Serviços Personalizados
Journal
Artigo
Indicadores
- Citado por SciELO
- Acessos
Links relacionados
- Similares em SciELO
Compartilhar
Psicologia, Saúde & Doenças
versão impressa ISSN 1645-0086
Psic., Saúde & Doenças vol.13 no.2 Lisboa 2012
Validação transcultural da Escala de Felicidade Subjectiva de Lyubomirsky e Lepper
Cross cultural validation of the Lyubomirsky and Lepper subjective happiness scale
J. L. Pais-Ribeiro
Universidade do Porto
RESUMO
Felicidade é um construto semelhante ao bem-estar subjectivo e tornou-se uma variável importante para a psicologia: é um construto complementar da saúde mental. Lyubomirsky e Lepper, desenvolveram uma medida de felicidade subjectiva com quatro itens. O objectivo do presente estudo é fazer uma validação transcultural desta medida. Os participantes constituem uma amostra de conveniência de 516 indivíduos, 54,3 % mulheres, idade média de 35,18 anos. O material utilizado são a escala de felicidade subjectiva, e ara a validade concorrente e discriminante, um item para a avaliação da satisfação global com a vida, a escala de bem-estar geral, a escala de bem-estar pessoal, o inventário de saúde mental com cinco itens, mais um item para avaliar a percepção de saúde e outro para a percepção de qualidade de vida. O teste para a hipótese de os quatro itens constituírem um único factor foi realizado através da análise factorial confirmatória, e mostra um bom ajustamento (CFI =0,97 e SRMR=0,03). A consistência interna e a validade convergente e discriminante mostram valores apropriados. A média é semelhante à das diferentes amostras utilizadas no estudo original. Como conclusão podemos afirmar que a versão portuguesa da escala de felicidade subjectiva mostra propriedades psicométricas idênticas às da versão original e que pode ser utilizada para comparação na investigação trans-cultural.
Palavras chave: felicidade subjectiva; validação transcultural; bem-estar subjectivo: saúde mental
ABSTRACT
Happiness is similar to subjective well-being and is becoming an important variable for psychology: it is a complementary construct for mental health. Lyubomirsky and Lepper, developed a measure of subjective happiness with four items. The aims of the present study are to cross-validate this measure. Participants constitute a convenience sample of 516 individuals, 54.3 % women, mean age of 35.18 years. Materials used are the subjective happiness scale, and for concurrent and discriminant validity, one item for the assessment of Life as a whole, the general well-being scale, the personal wellbeing, the Mental Health Inventory with five items, plus one item for health perception and another for quality of life. Testing for one factor hypothesis through confirmatory factor analysis shows a good fit (CFI =0.97 and SRMR=0.03). Internal consistency and convergent discriminant analysis are appropriate. Mean values are similar to the different samples of the original study. As final conclusions we can say that the Portuguese version of the subjective happiness scale has similar properties to the original one and that it can be used for comparisons in cross-cultural research.
Key words: subjective happiness; cross-cultural validation; subjective well-being; mental health
Felicidade é um conceito do senso comum utilizado na linguagem do dia a dia. Por isso o seu estudo científico é mais complexo, e o uso no senso comum não facilita a discussão, dado toda a gente saber o que é a felicidade. Por esta razão muitos investigadores evitam o uso deste termo preferindo o uso de termos mais específicos, enquanto outros o usam dadas as suas raízes históricas e populares (Diener, 2006). Em 2000, Diener diz que, coloquialmente, se utiliza o termo felicidade para designar o bem- estar subjetivo. É genericamente assumido que a felicidade é um componente decisivo da boa vida (Diener, Scolon & Lucas, 2003). As críticas sobre o mérito de se estudar este construto têm sido discutidas e criticadas, mas sempre salientando a sua importância para a psicologia (Myers, & Diener, 1995; Norrish, & Vella-Brodrick, 2008).
Se recorrermos aos filósofos da antiguidade, um dos mais antigos pensadores neste tema, o filósofo pré-Socrático Democritus, defendia que a felicidade consistia numa vida feliz, que dá prazer, não por causa do que a pessoa feliz possuía mas sim por causa do modo como ela reagia às circunstâncias da vida. Esta perspectiva foi abandonada durante séculos quando Sócrates, Platão, e Aristóteles impuseram a perspectiva de felicidade eudemónica, que consistia na possessão de grande quantidade de bens, embora Aristóteles defendesse que a felicidade consistia na realização total do potencial pessoal, não sendo o prazer um elemento central na definição. Pelo contrário, para os hedonistas como Aristippus, a felicidade era simplesmente a soma de muitos prazeres momentâneos (Diener et al. 2003): a sua filosofia defendia que o objectivo da vida era a procura do prazer adaptando as circunstâncias a si próprio mantendo o controlo sobre a adversidade e a prosperidade.
Modernamente o conceito é introduzido na declaração da independência dos Estados Unidos da América, no século XVIII, onde afirmava o direito dos cidadãos à vida, à liberdade, e à procura (pursuit) da felicidade. Se procurarmos na constituição da República Portuguesa não encontramos o termo felicidade mas sim bem-estar e qualidade de vida. Com efeito, na secção Princípios Fundamentais, Artigo 9.º (Tarefas fundamentais do Estado), afirma que São tarefas fundamentais do Estado, entre outras, na alínea d) Promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efectivação dos direitos económicos, sociais, culturais e ambientais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais. Ou seja, em Portugal, surge bem-estar e qualidade de vida numa posição similar da felicidade da constituição dos Estados Unidos da América (Pais-Ribeiro, 2009): simultaneamente, no texto desta alínea sugerem-se os elementos que podem contribuir para esse bem-estar e qualidade de vida, que é mais numa perspectiva eudemónica.
A literatura considera a felicidade como indicador de bem-estar subjectivo (Diener, 2006; Lyubomirsky & Lepper 1999), sendo, neste sentido, confundível com outras medidas deste tipo: Veenhoven (1997; 2000) refere que felicidade, satisfação com a vida, qualidade de vida, bem-estar, denotam o mesmo significado e são utilizados como sinónimos. Felicidade pode significar prazer, satisfação com a vida, emoções positivas, vida plena, ou sensação de contentamento entre outros (Diener et al, 2003). Porque a felicidade tem tantos sentidos quer na linguagem popular como na académica, Diener (2006) diz que tanto pode representar as causas como os efeitos, por exemplo, pode significar humor geral positivo, avaliação global de satisfação com a vida, viver uma boa vida, ou as causas que fazem as pessoas felizes no seu contexto de vida. A investigação sobre a felicidade começou por a utilizar como um equivalente de contentamento, satisfação com a vida e uma sensação de bem-estar (Ramm,1996).
Por definição, a felicidade é o grau no qual a pessoa avalia globalmente a qualidade da sua vida de uma forma positiva, ou seja, quanto a pessoa gosta da vida que leva (Veenhoven, 1997). Fordyce (1983), um dos primeiros autores a fazer intervenção para promover a felicidade, descreve-a como uma sensação emocional de bem-estar, que recebe muitos nomes (contentamento, completude, auto-satisfação, alegria, paz de espírito, etc.). Lyubomirsky e Lepper (1999) dizem que a felicidade subjectiva
(subjective happiness), consiste numa avaliação subjectiva que uma pessoa faz se é feliz ou infeliz. Ela reflecte uma categoria de bem-estar abrangente e molar, enquanto fenómeno psicológico (Diener, 1994).
Lyubomirsky, (2001) afirma que a capacidade que algumas pessoas têm para ser felizes, mesmo perante circunstâncias adversas, é impressionante, embora não seja claro quais os fatores naturais ou educacionais que explicam essa capacidade. A sua investigação tende a salientar as diferenças quanto às estratégias motivacionais, julgamentais e cognitivas que são utilizadas.
A felicidade subjectiva ou o bem-estar subjectivo não são sinónimos de saúde mental. São importantes para a saúde mental mas não são, nem suficientes nem sinónimos (Diener, Suh, & Oishi, 1997). Já há mais de 50 anos Jahoda (1958), afirmava que não se pode afirmar que há saúde mental positiva com base na ausência de doença mental, do que resulta a necessidade de avaliar outras dimensões complementares.
Porque nas últimas décadas cresceu notavelmente o interesse por esta variável, Lyubomirsky e Lepper, (1999) desenvolveram uma medida global de felicidade subjectiva. É um indicador baseado na perspectiva do respondente e pede-se que ele faça um julgamento global, molar, em que medida é feliz ou infeliz.
O presente estudo propõe-se fazer uma adaptação transcultural do instrumento desenvolvido por Lyubomirsky e Lepper, (1999). A adaptação de um instrumento para uma nova língua/cultura, numa perspectiva transcultural, é um processo necessário quando se pretende comparar o resultado nas diferentes línguas e/ou culturas. Utiliza-se a expressão adaptação transcultural (cross-cultural adaptation) para abranger o processo que considera, simultaneamente, a linguagem (tradução) e a adaptação cultural, na preparação de um questionário para uso num contexto diferente (Beaton, Bombardier, Guillemin, & Ferraz, 2000).
O uso de instrumentos de avaliação desenvolvidos numa língua, para uso noutra língua diferente é um procedimento normal, assumindo-se depois, que estamos em presença a) do mesmo instrumento, b) que avalia o mesmo construto, c) do mesmo modo. Ora isto nem sempre é verdade: para não o ser basta alterar o tempo que leva a completar o questionário, quer porque a tradução para a outra língua exige mais ou menos palavras, quer porque se retiram itens, como explicam Hambleton e Patsula (1999).
Há várias formas de transformar um instrumento para a nova língua. Dependendo das alterações necessárias, a tradução de um instrumento inclui três opções: a) aplicar o instrumento traduzido literalmente; b) adaptar partes do instrumento (ou seja, essas partes não constituiriam traduções literais mas sim ajustamentos) e, c) montar um instrumento totalmente novo, explicam de Vijver e Hambleton (1996).
O processo de adaptação é complexo e sujeito a viés. O enviesamento pode ocorrer a três níveis a) viés de construto, que significa que o construto estudado pode variar num grau substancial entre culturas; b) viés de método quando o factor cultural em estudo não é relevante para grande parte dos itens na cultura estudada; c) viés de funcionamento do item, que ocorre se pessoas de diferentes grupos com o mesmo resultado no construto operacionalizado, não têm o mesmo resultado no item (de Vijver, & Poortinga, 1997).
O objectivo do presente estudo é adaptar o questionário de felicidade subjectiva para Português-europeu, para poder ser utilizado numa perspectiva transcultural.
MÉTODO
Participantes
Os participantes constituem uma amostra de conveniência de 516 indivíduos da comunidade, 54,3 % mulheres, idade média 35,18 anos (DP= 12,10, entre 18 e 98 anos), que responderam voluntariamente ao questionário de modo anónimo e confidencial.
Material
O questionário utilizado incluía vários instrumentos, medidas, e questões demográficas, como género, idade e escolaridade. São os seguintes os instrumentos utilizados, incluindo o questionário que constitui elemento fulcral deste estudo.
Escala de felicidade subjectiva desenvolvida por Lyubomirsky e Lepper (1999) inclui quatro itens (ver anexo), que são afirmações em que, em duas, se pede aos respondentes para se caracterizarem a si próprios por comparação com os seus pares, quer em termos absolutos quer relativos (itens dois e três), e outros dois itens consistem em descrições de felicidade e infelicidade. Pede-se aos respondentes para indicar a extensão em que as afirmações os caracterizam, e a resposta é dada numa escala análoga visual com sete posições, ancorada em duas afirmações antagónicas que expressam o nível de felicidade ou a sua falta. Veenhoven (2009), revendo o conteúdo dos itens de escalas que se propõem avaliar a felicidade, rejeita este questionário como instrumento de avaliação deste construto, devido ao segundo item ser comparativo o que, defende este autor, não é consentâneo com a definição e a avaliação de felicidade. Os autores conceberam esta medida unidimensional, com somente quatro itens para não sobrecarregar os respondentes. Consideram a felicidade subjectiva uma variável latente.
Satisfação global com a vida- recorremos a uma medida clássica utilizada no World Values Survey, desenvolvida por Andrews e Withey (1976). Consiste num item que pede acerca da sua vida pessoal e das suas condições, qual o seu grau de satisfação com a sua vida em geral? A resposta é dada numa escala análoga visual com 10 posições ancorada em dois extremos em que num extremo está assinalado totalmente insatisfeito e no outro totalmente satisfeito. É considerada uma medida de referência para o bem-estar subjectivo.
Escala de Satisfação com a Vida - escala desenvolvida por Diener, Emmons, Larsen, e Griffin, (1985), e Pavot, e Diener, (1993): inclui cinco itens que constituem afirmações às quais o sujeito responde numa escala ordinal de sete posições entre totalmente em desacordo e totalmente de acordo. A escala foi validade para Portugal por Neto, Barros, e Barros, (1990) e por Simões, (1992).
Índice de Bem-Estar Pessoal - desenvolvido por Cummins, (1998) e adaptado ao Português por Pais-Ribeiro, e Cummins, (2008), inclui sete itens/domínios que pretendem avaliar a satisfação com a vida nesses domínios e em geral. A cada item as pessoas respondem quanto satisfeitas estão numa escala de 0 (extremamente insatisfeito) a 10 (extremamente satisfeito), com uma posição intermédia neutra. O Índice de Bem-Estar Pessoal é calculado numa nota de 0-100.
Saúde mental- avaliado com o Inventário de Saúde Mental de cinco itens. Este é uma versão reduzida da escala de 38 itens, desenvolvida por Veit e Ware (1983), estudada na versão Portuguesa por Pais-Ribeiro (2001). Esta versão reduzida exibe uma correlação de 0,95 com a versão de 38 itens, valor semelhante ao do estudo original, sugerindo que em termos globais pode substituir a versão mais longa. Inclui cinco itens, com uma resposta numa escala ordinal com cinco ou seis posições. Uma nota mais elevada exprime melhor saúde mental. Porque os itens incluídos são medidas de depressão, ansiedade, e bem-estar, esta medida deve ser considerada uma medida de distresse.
Percepção de saúde - avaliada com um item com resposta numa escala tipo likert com cinco alternativas de resposta entre óptima e fraca: uma nota elevada significa percepção de mais saúde. Idler e Benyamini (1997) numa revisão de investigação mostram que um item é uma medida adequada de percepção de saúde, e que é um preditor independente de mortalidade em quase todos os estudos, mesmo perante a inclusão de outros indicadores do estado de saúde e de outras co-variáveis relevantes reconhecidas como preditoras de mortalidade.
Percepção de qualidade de vida - avaliada com um item que pergunta como classifica a sua qualidade de vida?, com uma resposta numa escala tipo likert com cinco alternativas entre muito boa e muito má: Uma nota mais elevada exprime percepção de qualidade de vida mais positiva.
Tradução - A tradução dos itens constitui um momento decisivo da adaptação de um questionário para uma língua/cultura diferente, e deve responder a diferentes tipos de equivalência, tais como equivalência lexical, cultural, operacional, de medida, e funcional entre outras (Herdman, Fox-Rushby, & Badia, 1998). No presente estudo este processo foi garantido através de tradução/retroversão e discussão entre tradutores, que conheciam o construto, para além do domínio de ambas as línguas. A análise de conteúdo dos itens foi feita com recurso a dois especialistas conhecedores do construto. Seguiu-se o cognitive debriefing realizado com sujeitos do grupo a quem o questionário se dirige que tivessem um nível educacional baixo, de modo a verificar se entendiam as questões e o modo de lhes responder. O formato final do questionário é apresentado em anexo
RESULTADOS
Valores da média -No estudo original as médias dos resultados encontrados para 11 das amostras utilizadas andavam à volta de cinco (entre 4,63 e 5,13 para os estudantes quer dos EUA quer da Rússia): Nos extremos encontramos 5,62 para os reformados e para os adultos da comunidade dos USA, e 4,02 para o grupo de adultos da comunidade na Rússia. O desvio padrão andava à volta de 1 (entre 0,96 e 1,21 com excepção de um grupo de estudantes universitários com 1, 72).
No nosso estudo a média foi de 5,12 (DP=1,02): comparando os resultados por género não se encontram diferenças estatisticamente significativas: Não se verifica correlação estatisticamente significativa com a idade, e verifica-se uma correlação estatisticamente significativa, mas baixa, com a escolaridade (r(516) = 0,12, p = 0,004). Esta não associação com a idade, assim como a não existência de diferenças com base no género, já tinham sido salientadas noutros estudos (Myers & Diener, 1995)
Consistência interna- A fidelidade, avaliada com o alfa de Cronbach, é função do número de itens da escala tal como deriva da fórmula de Spearman-Brown, ou seja, escalas com muitos itens fornecem valores de consistência mais elevados do que escalas com poucos itens. Esta medida da homogeneidade dos itens não deverá ser demasiado elevada, de modo que a consistência interna não signifique de facto redundância dos itens onde os itens constituem para-frases uns dos outros. Cattell (1978) recomenda a existência de uma homogeneidade moderada dos itens de modo que cada um contribua de maneira única para a medida de uma dada escala. Kline (1986) sugere valores entre 0,30 e 0,70. Se dois itens exibem valores muito elevados, um não fornece informação nova, ou seja, é redundante. Para Briggs e Cheek, (1986), o nível óptimo de homogeneidade ocorre quando a correlação inter-item cai no intervalo 0,20 - 0,40 (p.114). Epstein, (1983) diz o mesmo, sugerindo que um item ideal deverá ter uma correlação elevada com a soma de todos os itens no teste (menos ele próprio) e uma correlação baixa com os outros itens.
A consistência interna no presente estudo é de 0,76 (no estudo original variava entre 0,79 e 0,94 (M = 0,86) para os diferentes estudos). A correlação item escala total corrigida para sobreposição, no presente estudo, é de 0,44, 0,59, 0,61 e 0,66. Esta é ligeiramente mais elevada do que a correlação inter-itens que varia entre 0,31 e 0,64. A inspecção dos resultados mostra que os valores encontrados, correlação inter-item e com escala total corrigida, são próximos, sendo que a correlação com a escala total é ligeiramente superior, quando no ideal esta correlação deveria ser substancialmente superior às primeiras. Dado que a escala contém somente quatro itens, e que a correlação item escala total corrigida para sobreposição aumenta com o aumento do número de itens, tal como a consistência interna, este resultado não é mau. O elemento principal, ou seja, a garantia que os itens não são redundantes, é evidente.
Estrutura do questionário - No estudo original da escala utilizaram-se 14 amostras, que incluíam entre 36 e 622 sujeitos, seis delas com menos de 100 sujeitos e quatro com mais de 300, em que 11 eram de estudantes universitários dos Estados Unidos da América ou da Rússia, uma de adultos da comunidade, outra de mulheres da comunidade e outra de reformados. Nesse estudo, a análise da distribuição dos itens em componentes principais, para cada amostra, mostrava que em todas, os itens carregavam um único componente.
No presente estudo, com vista a testar a hipótese da existência de uma única dimensão ou factor, recorremos à análise factorial confirmatória (AFC) com auxílio do EQS V6.1 (Bentler & Wu, 1995). Byrne (2005) sugere que se devem escolher os índices de entre a grande variedade disponibilizada pelos programas estatísticos, e que apenas um ou dois necessitam ser reportados. Recomenda a combinação de dois índices de ajustamento, nomeadamente, o Comparative Fit Índex (CFI; Bentler, 1990), e o Standardized Root Mean Square Residual (SRMR). O CFI avalia a adequação do hipotético modelo relativamente ao pior modelo (independente): se o modelo hipotético não constitui uma melhoria significativa os índices de ajustamento seriam próximos de zero (Bentler, 1995). Para serem adequados os valores de ajustamento requerem uma magnitude do CFI igual ou superior a 0,93 e um valor de SRMR abaixo de 0,08 (Hu & Bentler, 1999).
No presente estudo, os resultados da AFC para a solução de um factor, foram de CFI = 0,97, e SRMR= 0,03, indicando um bom ajustamento para a hipótese da solução de um factor, confirmando a solução proposta na versão original.
Validade convergente discriminante - Estas validades constituem subcategorias da validade de construto: A validade convergente observa-se quando a medida de um construto, que teoricamente deve estar relacionada com a medida de outro construto, exibe de facto uma relação substancial com ela; a divergente observa-se quando construtos que teoricamente não se relacionam, não mostram de facto relação entre eles. Estes valores são encontrados geralmente através da correlação (Campell & Fiske, 1959).
No estudo original a validade concorrente (ou convergente) com a medida de bem-estar subjectivo de Diener et al., (1985) variou entre 0,61 e 0,72 para quatro amostras, na casa dos 0,60 para três amostras dos EUA e de 0,72 para uma amostra da Rússia. Para o presente estudo a correlação foi de 0,60, ou seja, com magnitude semelhante aos originais. Ainda na área da validade convergente a correlação com a avaliação dos construtos da mesma área são da mesma magnitude (Satisfação global com a vida, Índice de Bem-Estar Pessoal respectivamente, 0,60 e 0,63). A correlação com a saúde mental, uma medida global de distresse, também na casa dos 0,60, cai dentro de valores semelhantes aos de outras investigações (Headey, Kelley, & Wearing, 1993; van Hemert, de Vijver, & Poortinga, 2002), correspondendo menor distresse a mais felicidade subjectiva. Para a validade divergente a correlação com construtos de áreas diferentes como a percepção de saúde (r(516)= 0,29, p< 0,0001), magnitude semelhante à referida por Lyubomirsky, Sheldon, e Schkade, (2005), ou de qualidade de vida (r(516) = 0,12, p< 0,005), correspondendo a melhor percepção de saúde e de qualidade de vida, mais felicidade subjectiva, valores que embora estatisticamente significativos, são baixos, com uma magnitude substancialmente menor do que os referidos para a validade convergente.
DISCUSSÃO
O bem-estar abrange um funcionamento psicológico óptimo e é especialmente proeminente na investigação psicológica actual (Ryan, & Deci, 2001). Na perspectiva hedónica, a felicidade subjectiva é considerada como sinónimo de bem-estar subjectivo, satisfação com a vida, entre outros, mas a inspecção dos itens mostra haver diferenças de conteúdo que podemos considerar significativas, mesmo que se aceite que são da mesma área, ou que os construtos subjacentes a estas variáveis sejam semelhantes. No presente estudo este aspecto é visível nas correlações entre estas variáveis (Felicidade Subjectiva, Satisfação global com a vida, Escala de Satisfação com a Vida, Índice de Bem-Estar Pessoal), com cerca de um terço da variância partilhada entre cada par. Esta magnitude correspondente a correlações entre os 0,60 e 0,63, mostra, por um lado, uma associação substancial e, por outro lado, que são variáveis diferentes. Diener, et al. (2003), Veenhoven (2007), e Ramm (1996), discutem em detalhe estas diferenças e semelhanças. Ou seja em vez de medidas alternativas devem, antes, ser consideradas medidas complementares.
A Psicologia tende a interessar-se pelos aspectos negativos da vida das pessoas, de tal modo que o número de artigos na área da psicologia que se debruçam sobre aspectos negativos relativamente aos aspectos positivos é de 17 para 1 (Myers & Diener, 1995).
A correlação moderada com a saúde mental (mais concretamente o distresse) encontrada no nosso estudo, medida esta que adopta uma perspectiva abrangente de saúde mental que inclui aspectos negativos e positivos, vai no sentido apontado por Compton, Smith, Cornish, e Qualls, (1996), e DeNeve, e Copper, (1998). Veit e Ware (1983), estudando a estrutura da saúde mental descrevem um conjunto de dimensões quer positivas quer negativas do funcionamento psicológico, incluindo o bem-estar, dimensões estas que são complementares. Pais-Ribeiro et al. (2010) numa população com pessoas com doenças crónicas encontra uma estrutura em que as variáveis psicológicas positivas se agrupam em componentes diferentes apontando para a sua complementaridade, mais do que para sobreposição ou redundância. Ou seja como referiam Diener, et al., (1997), a felicidade subjectiva é importante para a saúde mental mas não é, nem suficiente nem sinónimo.
O estudo de validação aqui apresentado com intenções transculturais apresenta boas propriedades psicométricas sugerindo que pode ser considerada uma boa medida, com propriedades semelhantes à versão original. O estudo original, apresentado com 14 amostras de grupos populacionais diferentes (embora dominantemente estudantes universitários) de dois países, mostra alguma heterogeneidade através de grupos de idade, populações e entre países. Os resultados do nosso estudo caem dentro dos parâmetros do estudo original, o que significa que a presente versão poderá ser considerada para comparação com os dados originais numa perspectiva transcultural.
REFERÊNCIAS
Alker, H., & Gawin, F. (1978). On the intrapsychic specificity of happiness'. Journal of Personality, 46, 311-325. doi: 10.1111/j.1467-6494.1978.tb00182.x [ Links ]
Andrews, F. M., & Withey, S. B. (1976). Social indicators of well-being: Americans' perceptions of life quality. New York: Plenum Press. [ Links ]
Beaton, D., Bombardier, C., Guillemin, F., & Ferraz, M. (2000). Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, 25, 31863191. doi: 10.1097/00007632-200012150-00014 [ Links ]
Bentler, P. M. (1995). EQS Structural equation program manual. Los Angeles, CA: BMDP Statistical Software. [ Links ]
Bentler, P.M. (1990). Comparative fit indexes in structural models. Psychological Bulletin, 107, 238246. doi:10.1037//0033-2909.107.2.238 [ Links ]
Bentler, P. M., & Wu, E. J. C. (1995). EQS/Windows users guide. Los Angeles, CA: BMDP Statistical Software. [ Links ]
Briggs, S. R, & Cheek, J. M. (1986). The role of factor analysis in the evaluation of personality scales. Journal of Personality, 54,106-148. doi:10.1111/j.1467-6494.1986.tb00391.x [ Links ]
Browne, M. W., & Cudeck, R. (1993). Alternative ways of assessing model fit. In: K. A. Bollen, J. S. Long, & C. A. Newbury (Eds.) Testing structural equation models (pp. 132 162). Newbury Park, CA: Sage. [ Links ]
Byrne. B. (2005). Factor analytic models: viewing the structure of an assessment instrument from three perspectives. Journal of Personality Assessment, 85, 1732. doi:10.1207/s15327752jpa8501_02 [ Links ]
Campell, D. T., & Fiske, D. W. (1959). Convergent and discriminant validation by the multitrait-multimethod matrix. Psychological Bulletin, 56, 81-105. doi:10.1037/h0046016 [ Links ]
Cattell, R. B. (1978). The scientific use of factor analysis in behavioral and life sciences.New York: Plenum. [ Links ]
Compton, W.C., Smith, M.L., Cornish, K.A., & Qualls, D.L. (1996). Factor structure of mental health measures. Journal of Personality and Social Psychology, 71, 406413. doi:10.1037//0022-3514.71.2.406 [ Links ]
Cummins, R. A. (1998). The second approximation to an international standard for life satisfaction. Social Indicators Research, 43, 307334. [ Links ]
DeNeve, K., & Copper, H. (1998). The happy personality: a meta-analysis of 137 personality traits and subjective well-being. Psychological Bulletin, 124, 197-229. doi:10.1037//0033-2909.124.2.197 [ Links ]
de Vijver, F., & Hambleton, R.(1996). Translating tests: some practical guidelines. European Psychologist, 1, 89-99. doi:10.1027/1016-9040.1.2.89 [ Links ]
de Vijver, F., & Poortinga, Y. (1997). Towards an integrated analysis of bias in cross-cultural assessment. European Journal of Psychological Assessment, 13, 2937. dói:10.1027/1015-5759.13.1.29 [ Links ]
Diener, E. (2000). Subjective Well-Being: the science of happiness and a proposal for a national index. American Psychologist, 55, 34-43. doi: 10.1037//0003-066X.55.1.34 [ Links ]
Diener, E. (1994). Assessing subjective well-being: Progress and opportunities. Social Indicators Research, 31, 103157. [ Links ]
Diener, E. (2006). Guidelines for national indicators of subjective well-being and ill-being. Applied Research in Quality of Life, 1, 151157. doi:10.1007/s11482-006-9007-x [ Links ]
Diener, E., Emmons, R. A., Larsen, R. J., & Griffin, S. (1985). The satisfaction with life scale. Journal of Personality Assessment, 49, 71-75. doi:10.1207/s15327752jpa4901_13 [ Links ]
Diener, E., Suh, E., & Oishi, S.(1997). Recent findings on subjective well- being. Indian Journal of Clinical Psychology, 24(1), 25-41. [ Links ]
Diener, E., Scollon, C., & Lucas, R. (2003). The evolving concept of subjective well-being: the multifaceted nature of happiness. Advances in Cell Aging and Gerontology, http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1566312403150079, 187-219. doi:10.1016/S1566-3124(03)15007-9 [ Links ]
Epstein, S. (1983). Aggregation and beyond: Some basic issues on the prediction of behavior. Journal of Personality, 51, 360-392. doi:10.1111/j.1467-6494.1983.tb00338.x [ Links ]
Fordyce, M. (1983). A program to increase happiness: further studies. Journal of Counseling Psychology, 30, 483-498. doi:10.1037//0022-0167.30.4.483 [ Links ]
Headey, B., Kelley, J., & Wearing, A. (1993). Dimensions of mental health: life satisfaction, positive affect, anxiety and depression. Social Indicators Research, 29, 63-82. [ Links ]
Herdman, M., Fox-Rushby, J., & Badia, X., (1998). A model of equivalence in the cultural adaptation of HRQoL instruments: the universalist approach. Quality of Life Research, 7, 323-335. [ Links ]
Hu, L.-T., & Bentler, P. M. (1999). Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural Equation Modeling, 6, 155. doi:10.1080/10705519909540118 [ Links ]
Idler, E., & Benyamini, Y. (1997). Self rated health and mortality: a review of twenty seven community studies. Journal of Health and Social Behavior, 38, 21-37. doi:10.2307/2955359 [ Links ]
Jahoda, M. (1958). Current concepts of positive mental health.New York, NY: Basic Books. [ Links ]
Kline, P. (1986). A handbook of test construction: Introduction to psychometric design.London; UK: Methuen. [ Links ]
Lyubomirsky, S. (2001). Why are some people happier than others? The role of cognitive and motivational processes in well-being. American Psychologist, 26, 239-249. doi:10.1037//0003-066X.56.3.239 [ Links ]
Lyubomirsky, S., & Lepper, H. (1999). A measure of subjective happiness: preliminary reliability and construct validation. Social Indicators Research, 46, 137155. [ Links ]
Lyubomirsky, S., Sheldon, K., & Schkade, D. (2005). Pursuing Happiness: The architecture of sustainable change. Review of General Psychology, 9, 111131. doi:10.1037/1089-2680.9.2.111 [ Links ]
Myers, D., & Diener, E. (1995). Who is happy? Psychological Science, 6,10-17. doi: 10.1111/j.1467-9280.1995.tb00298.x [ Links ]
Neto, F., Barros, J., & Barros, A.(1990). Satisfação com a vida. In: L. Almeida, R. Santiago, P. Silva, O. Caetano, & J. Marques (Eds). A Acção educativa: análise psico-social (pp.105-117). Leiria, Portugal: ESEL/APPORT. [ Links ]
Norrish, J., & Vella-Brodrick, D. (2008). Is the study of happiness a worthy scientific pursuit? Social Indicators Research, 87, 393407. [ Links ]
Pais-Ribeiro, J. (2001). Mental health inventory: um estudo de adaptação à população portuguesa. Psicologia, Saúde & Doenças, 2, 77-99. [ Links ]
Pais Ribeiro, J., & Cummins, R. (2008) O bem-estar pessoal: estudo de validação da versão portuguesa da escala. In: I.Leal, J.Pais-Ribeiro, I. Silva & S.Marques (Eds.). Actas do 7º congresso nacional de psicologia da saúde (pp. 505-508). Lisboa, Portugal: ISPA [ Links ]
Pais-Ribeiro, J. (2009). A importância da qualidade de vida para a psicologia da saúde. In: J.P.Cruz, S.N. de Jesus, & C Nunes (Coords.). Bem-estar e qualidade de vida (pp.31-49). Alcochete, Portugal: Textiverso. [ Links ]
Pais-Ribeiro, J., Silva, I., Pedro, L., Meneses, R., Cardoso, H., Mendonça, D., Vilhena, E., Martins, A., & Martins-da-Silva, A. (2010). Estrutura da boa vida em pessoas com doença crónica. In: I.Leal, & J.Pais-Ribeiro (Eds.). Psicologia da saúde: sexualidade género e saúde (pp.137-146).Lisboa, Portugal: Edições ISPA. [ Links ]
Pavot, W., & Diener, E. (1993). Review of the satisfaction with life scale. Psychological Assessement, 5,164-172. doi:10.1037//1040-3590.5.2.164 [ Links ]
Ramm, D. (1996). Clinically formulated principles of morality. New Ideas in Psychology, 14, 237-256. doi:10.1016/S0732-118X(96)00018-9 [ Links ]
Ryan, R., & Deci, E. (2001). On happiness and human potentials: A review of research on hedonic and eudaimonic well-being. Annual Review of Psychology, 52, 141166. doi: 10.1146/annurev.psych.52.1.141 [ Links ]
Simões, A. (1992). Ulterior validação de uma escala de satisfação com a vida (SWLS). Revista Portuguesa de Pedagogia, 26, 503-515. [ Links ]
van Hemert, D., de Vijver, F., & Poortinga. Y. (2002). The Beck Depression Inventory as a measure of subjective well-being: a cross-national study. Journal of Happiness Studies, 3, 257286. doi: 10.1023/A:1020601806080 [ Links ]
Veenhoven, R. (1997). Advances in understanding happiness. Revue Québécoise de Psychologie, 18, 29-74. [ Links ]
Veenhoven, R. (2000).The four qualities of life: ordering concepts and measures of the good life. Journal of Happiness Studies, 1, 139. doi: 10.1023/A:1010072010360 [ Links ]
Veenhoven, R. (2010).Questioning on happiness. Retirado em 12 de Junho 2010 de http://worlddatabaseofhappiness.eur.nl/ [ Links ]
Veit, C., & Ware, J. (1983). The structure of psychological distress and well-being in general populations. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 51, 730-742.dói:10.1037//0022-006X.51.5.730 [ Links ]
Recebido em 10 de Janeiro de 2011- Aceite em 31 de Maio de 2012
FELICIDADE SUBJECTIVA