ter alguém ao meu lado, o chamado amor verdadeiro, o amor para toda a vida.”), da cara-metade, conceptualizada como complemento e fonte de equilíbrio (“Acho que ele é a minha cara metade. Acaba por ser, um bocadinho, metade daquilo que eu sou.”; “Têm que estar os dois a par. Como temos duas pernas, é mais fácil andar com duas pernas do que andar a coxear…. Dá-nos um equilíbrio”.). Verifica-se, neste repertório, uma valorização do “romantismo”, do sentimento “amor”, enfatizando o amor como o mais importante e a base da felicidade.

Por fim, destacam-se ainda duas metáforas: (i) a metáfora do amor vencedor, em que perante os obstáculos ou problemas, os parceiros conseguem ultrapassá-los, porque juntos os enfrentam e com amor (“Houve muitos problemas… mas nós estávamos sempre os dois a apoiar-nos mutuamente e, corresse como corresse, não íamos dar tanta importância. O que importava era o que sentíamos.”); e a metáfora “efeito cupido”, no sentido de, quando ou com quem menos se espera, o amor surge naturalmente, sendo capaz de unir, ou esbater, as diferenças (“Havia alguma antipatia e uma dissonância muito grande. Se quiser procurar duas pessoas muito diferentes é o que nós éramos. Duas pessoas muito diferentes, com objetivos diferentes na vida, características diferentes e, portanto, que nunca pensariam que poderia entre elas haver um entendimento a outro nível.”).

O repertório amor pragmático apresenta uma conceptualização do amor e das relações mais racional, ponderada e, até, calculada, sendo maioritariamente utilizado como contraponto a outros repertórios, mais “idealistas”, e após o balanço das experiências relacionais. O amor é conceptualizado de forma mais fluida e flexível, considerando a possibilidade de vários amores ao longo da vida, a vulnerabilidade do amor e das relações às contingências, bem como a possibilidade do amor acabar e da dissolução das relações (“Não acho que haja o grande amor, nem acho que tenha que ser para sempre. Aquela expressão do Vinícius, «O amor é eterno enquanto dura» é uma expressão que, em mim, faz muito sentido enquanto uma pessoa está muito envolvida. Portanto, é eterno enquanto dura.”).

Inclui principalmente a noção de aprendizagem, insight ou amadurecimento, resultante das experiências relacionais, prescrevendo a prudência e precaução no âmbito relacional e afetivo (“As pessoas estarem sempre com alertas, estudar bem a pessoa.”; “O modo como vejo as relações foi 90% marcada pelo que se passou. E perdi completamente, perdi completamente os ideais românticos. Acho que as coisas são práticas, o dia a dia é prático, e tudo na vida funciona assim.”).

A iniciação e investimento na relação surgem neste repertório como o resultado de uma análise ponderada das condições pessoais e materiais dos parceiros (“E passado pouco tempo, de facto, tanto ele como eu, percebemos que era aquilo que queríamos… e, lá está, casámos! Aquela fase de apalpar um bocadinho o terreno e perceber se, de facto, é aquela pessoa. Depois analisar as condições para um projeto de vida, de toda aquela fase que se prolongou durante bastante tempo, de termos condições para o fazer.”), da listagem de atributos desejáveis no/na parceiro/a (“Nas vertentes pessoais, era uma pessoa brilhante do ponto de vista intelectual, uma pessoa que tinha sempre assunto para conversar …”; “Depois com o meu marido, como era um pessoa muito reta, eu achei que tinha ali o meu porto seguro. E foi mesmo isso que me levou a casar.”), bem como a manutenção ou término da relação depende do balanço das vantagens e das desvantagens da relação, para o/a próprio/a (“Perceber «isto é muito forte, muito intenso, mas o mal que provoca é superior ao bem que alguma vez na vida tirarei daquilo», até, de facto, se tomar a decisão de interromper este relacionamento porque estava a tornar-se complicado de gerir.”).

O repertório amor apaixonado é menos frequente, surgindo muito pontualmente ou em participantes muito específicos (como os/as jovens e os/as adultos/as solteiros/as). O amor é conceptualizado como uma alteração do estado normal, em termos cognitivos, emocionais e físicos (“Aquela coisa… assim… aquele calor a subir por nós acima! O coração a bater muito forte! Foi emocionante mesmo!”), associando-se às noções do “amor-cego” (“acho que grande paixão é um encantamento. De repente, o pessoal fica cego para tudo o que está na periferia e só vê aquele objeto de interesse de desejo e, durante um período de tempo, está tudo concentrado.”) e do amor “à primeira vista” (“até ter encontrado agora uma miúda que eu pensei que ia ser ocasional e que houve um “click” e, atualmente, é minha namorada”). Valoriza a aparência física (“ela também era extremamente bonita, uma pessoa extremamente física - ela tinha sido modelo, loira, muito vistosa - e a relação iniciou-se e solidificou-se numa parte física.”), enfatiza a ativação física e sexual (“em qualquer relacionamento, a atração física é a primeira coisa. Tem que haver logo algum… tem que haver aquele magnetismo, aquela química.”) e a noção da paixão “incontrolável” (“Sentes aquela atração completamente louca e obstinada por uma pessoa. Em que tu não consegues explicar por que é que aquilo acontece, não consegues explicar.”).

Por fim, o repertório amor game-playing é o menos frequente, concebendo as relações como um jogo, sem investimento emocional e sem compromisso. Surge maioritariamente associado às relações fugazes, volúveis e passageiras (“Nestas pequenas relações, não são relações, são apenas momentos em que uma pessoa tem aquela parte física, aquela parte sentimental mais distanciada. E depois voltamos ao nosso espaço, que é porreiro: uma pessoa chega a casa a que horas quer, fala com quem quer, não deve explicações a ninguém e não há cá controlos, não há cá responsabilidades com nada. Isso é espetacular!”) conceptualizando-as como relações de “não amor”, limitadas ao jogo da sedução e da conquista. Inclui a prescrição de aproveitar o momento e evitar o compromisso (“Eu, neste momento, o que eu faço: não tenho qualquer relação porque quero curtir a vida ao máximo, quero aproveitar de tudo para, um dia, mais tarde, sossegar um bocadinho e acalmar. E, depois, então conseguir manter algum tipo de relação”), veiculando, até, até a objetificação do/da parceiro/a em prol da satisfação pessoal (“Neste momento, quero é curtir a vida, aproveitar ao máximo, tirar o máximo possível da mulher.”).

Contraste entre os discursos da população juvenil e os da população adulta

Tanto os/as jovens como os/as adultos/as fazem uso de todos os repertórios, anteriormente descritos, mas, no entanto, os repertórios assumem padrões de relevância e utilização diferentes. Assim, o repertório amor romântico é o mais utilizado pelos/as jovens (39,62%), seguindo-se o companheiro (24,61%) e o apaixonado (14,62%) (Tabela 2).7

 

 

Os/as jovens, na sua maioria, utilizam o repertório romântico ao longo de toda a sua história: como ponto de partida para a história (fase cor de rosa, idealização da relação), na conceptualização/superação das dificuldades ao longo da história (metáfora “amor vencedor” e minimização/negação dos problemas), como prescrição para a manutenção da relação (noção de que o amor basta) e como projeção no futuro (expectativa do “final feliz”). Alternam com o repertório amor companheiro, nomeadamente na descrição do aprofundar/melhorar a relação, recorrendo à noção do entendimento e diálogo, que reforça a crença na mudança da relação. O repertório amor apaixonado está mais presente nos/nas jovens, principalmente a noção da alteração do seu estado normal devido à intensidade do amor, servindo para justificar/aceitar comportamentos menos ponderados ou mais impulsivos quando confrontados com problemas relacionais, tais como “cometia uma loucura, ficava fora e mim”, no caso de ser alvo de infidelidade, ou “são ciúmes, ele não estava a pensar bem”, no caso de comportamentos de controlo sobre a parceira.

Por seu turno, o repertório amor companheiro (42,53%) está amplamente disseminado nos/nas adultos/as, seguindo-se o romântico (27,22%) e o pragmático (20,55%). Os/as adultos/as utilizam, maioritariamente, o repertório companheiro como prescrição para manter e gerir a relação, recorrendo ao romântico como ponto de partida e como projeção no futuro (a crença no “verdadeiro amor/pessoa certa” e a noção do “efeito cupido”). Como contraponto ao romântico, alternam com um discurso mais ponderado e racional, nomeadamente no que diz respeito à listagem de atributos desejáveis para a escolha do/a parceiro/a e à análise das condições para o estabelecimento/consolidação da relação. Por fim, apesar do repertório game-playing ser o menos utilizado por ambos, está mais presente nos/nas jovens (9,53%) do que nos/nas adultos/as (4,39%), principalmente a noção de aproveitar o momento e de adiar o compromisso.

No que diz respeito a aspetos mais específicos dos discursos, verifica-se que existe um maior número de significados que são mais específicos da população adulta, não surgindo na população jovem, e outros significados que só estão presentes na população jovem. Por exemplo: a população adulta veicula, no repertório romântico, a valorização das manifestações de “romantismo” e, no repertório companheiro, defende a noção da reciprocidade na relação, conceptualiza o amor como construção e enfatiza a noção da partilha de experiências, emoções e valores para alicerçar e manter a relação; por sua vez, na população jovem, emerge a crença romântica de que “o amor basta/fonte de felicidade” e a expectativa de “abdicar/ceder por amor” (principalmente face à mulher).

Por fim, no que diz respeito ao estado civil dos/das participantes adultos/as (que implica diferentes experiências relacionais), verificam-se algumas diferenças na forma como conceptualizam o amor (Tabela 3)8.

 

 

Os/as participantes casados/as ou em união de facto são os/as que possuem uma perspetiva mais “companheira” e “romantizada” – veiculam a noção de que estão numa relação porque encontraram a “pessoa certa” e o “amor verdadeiro”, referindo os valores do amor companheiro como estando presentes na relação e que lhes permite gerir/ultrapassar as dificuldades, mantendo-os na relação. Isto reflete, no nosso entender, a concepção da vida a dois (seja sob a forma formal do casamento ou informal) sob o imperativo do “amor” (Pais, 1998; Giddens, 1992): na atualidade, dada a “liberdade” e desinstitucionalização das relações, a “escolha” de estar e permanecer numa relação implicará ir ao encontro das expectativas românticas da felicidade e da realização pessoal através do amor (Giddens, 1992) que, sendo verdadeiro, pressupõe que seja para sempre – podendo implicar, em alguns casos, anos de infelicidade.

Os que mais se aproximam do padrão juvenil são os/as solteiros/as (ver tabelas 2 e 3), diferenciando-se apenas no maior recurso ao amor pragmático, em vez do apaixonado, dado que enfatizam a análise racional das condições relacionais e dos atributos desejáveis (por enquanto omissos) no/na parceiro/a para justificar o não terem, ainda, uma relação. Os/as divorciados/as, por seu turno, também recorrem mais ao amor pragmático, comparativamente aos/às casados/as, cujos significados lhes permite conceptualizar a história relacional que “falhou” e integrá-la como fonte de aprendizagem e amadurecimento.

Contraste entre os discursos de diferentes gerações

Há uma similaridade transversal nos vários grupos geracionais que constituem a população adulta, no que diz respeito ao padrão de utilização dos diferentes repertórios (tabela 4)9: por um lado, o repertório companheiro como principal grelha interpretativa utilizada para dar sentido ao amor e às diferentes experiências amorosas, sendo amplamente partilhado, e, por outro, os repertórios apaixonado e game-playing como as grelhas preteridas, usadas, na sua maioria, para enquadrar o passado ou fases de transição da história relacional dos/das participantes.

 

 

Apesar desta homogeneidade, encontramos algumas especificidades que distinguem a faixa etária que viveu a juventude no período pós 25 de Abril (40-52 anos): os/as participantes oscilam entre o repertório companheiro e o repertório pragmático, enquanto os/as das outras faixas oscilam entre companheiro e o romântico, sendo também os/as que, comparativamente aos/às restantes, fazem mais uso do repertório apaixonado e do repertório game-playing.

De um modo geral, verificamos que os/as participantes “pós 25 de Abril” se distinguem pelo uso mais diversificado e distribuído dos diferentes repertórios, revelando maior ambiguidade na forma como conceptualizam o amor e as relações: por um lado, apresentam uma perspetiva tradicional do amor, que veicula a desejabilidade do casamento/durabilidade da relação, associada à constituição da família e investimento no projeto comum da vida a dois, defendendo a fidelidade como condição essencial (sendo o tema mais focado nesta faixa etária); e, por outro, quando confrontados/as com a frustração ou não concretização deste arquétipo relacional (situações de infidelidade, ruptura, rejeição, conflitualidade), abandonam o ideal da vida a dois e adoptam uma perspetiva mais “calculista” do amor. Posicionam-se como mais individualistas, em termos afetivos e relacionais, na medida em que a vivência do amor a dois faz sentido quando é favorável ao/à próprio/a (repertório pragmático), quando acarreta emoções fortes de prazer (repertório apaixonado) ou quando não implica compromisso e investimento (repertório game-playing), como se pode observar no exemplo que segue.

“Porque quando a escolhi para me casar tinha a certeza que era a pessoa que queria mas, pelo vistos… Sinceramente, ao longo destes anos todos, penso que, realmente, aquilo não era para mim. Eu estava ali, mas estava ali enganado. E ainda bem. Porque, de facto, não seria tão feliz como sou agora neste momento, independentemente de estar sozinho. Neste momento, prefiro estar assim… tenho a minha namorada, que me dá pica… já tive outras relações, só físicas e que não davam chatices…” (Caso P, divorciado, 45 anos).

Esta ambiguidade discursiva pode relacionar-se, em parte, com o facto de serem participantes que vivenciaram a sua juventude na época pós-ditatorial - período de transição entre um regime muito fechado e tradicional para um regime democrático e de maior “liberdade”. Como indicam Dias e Machado (2008), tratou-se de um contexto histórico e político único, que se caracterizou pela veiculação de um discurso de reivindicação de liberdades e de crítica social, em todos os âmbitos, assente numa ideologia de esquerda, que acarretou transformações no discurso sobre a conjugalidade. Verifica-se, na geração de Abril, um discurso “de oposição” ao Estado Novo, representando um ponto de ruptura com a repressão da época ditatorial.

Por sua vez, os/as participantes que viveram a juventude na época ditatorial, veiculam nas suas histórias concepções mais conservadoras e tradicionalistas, próprias do Estado Novo, com valores e conceitos morais tidos como inquestionáveis (a família, o casamento, a fidelidade, a limitação da mulher ao papel de esposa, mãe e dona de casa, o homem como elemento de autoridade no núcleo familiar, austero e rígido). A título de exemplo:

“A nossa história de namoro até ao casamento não foi muito longa. Depois a fase do casamento e os filhos. Para constituir família.”; “Tive de ter aquela fase de adaptação ao casamento. A mim, bastava-me olhar para ver que o olhar dele era um olhar de reprovação. Ele é assim muito sério. Eu acho que, para mim, é correto de mais.” (Caso B, 62 anos, casada).

“O sonho de casar, de nos amarmos e respeitarmos, sermos fiéis até que a morte nos separasse.” (Caso L, 62 anos, divorciada)

“Ela fazia-me tudo o que eu queria. Dava-me coragem para ir trabalhar, quando chegava a casa ia-me logo preparar o bifezinho.” (Caso J, divorciado, 62 anos).

No entanto, quando falam no presente e se projetam no futuro, agora já distanciados/as no tempo e com outras vivências, já tecem alguma reflexão e análise crítica daqueles valores (repertório pragmático), principalmente quando têm uma história relacional que não se enquadrou no guião convencional.

“Hoje nada me pesa porque eu era uma excelente dona de casa, uma excelente cozinheira, fazia tudo para o trazer sempre bem vestido. Mas eu achava que ele não me respeitava como mulher. E eu, então… a relação chegou ao fim. Agora, antes divorciada que casada e infeliz, como vejo a maioria das mulheres por aí! Agora já não é como antigamente, ainda bem que os tempos mudaram e, sinceramente, não me importo que falem de mim.” (Caso L, divorciada, 62 anos).

Ao contrário do que seria expectável, dado o distanciamento geracional e o diferente enquadramento histórico e político, os/as participantes que viveram a adolescência nos anos 90, já na segunda década do regime democrático (26-39 anos), têm um discurso mais próximo dos/das participantes que viveram a juventude na época do Estado Novo (faixa etária 53 anos ou mais), do que da geração que os antecedeu, a geração de Abril.

Quase 80% dos relatos, quer da geração “democrática”, como da geração do “Estado Novo”, remete para o repertório amor companheiro e para o repertório romântico, caracterizando-se, globalmente, por um discurso mais fechado e hegemónico: (i) no repertório companheiro veiculam essencialmente a expectativa da vida a dois e da construção de um projeto comum, assente nos valores do “companheirismo”, invioláveis e rígidos; (ii) no repertório romântico está patente a desejabilidade da durabilidade da relação, o ideal do “amor único e verdadeiro” e a primazia do casamento e da constituição de família; (iii) e a “desvalorização” do repertório apaixonado que, sendo associado à intensidade emocional, à ativação física e à erotização, é conceptualizado como “imaturo” e “menor”, ou inferior, quando comparado ao verdadeiro amor (sendo usual a distinção entre “paixão” e “amor”).

“Há um casal que eu admiro, têm 4 filhos fantásticos. Quando um dia eu tiver família gostava que fosse assim. Não é só pelo número de filhos mas pela capacidade que têm em gostar um do outro. E os filhos, são miúdos extremamente educados, sem nada que ver com aquilo que nós hoje encontramos. É o meu modelo de relação, uma relação que dura há anos, um amor genuíno.” (Caso B, 37 anos, divorciado).

Embora recorram, também, ao repertório pragmático, a geração do Estado Novo e a geração “democrática” fazem-no de forma diferente da geração de Abril: usam-no fundamentalmente como complemento “racional” do “projeto a dois” (do amor companheiro) ou para sustentar a crença da “pessoa certa” (do amor romântico), procedendo à análise das condições “logísticas” para a relação a dois e à listagem dos atributos desejáveis no/na parceiro/a.

“Foi o culminar de vários meses de preparação, de ponderar se tínhamos ou não condições para avançar, em termos económicos e profissionais. Pronto, o casamento é o expoente máximo de tudo aquilo.” (Caso F, casada, 28 anos).

“Se eu visse um homem educado, respeitador. Toda a mulher, antes da coabitação com um homem, devia ver se, na realidade, aquele homem seria um bom marido e um bom pai para os seus filhos.” (Caso L, divorciada, 62 anos).

Os aspetos diferenciadores, introduzidos pela geração de Abril, que se mantêm na geração democrática e nos permite distingui-la da geração do Estado Novo, dizem respeito à formalização “desinstitucionalizada” do amor (permitindo outras formas de formalização, como a união de facto), à consideração da possibilidade das relações terminarem (embora não seja desejável e seja de evitar) e ao alargamento (que se traduz num acréscimo) dos papéis associados à mulher.

Fazendo uma análise holística, verificamos que as grelhas romântica e companheira parecem ser as mais difundidas e partilhadas culturalmente, dado que o guião romântico e os valores/prescrições do “companheirismo” assumem destaque no discurso dos/das participantes de todas as gerações, inclusive na população juvenil. Assim, estas grelhas parecem ter uma continuidade discursiva transgeracional. É a geração de Abril que introduz “descontinuidade” nesta continuidade discursiva, ainda que o faça de um forma ambígua, ao apresentar significados mais flexíveis e formas relacionais mais diversificadas e alternativas às convencionais, algo inexistente no discurso da geração que a antecedeu e que se dissipa, também, na geração que a sucede.

Assim, analisando transversalmente os discursos geracionais, consideramos que há um “retorno” às concepções tradicionais do amor, às formas relacionais conservadoras e, até, a um certo “moralismo” e “estigmatização” dos que não seguem o padrão convencional. A geração “democrática” (e mesmo a juvenil) aspira à “segurança”, à “estabilidade” e à “certeza” do “amor verdadeiro e para toda a vida”, de “constituir família” e do “projeto a dois” da geração do Estado Novo, embora já não subjugada à “institucionalização”, característica do Estado Novo, mas, do nosso ponto de vista, subjugado à “fusão” afetiva/relacional (Pais, 1998).

“As pessoas têm um envolvimento, tem que haver esse respeito. Quer dizer, nós, felizmente, distinguimo-nos dos cães, não é (risos)! De facto, os cães em qualquer sítio da rua fazem. Portanto, eu sei que isso hoje acontece. Nós andamos na rua e, de facto, as coisas acontecem como se fosse tudo muito natural – a televisão e as novelas, por exemplo, esta geração dos Morangos é uma geração completamente inútil. Expõe-se ali o corpo feminino… que acho que é uma obra muito bem-feita para que possa ser entregue assim “sem rei e sem roque”, sem regra, não é! Sem qualquer pudor. Quando nós chegamos a este ponto, alguma coisa está errada.” (Caso B, divorciado, 37 anos).

“E, portanto, hoje se calhar também atingimos situações que, para mim, são completamente anormais – troca de casais e coisas do género. E acho que precisávamos de voltar, não diria, voltar há 40 ou 50 anos, mas acho que precisávamos de voltar um bocadinho ao tradicional. Hoje é tudo um bocadinho mais impessoal. As pessoas vivem, assim, como se fosse tudo ao monte no supermercado.” (Caso S, solteira, 28 anos).

Verifica-se, assim, que, enquanto a geração do Estado Novo assume estas concepções tradicionais sob o discurso dos constrangimentos contextuais que, na data, limitaram o seu leque de alternativas e possibilidades de conceptualizar e viver o amor, os da geração “democrática” fazem-no sob o discurso da “escolha” - no sentido que, face ao vasto leque de opções, em que tudo é permitido, escolhem o guião convencional.

Por sua vez, a população juvenil atual tende também a adoptar o modelo “tradicional”, revelando, até, discursos mais extremados e genderizados, que veiculam relações assimétricas e desiguais. Como vimos anteriormente, quando comparados com a população adulta em geral, recorrem mais aos repertórios apaixonado e game-playing mas, no entanto, tal não significa que apresentem concepções sobre o amor mais abertas, igualitárias ou flexíveis. Pelo contrário, na adopção destes repertórios, é notória a conotação moral, a crítica negativa, o duplo padrão sexual (“Começar com alguma rapariga e depois vir a saber histórias! Que anda com todos, isso é difícil! Já trás defeito: nos rapazes “pegar” muitas é bom. Agora, saber que uma rapariga é marada, é mau. Pode ser um bocado machista, mas uma pessoa tem de pensar na imagem, não é!”), a instrumentalização da mulher (“Quanto mais se pega as raparigas, mais se aprende! Essas, as maradas, servem para curtir e… para coisa séria, não!”), bem como a legitimação de comportamentos de controlo e exercício de poder no masculino (“Arranjar alguém que não seja fiel, acho que me passo da cabeça, cometo uma loucura. Nem sei o que faria….Por isso é que não podemos dar muita liberdade, temos de estar atentos e controlar.”) e a “submissão”/tolerância a tais comportamentos pelo lado feminino (“Quando as coisas vieram ao de cima, tentei fazer com que ele confiasse mais em mim, fiz coisas para recuperar a confiança: acabei com os hi-5, com o MSN, acabei com tudo, mudei o número de telemóvel, para que ninguém tivesse o meu número, e tentei mostrar que estava empenhada nisto.”), veiculando a dominância masculina e a submissão feminina.

Repertórios interpretativos sobre o amor – discursos femininos e masculinos

Tanto as mulheres, como os homens, apresentam o perfil discursivo já descrito na análise geracional, não havendo diferenças de género nos padrões identificados. Como podemos constatar na análise da tabela 510, o padrão de utilização dos repertórios é muito similar, sendo apenas de destacar o facto do repertório game-playing (volubilidade, relações passageiras, descomprometimento) ser mais utilizado no masculino. Dentro deste padrão comum, o que verificamos é a existência de significações específicas e usos diferenciados de algumas construções.

 

 

A noção de “aproveitar o momento e adiar o compromisso”, presente no repertório game-playing, é exclusiva do discurso masculino, principalmente nos homens jovens e nos solteiros da população adulta. Também no repertório game-playing, o envolvimento em relações volúveis e passageiras, bem como a objetificação do parceiro no contexto dessas relações, é mais característica do masculino. Quando surge no feminino, tem uma componente de emocionalidade – no sentido da expetativa romântica do “amor impossível” ou no sentido de esquecer/ultrapassar desilusões amorosas, e não, apenas, na mera instrumentalização de obtenção de prazer pelo prazer, (“Já que isto também é uma relação que já estava a acabar, então deixa-me arranjar outro desgraçado que ajude a aclarar o processo. (…) Depois a situação de ter tido coisas pontuais mas, essas, claramente e meramente, instrumentais: ora deixa-me conhecer outros corpos, outros homens para ver se o meu corpo se descola da pele, do cheiro e das marcas.”).

No âmbito de alguns temas abordados, há uma diferenciação no que diz respeito ao tópico da infidelidade, tolerável e desculpável quando é perpetrada no masculino, inaceitável e condenável quando é perpetrada no feminino. Assim, enquanto os homens tendem a responsabilizar e, até, “demonizar” a mulher infiel (“Relacionei-me com uma pessoa que, de facto, não tinha carácter nenhum. Tive para aí uns 6 meses em que ela estava a preparar eventualmente a saída, digo eu, estaria no início da relação com o outro fulano. Confrontei-a e disse-lhe tudo o que tinha na cabeça para lhe dizer. que não tinha carácter nenhum.”), as mulheres são tolerantes com a infidelidade masculina, tendendo a desresponsabilizar o parceiro, recorrendo às necessidades físicas do homem ou, ainda, culpabilizando a mulher com quem foi cometida a infidelidade (“Quando me traiu, foi um momento infeliz. Mas eu já lhe tinha dito que relações sexuais comigo, só quando me sentisse muito segura e confiasse nele. Para mim só faz sentido numa relação de amor, mas os homens… Por isso, disse-lhe que compreendia que ele procurasse noutro sítio. Mas… chateou-me a fulana! Ela era assim um bocado… ele fazia parte de uma lista de gajos com quem ela queria ir para a cama…”)

Estas especificidades refletem, por um lado, a conceptualização da sexualidade feminina como inerentemente afetiva, limitando a sua expressão ao contexto de relações de amor, e, por outro, a conceptualização da sexualidade masculina como maioritariamente “fisiológica” e separada do afeto, permitindo ao homem maior liberdade sexual. Assim, verifica-se uma clara diferenciação de género na associação afetividade/sexualidade, partilhada por homens e mulheres, que continua a sustentar a desejabilidade da maior reserva e inibição da sexualidade feminina e da maior impulsividade e expressão da sexualidade masculina. Esta diferenciação genderizada sustenta também a expetativa da maior restrição e exclusividade relacional no feminino e a aceitação/tolerância da amplitude e “não-exclusividade” relacional no masculino.

Por fim, no âmbito do repertório pragmático, tanto os homens como as mulheres procedem à listagem de atributos desejáveis no parceiro mas, no entanto, diferenciam-se no tipo de atributos que valorizam: enquanto a mulher valoriza características psicológicas e de carácter afetivo, no sentido em que o parceiro seja possuidor de atributos que as faça sentir seguras, o homem valoriza o aspeto físico, a imagem social e as características tradicionalmente associadas aos papéis considerados naturalmente femininos – de mãe, esposa, prestadora de cuidados. Ainda neste âmbito, é notória a diferenciação da geração do Estado Novo, que valoriza, de forma mais explícita e marcada, essas características tradicionais (“Um homem sério, respeitador, cavalheiro… muito trabalhador, não faltou com nada aos filhos”; “Uma boa esposa, dona de casa exemplar, boa mãe, excelente cozinheira!”).

À semelhança do que sucedeu em outros países Ocidentais, também em Portugal as mudanças operadas ao nível da igualdade de género, acarretaram mudanças nas relações de intimidade (Giddens, 1992; Neves, 2007; Santos & Amâncio, 2002). No entanto, o relato dos/das participantes revela que o duplo padrão persiste. Este resultado vai ao encontro de vários estudos que indicam que as mudanças são “condicionadas” e que as normas do duplo padrão tradicional persistem: continua a limitar-se a intimidade feminina à emocionalidade, à exclusividade e ao comprometimento nas relações (Alferes, 1997; Santos & Amâncio, 2002), restringindo a liberdade sexual feminina; e, pelo contrário, a subordinação do sexo ao prazer, o maior número de relações e a iniciação sexual precoce (Alferes, 1997; Saavedra et al., 2010), o menor investimento afetivo, a dissociação amor/sexo, as relações sem compromisso e o menor investimento afectivo são aceites e mais frequentes no caso dos homens (Dias, 2006).

 

Discussão dos resultados e conclusão

No presente estudo procurámos identificar as grelhas interpretativas disponíveis culturalmente para significar o amor e as experiências amorosas, compreender de que forma são aprofundadas e transformadas pelos/as diferentes participantes e refletir criticamente sobre as implicações destas construções na vivência das relações amorosas.

Identificámos cinco repertórios interpretativos sobre o amor (o companheiro, o romântico, o pragmático, o apaixonado e o game-playing) e verificámos que, apesar desta multiplicidade, há uma homogeneidade na forma como os diferentes repertórios são apropriados e conjugados: o repertório companheiro e o repertório romântico são as grelhas interpretativas mais disseminadas para conferir significado às experiencias amorosas, coexistindo com outras grelhas menos difundidas ou menos consensuais culturalmente (repertório apaixonado, pragmático e game-playing).

Por um lado, há que refletir sobre a multiplicidade de repertórios e, por outro, sobre a homogeneidade da forma como se conjugam. No que diz respeito à multiplicidade de repertórios, esta reflete, no nosso entender, o resultado das transformações da modernidade na intimidade e nas relações familiares e sociais que ocorreram nos países ocidentais (Giddens, 1992) refletindo, também, as contradições/tensões que aquelas acarretam (Pais, 1998). A literatura indica o desenvolvimento histórico e sociocultural do amor, desde o “amour passion” do século XVIII, passando pelo amor romântico que se institui com norma nas sociedades modernas ocidentais, assimilando alguns elementos do amor erotizado (Giddens, 1992) e associando-lhe as noções da confiança, da descoberta mútua e da autorrevelação com a pessoa “especial” (Giddens, 1992), até à noção de amor confluente (igualdade nas trocas emocionais, desenvolvendo-se na medida em que cada um proporciona e recebe gratificação suficiente para estar na relação) e da ideia “relacionamento especial” em detrimento da “pessoal especial” (Bauman, 2003).

Do nosso ponto de vista, os diferentes repertórios refletem a simultaneidade de todos aqueles discursos e transformações, em que não se foram sobrepondo ou substituindo, mas que coexistem e concorrem entre si na atualidade. Os/as participantes do nosso estudo revelam ter ao seu dispor diferentes versões do amor, que vão apropriando e utilizando para dar sentido às suas experiências relacionais em função do que lhes permite um posicionamento subjetivo e social mais favorável (daí, por exemplo, serem os/as participantes solteiros/as e divorciados/as que mais recorrem ao repertório pragmático e serem os/as que estão numa relação a adoptarem um discurso marcadamente romântico e companheiro).

No entanto, a homogeneidade da conjugação dos repertórios indica que há discursos que são mais disseminados culturalmente e que prevalecem sobre outros. À semelhança do que ocorre na maioria das sociedades ocidentais (Giddens, 1992; Neves, 2008), também em Portugal o amor romântico parece ser um dos mais dominantes culturalmente, regulando as relações. O amor romântico, historicamente, começou a partir do século XVIII, resultante das transformações sociais que a revolução industrial acarretou (abandono da vida rural e êxodo para as cidades, individualismo, etc.) e foi-se consolidando, ao longo dos século XIX, por vários fatores: a introdução do romance literário, a noção do lar e da família nuclear, modificação nas relações familiares, a noção de “maternidade”, etc. O modelo romântico permitiu “formalizar”/controlar a sexualidade e, ao introduzir-lhe elementos virtuosos (fidelidade, complementaridade dos cônjuges, respeito mútuo, exclusividade) oriundos da moral judaico-cristã, tornou-se um modelo feminizado (Giddens, 1992), com consequências para a vida das mulheres (limitação à esfera privada, papéis restritos ao cuidado do lar e à maternidade). No entanto, com a entrada das mulheres no mercado trabalho, os movimentos feministas e a luta pela igualdade de direitos das mulheres nas várias áreas, o modelo romântico foi posto em causa. Como consequência, o discurso romântico foi reajustado, valorizando noções como a igualdade, a reciprocidade e o apoio mútuo (Bauman, 2003; Giddens, 1992) que, no nosso entender, correspondem ao repertório “companheiro” identificado no nosso estudo.

Assim, concluímos da nossa análise que o amor romântico surge como o discurso que orienta as relações afetivas amorosas, em que a relação de amor é vista como fonte de felicidade e de realização pessoal, imperando a crença do verdadeiro amor, de um só amor e para sempre. No entanto, dado que o amor, enquanto estado emocional por si só parece não ser suficiente para se manter face às tensões e dificuldades relacionais, a grelha companheira surge para as gerir e solucionar, de forma a manter a relação e, em última análise, perpetuar e reforçar o modelo romântico tradicional. No nosso entender, estas grelhas complementam-se e ambas sustentam a união (formal ou informal) monogâmica e a família nuclear, bem como continuam a reforçar a diferenciação dos papéis de género e as assimetrias na relação homem-mulher (relembramos, a realização pessoal da mulher continua a ser essencialmente associada ao amor e à família, bem como as expectativas “companheiras” da compreensão, do apoio e do suporte recaem mais sobre a mulher).

Por seu turno, o repertório apaixonado parece-nos refletir o “amour passion” (desvinculado da esfera conjugal e caracterizado pela “urgência” emocional e sexual, era considerado potencialmente perturbador e propício à desordem social) que dominou o discurso social até ao século XVIII (Giddens, 1992), continuando a existir na atualidade a versão perturbadora do amor, como algo incontrolável e propício a opções radicais. Nesta lógica, não é de admirar que o repertório apaixonado, embora mais utilizado pelos/as jovens (porque começam a viver as primeiras relações e a iniciar a vida sexual), surja timidamente nos relatos dos/das participantes e para dar sentido a comportamentos ou práticas relacionais que se desviam da imagem social desejável. O repertório apaixonado permite-lhes enquadrar a componente mais erótica e sexual, sem colidir com as “virtudes” do guião romântico, bem como justificar comportamentos dissonantes com o que é socialmente desejável que, neste repertório, sob a conotação do seu carácter incontrolável e perturbador, são aceitáveis.

Por seu turno, o repertório pragmático vai ao encontro do que Giddens (1992) denomina de “amor confluente” ou da “relação especial”, resultante da crise do discurso romântico e das dissoluções da relações. Como vimos, neste repertório está presente a noção da contingência, da finitude das relações e de se estar numa relação enquanto esta acarretar satisfação e vantagens suficientes, o que coincide com o descrito por Giddens (1992) e Bauman (2003). De facto, são os/as participantes que não têm uma relação atual ou que passaram por ruturas relacionais que mais recorrem a este repertório, permitindo-lhes conceptualizar o que falhou a “escolha” de estarem sós.

Por fim, o repertório game-playing assume um menor destaque, sendo conceptualizado como “não-amor”. Por se tratar da sua antítese (relações fugazes, sem compromisso, envolvimento físico sem envolvimento afetivo), acaba por reforçar o modelo romântico e é essencialmente associado ao masculino, o que revela o duplo padrão sexual ainda existente na sociedade atual.

Este padrão, como já referimos, é culturalmente partilhado, tanto por homens como por mulheres, independentemente do seu estado civil, atravessando as diferentes gerações. No entanto, são de destacar algumas diferenças geracionais, que podem ser compreendidas à luz do seu diferente enquadramento histórico, social e político, nomeadamente: (i) na geração que viveu a juventude na época ditatorial identificaram-se significados marcadamente mais conservadores e tradicionalistas, com valores e regras de conduta rígidos, próprios do Estado Novo (primazia da família e do casamento, papéis tradicionais genderizados); (ii) na geração pós-25 de Abril que, tendo vivido a juventude num período único da nossa história recente, apresenta significações mais flexíveis e uma maior abertura a formas relacionais alternativas (apesar da ambiguidade, oscilando com as concepções tradicionais); e (iii) na geração “democrática” e, inclusive, na população juvenil atual, que “retomam” as concepções tradicionais do amor e as formas relacionais conservadoras, sendo os jovens que adotam posicionamentos mais extremados e genderizados, veiculando maior assimetria e desigualdade na conjugalidade.

Consideramos que a geração pré-25 de Abril, hoje distanciada temporalmente dessa época, conserva na memória os constrangimentos e o leque limitado de opções relacionais, havendo uma certa resignação “refletida” ao contexto que os condicionou (“Naqueles tempos, os pais controlavam tudo. Era namorar à porta de casa e não havia oportunidades para conhecer, até ao casamento”). Por seu turno, a geração pós 25 de Abril, ambígua no discurso, revela a necessidade de expressar a sua individualidade e liberdade, por oposição à repressão e censura da época ditatorial (“O namoro é um tempo de descoberta e cumplicidade. Ver se se entendem ou não, se é o que querem, ter liberdade para conhecer outras pessoas e ter outras experiências. Se funcionar, muito bem! Se não, partir para outra e amigos na mesma.”). Por fim, as gerações posteriores, que não vivenciaram os constrangimentos às liberdades pessoais e a repressão do Estado Novo, e se deparam com uma multiplicidade de percursos relacionais possíveis e, até, paradoxais, recuperam os valores “tradicionais” e “rígidos” da conjugalidade, como estratégia de conseguir algum sentido de pertença, segurança e estabilidade, numa sociedade cada vez mais globalizada, instável e incerta em vários âmbitos (“É importante ter uma relação. E, para mim, quando acontecer, quero que seja para toda a vida. É importante ter um suporte emocional, ter uma base, uma base que…. Eu vou avançar, mas sei se alguma coisa correr mal temos aquela base que está ali para me amparar na queda. Acho que é isso.”).

As ruturas continuam a ser conceptualizadas e vivenciadas pelos/as participantes das diferentes gerações de forma negativa (tanto por parte das mulheres, como por parte dos homens), estando patente nos seus relatos a descrição da desorganização subjetiva e da perturbação afetiva que tal acarreta. Por outro lado ainda, o estar só/não ter uma relação é conceptualizado como “algo em falta”, “estar incompleto”, o que reflete a forte disseminação e partilha do modelo relacional “fusional”.

Assim, consideramos que estas concepções acabam por constrangir a forma como os/as participantes se posicionam nas relações e vivenciam o amor: apesar de estar presente a possibilidade do término das relações e de conceptualmente os parceiros não estarem subjugados ou ao serviço da relação, parece haver um receio da abertura e da flexibilidade que tal acarreta, criando a sensação subjetiva de insegurança ou incerteza – pelo que os participantes recuperam a noção de “amor verdadeiro” e o ideal do projeto comum com formas de recuperar algum sentido de segurança, estabilidade, previsibilidade e controlo, numa sociedade em constante mutação.

Por outro lado, ainda, estas diferenças geracionais, podem ser entendidas, também, no contexto das transformações da modernidade na intimidade, anteriormente referidas. Enquanto na maioria do mundo ocidental, essas transformações ocorreram ao longo de três séculos, em Portugal as transformações sucederam mais tardiamente e num período de tempo mais curto. Só no final do século XIX os efeitos da revolução industrial começaram a fazer-se sentir e, no início do século XX, Portugal era um país maioritariamente rural. É possível que a geração pós-25 de abril seja a que mais vivenciou as rápidas e drásticas mudanças, daí a maior ambiguidade e que, as gerações mais jovens estejam atualmente a vivenciar um período de crise e questionamento dos “avanços” operados e dos discursos alternativos existentes, tendendo a aproximar-se dos modelos tradicionais e convencionais do amor.

O “retorno” ao conservadorismo e a “nostalgia” dos valores tradicionais e “seguros” do passado, que encontramos no estudo, não podem deixar de ser entendidos, também, sob o contexto histórico e político atual, tanto em Portugal como na Europa: período de crise generalizada, em que as ideologias mais extremadas e radicais tendem a emergir, tendo repercussões nas relações sociais. Assim, não podemos deixar de nos questionar, por um lado, se começamos a assistir à inoculação de um discurso que tende a associar à liberdade, à paridade e à diversidade nos usos e costumes as noções de “anarquia”, caos social e crise de valores, utilizadas como “bodes expiatórios” dos problemas sociais e económicos atuais; ou, por outro, se observamos, da parte das gerações mais novas, uma subvalorização dos avanços e das mudanças sociais conquistados pelas gerações que as antecederam.

 

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*Autor para correspondência:

Ana Rita Dias, Escola de Psicologia, Universidade do Minho, Campus de Gualtar, 4710-057 Braga, Portugal. E-mail: ritacondedias@psi.uminho.pt

 

Recebido 18/02/2012

Aceite 22/01/2013

 

Notas

2 Na data em que foi realizada a entrevista, atualmente terão 58 ou mais.

3 Na data em que foi realizada a entrevista, atualmente terão 45-57.

4 Na data em que foi realizada a entrevista, atualmente terão 26-44.

5 Na data em que foi realizada a entrevista, atualmente terão 20-25.

6 Valores calculados automaticamente no Nvivo, utilizando as matrizes que contabilizam a percentagem dos relatos (de todos os participantes) codificados em cada repertório.

7 Valores calculados automaticamente no Nvivo, utilizando as matrizes que contabilizam a percentagem dos relatos codificados em cada repertório, em função dos atributos “jovem” e “adulto”.

8 Valores calculados automaticamente no Nvivo, utilizando as matrizes que contabilizam a percentagem dos relatos dos adultos codificados em cada repertório, em função dos atributos “solteiro”, “casado/união de facto”, “divorciado/casado”, que compõem a classificação “estado civil/relacional”.

9 Valores calculados automaticamente no Nvivo, utilizando as matrizes que contabilizam a percentagem dos relatos dos adultos codificados em cada repertório, em função dos atributos “26-39 anos”, “40-52 anos”, “53 ou mais anos” que compõem a classificação “grupos etários”.

10 Valores calculados automaticamente no Nvivo, utilizando as matrizes que contabilizam a percentagem dos relatos codificados em cada repertório, em função dos atributos “feminino” e “masculino” que compõem a classificação “sexo”.