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Psicologia, Saúde & Doenças

versão impressa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.13 no.2 Lisboa  2012

 

Funções executivas em sujeitos candidatos e submetidos a cirurgia bariátrica

Executive functions in patients seeking and undergoing bariatric surgery

Susana Sousa 1, Olga Ribeiro 2, José Góis Horácio 2 & Luís Faísca 3

 

1 Universidade do Algarve, Faro, Portugal (s.susana84@gmail.com)

2 Unidade de Neuropsicologia do Hospital de Egas Moniz, Lisboa, Portugal;

3 Instituto de Biotecnologia e Bioengenharia/CBME, Universidade do Algarve, Faro, Portugal

 

RESUMO

A obesidade é uma condição crónica que, além do impacto ao nível da saúde, tem sido relacionada com dificuldades cognitivas, nomeadamente no funcionamento executivo. Na presente investigação pretende-se comparar as funções executivas de dois grupos de obesos: 30 indivíduos candidatos a cirurgia bariátrica e 30 indivíduos sujeitos este tratamento cirúrgico. Foram aplicadas cinco provas neuropsicológicas para avaliar o funcionamento executivo: Mapa do Zoo, Trail Making Test, Stroop, Wisconsin Card Sorting Test e Iowa Gambling Task. Os resultados não evidenciam diferenças significativas entre os dois grupos na maioria das dimensões avaliadas. Os participantes de ambos os grupos apresentam resultados abaixo do esperado atendendo aos seus grupos de referência, revelando dificuldades nas capacidades de planeamento, resolução de problemas, controlo/inibição, flexibilidade cognitiva e tomada de decisão.

Palavras-chave- Obesidade; Funções Executivas; Cirurgia Bariátrica

 

ABSTRACT

Obesity has been linked to cognitive difficulties in executive functions. This study aims to compare the executive functioning of two groups: 30 obese subjects seeking bariatric surgery and 30 bariatric surgery patients. In order to study the influence of weight on cognition, we compare obese subjects and subjects who had lost weight after surgery. We applied five neuropsychological tests to evaluate different components of executive functioning (Zoo Map test, Trail Making Test, Stroop, Wisconsin Card Sorting Test and Iowa Gambling Task). The results show no differences between the groups in almost all components. However, both groups performed below their expected level (considering normative data). They both show difficulties in planning, troubleshooting, control/inhibition, cognitive flexibility and decision-making.

Keywords- Obesity, Executive Functions; Bariatric Surgery

 

A obesidade é definida como uma acumulação de gordura corporal que constitui risco para a saúde (World Health Organization [WHO], 2004). É considerada uma condição crónica (Cassell & Gleaves, 2006) que acarreta riscos acrescidos para a saúde pública. A sua etiologia é heterogénea e pode ser classificada segundo dois grandes contextos, que se influenciam mutuamente: 1) obesidade endógena, relacionada com componentes genéticos, neuropsicológicos, endócrinos e metabólicos; 2) obesidade exógena, influenciada por factores externos de origem comportamental, dietética e/ou ambiental (Monteiro & Angellis, 2007).

A cirurgia bariátrica é uma modalidade terapêutica que produz redução de peso prolongada, através da restrição do volume da ingestão e do controlo da absorção da alimentação ingerida. É realizada quando a dieta, o exercício físico e os tratamentos médicos ou farmacológicos para perda de peso não resultam. O procedimento bariátrico é definido pela alteração cirúrgica do estômago ou intestino. Além da redução de peso, a cirurgia contribui para a redução das comorbilidades associadas à obesidade (Johnson & DeMaria, 2006).

A classificação mais comum do nível de gordura corporal é o Índice de Massa Corporal (IMC), calculado pela fórmula: peso (Kg)/altura2 (m). A obesidade é definida a partir de um IMC igual ou superior a sendo possível distinguir três níveis de gravidade: obesidade moderada ou classe I, quando o IMC se situa entre 30 e 34,9; obesidade grave ou classe II, se o valor de IMC está entre 35-39,9; e obesidade extrema ou Classe III quando o IMC é superior a 40 (WHO, 2004).

São vários os estudos que têm analisado a relação entre o IMC e possíveis modificações estruturais e metabólicas ao nível do sistema nervoso central (SNC), pois parecem existir diferenças morfométricas cerebrais em sujeitos obesos quando comparados com sujeitos com IMC normal (Ward, Carlsson, Trivedi, Sager & Johnson, 2005). Gunstad et al. (2008), verificaram existir uma correlação negativa entre o IMC, o volume cerebral e o volume de massa cinzenta (Gunstad, Paul, Cohen, Tate, Spitznagel & Grieve 2008): os sujeitos obesos possuem menor volume cerebral do que sujeitos normais, assim como menor volume na massa cinzenta das regiões frontais, temporais e parietais do cérebro. Volkow et al. (2008) analisaram o metabolismo cerebral da glicose em sujeitos obesos saudáveis (sem comorbilidades associadas) através de PET (Positron Emission Tomography), tendo verificado uma correlação negativa entre o IMC e a actividade metabólica no córtex pré-frontal e no giro cingulado anterior (Volkow et al., 2008). Observaram ainda que o nível de metabolismo pré-frontal desses indivíduos se correlacionava positivamente com o desempenho em provas de funções executivas (nomeadamente, Wisconsin Card Sorting Test (WCST), Trail Making Test (TMT) e Stroop Interference Test), confirmando assim estudos anteriores que associavam a actividade metabólica destas regiões cerebrais ao desempenho de tarefas executivas (Goldstein et al., 2004).

As funções executivas são um termo abreviado para um conjunto complexo de competências, que incluem um largo espectro de processos cognitivos e comportamentais como o planeamento, resolução de problemas, flexibilidade cognitiva, monitorizarão do comportamento, memória de trabalho, multitasking, utilização de feedback, sequenciação, iniciação e inibição e resistência à interferência (Chan, Shum, Toulopoulou, & Chen, 2008). Alguns estudos têm analisado o funcionamento executivo na obesidade. Em 2007, Gunstad et al. encontraram uma relação inversa entre o IMC e o desempenho em provas cognitivas, numa amostra de obesos adultos saudáveis (Gunstad, Paulb, Cohenb, & Tateb, 2007). Boeka e Loken (2008) verificaram que sujeitos com obesidade extrema revelam maior prevalência de erros e perseveração no WCST, alcançado assim pior desempenho do que indivíduos com IMC normal. Dois anos depois, Lokken, Boeka, Yellumahanthi, Wesley e Clements (2010) encontraram resultados mais baixos no WCST por parte de candidatos a cirurgia bariátrica, sugerindo dificuldades na resolução de problemas, planeamento e perseveração. Também Davis, Patte e Reid (2010) encontraram pior desempenho em tarefas de tomada de decisão em mulheres obesas com e sem compulsão alimentar, quando comparadas a mulheres com peso normal. Estes resultados sugerem uma tomada de decisão não adaptativa e dificuldades na capacidade para adiar a gratificação e lidar com benefícios a longo prazo.

No entanto, é necessário levar em conta as comorbilidades psicológicas da obesidade, entre as quais se destacam a depressão e a ansiedade (Scott et al., 2008), que podem justificar os baixos desempenhos de sujeitos obesos em provas que avaliam as funções executivas. Cserje et al. (2009) mostraram que, numa amostra de mulheres obesas, a presença destes sintomas psicológicos pode mediar, pelo menos parcialmente, o efeito do IMC sobre as dificuldades ao nível da flexibilidade cognitiva e atenção sustentada (Cserje, Luminet, Poncelet, & Lénárd, (2009).

Existem poucos estudos que exploram as alterações cognitivas após o tratamento da obesidade. Num estudo realizado no Brasil, verificaram-se melhorias na atenção e no cálculo em obesos operados, apontando os autores como principais causas os benefícios ao nível dos sistemas circulatório e respiratório, causados pela redução de peso, que por sua vez levam a melhoria das funções cerebrais (Pinto, Satler, & Tomaz, 2010). Observou-se ainda desempenhos inferiores face a um grupo de obesos não operados, ao nível da memória e da aprendizagem, resultados que podem ser explicados por carências nutricionais sentidas na fase pós-operatória, nomeadamente de vitamina B1, indispensável ao funcionamento cerebral.

Num estudo realizado em 2010, Gunstad et al. constataram melhorias na memória (aprendizagem, memória a curto prazo, memória a longo prazo e reconhecimento) ao fim de 12 semanas após cirurgia bariátrica. Observaram-se ainda melhorias nas funções executivas, mas sem que essas alterações fossem estatisticamente significativas (Gunstad et al., 2010). Para estes autores, o reduzido número de estudos existentes que analisam o desempenho cognitivo após cirurgia bariátrica justifica a necessidade de conduzir investigação adicional para clarificar os efeitos da redução de peso nas funções cognitivas avaliadas no período pós-operatório.

O principal objectivo deste estudo é explorar o desempenho cognitivo de indivíduos obesos candidatos a cirurgia e de indivíduos já submetidos a esse procedimento cirúrgico. Admitindo que a obesidade é um fator de risco nas funções executivas e considerando os efeitos positivos da cirurgia bariátrica na redução de peso, estabelece-se como hipótese que os participantes submetidos a cirurgia e que tenham reduzido o seu IMC apresentem um desempenho executivo superior ao dos participantes obesos ainda não operados. A ser confirmada tal hipótese, estar-se-á a contribuir para o esclarecimento do papel da obesidade nas alterações ao funcionamento cognitivo, nomeadamente ao nível das funções executivas.

 

MÉTODO

Participantes

Participaram dois grupos, cada um com 30 participantes: obesos candidatos a cirurgia bariátrica (grupo pré) e obesos já submetidos ao mesmo procedimento cirúrgico (grupo pós). O processo de amostragem foi não probabilístico, sendo os participantes selecionados entre os sujeitos acompanhados pelo Projeto de Tratamento Cirúrgico da Obesidade do Hospital Egas Moniz de Lisboa. Foram definidos os seguintes critérios de inclusão: a) Ter diagnóstico de obesidade; b) Ser candidato a cirurgia para tratamento da obesidade ou já ter efectuado a cirurgia; c) Idade compreendida entre os 25 e os 60 anos; d) Ausência de deterioração cognitiva ou história de doença neurológica ou consumo de drogas.

Os dois grupos são predominantemente constituídos por participantes do sexo feminino, casados ou em união de facto, maioritariamente com escolaridade ao nível do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário, com idades entre os 26 e os 59 anos (M= 43,9 anos). Os dois grupos são equivalentes em termos de sexo, idade, escolaridade, situação profissional e rendimento mensal.

No grupo pós-operatório, 40% dos sujeitos foram submetidos a Sleeve Gástrico, 37% a Bypass Gástrico e 23% colocaram Banda Gástrica. Estes indivíduos têm em média um tempo de pós cirurgia de 22,6 meses (DP = 23,1) e apresentam uma redução de 31,5% na média do peso relativamente ao seu peso pré-cirurgia.

Em comparação com os sujeitos candidatos a cirurgia, os sujeitos operados apresentam valores de IMC moderadamente mais baixos. Verifica-se um IMC médio de 42,71 (DP = 5,98) no grupo pré (Obesidade Extrema) e um IMC médio de 32,63 (DP= 4,33) no grupo pós-operátorio (Obesidade Moderada). Regista-se assim uma diferença de 10,09 pontos no IMC, sendo esta diferença de magnitude elevada e estatisticamente significativa (t = 7,48; p < 0,0001; d de Cohen = 1,93). Relativamente ao peso, o grupo pré apresenta uma média de 117kg e o grupo pós uma média de 88kg, o que corresponde a uma diferença estatisticamente significativa e de grande magnitude (t = 6,35; p = 0,0001, d de Cohen = 1,60).

Material

A todos os participantes foi explicado que a sua participação seria voluntária e confidencial, através de Consentimento Informado. Foram utilizados os seguintes instrumentos para recolha de dados: Questionário Sociodemográfico e Clínico, a versão portuguesa da Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS) (Zigmond & Snaith, 1983; versão portuguesa de Pais-Ribeiro, Silva, Ferreira, Martins, Menezes, & Baltar, 2007), e cinco provas de avaliação das funções executivas: Mapa do Zoo (Wilson, Alderman, Burges, Emslie, & Evans, 1996), TMT (versão portuguesa de Cavaco, Pinto, Gonçalves, Gomes, Pereira, & Malaquias, 2008), Stroop (Golden, 1975), WCST (Heaton, Chelune, Talley, Kay, & Curtiss, 2001) e Iowa Gambling Task – IGT (Bechara, 2007).

Procedimentos

Após concedida autorização por parte da instituição, iniciou-se a recolha individual dos dados. A cada participante foi explicado, num primeiro momento, o propósito do estudo e o facto de a sua participação ser voluntária e confidencial, através da leitura e preenchimento de Consentimento Informado. De seguida passou-se ao preenchimento dos instrumentos de recolha de dados e à realização das provas neuropsicológicas. Posteriormente, os dados recolhidos foram submetidos a análise estatística através do programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS).

 

RESULTADOS

A quase totalidade das diferenças observadas entre os dois grupos nos parâmetros de avaliação neuropsicológica é de magnitude reduzida (d de Cohen < 0,5) e não significativa (Quadro 1), à exceção dos erros cometidos na parte B do TMT, tendo o grupo pós-operatório apresentado um número de erros significativamente superior ao grupo pré-operatório (t = -2,52; p = 0,01).

 

Quadro 1

Resultados das provas de avaliação neuropsicológica e da HADSpara os grupos pré- e pós-operatório (pontuações diretas; média ± desvio-padrão)

 

As pontuações obtidas na HADS indicam que ambos os grupos apresentam indicadores de sintomatologia ansiosa leve, não diferindo entre si (p = 0,23). No que respeita à depressão, existe uma diferença significativa e de grande magnitude (p = 0,0001), apresentando o grupo pré-operatório valores superiores e indicadores de sintomatologia leve e situando-se o grupo pós-operatório no limite normal.

Admitindo que a presença de sintomas depressivos pode afectar o desempenho em provas neuropsicológicas, os resultados nulos encontrados na comparação entre dois grupos poder-se-iam dever, pelo menos parcialmente, aos níveis de depressão mais elevados do grupo pré-operatório. No entanto, após realizar uma ANCOVA em que a medida de depressão entrou como co-variável, a ausência de diferenças significativos entre grupos manteve-se, indicando que o desempenho nas provas neuropsicológicas não parece ser afectados pelas diferenças nos níveis de depressão.

Numa segunda análise, procedeu-se à comparação dos valores obtidos pelos dois grupos com os valores de referência (ajustados para idade e escolaridade) de cada prova neuropsicológica, sempre que os mesmos estavam disponíveis (nomeadamente, TMT, Stroop, WCST e IGT). Verificou-se que o desempenho dos dois grupos foi sistematicamente inferior ao esperado atendendo à idade e escolaridade dos participantes. Na parte A do TMT, verifica-se que ambos os grupos apresentam tempos médios de execução claramente superiores ao esperado (grupo pré: t = -4,21, p = 0,0001; grupo pós; t = -3,24, p < 0,003), embora o número de erros não difira significativamente dos níveis de referência (grupo pré: t = -1,78, p = ns; grupo pós: t = -1,00, p = ns). Na parte B do TMT, ambos os grupos apresentaram um número médio de erros superior ao esperado (grupo pré: t = -2,71, p < 0,01; grupo pós: t = -3,86, p < 0,001), embora apenas o grupo pré-operatório tenha despendido na execução um tempo significativamente superior ao valor de referência (grupo pré: t = -3,17, p < 0,004; grupo pós: t = -1,02, p = ns). Em três das medidas proporcionadas pela prova de Stroop, tanto o grupo pré- como o grupo pós-operatório se posicionaram claramente abaixo dos níveis de referência (prova de leitura, prova de nomeação e prova de interferência; valores de p < 0,001); no entanto, relativamente ao parâmetro nível de interferência, apenas o grupo pós-operatório mostrou desempenho abaixo do esperado (t = -2,10, p < 0,04). No WCST, os dois grupos apresentam resultados significativamente abaixo do esperado em todos os parâmetros considerados (% de erros, % de respostas perseverativas, % de erros perseverativos, % de erros não perseverativos; valores p < 0,01). Também a comparação com os valores de referência do IGT indica que ambos os grupos alcançaram resultados totais claramente abaixo dos valores de referência (p < 0,01).

 

DISCUSSÃO

Com o objetivo de explorar as implicações da obesidade nas funções executivas, o presente estudo comparou o desempenho cognitivo de dois grupos de sujeitos obesos: antes de realizar cirurgia para redução de peso (grupo pré-operatório) e depois de submetidos à cirurgia bariátrica (grupo pós-operatório) cirúrgica. Desta forma, pretendia-se averiguar o impacto da perda de peso após cirurgia no funcionamento executivo.

A ausência de diferenças de desempenho entre os dois grupos não permitiu confirmar a hipótese segundo a qual se esperava melhoria no funcionamento executivo após a perda de peso induzida por cirurgia bariátrica (Duchesne et al., 2009; Gunstad et al., 2007).

Uma possível explicação para não se observarem melhorias a nível do funcionamento executivo remete para eventuais restrições nutricionais e alimentares decorrentes do procedimento cirúrgico e da dieta pós-intervenção, as quais podem ter impacto no SNC pela redução do metabolismo de glicose no cérebro (Benton & Sargent, 1992). A redução da capacidade gástrica e a diminuição do trato intestinal também podem originar distúrbios nutricionais específicos por redução da capacidade de absorção, por exemplo na vitamina B1, que potenciam alterações cognitivas após cirurgia (Martinez-Vall & Andres, 2007).

Pode-se ainda questionar se a perda de peso dos sujeitos operados terá sido suficiente para se verificarem as melhorias esperadas a nível cognitivo. Apesar da redução de cerca de 10 pontos no IMC registada no momento da avaliação, muito sujeitos operados ainda se encontram num grau de obesidade moderada ou grave.

O facto de ambos os grupos mostrarem sistematicamente desempenhos abaixo do seu grupo de referência nas diferentes provas aplicadas parece reforçar a evidência de que a obesidade se associa a dificuldades nas funções executivas. Estes resultados são consistentes com outros estudos que relatam dificuldades cognitivas específicas em sujeitos obesos (Cserje et al., 2009; Duchesne et al., 2009; Gunstad et al., 2007) e são compatíveis com a hipótese de existir um perfil cognitivo característico desta população que não seja consequência directa de um IMC elevado (Feil et al., 2009).

No que respeita à ansiedade e depressão, os resultados vão ao encontro de investigações que relatam melhorias nos sintomas depressivos após perda de peso e a manutenção dos níveis de ansiedade após tratamento da obesidade (Dixon, Dixon, & O'Brien, 2003). As melhorias na sintomatologia depressiva podem dever-se à redução de peso, à diminuição das limitações físicas associadas à obesidade, à melhoria no estado geral de saúde e na qualidade de vida (Dymek, Le Grange, Neven, & Alverdy, 2002). A prevalência dos sintomas de ansiedade após cirurgia pode ser explicada pela necessária adaptação dos sujeitos às mudanças provocadas pela perda de peso resultante da cirurgia (Dymek et al., 2002). Por outro lado, e uma vez que os sintomas de ansiedade estão presentes nos dois grupos, pode-se avançar a hipótese de constituírem traços psicológicos característicos destes sujeitos, tal como sugerido por Scott et al. (2008).

Em síntese, a intervenção cirúrgica e consequente perda de peso parece não ter tido o efeito esperado na melhoria do desempenho cognitivo dos participantes avaliados no presente estudo. De um modo geral, e independentemente de terem sido ou não submetidos a intervenção cirúrgica e consequente perda de peso, o desempenho dos participantes indiciou um funcionamento executivo claramente abaixo dos níveis esperados atendendo à sua idade e nível de escolaridade.

O perfil executivo dos dois grupos indica dificuldades na produção de respostas atencionais e comportamentais alternativas, sendo compatível com as dificuldades relatadas pelos sujeitos obesos em estabelecer novos padrões de saúde relacionados com a alimentação e a actividade física. Considera-se provável que sujeitos obesos com dificuldades nestas funções cognitivas estejam em risco de aumento de peso ou até mesmo perpetuar a sua obesidade, devido à influência que o funcionamento executivo tem na capacidade auto-reguladora do comportamento.

O estudo conta com algumas limitações, nomeadamente a sua natureza transversal com grupos independentes, quando o ideal seria um estudo longitudinal (pré-, pós-cirurgia e follow-up). A amostra, recolhida em função da disponibilidade dos participantes, não permitiu obter grupos totalmente equivalentes em termos de idade, escolaridade e comorbilidades. Por outro lado, a heterogeneidade do grupo pós-operatório relativamente ao tipo de cirurgia e ao tempo pós-cirúrgico pode ter aumentado a variabilidade dos resultados e camuflado eventuais diferenças.

Futuras investigações deverão recorrer a planos longitudinais, para avaliar o funcionamento executivo desde a pré-cirurgia e até 36 meses após a intervenção, de modo a melhor caracterizar a evolução das funções cognitivas executivas e clarificar se essa evolução se associa à progressão na perda de peso. Acreditamos que o recurso a paradigmas de avaliação neuropsicológica, em conjunto com o estudo biológico dos mecanismos cerebrais subjacentes, pode ajudar a compreender os aspectos comportamentais da alimentação excessiva e do aumento de peso. Assim, seria importante prosseguir com a exploração dos factores cognitivos que possam caracterizar população obesa.

 

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Recebido em 20 de Junho de 2012/ Aceite em 10 de Novembro de 2012