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Psicologia, Saúde & Doenças

versão impressa ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.14 no.1 Lisboa mar. 2013

 

Estresse: Revisão Narrativa da Evolução Conceitual, Perspetivas Teóricas e Metodológicas

Stress: Narrative Review of Conceptual Evolution, Theoretical and Methodological Perspectives

 

André Faro & Marcos Emanoel Pereira

Universidade Federal de Sergipe (UFS), Departamento de Psicologia (DPS), Aracaju- Sergipe-Brasil. Universidade Federal da Bahia (UFBA), Pós-Graduação em Psicologia Social, Salvador-Bahia-Brasil.

 

RESUMO

A presente revisão narrativa objetivou traçar a evolução conceitual do estresse, abarcando aspectos teóricos e metodológicos das três principais vertentes de estudo, entendidas aqui como: a perspetiva baseada na resposta, a perspetiva baseada no estímulo e a perspetiva cognitiva. Além disso, buscou-se apresentar uma proposta de conceituação do estresse de acordo com o panorama contemporâneo de estudos e com as evidências empíricas acerca do fenômeno, tendo como meta fomentar debates e incentivar a produção de delineamentos de pesquisa que contemplem problemáticas estudadas na psicologia da saúde e áreas de interface. Espera-se evidenciar importantes informações a respeito dos modos de aplicação da teoria, trazendo à pauta as contribuições e possibilidades de cada vertente de análise.

Palavras-Chave - adaptação psicossocial; capacidade de adaptação; estresse; processo saúde-doença; psicologia da saúde; revisão narrativa.

 

ABSTRACT

This narrative review aimed to outline the conceptual evolution of stress, covering theoretical and methodological aspects of the three main areas of study, defined here as the response-based perspective, the stimulus-based perspective and the cognitive perspective. In addition, we sought to present a proposal for a conceptualization of stress according to the contemporary viewpoint of studies and the empirical evidences about the phenomenon, aiming to foster debate and encourage the production of research designs that consider issues studied in health psychology and interface areas. Thus, it seeks to highlight the historical development of the theory of stress, one of the most common forms of study of the health-illness process and of human capacity for adaptation in researches of psychology and health.

Keywords: psychosocial adaptation; adaptability; stress; health-illness process; health psychology; narrative review.

 

Entre teorias de grande alcance nas áreas de interface da psicologia e as ciências da saúde, certamente, o estresse figura como um dos construtos mais enfatizados quando se discute a adaptação dos seres humanos às adversidades. Em seu largo espectro de influência teórica e ampla difusão no âmbito das propostas de pesquisa, o processo de estresse pode ser considerado como um tema que, muito provavelmente, os pesquisadores psicólogos já se depararam, ou se depararão, ao priorizar a análise do processo saúde-doença em sua dinâmica biopsicossocial.

Um conceito interdisciplinar que hoje espelha a amplitude de abordagens do estresse é ele entendido enquanto fenômeno psicossocial, que incide sobre o funcionamento neurofisiológico, disparado quando ocorre a percepção de uma ameaça real ou imaginária que denota a capacidade de afetar a integridade física e/ou mental de um indivíduo (Santos, 2010). Todavia, ainda que se entenda o estresse como um conceito de fácil apreensão, não só na academia, mas também no saber leigo, não são encontrados estudos que aprofundem o olhar sobre os momentos de sua evolução conceitual e o paralelo estabelecimento dos parâmetros de compreensão contemporâneos. Isso destaca visto que, a depender do panorama explicativo assumido, a menção ao estresse pode assumir diferentes entendimentos e, consequentemente, produz diversas implicações não só no delineamento das investigações, mas, sobretudo, na interpretação de resultados das pesquisas.

Logo, julgou-se necessária a realização de um estudo, em língua portuguesa, que efetuasse uma revisão narrativa acerca da teoria do conceito de estresse, mostrando em que sentido, e porquê, houve sua evolução conceitual, o que permitiria o apontamento de direcionamentos atuais para a investigação em seus diferentes campos de aplicação. Com efeito, a revisão narrativa é apreendida como um procedimento metodológico que visa à descrição e detalhamento de um dado tema (Rother, 2007), reunindo informações relevantes de caráter teórico e contextual para evolução de um determinado tópico de estudo. Por isso, o estilo de produção segundo a lógica da revisão narrativa foi escolhida como a abordagem mais apropriada para este trabalho.

Frente ao exposto, a presente revisão narrativa objetivou: 1. Traçar a evolução conceitual do estresse, abarcando aspectos teóricos e metodológicos das três principais vertentes de estudo, entendidas aqui como: a perspetiva baseada na resposta, a perspetiva baseada no estímulo e a perspetiva cognitiva; e 2. Apresentar uma conceituação do estresse de acordo com o panorama contemporâneo de estudo e evidências empíricas sobre o fenômeno, tendo como meta fomentar debates e incentivar a produção de delineamentos de pesquisa que contemplem problemáticas estudadas na psicologia da saúde e áreas de interface.

Espera-se que com esta revisão sejam evidenciadas importantes informações a respeito dos modos de aplicação da teoria, trazendo à pauta as contribuições e possibilidades de cada vertente de análise. Com isso, intenta-se ressaltar o desenvolvimento histórico da teoria do estresse, uma das mais comuns formas de estudo do processo saúde-doença e da capacidade de adaptação humana no âmbito das investigações em psicologia e saúde.

 

Evolução Conceitual do Estresse

O estresse está intimamente ligado à capacidade de adaptação e à mudança. Embora exista algum consenso a partir desse princípio, a definição do estresse permanece como um dos aspectos de maior discussão quando se busca estudar o assunto. Percebe-se, atualmente, que se configura uma tarefa inócua buscar um simples conceito para este fenômeno (Moal, 2007), posto que apesar de ter estabelecida sua aceitação científica, diferentes campos de pesquisa se dedicam ao estudo das inúmeras facetas do estresse, o que faz proliferar as mais diversas concepções (Monroe, 2008; Santos, 2010). É necessário, então, extrair as principais contribuições da evolução conceitual do fenômeno e assim restringir o que se pretende explicar quando se faz referência ao termo estresse.

O termo estresse foi mencionado a partir do século XIV, traduzindo situações de desafio, adversidade ou aflição. Entretanto, foi apenas a partir do século XIX que o estresse ficou entendido como a razão existente entre a ação e a reação ocasionada por uma força que age sobre uma determinada superfície. Assim, entre os séculos XIV e XIX, o estresse assumiu, evolutivamente, a noção de ser um objeto ligado à relação entre a exposição a um dado elemento e a capacidade de resistir à ação do mesmo (González, 2001; Selye, 1993).

Na fisiologia, Claude Bernard, no final do século XIX, deu início a uma nova fase de estudos sobre a adaptação dos seres vivos, afirmando que somente com um meio interior constante e estável o organismo encontra condições suficientes para manter a sobrevivência (González, 2001). Deste ponto em diante, aventou-se que as repercussões motivadas por mudanças do ambiente externo poderiam conduzir a condições de desestabilização e desintegração do organismo alvo, isto por alterar o funcionamento fisiológico em virtude de desordens no equilíbrio orgânico. Sob o mesmo princípio, Walter Cannon sistematizou, em 1935, o então conceito fundamental para os estudos dos efeitos de agentes desestabilizadores sobre o organismo – a homeostase. Cannon mostrou que o corpo possui um sistema básico de defesa e manutenção dos níveis basais de funcionamento fisiológico, intitulado homeostasia, cujo significado é ser um estado de equilíbrio que permite a adaptação do organismo diante das constantes mudanças do ambiente externo, absorvidas direta ou indiretamente pelo meio interno (Cannon, 1935).

Poucos anos depois de Cannon, em 1936, Hans Selye publicou o primeiro trabalho sob a ótica do estresse [A syndrome produced by diverse nocuous agents (Nature, 1936)], no qual alegou a existência de um conjunto orquestrado de respostas endocrinológicas que são ativadas frente à ação de estímulos nocivos que alteram o estado de homeostase. A partir deste conceito, inicialmente concebido como uma síndrome biológica, Selye incitou no meio científico a necessidade de se estudar as respostas adaptativas, sendo que o interesse residia em descobrir o limiar existente entre a capacidade de sobrevivência e o declínio da saúde mediante os desafios que lhes são impostas (Viner, 1999).

Causando significativo impacto após sua primeira menção em 1936, o estresse foi paulatinamente assumido enquanto objeto de estudo nas diversas áreas da ciência, cujos enfoques particulares a cada campo designaram sua definição básica e os prováveis caminhos das investigações na temática. Como ilustração disso, nas ciências biológicas em geral, o estresse ainda é, basicamente, apreendido enquanto repercussão da ação de estímulos adversos sobre o organismo (Buwalda et al., 2005; Gunnar & Quevedo, 2007; Vannitallie, 2002).

Já nas ciências sociais, em que o interesse surge aliado a ideia de que o ambiente sociohistórico fomenta níveis de exposição e competência adaptativa variados, o estresse é concebido através do conjunto de fatores sociais que alteram a adaptação do indivíduo, sendo que é a possível incapacidade de ajuste com as demandas adaptativas do meio que resulta em efeitos danosos sobre a saúde, e não mera responsividade automática aos estímulos estressógenos (Aneshensel, 1992; Aneshensel, 2005; Angus et al., 2007; DeVries, Grasper, & Detillion, 2003).

Na psicologia, hoje em dia se compartilham algumas noções do estresse com as ciências sociais e, também, ratifica-se o impacto sobre o funcionamento biológico, mas o enfoque explicativo parte prioritariamente do indivíduo para o meio. Logo, uma conceituação basal para a psicologia é o estresse como uma relação particular entre o indivíduo e o ambiente, tornando-se essencial compreender todo e qualquer recurso psicológico e social que intermedeie este contato (Cooper & Dewe, 2007; Lazarus, 2000; Moal, 2007).

Pode-se resumir, então, que, desde as suas origens, o estresse tem fundamentos pautados em dois aspectos: o estudo de como o organismo mantém suas funções diante das perturbações impostas pelos fatores estressores; e quais os custos e consequências resultantes da dinâmica regulatória (Goldstein & Kopin, 2007; McEwen, 2008; McEwen & Lasley, 2007; McEwen & Wingfield, 2003). Com isso, embora exista uma linha básica de pensamento em cada área da ciência, que é a concepção do estresse como um estado de alteração frente à ação de estímulos que incitam o seu desequilíbrio, as disciplinas científicas privilegiaram um enfoque particular no estudo do estresse.

Especificamente na psicologia da saúde, prisma deste estudo, preconiza-se o estresse como um processo relacional e o que se busca é entender o porquê da variabilidade enquanto exposição psicossocial a risco à saúde ou intensidade da resposta adaptativa, isto dentro do panorama explicativo das diferenças individuais (House & Mortimer, 1990; Lazarus, 2007; Monroe, 2008; Schnittker & McLeod, 2005). Desse modo, o foco se volta para as particularidades da interação entre o aparato psicológico, o entorno social e o funcionamento biológico, privilegiando-se, sobretudo, a busca pela elucidação de como funciona e se diferencia, quantitativa e qualitativamente, a capacidade de adaptação individual.

Hoje, com o passar das suas sete décadas de estudo, constata-se que o conceito de estresse é contingente ao campo de estudo pelo qual é apropriado, requerendo-se, então, o esforço de situá-lo temporal e espacialmente para que se circunscreva o seu alcance e possibilidades explicativas. Portanto, três perspetivas teóricas são reconhecidas como os principais aportes explicativos e sobre eles se desenvolve a evolução teórica do estresse (Kudielka, Buske-Kirschbaum, Hellhammer, & Kirschbaum, 2004; Moal, 2007; Monroe, 2008). São elas:

1. A perspetiva baseada na resposta, cujo interesse está na repercussão biológica do fenômeno;

2. A perspetiva baseada no estímulo, que se volta para a análise dos eventos psicossociais e sociais que deflagram as respostas neurofisiológicas do estresse;

3. A perspetiva cognitivista, que assume o estresse como uma relação particular entre o indivíduo e o meio.

Enfim, com base no que foi explicitado, a seguir são descritas com maior profundidade as propostas das três perspetivas, explorando-se a contribuição de cada uma dessas para a conceituação mais recente acerca do estresse e, como consequência, buscando-se fundamentar a exposição com estudos que se alinhem a alguma das vertentes de trabalho, provendo respaldo teórico para a execução de investigações em psicologia da saúde e psicologia social da saúde.

 

A Perspetiva Baseada na Resposta

No senso comum, com frequência se constata que as pessoas mencionam um suposto “estado de estresse” em virtude de suas sensações corporais, sejam elas relatadas através de desgaste físico, ou mesmo pela percepção de tensão emocional (e.g.1 “meu estômago queima, devo estar estressado”). Vê-se, então, que a palavra estresse tenta traduzir sinais biológicos que indicam que o organismo está funcionando fora de seu padrão habitual.

Esse sentido atribuído ao estresse aloca-se, historicamente, na perspetiva baseada na resposta, que predominou entre os anos de 1940 e 1970. Sua contribuição foi demonstrar que o organismo possui um padrão básico de respostas diante de situações que alteram o seu estado de homeostase, o qual busca se restabelecer por meio de uma cadeia de reações gerais no funcionamento neurofisiológico.

Para Selye, fundador da teoria e principal representante da perspetiva, o estresse é uma resposta orgânica inespecífica frente a uma demanda qualquer que altere o estado de homeostase (Selye, 1954; Selye, 1993). Relativos ao estresse, Selye apontou que quatro aspectos que devem ser ressaltados: a) a inespecificidade da resposta, b) a existência de um complexo estereotipado de reações fisiológicas, c) o excessivo consumo de energia adaptativa e, por fim, d) o surgimento das doenças adaptativas.

Por inespecificidade, Selye explicou que o aparato inato de defesa é ativado diante de qualquer elemento biológico, psicológico ou social desestabilizador, havendo um conjunto comum de reações neurofisiológicas disparado em vista do restabelecimento da homeostase. Tal conjunto foi denominado como a Síndrome de Adaptação Geral (SAG - Selye, 1936).

A SAG representa um padrão regular de respostas neurofisiológicas que seguem um processo em três fases bem definidas: alarme, que é a resposta inicial e se caracteriza pelo mecanismo de luta-fuga; a resistência, que mobiliza a capacidade do organismo suportar a ação do estressor em um espaço de tempo limitado; e, por último, a exaustão, que ocorre quando os recursos adaptativos da resistência cessam em virtude do desgaste por superativação ou falência de funções orgânicas (Selye, 1950; Selye, 1954).

Tal como explicitado por Selye no início do século XX, ainda hoje se confirma que caso o contato com o estressor seja passageiro ou o organismo disponha de recursos suficientes para lidar com a situação, a fase de alarme cessa e o organismo inicia seu trajeto para o restabelecimento dos níveis homeostáticos de funcionamento (Cohen & Herbert, 1996; McEwen, 1999b; Selye, 1954; Ursin, 1998). Porém, haja vista que entre os seres humanos a presença do estressor não precisa ser real e a repercussão emocional mantém ativo o espectro da experiência estressora, o indivíduo lança mão de sua energia adaptativa para resistir à situação e, por isso, o estressor pode ser tolerado dentro de limites individuais de intensidade e temporalidade da exposição, o que caracteriza a segunda etapa do estresse, que é a fase de resistência. Entretanto, com o prolongamento da exposição e o excesso no consumo dos recursos adaptativos, é provável a fragilização de um ou mais sistemas orgânicos e, possivelmente, o surgimento de doenças, posto que o desgaste contínuo altera prejudicialmente o funcionamento biológico, revelando a fase de exaustão (Selye, 1950; Selye, 1954).

Todo o processo da SAG envolve a ativação e o consumo de energia adaptativa, cujo significado é o montante de recursos psicobiológicos disponíveis para lidar com alterações no estado basal de funcionamento. Por exemplo, Selye (1954) destacou que mediante o contato com um estressor, são ativadas reações ligadas à ansiedade e aumento da força muscular, visando a um suposto combate com o elemento estressógeno, processo esse intuitivo em qualquer animal. Atualmente, considera-se que a energia adaptativa seja traduzida através do uso de recursos cognitivos e a complacência de alguns mecanismos cerebrais, que facilitam ou limitam o nível de adaptabilidade ao ambiente e o contexto experiencial (Lupien, Maheu, Tu, Fiocco, & Schramek, 2007).

Selye demonstrou que quatro estruturas sofrem as primeiras transformações deletérias desencadeadas pelo estresse (Selye, 1940; 1944). Ocorre a hiperatividade crônica do córtex supra-renal, o que influencia a dinâmica hormonal do cortisol e outros hormônios por ele ativados. Há também a atrofia do timo e dos gânglios linfáticos, o que interfere negativamente sobre o aparato imunológico e facilita o aparecimento de úlceras gastrointestinais, resultantes da liberação contínua de ácidos digestivos. Dado o fato que estes seriam os primeiros sistemas a apresentar perdas funcionais, o estresse se mostrou como um processo envolvido com o aparecimento de inúmeras patologias, tais como gastrites, infecções e distúrbios hormonais.

Uma vez que a energia adaptativa é finita e requer ausência/minimização de desgaste para reposição parcial ou total, concluiu-se que o excesso de ativação dos sistemas orgânicos envolvidos na defesa do organismo tende a acumular consequências negativas derivadas do desgaste, o qual, por paralelismo biológico, derivado da insuficiência de recursos proporcionais ao montante de mobilização, ocasiona perdas funcionais dos órgãos e tecidos mobilizados durante o processo (Selye, 1936; Selye, 1954). Este, portanto, foi o principal contributo que as pesquisas iniciais sobre o estresse trouxeram para a compreensão de como experiências danosas, objetivas ou subjetivas, podem facilitar o adoecimento (McEwen & Wingfield, 2003; Viner, 1999).

As doenças adaptativas, segundo Selye (1954), surgem em virtude de duas condições: ou o estressor supera a capacidade adaptativa individual ou atinge vulnerabilidades predisposicionais na estrutura do organismo. Como resultado, diferentes indivíduos podem desenvolver diferentes patologias sob a influência de um mesmo tipo de estressor (Selye, 1950; Selye, 1993). Como exemplo de inadequação da capacidade adaptativa, tem-se os estressores crônicos que, por mais que se disponibilizem recursos para a adaptação, há a contínua tendência de ultrapassar os limites de energia adaptativa (e.g. a relação entre tensão emocional e depressão endógena) (Hammem, 2005; McEwen & Lasley, 2007).

No caso da vulnerabilidade, a predisposição genética para doenças degenerativas pode ser ativada pela imunossupressão decorrente da cronificação das reações neurofisiológicas, o que torna o estresse um facilitador das patologias (e.g. a relação entre o estresse e o desencadeamento da esclerose múltipla) (Ackerman et al., 2002; Beeney & Arnet, 2008; McEwen, 2008; Olff, 199). Finalmente, Selye (1993) enfatizou que as doenças adaptativas não eram derivadas do estressor ou do estresse propriamente dito, mas da inadequação das reações, tendo em vista que a cadeia de repercussão neurofisiológica é composta por respostas estereotipadas (e.g. padrões responsivos regulares de liberação do cortisol) e muitas vezes incompatíveis ao contexto atual da vida humana.

Em síntese, para a perspetiva baseada na resposta, o estresse pode ser resumido como um processo tripartite que consiste em (Selye, 1954; Selye, 1993):

O efeito direto do estressor sobre o corpo;

  1. A estereotipia de respostas fisiológicas que estimulam a defesa de tecidos e órgãos específicos para combater o elemento estressor objetivo ou subjetivo, e, quando contínua;
  2. Reações internas que incitam à falência ou perda de capacidade de determinados órgãos ou sistemas, além da instabilidade funcional de tecidos por desnecessário ou excessivo estado de defesa.

Por ser o primeiro momento das pesquisas sobre o tema, é perceptível que Selye estruturou seus achados em torno das consequências do estresse, discriminando os sistemas orgânicos que são afetados no processo, isto pela clara influência de sua área de formação, a endocrinologia. Dentre seus principais contributos à ciência, tem se comprovado que o estresse está na raiz de inúmeras doenças físicas e desordens psicológicas (Cohen, Janick-Deverts, & Miller, 2007), sendo esse o conhecimento mais difundido acerca do estresse até hoje. A linha de investigações de Selye evoluiu significativamente para os estudos da neurofisiologia do estresse, ramo responsável pela consolidação do estresse enquanto fator de risco à saúde (Pert, 2007; Ursin, 1998).

Um aspecto limitante a ser destacado é que caso se utilize o conceito de estresse baseado na resposta, torna-se prospectivamente inviável estudá-lo, pois a proposta se limita a aguardar a reação biológica para determinar a origem e a intensidade da repercussão (Ursin & Ericksen, 2004). Com isso, a ênfase da resposta ao estresse se restringe à investigação do estado de estresse ou mesmo como o organismo reage a esse, configurando um campo de estudos focado na comprovação de consequências.

Consentindo com a necessidade de ampliação do seu conceito, o próprio Selye ressaltou que embora se detivesse inicialmente a mapear as repercussões biológicas, um dos possíveis caminhos para o prosseguimento dos estudos era a investigação acerca das particularidades da resposta ao estresse e o aprofundamento sobre as características dos estressores (Selye, 1954; Selye, 1993; Viner, 1999). Esta análise encontrou endosso nos estudos mais recentes do estresse (Depke et al., 2008; Gunnar & Quevedo, 2007), pois, tal como pressupunha Selye, apesar de se confirmar em última via sobre o funcionamento biológico, o estresse é um fenômeno inerente às dinâmicas psicológica e social humanas.

Dohrenwend (1973a), corroborando a validade do estresse enquanto conceito, mas trazendo inquietações a respeito do estado do conhecimento da época, citou que o mais importante passo a ser dado seria a mensuração dos fatores que ocasionam o estresse, pontuando, assim, que os estressores seriam o aspecto de maior relevância para as pesquisas. Recentemente esta proposta foi relembrada por Dohrenwend (2006), ao explicar que, se elemento indutor do estresse é um importante fator para o funcionamento do organismo em geral, ainda é atual a necessidade de considerar os estressores como fenômenos estratégicos para a compreensão do estresse.

Com base nos motivos citados, a perspetiva baseada na resposta se mostrou demasiadamente restrita para a psicologia, tendo em vista que não abstraiu o papel interacional de componentes psicológicos e sociais (e.g. emoções e a cognição) no estresse enquanto processo (Lazarus, 1973; Lazarus, 2000; Lazarus & Folkman, 1984; Olff, Langeland, & Gersons, 2005; Ursin, 1998). Na tentativa de fornecer uma resposta a esses questionamentos, surgiu a segunda linha explicativa do estresse, a perspetiva baseada no estímulo, a qual buscou explicitar o poder diferencial dos eventos externos na eliciação das reações de estresse.

 

A Perspetiva Baseada no Estímulo

Não é incomum encontrar estudantes que se expressem da seguinte forma: “estou estressado por causa da pós-graduação”. Aqui, percebe-se que o foco da atenção não se centra nas repercussões biológicas do estresse, como visto na perspetiva baseada na resposta, mas na singularidade do estressor. Esse relato pressupõe que os estímulos causadores do estresse incidem sobre os indivíduos e são eles os prováveis responsáveis pelo desencadeamento da cadeia de respostas do organismo, seguindo-se o modelo comportamental clássico baseado na díade Estímulo-Resposta (E-R). Nesta perspetiva, o estresse é uma característica probabilística de condições ambientais particulares que autonomamente incidem sobre a capacidade adaptativa dos indivíduos.

Corroborando os achados biológicos de Selye e tentando aprofundar os estudos acerca dos fatores eliciadores do estresse, Dohrenwend (1973a) citou que não é interessante unicamente identificar as repercussões do estresse, mas, sobretudo, as pesquisas devem se voltar para a detecção dos estressores que motivam o seu desencadeamento. Desta forma, a perspetiva baseada no estímulo defende que cada estressor apresenta nuanças que denotam demandas específicas sobre a capacidade adaptativa do indivíduo e, com isso, produzem respostas de estresse diferenciadas (Thoits, 1981).

Com efeito, o foco dos estudos centra-se no estabelecimento de relações entre tipos de estressores e a sua correlação com a reação fisiológica, que varia sua intensidade de acordo com as características do estressor (Dohrenwend, 1973a). Como o grande marco desta perspetiva, Holmes e Rahe (1967) propuseram medidas para denominados Eventos Vitais Estressores (EVE), que seriam, então, determinadas situações críticas que podem ocorrer na vida de qualquer indivíduo e, frente a estas, sempre é requerida uma quantidade de esforço adaptativo específica para cada tipo evento. Em outras palavras, cada EVE apresenta um peso na medida final de vulnerabilidade ao estresse, exigindo maior ou menor dispêndio de energia para se ajustar à situação e manter o status de saúde.

Holmes e Rahe (1967), após documentar uma ampla lista de situações que tinham ocorrido na vida de aproximadamente 5000 pessoas, perceberam que os indivíduos doentes tinham experiências em comum no período anterior à eclosão da patologia. Entre os eventos constatados havia desde questões de maior potencial desestruturador, como, por exemplo, a descoberta de uma doença grave, casamento e nascimento de filho; até situações menos graves, tais como perda de objetos pessoais, mudança de hábitos e mudança de residência, dentre outros. O diferencial entre a variação da gravidade percebida foi que enquanto as de maior potencial podem levar ao adoecimento de forma isolada, as de menor potencial atuam muitas vezes em conjunto, a ponto de extenuar a capacidade adaptativa, equiparando, ao final, o seu poder deletério ao das situações mais graves.

De posse da lista de eventos, Holmes e Rahe (1967) conduziram entrevistas para detectar a problemática básica que caracterizava os eventos como estressores e encontraram que todos, de modo direto ou indireto, requeriam ações adaptativas para enfrentar a situação. Explicando o seu achado, os autores pontuaram que não era o significado atribuído ao evento, nem mesmo a repercussão de cunho emocional ou social que determinava o caráter estressor da situação, mas, a necessidade de empregar esforços para adaptar-se e/ou lidar com o evento é que demonstrava o poder deletério do evento vital estressor, isto é, a mera presença do EVE denota a existência do estresse (Rahe, 1978; Rahe, 1990).

A partir de testagens anteriores, Holmes e Rahe (1967) desenvolveram a Escala de Reajustamento Social (Social Readjustment Rating Escale – SRRE), certamente, o instrumento de medida do estresse mais utilizado até hoje (Monroe, 2008). Nele, estão relacionados 43 eventos que representam as mais comuns situações eliciadoras de estresse, propondo-se que ao se identificar a ocorrência de experiências altamente danosas na vida de uma pessoa, é possível predizer o diagnóstico de estresse e o quão vulnerável em sua saúde estaria em vista da exposição.

Para cada um dos itens da SRRE se atribuiu um valor de esforço adaptativo específico, denominado como Unidade de Mudança na Vida (Life Change Unit – LCU). O item de menor potencial lesivo na SRRE (recebimento de multa por infração) possui 11 LCU´s e o de maior impacto possui 100 LCU´s (morte do cônjuge). Até 150 LCU é o esperado para a experiência de um ano anterior a medida, sendo este o parâmetro de normalidade. Com o ponto de corte, mais três níveis foram estabelecidos para a determinação de uma crise vital na SRRE. Na faixa de 150 até 199 pontos, a probabilidade adoecimento em virtude dos EVE seria de 37%. Entre 200 e 300 LCU, a probabilidade de doenças motivadas pelo estresse ficou em 51% e, acima de 300 LCU, a probabilidade aumentaria para 79% (Holmes & Rahe, 1967).

Por modular a intensidade do estresse, o mapeamento de EVE´s assumiu destaque como objeto de estudo que estabelece o prospecto montante de energia adaptativa despendida pelo indivíduo para enfrentar o estressor (Dohrenwend, 1973b), suprindo a lacuna deixada por Selye ao não mensurar os fatores que disparavam a SAG. Conforme a opinião de Holmes e Rahe (1967), embora exista alguma mediação subjetiva das experiências, o importante para os estudos do estresse é a quantidade de mudanças derivadas da ocorrência dos estressores, pois esta variação é que proporciona as mais significativas mudanças no funcionamento biológico do indivíduo. Para esses autores, a realidade objetiva ou material do estressor se sobrepõe a outros impactos, tais como o do significado, as emoções ou a desejabilidade social, geralmente ligados ao contexto do estresse. Enfim, refletindo de forma clara a perspetiva baseada no estímulo, é a presença e a magnitude intrínseca ao evento estressor que determina o alcance das reações do estresse.

Dada a explicação, é possível definir, pelo menos, duas categorias básicas de estressores: os macro-estressores, que são situações que ocasionam grandes mudanças na vida de um indivíduo ou grupo, ou seja, eventos que requerem um importante investimento de energia adaptativa para prover a capacidade de lidar adequadamente com a situação (e.g. casamento e nascimento de um filho); e os micro-estressores, que são eventos de menor porte que ocorrem na vida dos indivíduos e no cotidiano dos grupos, que requerem algum esforço para enfrentar a situação (e.g. tensão no trânsito e relações interpessoais no trabalho).

Tal como se percebe hoje em dia, o conjunto de medidas dos EVE favoreceu, de forma inovadora, a criação de taxonomias de situações estressoras a partir da análise dos padrões mais comuns de resposta observadas em indivíduos sob estresse. Por exemplo, Holmes e Rahe (1967) pontuaram a perda do cônjuge como 100 pontos, numa escala onde este valor corresponde aproximadamente a 70% do ponto de corte mínimo para a probabilidade de desenvolver uma doença em virtude do estresse (150 LCU) em um período de 1 ano. Sobre isso, Cottington, Matthews, Talbott e Kuller (1980), ao analisarem a relação entre EVE e casos de morte súbita em mulheres, encontraram que aquelas que morreram subitamente tinham uma chance seis vezes maior de terem perdido alguém significativo em um período de seis meses antes do falecimento. Recentemente, Ackerman et al. (2002) constataram que a presença de EVE é um preditor da exarcerbação dos sintomas de esclerose múltipla (80% em seis meses) e eleva a chance de piora no quadro em cerca de 13 vezes em um espaço de 15 dias.

Enfim, o pressuposto da perspetiva baseada no estímulo encontrou alicerce na distinção do poder dos estressores sobre a variação do estresse, preconizando que há situações que são naturalmente estressoras em qualquer nível considerado e sua repercussão está ligada às características objetivas do estímulo, sendo estas as suas maiores contribuições para a teoria do estresse.

Dentre as críticas que surgiram acerca da perspetiva em questão, a medida dos EVE´s falhou ao não considerar as diferenças individuais (Cohen, Kamarck, & Mermelstein, 1983; Lazarus & Folkman, 1984), além de não ter sido explicitado o poder de variáveis que modificavam do impacto dos estressores (DeLonguis, Folkman, & Lazarus, 1988; Lazarus, 1993). Reiterando parcialmente as críticas, Dorhenwend (2006) destacou que foram poucas as pesquisas que conseguiram corroborar a validade preditiva das medidas de EVE de forma geral, não sendo, portanto, referências adequadas para a avaliação da proposta da perspetiva baseada no estímulo.

Outra crítica importante se centrou no poder dos estressores, uma vez que Holmes e Rahe (1967) focalizaram eventos que, em sua maioria, causavam importante repercussão mas, quase que totalmente, desprezaram situações corriqueiras que se configuram como estressores comuns a determinadas pessoas. Com isso, entende-se que se por um lado os macro-estressores denotam impacto generalizado, sua ocorrência não é frequente, e quando frequentes se restringe a uma combinação particular (e rara) de eventos graves, tal como pode ocorrer em uma guerra (Lazarus, 1993). Já os micro-estressores, cujo principal representante é o aborrecimento cotidiano, pouco assumiram destaque na perspetiva do estímulo, apesar de denotar uma maior correlação com estados de adoecimento mais comuns (Ader & Cohen, 1993; Lazarus & Folkman, 1984; McEwen, 2008).

A partir da necessidade de relativizar o impacto dos EVE´s, ascendeu a ideia de que a avaliação do evento é um elemento diferencial na determinação do estresse, pois, a depender da interpretação individual, um estressor produz distintos desfechos a partir da subjetivação da intensidade nas reações adaptativas (Lazarus, 1999). Nesse sentido, a redução do volume de estudos a partir do final da década de 1980 acerca dos EVE´s foi consequência da necessidade de compreensão da variabilidade responsiva do estresse, posto que ao se generalizar os estressores e padronizar o seu impacto, pouco se avançou na criação de uma medida capaz de detectar nuanças como maior ou menor vulnerabilidade aos estressores.

Compreende-se, então, que a perspetiva baseada no estímulo não contemplou o fato de que há mecanismos adaptativos que elevam ou atenuam a intensidade da reação estressógena, tornando difícil a distinção de situações onde realmente ocorre o estresse de outras situações em que o organismo apenas reage, mantendo a repercussão dentro dos padrões usuais para o sujeito. Coerentemente a tal argumentação, percebe-se que tanto a perspetiva baseada no estímulo, como a baseada na resposta, careciam de refinamento, pois se pautaram em defender a universalidade dos estressores e o automatismo global da resposta – escamoteando as diferenças biológicas, psicológicas e sociais –, feito que despreza a variabilidade adaptativa do ser humano, já que tudo era (perspetiva baseada no estímulo) ou resultava (perspetiva baseada na resposta) em estresse.

Partindo da constatação que a percepção do mundo e a significação subjetiva são os estressores mais comuns aos indivíduos em geral, estudiosos foram além das perspetivas baseadas no estímulo e na resposta e perceberam que a avaliação cognitiva desempenhava o papel fundamental da determinação do estresse (Cooper & Dewe, 2007; Lazarus, 1973; Lazarus, 2000). Esta mudança de ponto de vista tentou explicar as diferenças individuais, pois apesar de haver a exposição a estressores similares, indivíduos diferem enquanto resposta e, também, apesar de sofrerem a ação de estressores de diferentes categorias, são constatadas repercussões de similar intensidade.

Em resumo, a perspetiva baseada no estímulo trouxe efetivamente o estudo do estresse para os domínios da psicologia e, em virtude das críticas geradas, prefaciou o desenvolvimento da corrente atual dos estudos, a perspetiva cognitiva. Assim, contemporaneamente se defende o princípio que apesar do estresse ser um fenômeno interativo entre o sujeito e o mundo, esta relação não é de causalidade direta (E-R), pois está permeada por processos intra-individuais que determinam o curso da experiência humana (modelo Estímulo-Organismo-Resposta; E-O-R).

 

A Perspetiva Cognitiva

Por vezes, ouve-se alguma afirmação com a seguinte intenção: “não estou conseguindo lidar com X (uma situação qualquer) e isso me deixa estressado; assim, terminarei adoecendo”. Tal expressão se insere na perspetiva cognitiva, revelando que o estresse não se limita à reação orgânica, nem ao evento estressor, mas, especialmente, faz referência ao fato de não estar capacitado a enfrentar a situação e, com isso, manejá-la satisfatoriamente na própria vida.

Conceitualmente, a perspetiva cognitiva propiciou avanços nos estudos acerca da subjetividade do estresse ao defender que processos psicológicos interferem na relação entre o ambiente e o organismo (Cooper & Dewe, 2007). Com efeito, partindo do princípio que o estresse não é uma condição isolada ou meramente responsiva, a investigação dos processos psicológicos ligados à interpretação dos estressores permitiu a estruturação de modelos explicativos da psicologia voltados para a relação entre o estímulo, o organismo e a resposta final (E-O-R), ou seja, antecedentes, variáveis processuais e resultados (Folkman, Lazarus, Gruen, & DeLongis, 1986).

Para a perspetiva cognitiva, apenas quando um estressor (E) é avaliado como uma demanda que supera a capacidade adaptativa (O) é que surgem reações adaptativas de estresse (R) (Lazarus, 1993). Desta forma, o estresse só ocorre mediante a percepção de experiências que ultrapassam a capacidade do indivíduo lidar de forma satisfatória com a situação ou ainda quando as respostas eliciadas pelo contato com o estressor extrapolam o nível de competência disponível para enfrentar a situação (Lazarus & Folkman, 1984).

Para Lazarus (1999), no início dos estudos sobre o estresse havia a tendência generalizante acerca dos estressores, em que quase toda experiência humana era considerada sob o prisma da necessidade incessante de adaptação. Porém, ao contrário do que se pressupunha, é evidente que a maioria das ações rotineiras e automatizadas através de processos cognitivos, ou mesmo estilos de vida, não necessariamente envolvem estresse (Lazarus, 2000). Cabe salientar, portanto, que segundo a perspetiva cognitiva nem todas as experiências são estressoras, como uma vez afirmado na perspetiva baseada na resposta, nem mesmo todos os estressores possuem a capacidade intrínseca de produzir estresse, tal como defendido pela perspetiva baseada no estímulo. Com isso, a avaliação cognitiva é o processo interativo que determina o porquê e em que medida as transações entre a pessoa e o ambiente são estressoras (Lazarus, 1993; Lazarus, 2007; King, 2005).

Apontando para a especificidade do fenômeno, o prisma cognitivo ressalta que apenas quando um estímulo é percebido como um fator de ameaça, desafio, dano ou prejuízo, respostas ligadas ao estresse são desencadeadas. Nesse caso, excluem-se situações ordinárias que usualmente não disparam níveis excitatórios acima do habitual e contextos onde algum subsídio adaptativo foi formado em meio a experiência prévias (Lazarus & Folkman, 1984). Na mesma linha de explicação, entende-se que o estresse não é unidirecional, isto é, não se limita a um processo avaliativo único. Assim, mediante avaliações sucessivas do estressor e do próprio desfecho do estresse, após terem sido lançados à mão os mecanismos adaptativos, o indivíduo busca continuamente novos estados de ajustamento ao estressor e, com isso, altera a relação entre a percepção e a reação do estresse até que seja extinto o caráter ou o estímulo estressor (e.g. estressor à avaliação à enfrentamento à reação de estresse à desfecho à reavaliação à estressor com nova conformação à enfrentamento à ...) (Lazarus, 1993).

Tendo em vista a maior profundidade na explicação de como se processa psicologicamente a tríade E-O-R, a avaliação cognitiva assumiu destaque entre os modelos teóricos mais robustos na explicação do estresse (Cooper & Dewe, 2007; Lazarus, 2007; Monroe, 2008). Tal modelo percute como peça central o pressuposto da influência de processos avaliativos cognitivos sobre o impacto dos estressores, dado o fato de estressores considerados menores serem capazes de amplificar a reação de estresse em virtude do significado atribuído à interação indivíduo-ambiente.

Logo, ao espraiar-se como um terreno propício para o desenvolvimento de ideias, isto por primar pela variabilidade adaptativa diante dos estressores, coube aos pesquisadores identificar as variáveis e processos que dão suporte à avaliação cognitiva na relação entre o indivíduo e o estressor. A partir desse momento surgiu um amplo espectro de investigações que buscaram elucidar o porquê de alguns indivíduos perecerem mais rapidamente à ação de estressores que, entre outros sujeitos, pode passar despercebida.

Superando, portanto, o momento teórico fundado em respostas reflexas e o determinismo ambiental, o conceito de estresse se expandiu e agregou a multiplicidade de fatores que envolvem diferenças individuais. Essas diferenças foram inseridas como modelo basal para explicar a suscetibilidade ao estresse em duas condições: diretamente, por vulnerabilidade adquirida ou inata, ou indiretamente, por meio de preditores e mediadores da relação o estressor-avaliação-resposta. Essa última condição é que se revelou como mais promissora para os estudos, pois se é possível influenciar o processo em meio aos seus elementos causais ou mesmo alterar os fatores que transmitem os efeitos do estímulo estressor, a compreensão da via intermediária do processamento cognitivo é o caminho pelo qual deveria seguir a investigação do estresse.

Para a condução de pesquisas que surgiram nas últimas décadas, a vertente explicativa cognitiva é, sem dúvida, a que melhor estruturou o conceito de estresse (Hankin, 2008), prevalecendo entre os mais recentes estudos no âmbito da psicologia. Embora as perspetivas anteriores tenham denotado importantes contribuições, ainda assim não abstraíram a principal característica do estresse: estímulo e resposta são elementos parciais no processo, pois o complexo causal é determinado pela particular interação entre ambiente, percepção do estresse, status organismo e tempo de exposição.

Em decorrência da relevância das diferenças individuais que afetam a percepção do estresse e o funcionamento neurofisiológico, uma considerável gama de variáveis se inseriu como vias explicativas das distintas reações adaptativas, favorecendo o desenvolvimento de campos de estudo independentes, porém complementares, na formulação teorizações mais complexas para o estresse.

Adquiriram significância as características da realidade psicossocial, notabilizando o seu poder de predição dos efeitos do estresse, como por exemplo a raça e o sexo (Eaton & Bradley, 2008; Jones, Cross & DeFour, 2007; Leicht, 2008; Vega & Rumbaut, 1991). Também elegantes e complexas proposições teóricas provieram para alinhar os recursos psicológicos e psicossociais às explicações sobre o estresse, com destaque para as estratégias de enfrentamento (coping), a percepção de controlabilidade e o suporte social (Bolger & Amarel, 2007; Folkman, 1984; Lazarus & Folkman, 1984; Schreurs & Ridder, 1997).

Hoje em dia, é importante ressaltar que a análise de construtos teóricos na relação com o estresse parece ser a principal vertente de estudo na temática para as próximas décadas, tendo em vista que se trata de como o estresse é manejado psicológica e psicossocialmente. E, além do mais, esses construtos reportam às explicações do porquê da diferenciação adaptativa inter e intra-individual diante dos estressores e no próprio processo de estresse.

Enfim, depreende-se desta exposição que a mediação cognitiva é uma constante nas experiências humanas e atualmente é defendida como a maior responsável pela variabilidade individual a respeito do estresse. Em consequência de sua ampla exposição e, de certo modo, de sua oposição à abordagem da perspetiva baseada no estímulo, a perspetiva cognitiva é alvo de críticas dirigidas à sua possibilidade de aplicação concreta, extrapolando as suposições teóricas. Por isso, no próximo tópico são abordadas duas análises paradoxais que se fazem em relação à proposta cognitiva, trazendo-se, ao final, a delimitação de uma acepção para o estresse que busca agregar as contribuições que todas as perspetivas fizeram à teoria do estresse, em especial, a perspetiva cognitiva.

 

A Adoção da Perspetiva Cognitiva e sua Amplitude: Uma Delimitação para o Conceito de Estresse

A respeito da adoção da perspetiva cognitiva, existem dois argumentos aparentemente opostos que se posicionam quanto à sua validade:

  1. A perspetiva cognitiva não pode ser aplicada a todos os estressores - se por um lado é relativamente forte a ligação entre o estresse biológico e o estresse percebido, por outro, há poucas evidências de que a avaliação cognitiva suporte os estressores de forma indistinta (Dohrenwend, 2006; Rahe, 1990).
  2. O ato de interpretar as experiências e atribuir significados é o único motor do estresse – há uma fraca relação entre os estressores ambientais e um padrão de repercussão sobre os indivíduos, dada a variabilidade de desfechos encontrados mediante a exposição a um mesmo evento estressógeno. Portanto, sob a ação de um único estressor a resposta pode ir desde a ausência de estresse ao extremo do surgimento de doenças adaptativas (Lazarus, 1973; Lazarus & Folkman, 1984).

De acordo com as duas posições supracitadas, os argumentos para a defesa e combate aqui serão tratados inicialmente de forma separada, e, ao final, mostra-se em que sentido esta suposta dicotomia conjuga do mesmo aspecto crítico e possibilita congregar as três perspetivas evolutivas do estresse. Enfim, busca-se estabelecer alguns limites e possibilidades de aplicação da perspetiva cognitiva, embasando, no desfecho, o prisma acerca do estresse que se concebe para o final desta investigação.

Sobre o primeiro argumento, o qual minimiza o poder da proposta cognitiva, para Rahe (1978), embora se aplique a um rol significativo de situações comuns, a avaliação cognitiva parece exercer um papel de menor impacto diante de macro-estressores, ou seja, o estresse é uma questão de probabilidade e não de significado. Por exemplo, Skinner e Lei (1980) destacaram que apenas a presença de um EVE é capaz de motivar um estado de estresse. Em seu estudo, os autores compararam dois tipos de medida: uma primeira em que as pessoas indicavam o evento estressor e a sua magnitude e um segundo que somente listava a ocorrência daquela situação. Como resultados, constataram que cotejar a magnitude dos eventos implica em uma ínfima diferença na capacidade preditiva do instrumento, fato que não supera a vantagem de utilizar uma medida objetiva; logo, não há, segundo Skinner e Lei, a necessidade da valoração subjetiva dos eventos estressores e os EVE podem ser previamente selecionados pelo pesquisador.

Analisando-se de forma mais ampla a posição de Rahe (Rahe, 1978; Rahe, 1990), é sabido que os estressores não se resumem a eventos micro ou macro, existindo a necessidade de se explicitar a função da mediação cognitiva. Por exemplo, é evidente que de fato existem demandas que vão além dos recursos humanos de adaptação (e.g. tortura, Eitinger & Major, 1993), o que dispensa um primeiro filtro cognitivo em virtude da excessiva carga estressora e da imprevisibilidade de desfecho. Contudo, ainda assim, o papel da avaliação e interpretação dos eventos se faz presente na modulação do estresse, posto que apesar de não atuar sobre a percepção do estímulo, age posteriormente na administração dos efeitos e na reavaliação do estressor.

Detalhando-se tal exemplo, constata-se que mesmo diante de doenças crônicas severas e debilitantes, que são estressores potentes e que tendem a superar os mecanismos neurofisiológicos de adaptação, os indivíduos encontram formas de lidar com a repercussão da doença, provendo novos sentidos para o estímulo inicial e atenuando os efeitos do estresse por meio do suporte social (Dysvik, Natvig, Eikeland, & Lindstrøm, 2005). Outro exemplo é que em contextos sociais nocivos, onde a controlabilidade individual pouco interfere no desenrolar da situação (e.g. ser vítima de atos de violência repentina e gratuita), a significação post-hoc auxilia a contornar os danos causados pelo estressor e, por vezes, permite a restauração de um status adaptativo saudável (Crofford, 2007; McEwen & Lasley, 2007). Portanto, tais influências da mediação sobre o estresse são defendidas em virtude de que as pessoas podem exibir distintos padrões adaptativos por meio das sucessivas reavaliações de um estressor persistente ou inesperado.

A análise demonstra que nem sempre a avaliação cognitiva tem o poder de eliminar o caráter estressógeno de algumas situações em sua primeira interpretação, dada a existência de alguns estressores que ultrapassam a capacidade de ajuste psicológico e biológico, mas, nem por isso é anulado o papel da reavaliação cognitiva do estressor (Lazarus, 1999; Skinner & Zimmer-Gembeck, 2007). Assim como nos exemplos acima citados, a dinâmica cognitiva, em sua a função de alterar o curso do estímulo estressor, conduz a ativação de recursos adaptativos que agem minimizando as reações do estresse, permitindo a resistência temporária ao estressor mesmo em condições severas e, por vezes, fornece interpretações mais suscetíveis ao manejo da situação (Breznitz & Goldberger, 1993; Duncan, 2007; Hagedoorn, Sanderman, Bolks, Tuinstra, & Coyne, 2008; Sapolsky, 2007)

Outra observação que reforça a existência da mediação cognitiva é que embora situações agudas e de alto teor nocivo possuam o caráter de provocar reações de estresse acentuadas, a capacidade de associar experiências prévias e atuais, partindo para a elaboração de novos modos de adaptação, assegura que os indivíduos apresentem diferentes níveis de ajuste pós-exposição (Parker, Bahrick, Fivush, & Jonhson, 2006; Taylor & Stanton, 2007). Esta assertiva corrobora a visão de que avaliação cognitiva tanto influencia a percepção do estressor, como também o processo e o desfecho do estresse. Como ilustração, diante de dois sujeitos que perderam metade da sua família em um acidente, pode-se hipotetizar diferentes posturas diante da mesma notícia: enquanto em um predomina a lamentação pela a morte de metade seus parentes, o outro denota menor sofrimento (ou apresenta consequências menos danosas) pelo fato de metade da família ter sobrevivido às circunstâncias.

Finalizando a análise do primeiro argumento e resguardando-se os extremos da adaptação humana, a mediação cognitiva se faz presente antes, durante e após o contato com o estressor, seja extinguindo, atenuando ou acentuando o impacto inicial e as repercussões do estresse. Pressupõe-se, também, que ainda que seja factual a ocorrência de eventos extremos, a vida, em geral, permanece diante da mediania do impacto desestruturador das experiências, o que reitera a legitimidade da mediação cognitiva como a base das experiências estressógenas.

Sobre o segundo argumento, que superestima a perspetiva cognitiva, o destaque é dado ao papel da interpretação à luz da máxima do filósofo Epiteto: “o homem não é afetado pelas coisas, mas pela forma que vê e faz coisas”. Acredita-se, neste viés, que as experiências humanas somente podem ser explicadas por características internas ao indivíduo, pois a interpretação é a condição sine qua non para a determinação do que afeta, ou não, o bem-estar. Esta postura, apesar de parecer ser a mais aceita nos estudos ligados ao estresse e a cognição na psicologia (Cooper & Dewe, 2007), também merece que sejam preservados alguns limites em sua assunção.

Como já se expôs anteriormente, existem alguns estressores que extrapolam a capacidade adaptativa humana. Mesmo com o poder da interpretação em atenuar a ameaça de alguns estímulos estressores, características inerentes a determinados eventos superam os extremos da adaptação. Por exemplo, ainda que um paciente com câncer agressivo demonstre uma elevada capacidade de ajustamento, a doença em si produz repercussões neurofisiológicas e psicossociais que são incompatíveis com a superação completa das adversidades (Antoni et al., 2009; Walker, Heys, & Eremin, 1999).

Não se pode considerar, portanto, que o estresse é originado exclusivamente pela forma de perceber as experiências, totalizando a avaliação dos estressores como única via de impacto dos estressores. Diante disso, apesar de poder existir uma grande disponibilidade de recursos adaptativos, organismo e mente tendem a sucumbir frente à sobreposição de sucessivas transformações e perdas derivadas de estressores extremos.

Embora coerente com a proposta inicial de Lazarus (1993), a limitação do segundo argumento se dá em vista da supremacia inquestionável da avaliação cognitiva, como se faz na frase de Epiteto. Como consequência, percebe-se que parafrasear o filósofo responsabiliza totalmente o indivíduo pela dinâmica adaptativa ao colocar a mediação cognitiva como elemento único do estresse, o que anula o impacto particular de eventos altamente estressógenos e despreza a certeza de prejuízos biológicos e sociais incontroláveis (Hobfoll, 1988).

Sobre isso, por exemplo, diante de um câncer agressivo e terminal, mecanismos psicossociais como a resignação, busca de apoio social e a regulação emocional se fazem úteis para estruturar as defesas psicológicas durante a experiência e na preparação para adversidades futuras (Hagedoorn et al., 2008), o que mostra o papel da percepção, mas mantém eminente a importância de caracterizar o estressor, já que ele produz danos em parte independentes da avaliação subjetiva (Hobfoll, 1988; Lin & Ensel, 1989). Enfim, apesar do grande poder mediador da percepção, a avaliação cognitiva apresenta limites em sua capacidade de alterar completamente o curso de determinados estressores, pois a vida também é constituída, ainda que em menor frequência, por situações psicossociais e biológicas que ultrapassam o limiar de enfrentamento humano.

Portanto, a partir do que foi exposto até o momento, entende-se que o conceito de estresse que melhor se adéqua da realidade é o de Lazarus e Folkman (1984) – uma relação particular entre o sujeito e o ambiente que é avaliado pelo indivíduo como sobrecarregando ou excedendo seus recursos e ameaçando seu bem-estar –, com a ressalva que aqui se faz, isto é, desde que não se suponha o totalitarismo da avaliação cognitiva e nem se despreze o poder de alguns estressores; o que requer a avaliação dos mediadores do processo de estresse.

O estresse, na presente proposta de interpretação, seria, então, fruto de avaliações sucessivas dos estímulos percebidos pelos indivíduos, ocorrendo quando pressões ambientais, psicológicas ou ainda desajustes biológicos imprimem a necessidade de prover ou ativar recursos adaptativos, até que seja dissipado o caráter estressor ou o organismo sucumba a sua magnitude e/ou à ação do tempo de exposição.

Sintetizando-se, enfim, a perspetiva cognitiva, viu-se que o delineamento de fatores além da relação E-R situou o estresse como conceito viável para o desenvolvimento de pesquisas na psicologia, pois, estando caracterizado como processo E-O-R, estão abertas as possibilidades de escrutínio das variáveis que influenciam o fenômeno. Como grande contributo da perspetiva, sem dispensar na totalidade as perspetivas da resposta e do estímulo, a inclusão da avaliação cognitiva proporcionou a organização de diferentes estratégias de medida e investigação do estresse.

 

COMENTÁRIOS

Como foi visto nesta revisão, o conceito de estresse passou por diferentes momentos evolutivos desde a sua proposição por Selye, em 1936, alcançando, hoje em dia, o status predominante de ser um conceito voltado para a interpretação de estressores e as modalidades de repercussão que incidem sobre o organismo.

Quanto às contribuições peculiares a cada perspetiva aqui descrita, viu-se que a vertente baseada na resposta fomentou a consolidação do estresse como um elemento primordial para a apreensão da dinâmica psicossocial do processo saúde-doença, descrevendo tipos e níveis de influência do estresse sobre o organismo, além de ter sido proposto que o fenômeno pode estar envolvido em diversas condições de saúde. No caso da perspetiva baseada no estímulo, o mapeamento de estressores e a análise estratificada do impacto das adversidades sobre o organismo foi uma contribuição fundamental para a entrada do estresse no âmbito da psicologia, tendo, atualmente, reunido um amplo rol de evidências acerca da relação entre experiências humanas e a intensidade do desgaste dos recursos adaptativos, o que por sua vez facilitaria o aparecimento de doenças.

No que tange à perspetiva cognitiva, a ênfase na mediação subjetiva abriu novas possibilidades de investigação, ratificando o pressuposto de que a capacidade de atribuição de significados seria o filtro fundamental para a análise das relações entre o indivíduo e o mundo, também entendida enquanto relação entre percepção e repercussão das experiências cotidianas que podem afetar o processo saúde-doença e adaptação aos estressores.

Constatou-se, ainda, que cada uma das perspetivas de conceituação do estresse exibem possibilidades de trabalho e críticas ao seu modelo de investigação, cabendo ao pesquisador compatibilizar suas pretensões de estudo aos pressupostos que melhor fundamentam sua vertente de análise. Logo, a depender dos objetivos de pesquisa, é necessário verificar que tipo de abordagem é mais favorável à condução e delineamento da investigação, podendo ela estar voltada à comprovação de impacto do estresse sobre a saúde (perspetiva baseada na resposta), à elucidação de estressores e sua capacidade de mobilização adaptativa (perspetiva baseada no estímulo) ou às formas de avaliação das experiências que são percebidas como estressoras e as consequências destas sobre o indivíduo (perspetiva cognitiva).

Em relação ao conceito aqui proposto, pretende-se que ele possa auxiliar os investigadores à apreensão da característica processual do estresse, suscitando à reflexão acerca da abrangência de suas diversas facetas de análise, que comportam, dinamicamente, elementos explicativos derivados do ambiente (estressores), da mediação subjetiva (processos psicológicos) e suas consequências (doenças e distúrbios relacionados).

Sobre as limitações desta revisão, cabe lembrar que aqui não foi devidamente aprofundado o conhecimento sobre a neurofisiologia do estresse, que é um campo de estudos de extrema relevância para o esclarecimento acerca das vias pelas quais o estresse afeta o organismo. Outra limitação se trata de não terem sido exploradas as contribuições das ciências sociais e da epidemiologia social ao estudo do estresse, que usualmente trazem dados que atestam o estresse como um elemento capaz de alterar a probabilidade de determinados grupos sociais (e.g. minorias raciais, mulheres, pobres, idosos, etc.) sofrerem uma maior exposição a estressores seletivos (e.g. privação social, racismo, preconceito, etc.) e, consequentemente, exibirem piores perfis de saúde.

Frente ao exposto na revisão e às limitações detectadas, acredita-se que o estresse é um tema promissor, e profícuo, para a continuidade das pesquisas em psicologia da saúde, requerendo dos estudiosos o investimento em pesquisas que detalhem, por exemplo, como ocorre a produção de variabilidade nos índices de saúde de indivíduos e grupos, tendo como base o estresse como mecanismo explicativo. Outrossim, interessam também pesquisas que possam aprofundar os estudos sobre a adaptação a determinados tipos doenças, agudas e crônicas, visando à elucidação de como as pessoas lidam com os desafios impostos pela situação e como isso afeta a sua saúde. Com o estudo da interação entre os fatores estressores e as formas assumidas pela capacidade de adaptação, tornar-se-ia possível entender melhor como as diferenças individuais modificam as reações ao estresse, ou seja, o que torna uma pessoa mais suscetível, ou não, às consequências do estresse severo e/ou persistente.

Para finalizar, julga-se pertinente lembrar a pergunta de Evans (1994), que questionou por que algumas pessoas adoecem mais facilmente, enquanto outras não. De acordo com o estudo sobre o estresse aqui efetuado, acredita-se que a diferença entre os que adoecem mais ou menos facilmente não se deve ao nível de exposição a estressores, nem exclusivamente às características de inserção social, mas, sobretudo, aos modos de lidar e atribuir significados às experiências e estímulos estressógenos, visto que a capacidade adaptativa, em sua perspetiva psicossocial, parece assumir parte significativa do quão bem adaptado, ou não, encontrar-se-á o indivíduo ao se deparar e/ou perceber estressores.

 

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AGRADECIMENTOS

Pesquisa financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e pela Fundação de Amparo à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe (FAPITEC-SE).

 

Recebido em 26 de Julho de 2011/ Aceite em 17 de Março de 2013

 

NOTAS

1 e.g. – exempli gratia (por exemplo).